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Breves considerações acerca do regime de bens da participação final nos aquestos

Breves considerações acerca do regime de bens da participação final nos aquestos

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O regime de bens da participação final nos aquestos prevê que cada cônjuge possua um patrimônio próprio, cuja administração é exclusiva de cada um.

Contextualização

O regime da participação final nos aquestos, novidade trazida pelo novo Código Civil, que ao introduzi-lo suprimiu o regime dotal, vem disciplinado nos artigos 1.672 a 1.686.

Menos conhecido, este regime prevê que cada cônjuge possua um patrimônio próprio, cuja administração é exclusiva de cada um. Os bens são de propriedade do cônjuge em nome do qual estão registrados. Os bens em nome dos dois pertencem a cada um proporcionalmente à sua contribuição para a compra. Também as dívidas não são partilhadas, exceto se ambos foram beneficiados por elas. Neste regime, aplicam-se, portanto, as regras da separação de bens e da comunhão de aquestos.

Dissolvida a sociedade conjugal, marido e mulher têm direito à metade dos bens adquiridos com a renda do trabalho do casal, excluídos os patrimônios particulares, que são formados pelos bens anteriores ao casamento e pelos comprados com recursos da sua venda, pelos bens recebidos por doação ou herança e pelas dívidas relativas a estes bens.


Raízes Históricas: Conceito Original e Suas Desfigurações

O regime surgiu na Suécia e passou a outras legislações, notadamente as da França, da Alemanha e da Espanha. Destarte, a concepção original sofreu várias alterações teóricas que o desviaram.

Esta desfiguração do regime da participação nos aquestos é assim entendida pelo ilustre Prof. João Baptista Villela:

Com vistas a garantir a efetividade do crédito de participação de cada cônjuge sobre os ganhos do outro, introduziu-se na estrutura do regime um conjunto de medidas que, não se harmonizando com os seus pressupostos jurídicos, acabam por neutralizar os benefícios que com o modelo se pretende instituir.

Assim é que na Suécia não assiste ao cônjuge, sem o consentimento do consorte, o direito de dispor de seus bens matrimoniais ou mesmo de hipotecá-los. E bens matrimoniais não são ali apenas os adquiridos a título oneroso após o casamento, senão todos aqueles – mesmo os de aquisição anterior – que não estejam marcados por uma vinculação pessoal com o titular.

Desrespeitada a proibição de alienar ou gravar de hipoteca, fica o ato sujeito a desfazimento. A restrição de dispor e dar em garantia alcança mesmo certos bens móveis.

No direito da República Federal da Alemanha, além da proibição – de discutida exegese – sob que está cada cônjuge de obrigar-se, sem a adesão do outro, pela totalidade do matrimônio, prevê-se a ineficácia de atos singulares de alienação, concluídos sem outorga conjugal.

O legislador francês adotou linha diversa de operação, mas que pode chegar aos mesmos resultados práticos. Em aparência e, até certo ponto, mesmo em realidade, não só a administração e o gozo dos bens próprios são exclusivos de um e outro cônjuge, como nenhuma prescrição normativa os impede de aliená-los livremente. Mas na formação contábil dos patrimônios, para o fim de se fixar seus respectivos acréscimos, manda a lei agregar aos bens existentes aqueles cuja alienação tenha determinado o empobrecimento de seus titular: ‘aos bens existentes reúnem-se ficticiamente os de que o esposo dispôs entre vivos, a menos que o outro cônjuge haja consentido na doação, assim como os teria alienado fraudulentamente. A alienação para renda vitalícia ou a fim do perdido presume-se feita em fraude dos direitos do cônjuge, se este não deu seu consentimento’.

Para garantir a satisfação do seu crédito de participação, o cônjuge-credor pode recorrer subsidiariamente a ação revocatória, nos termos do artigo 1.577 do Código Civil Francês. Aí radica, de resto, uma considerável diferença entre o modelo francês, de um lado, e os modelos sueco e alemão, de outro: no primeiro só se alcançam os atos de alienação, se necessário para assegurar a satisfação do cônjuge-credor. E mais: no direito francês, se a disposição foi a título oneroso, a ação só poderá ser intentada contra o adquirente de má-fé. Trata-se, sem dúvida, de uma grande vantagem do estatuto francês sobre os outros dois (2005, p. 1).


Conceito

A noção geral está prevista no artigo 1.672 do Código Civil:

Art. 1.672 – No regime da participação final nos aquestos, cada cônjuge possui patrimônio próprio, consoante disposto no artigo seguinte, e lhe cabe, à época da dissolução da sociedade conjugal, direito à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento.

Aquestos, quer dizer, bens adquiridos na constância da convivência conjugal.

Para optar pelo regime da participação final nos aquestos, faz-se indispensável, a celebração do pacto antenupcial.

Suas características reúnem elementos da separação de bens, dentro da constância do casamento, e da comunhão parcial, na dissolução da sociedade conjugal e a apuração contábil do ativo e do passivo.

A regra geral é a formação de dois patrimônios distintos, o do marido e o da mulher (os bens adquiridos antes ou depois do casamento constituem patrimônio particular); quando da dissolução da sociedade conjugal, os bens são considerados de acordo com o modelo da comunhão parcial.

Cada cônjuge conserva seu patrimônio pessoal, inclusive a livre administração. Exige-se, porém, para a venda de imóveis a autorização do outro.

Consideram-se aquestos não apenas os que restarem no momento da dissolução da sociedade conjugal, mas todos os bens adquiridos durante o tempo em que durou o casamento e os respectivos valores se tiverem sido alienados. Deve-se realizar, portanto, uma apuração de natureza contábil.

Durante o período em que perdurar o casamento, não haverá qualquer comunhão de bens, ainda que parcial. Existe apenas uma expectativa de direito, que será constituído no momento em que a sociedade conjugal chegar ao fim. Marido e mulher comportam-se como se estivessem submetidos ao regime da separação de bens.

Com a dissolução da sociedade conjugal, o Código Civil estabelece a forma como se dará a apuração e partilha contábil.

Art. 1.674 – Sobrevindo a dissolução conjugal, apurar-se-á o montante dos aquestos, excluindo-se da soma dos patrimônios próprios:

I – os bens anteriores ao casamento e os que em seu lugar se sub-rogaram;

II – os que sobrevieram a cada cônjuge por sucessão ou liberalidade;

III – as dívidas relativas a estes bens.

Apuram-se, portanto, os bens anteriores ao casamento, os sub-rogados a eles e os que sobrevierem a cada cônjuge por sucessão ou liberalidade e as dívidas relativas aos bens. Estes bens são excluídos dos aquestos.

O artigo 1.675 diz que “ao determinar-se o montante dos aquestos, computar-se o valor das doações feitas por um dos cônjuges, sem a necessária autorização do outro; neste caso, o bem poderá ser reivindicado pelo cônjuge prejudicado ou por seus herdeiros, ou declarado no monte partilhável, por valor equivalente ao da época da dissolução”.

Em conformidade com o disposto no artigo 1.675 do Código Civil, inclui-se nos aquestos o valor das doações feitas por um dos cônjuges sem autorização do outro, facultando-se inclusive, a reivindicação destes bens e eventuais alienações feitas em detrimento da meação.  Devem ser as doações e alienações realizadas em bens adquiridos na constância do casamento.

Os artigos 1.683 e seguintes do Código Civil disciplinam a divisão dos aquestos, tema este que será, de forma detalhada, oportunamente, em apartado e, estudado.


Natureza Jurídica: Distinção Com o Regime da Comunhão Parcial de Bens

Em comparação com o regime da comunhão parcial de bens, a noção geral é de que no regime da comunhão parcial os cônjuges participam dos aquestos desde a celebração do casamento; no regime da participação final nos aquestos, os cônjuges participam dos aquestos apenas no final, quando da dissolução do casamento.

Para o doutrinador José Luiz Gavião de Almeida, “trata-se de um regime mutante: é de separação judicial durante o matrimônio, e de comunhão parcial quando a sociedade conjugal é extinta” (ALMEIDA, 2008, P. 351).

A diferença é bem simples, ou seja, na comunhão parcial todos os bens adquiridos pelos cônjuges que não sejam por herança, doação (salvo se a herança ou doação for feita especificamente para ambos os cônjuges), além daquelas outras hipóteses dispostas no artigo 1.659, bem como aqueles que já constassem no patrimônio individual antes do casamento ou os que a eles se tenham sub-rogado, não entram na comunhão, porém todos aqueles sejam, a exclusão destes, adquiridos na constância do casamento, sim integram o acervo comum.

Na comunhão parcial, portanto, a única coisa que se verificará, na dissolução da sociedade conjugal, será o momento da aquisição dos bens e a sua origem; não se tratando das hipóteses acima aventadas e tão somente pelo fato de terem sido adquiridos depois do casamento, pertencerão a ambos os cônjuges.

 Na participação final dos aquestos, a disposição é similar (para precisar as diferenças se deve realizar o cotejo dos artigos 1.659, 1.660, 1.673 e 1.674), porém a união de bens havidos na constância do casamento somente ocorrerá no momento da dissolução, e daí o nome participação final, ou seja, podem os cônjuges, até antes da dissolução, dispor livremente de seus bens como se fossem inteiramente seus, administrá-los como queiram, inclusive aliená-los, se forem móveis, ou ainda os imóveis, desde que assim determinados no pacto antenupcial, à guisa do artigo 1.656. É, portanto, somente no final da sociedade conjugal que se realiza esta participação.


Fundamento Ético

Segundo nos ensina o Prof. João Baptista Villela, da Universidade Federal de Minas Gerais, o regime da participação final nos aquestos está “fundado no propósito ético de associar cada cônjuge aos ganhos do outro e inspirado economicamente na intenção de conciliar as vantagens da comunhão com as da separação” (VILLELA, 2005, p. 1).

Para o ilustre professor, o regime da participação final nos aquestos “padece de construção dogmática defeituosa. Seu estatuto legal, além de incongruente sob o ponto-de-vista da estrutura, acaba por combinar antes os inconvenientes da separação com os da comunhão” (VILLELA, 2005, p. 1).

Na justificativa do projeto do novo Código Civil afirmou-se a necessidade deste regime para atender a situações especiais e aproximar nossa legislação daquelas existentes em nações mais desenvolvidas.

Segundo Miguel Reale, “sob a denominação de regime de participação final nos aquestos, para distingui-lo do regime da comunhão parcial, que implica aquela participação desde a celebração do casamento, prevê-se um novo regime de bens que poderá atender a situações especiais, tal como se verifica nas nações que vão atingindo maior grau de desenvolvimento, sendo frequente o caso de ambos os cônjuges exercerem atividades empresariais distintas” (REALE, 1975, p. 109).

Conclui-se então, que a justificativa estaria em que o acúmulo de capital verificado durante o casamento, seja em virtude do trabalho, seja em decorrência de poupança, resulta esforço de ambos os cônjuges, a quem deve, por conseguinte reverter.

Manifesta-se sob duas formas a combinação dos elementos integrantes deste regime: o regime da comunhão de aquestos e o da participação final nos aquestos. No primeiro comunicam-se os mesmos bens adquiridos; no segundo, permanece cada bem sob a propriedade exclusiva do cônjuge que o tenha adquirido, surgindo para o outro um direito de participação no seu valor.


Inspiração Econômica

Para bem compreender os fins e o como especificamente funciona o regime da participação final nos aquestos, faz-se necessário entender qual é a sua inspiração de ordem econômica.

Segundo o entendimento do ilustre Prof. João Batista Villela, a participação final nos aquestos pretende ser:

A síntese coletiva de dois valores antagônicos na organização patrimonial do casamento. De um lado, quer incorporar os ideais do regime da comunhão, que, além de expressar a unidade de vidas do casal, assegura aos cônjuges mútua proteção econômica. De outro lado, não deseja abrir mão da maior autonomia conjugal e das comodidades que conferem os regimes separatórios. Por isso, ao mesmo tempo que define uma participação de cada cônjuge nos incrementos patrimoniais do outro, evita – ao menos em sua forma pura – a constituição de qualquer massa comum de bens (2005, p. 1).

Trata-se, portanto, de um regime matrimonial de bens que almeja aliar as vantagens da comunhão com as da separação, ao mesmo tempo em que se propõe a sanar os inconvenientes de uma e de outra. Está, como se vê, a meio caminho entre os regimes comunitários e da separação de bens.

Esta é a sua inspiração econômica, um regime que mistura a comunhão com a separação, revelando, em matéria patrimonial, a independência dos cônjuges (separados nos bens) e a vontade comunitária de participação nos ganhos (associados).


Razão Prática: Críticas da Doutrina

Ainda desacreditado e pouco utilizado, o regime da participação final nos aquestos, não se mostra, ao olhar da doutrina, como sendo um modelo possível e capaz de servir e atender as aspirações conjugais no tocante a administração e eventual partilha dos bens, quando da dissolução da sociedade conjugal, seja pela separação judicial, pelo divórcio e pela morte de um dos cônjuges.

Muito se critica sobre o modelo trazido ao nosso ordenamento jurídico pelo novo Código Civil, inclusive de que se trataria de um modelo alienígena, importado de outras legislações, sobretudo, da Suécia, onde teria tido origem, da França e da Alemanha.

Além de não se tratar de uma contribuição original, os críticos do regime lhe impõem importantes ressalvas de que teria o legislador desviado frontalmente de suas nascentes teóricas.

A principal crítica se alicerça no fato de que, no modelo brasileiro, atribuir ao cônjuge não-proprietário ou seus herdeiros, ação reivindicatória sobre os bens alienados sem o seu consentimento, o que seria tecnicamente impróprio, considerando que falta um de seus pressupostos mínimos, qual seja, o domínio do autor, visto que o ato de disposição se fez por quem era o proprietário exclusivo. Também não exclui os bens móveis.


A Administração dos Bens do Casal

Os cônjuges, marido ou mulher, podem livremente praticar os atos de disposição em administração dos bens do casal necessários ao desempenho de sua profissão.

Não há, portanto, qualquer limitação a qualquer dos cônjuges, em conjunto ou isoladamente, se imbuídos de boa-fé, para alienar os bens do casal ou os administrar, conforme disciplina o caput do artigo 1.663 do Código Civil:

Art. 1.663 – A administração do patrimônio comum compete a qualquer dos cônjuges.

O princípio constitucional da igualdade entre homem e mulher, preconizado no artigo 226, parágrafo 5º da Constituição Federal, não deixa dúvida: podem os cônjuges, em conjunto ou isoladamente, munidos de boa-fé, alienar os bens do casal ou os administrar, conforme já dito, exceção se faz a alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis, conforme disposto no artigo 1.642, I e VI do Código Civil:

Art. 1.642 – Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quanto a mulher podem livremente:

I – praticar todos os atos de disposição e de administração necessários ao desempenho de sua profissão, com as limitações estabelecidas no inciso I do art. 1.647;

VI – praticar todos os atos que não lhes forem vedados expressamente.

É lícito a qualquer dos cônjuges, independentemente de autorização prévia do outro, comprar bens domésticos. Se através de financiamento ou crediário, obrigam-se solidariamente ambos os cônjuges. Artigos 1.643 e 1.644 do Código Civil.

Art. 1.643 – Podem os cônjuges, independentemente de autorização um do outro:

I – comprar, ainda a crédito, as coisas necessárias à economia doméstica;

II – Obter, por empréstimo, as quantias que a aquisição dessas coisas possa exigir.

Art. 1.644 – As dívidas contraídas para os fins do artigo antecedente obrigam solidariamente ambos os cônjuges.

Em havendo a impossibilidade de um dos cônjuges em exercer a administração dos bens, poderá o outro cônjuge fazê-lo. Poderá, inclusive, alienar bens imóveis comuns e do consorte, também os móveis, desde que com autorização judicial, conforme disciplina o artigo 1.651 do Código Civil:

Art. 1.651 – Quando um dos cônjuges não puder exercer a administração dos bens que lhe incumbe, segundo o regime de bens, caberá ao outro:

I – gerir os bens comuns e os do consorte;

II – alienar os bens móveis comuns;

III – alienar os imóveis comuns e os móveis ou imóveis do consorte, mediante autorização judicial.

Aquele cônjuge que estiver na posse de bens particulares comuns ou do outro cônjuge será o responsável pelos frutos, se o rendimento for comum, como procurador, se munido de mandato expresso ou tácito para administrá-los, e como depositário. Deverá prestar contas se convocado.

Terá legitimidade para exigir a responsabilidade o outro cônjuge ou os seus herdeiros, conforme disciplina o artigo 1.652 do Código Civil:

Art. 1.652 – O cônjuge, que estiver na posse dos bens particulares o outro, será para com este e seus herdeiros responsável:

I – como usufrutuário, se o rendimento for comum;

II – como procurador, se tiver mandato expresso ou tácito para os administrar;

III – como depositário, se não for usufrutuário, nem administrador.

Além da possibilidade de qualquer dos cônjuges administrarem os bens, a legislação permite que um dos cônjuges possa ingressar em juízo para buscar a proteção do bem comum nas hipóteses de pedir a desobrigação ou reivindicar o livre domínio dos imóveis do casal que tenham sido gravados ou alienados sem o consentimento ou sem o suprimento judicial (artigo 1.642, III do Código Civil) ou se não casados sob o regime da separação absoluta, de pedir a rescisão dos contratos de fiança e doação ou a invalidação do aval realizado pelo outro cônjuge com infração ao disposto nos incisos III e IV do artigo 1.647 do Código Civil e para pedir a posse, propriedade e domínio dos bens móveis ou imóveis adquiridos na constância do casamento que foram doados ou transferidos pelo outro cônjuge ao concubino, desde que provado que os bens não foram adquiridos pelo esforço comum destes, se o casal estiver separado de fato por mais de cinco anos (artigo 1.642, V do Código Civil).

Art. 1.642 – Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quanto a mulher podem livremente:

 III – desobrigar ou reivindicar os imóveis que tenham sido gravado ou alienados sem o seu consentimento ou sem suprimento judicial;

V – reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo outro cônjuge ao concubino, desde que provado que os bens não foram adquiridos pelo esforço comum destes, se o casal estiver separado de fato por mais de 5 (cinco) anos.

Art. 1,647 – Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum cônjuge pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:

III – prestar fiança ou aval;

IV – fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação.

O prazo decadencial para anulação de ato por falta de autorização conjugal ou de suprimento judicial é de dois anos, contados do término da sociedade conjugal, tendo legitimidade ativa o cônjuge a quem caiba conceder a outorga ou por seus herdeiros, conforme disciplinam os artigos 1.649, caput e 1.650 do Código Civil:

Art. 1.649 – A falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessária (art. 1.647), tornará anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a anulação, até 2 (dois) anos depois de terminada a sociedade conjugal.

Art. 1.650 – A decretação de invalidade dos atos praticados sem outorga, sem consentimento, ou sem suprimento do juiz, só poderá ser demandada pelo cônjuge a quem cabia concedê-la, ou por seus herdeiros.

Nada obsta, contudo, que o cônjuge venha posteriormente convalidar o ato praticado pelo outro cônjuge sem o seu consentimento, o que se fará através de instrumento público, no caso de bem imóvel, ou particular, se bem móvel. Feito isto, desaparece o vício do ato jurídico, nos termos do parágrafo único do artigo 1.649 do código Civil.

A anulação se presta às alienações de bens particulares do cônjuge.

No caso da reivindicação, que se presta às alienações de bens comuns, tem a natureza de ação real, e, à falta de prazo prescricional específico, deve-se observar aquele fixado pelo artigo 205 do Código Civil, qual seja, 10 (dez) anos.


O Cálculo dos Aquestos Finais no Momento da Dissolução da Sociedade Conjugal

Com a dissolução da sociedade conjugal o Código Civil estabelece a forma como se dará a operação contábil.

Art. 1.674 – Sobrevindo a dissolução da sociedade conjugal, apurar-se-á o montante dos aquestos, excluindo-se da soma dos patrimônios próprios:

I – os bens anteriores ao casamento e os que em seu lugar se sub-rogaram;

II – os que sobrevieram a cada cônjuge por sucessão ou liberalidade;

III – as dívidas relativas a esses bens.

Em resumo, apuram-se os bens anteriores ao casamento, os sub-rogados a eles e os que sobrevieram a cada cônjuge por sucessão ou liberalidade e as dívidas relativas aos bens. Estes bens são excluídos dos aquestos.

Seria mais técnico apenas haver informado que não seriam incluídas as dívidas referentes aos bens que também não se comunicam.

O artigo 1.675 disciplina que “ao determinar o montante dos aquestos, computar-se-á o valor das doações feitas por um dos cônjuges, sem a necessária autorização do outro; nesse caso, o bem poderá ser reivindicado pelo cônjuge prejudicado ou por seus herdeiros, ou declarado no monte partilhável, por valor equivalente ao da época da dissolução”.

Desta forma, nos termos do artigo 1.675 do Código Civil, inclui-se nos aquestos o valor das doações feitas por um dos cônjuges sem autorização do outro, facultando-se, inclusive, a reivindicação desses bens e eventuais alienações feitas em detrimento da meação. Importante ressaltar, que trata-se das doações e alienações feitas dos bens adquiridos na constância do casamento.

Art. 1.675 – Ao determinar-se o montante dos aquestos, computar-se-á o valor das doações feitas por um dos cônjuges, sem a necessária autorização do outro; nesse caso, o bem poderá ser reivindicado pelo cônjuge prejudicado ou por seus herdeiros, ou declarado no monte partilhável, por valor equivalente ao da época da dissolução.

Em seguida, dispõe o artigo 1.683 do Código Civil:

Art. 1.683 – Na dissolução do regime de bens por separação judicial ou por divórcio, verificar-se-á o montante dos aquestos à data em que cessou a convivência.

Logo, portanto, assim que dissolvido o casamento pela separação judicial ou pelo divórcio, verifica-se o montante dos aquestos. Se a divisão for possível, faz-se a repartição de cada um. Se não o for, apura-se o respectivo valor para reposição em dinheiro em favor do cônjuge não proprietário, nos termos do artigo 1.684 do Código Civil:

Art. 1.684 – Se não for possível, nem conveniente a divisão de todos os bens em natureza, calcular-se-á o valor de alguns ou de todos para reposição em dinheiro ao cônjuge não proprietário.

Então, se não for possível repor em dinheiro, deve-se aplicar o disposto no parágrafo único do artigo 1.684 do Código Civil:

Art. 1.684, parágrafo único. Não se podendo realizar a reposição em dinheiro, serão avaliados e, mediante autorização judicial, alienados tantos bens quantos bastarem.

Vejamos, através da seguinte simulação, como se procede a divisão dos bens no regime da participação final nos aquestos:

. Patrimônio final do marido.......................................................................R$400.00,00

. ( - ) Bens excluídos................................................................................R$120.000,00

. ( = ) Ganhos ou aquestos......................................................................R$280.000,00

. Patrimônio final da mulher.....................................................................R$200.000,00

. ( - ) Bens excluídos................................................................................R$100.000,00

. ( = ) Ganhos ou aquestos......................................................................R$100.000,00

. Crédito de partição devido pelo marido à mulher:

. ( + ) Ganhos ou aquestos do marido.....................................................R$280.000,00

. ( - ) Ganhos ou aquestos da mulher......................................................R$100.000,00

. ( = ) Sub produto dos ganhos do marido...............................................R$180.000,00

. ( = ) Sub produto dos ganhos do marido (R$180.000,00 / 2)..................R$90.000,00

Tem-se então, que o crédito da mulher contra o marido é de R$140.000,00 (R$280.000,00 dividido por 2) e que o crédito do marido contra a mulher é de R$50.000,00 (R$100.000,00 dividido por 2).

Esses créditos são compensados e assim se obtém o crédito de participação devido pelo marido à mulher, qual seja, R$90.000,00 (R$140.000,00 - R$50.000,00).

A diferença marcante do regime da participação final nos aquestos frente aos demais regimes está consubstanciada no fato de que a participação se faz sobre os incrementos patrimoniais, mas de forma contábil e modo de apuração de valores, não através da comunhão ou condomínio.

Significa então que, após a compensação de bens, aquele cônjuge em desvantagem passa a ter um crédito que consiste na diferença apurada, e não uma parcela sobre o bem indivisível.

Quanto à parcela que subtrai do patrimônio, o chamado passivo, dispõe o artigo 1.677 do Código Civil:

Art. 1.677 – Pelas dívidas posteriores ao casamento, contraídas por um dos cônjuges, somente este responderá, salvo prova de terem revertido, parcial ou totalmente, em benefício do outro.

Já o artigo 1.678 dispõe:

Art. 1.678 – Se um dos cônjuges solveu uma dívida do outro com bens do seju patrimônio, o valor do pagamento deve ser atualizado e imputado, na data da dissolução, à meação do outro cônjuge.

Em nota de pé de página, o doutrinador José Luiz Gavião de Almeida, em seu livro Direito Civil – Família esclarece:

O valor utilizado, da época da dissolução, vale para todas as hipóteses de extinção da sociedade conjugal. Mas há que se entender o dispositivo em consonância com o art. 1.683 do CC, que fale que, no caso de separação judicial, o montante dos aquestos é verificado pela data em que essa providência for requerida. Mas uma coisa é os bens serem considerados aquestos; outra, o valor que ingressam na comunhão. Ainda que o artigo fale apenas em separação judicial, o mesmo se deve entender relativamente ao divórcio direto, e à anulação ou nulidade de casamento com prévia separação de corpos, pois em todos esses casos, o que não se quer é que um dos cônjuges se beneficie com o esforço isolado do outro. (2008, p. 353)


Bibliografia Consultada

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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, José Márcio de. Breves considerações acerca do regime de bens da participação final nos aquestos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4913, 13 dez. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/51361. Acesso em: 5 maio 2024.