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A eficácia da prisão civil nas ações de execução de alimentos

A eficácia da prisão civil nas ações de execução de alimentos

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A eterna polêmica sobre a discutível eficácia da prisão civil nas ações de execução de alimentos, tratada à luz das modificações implementadas pela Lei 13.105/15.

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho busca fazer uma análise do instituto da prisão civil aplicável ao devedor de alimentos que esteja em situação de inadimplência, na fase de execução processual, e averiguar se este mecanismo é realmente eficaz no que diz respeito à satisfação do crédito alimentar.

Em outras palavras, procura-se, com esta pesquisa, obter um melhor entendimento dos fundamentos, forma e consequentes resultados desta prisão, visando compreender se ela atinge ou não o fim a que se propõe.

Gonçalves (2015, p. 506) trata do significado da expressão alimentos e afirma que a definição da referida palavra merece ampla interpretação, não recaindo sobre esta o seu sentido literal, qual seja o sustento alimentar de uma pessoa, devendo ser utilizado entendimento técnico e abrangente hermenêutica a cada caso concreto. Tal vocábulo envolve não só o essencial ao sustento, mas também tudo aquilo que é necessário para que o alimentando mantenha sua condição tanto social quanto moral.

A prestação de alimentos advém de um dever familiar imposto pela Constituição Federal de 1988, em seu Artigo 229, em que o Estado atribui aos pais, detentores do poder familiar, o dever de assistência aos filhos menores, afastando a sua própria responsabilidade, colocando-se assim em terceiro lugar (em segundo está a sociedade) na lista dos responsáveis pela manutenção do bem estar e da dignidade dos integrantes de uma família, como nos afirma o Artigo 227 da Carta Magna.

Essa obrigação de prestar alimentos é, portanto, norma de ordem pública, justificada pelo Princípio da Solidariedade Familiar, previsto no Artigo 3º, I, da Constituição Federal. Neste dispositivo, tal princípio é reconhecido como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, e “deve-se entender por solidariedade o ato humanitário de responder, pelo outro, de preocupar-se, e de cuidar de outra pessoa.” (TARTUCE, 2014, p. 13).

Além de estar fundamentado nos princípios da dignidade da pessoa humana e principalmente no da solidariedade familiar, o dever de pagar alimentos tem como base legal o Art. 1694, caput, do Código Civil de 2002: “Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros, pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.”

Desse modo, quando se trata de alimentos a serem prestados em decorrência do dever advindo do poder familiar, e ainda, envolver direito de incapaz, este dever de sustento tem um nível de exigência maior.

A incapacidade e vulnerabilidade do alimentando somadas ao alívio do encargo de dar assistência, que seria próprio do Estado, dão origem à única possibilidade de prisão civil por inadimplência de dívida atualmente em vigor no Brasil.

A Convenção Internacional de Direitos Humanos, mais conhecida como Pacto de São José da Costa Rica, incorporou ao ordenamento jurídico brasileiro a possibilidade de se decretar a prisão civil do devedor de alimentos inadimplente, o que está previsto no Artigo 5º, LXVII, da Constituição Federal: “não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel”.

Há muito se proibiu a prisão do depositário infiel, matéria inclusive sumulada pelo Supremo Tribunal Federal, através da Súmula Vinculante 25 afirmando que “é ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade de depósito”.

 Desse modo, resta somente a opção de prisão do devedor de alimentos, que “não é uma pena, sanção ou punição, ostentando a função de medida coercitiva, destinada a forçar o cumprimento da obrigação por parte do devedor.” (DIDIER, 2010, p. 698)

Diante de todo o exposto, julga-se ser de extrema relevância a análise do instituto da prisão civil, ainda porque na prática a situação muda de proporção e envolve direitos fundamentais tanto do ‘credor’ quanto do devedor, os quais devem ser sopesados e aplicados respeitando os limites e prioridades de cada um.

Justifica-se ainda este trabalho pelo fato do sistema penitenciário brasileiro ser falho, além de não funcionar literalmente segundo a lei e não ter infra-estrutura suficiente para que sejam abrigados os presos criminais e civis em regime fechado.

O trabalho tem como principal fonte instrutora a pesquisa bibliográfica, a qual possibilita uma maior familiaridade com os temas abaixo relacionados.

As fontes utilizadas são livros, artigos científicos e publicações periódicas, principalmente as especializadas, bem como jurisprudências e o próprio texto legal, que possuem temas ligados ao Direito Constitucional, no que se refere aos princípios e pressupostos que fundamentam a obrigação de prestar alimentos e o instituto da prisão civil; ao Direito de Família, no que tange ao poder familiar, aos alimentos propriamente ditos, e à Lei de Alimentos (Lei 5478/1968); e ainda ao Processo Civil, analisando a execução de alimentos e a eficácia da prisão como meio coercitivo para satisfação do crédito alimentar.  

Os métodos adotados em relação aos dados bibliográficos são o dedutivo e monográfico.

O primeiro capítulo trata da obrigação alimentar em seus aspectos inicias, analisando constitucionalmente o rol de princípios que a fundamenta, a origem do direito de dar e receber os alimentos, suas características e pressupostos e ainda os pontos considerados relevantes pelo magistrado na hora de fixar o quantum a ser pago.

Em seguida, analisa-se a fase de execução e do cumprimento de sentença, fazendo a distinção entre execução espontânea e execução forçada, abordando a função jurisdicional desta última junto aos princípios que são próprios dessa fase processual. Ainda no segundo capítulo, trata-se do rito do cumprimento de sentença e de todas as mudanças implantadas pelo Novo Código de Processo Civil de 2015, as quais deram fim a várias discussões doutrinárias e divergências jurisprudenciais, surgidas da omissão do legislador no Código de 1973.

No terceiro capítulo fala-se detalhadamente do objeto desta pesquisa, a prisão civil. Nele se comentam os aspectos jurídicos do instituto, a ratificação do Pacto de São José da Costa Rica, o conflito entre os direitos igualmente fundamentais de titularidade do credor e do devedor; e as condições de aplicação dessa medida que é excepcional, além de extremamente rigorosa.

Faz-se também uma breve explanação acerca do regime de cumprimento das prisões civis, pois muitos eram os entendimentos jurisprudenciais que decretavam a prisão civil com prazo a ser cumprido em regime aberto ou semiaberto, divergindo do que foi estabelecido pelo § 4º do Art. 528, CPC/15.

E por fim chega-se à grande questão inspiradora desta pesquisa, analisa-se a eficácia da medida de coerção pessoal, utilizada para compelir o devedor inadimplente a satisfazer sua dívida. Prender o executado é realmente o método mais efetivo para garantir o pagamento de pensão alimentícia?

Após analisar a prisão civil em todos os seus aspectos, busca-se entender se essa medida extrema é eficaz quando aplicada a todos os casos, ou se em determinadas situações a aplicação de outros meios executórios trariam resultados mais rápidos e satisfatórios.


2 DA OBRIGAÇÃO DE PRESTAR ALIMENTOS

Neste Capítulo, encontra-se a base fundamental que sustenta constitucionalmente a obrigação de prestação alimentícia de uns parentes para com outros, principalmente em relação à obrigação dos pais para com seus filhos, a qual é decorrente do poder familiar e quando firmada judicialmente e inadimplida pode levar à prisão aquele que é obrigado.

Trataremos ainda da obrigação alimentar em sua origem, analisando seus pressupostos e características, bem como as partes obrigadas e a ordem de preferência caso o devedor direto esteja em situação não favorável à satisfação da obrigação.

E por fim, abordaremos os pontos e limites que devem ser observados e levados em consideração pelo juiz no momento da fixação do quantum a ser pago.

2.1 BASE PRINCIPIOLÓGICA

Essa base é composta por vários princípios, que segundo a definição de De Plácido e Silva é:

No sentido jurídico, notadamente no plural, quer significar as normas elementares ou os requisitos primordiais instituídos como base, como alicerce de alguma coisa. E, assim, princípios revelam o conjunto de regras ou preceitos, que se fixaram para servir de norma a toda espécie de ação jurídica, traçando, assim, a conduta a ser tida em qualquer operação jurídica. (...) Princípios jurídicos, sem dúvida, significam os pontos básicos, que servem de ponto de partida ou de elementos vitais do próprio direito. (DE PLÁCIDO E SILVA apud PRETEL, 2009)

O tema em questão segue o que os princípios Constitucionais e os relacionados ao Direito de Família preceituam, além de ter respaldo no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Nesse sentido, passemos a entender os pontos de partida que orientam e fundamentam a obrigação de prestar alimentos.

2.1.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

Expresso no 1º artigo da Constituição Federal Brasileira de 1988, a Dignidade da pessoa humana - juntamente com a soberania, cidadania, valores sociais do trabalho, livre iniciativa e pluralismo político -, é considerada fundamento da República Federativa do Brasil, o que quer dizer que esta expressão define algo que deve ser sobremaneira garantido pelo Estado Democrático.

Tal expressão foi incluída na Carta Magna de 88 fundamentando-se na certeza de que o homem não pode ser avaliado como coisa, não pode receber um preço, e na ordem da natureza é um ser superior, pois possui como valor intrínseco a dignidade. Esse valor foi então consubstanciado sob a forma de princípio fundamental, tornando-se, para muitos, um Macroprincípio ou Superprincípio, considerado o bem maior de todo o ordenamento jurídico.

Maria Berenice Dias trata do assunto afirmando:

Na medida em que a Constituição elevou a dignidade da pessoa humana a fundamento da ordem jurídica, houve uma opção expressa pela pessoa, ligando todos os institutos a realização de sua personalidade. Tal fenômeno provocou a despatrimonialização e a personalização dos institutos, de modo a colocar a pessoa humana no centro protetor do direito. (DIAS apud SANTOS, 2013)

Dessa forma, partindo da máxima de que não há ser humano sem dignidade, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana norteia vários outros princípios e deve ser observado em inúmeras situações, principalmente nas que se relacionam com o Direito de Família, pois esta é a base da sociedade e merece total atenção e garantias especiais por parte do Estado.

Em termos práticos, a garantia deste princípio no que diz respeito ao Direito de Família consiste em buscar meios que possibilitem a todas as famílias e seus respectivos componentes o direito à sobrevivência digna, ou seja, à alimentação, à saúde, moradia, educação, lazer, acesso à informação, permitindo assim que os indivíduos integrantes de um seio familiar cresçam de maneira próspera e saudável e assim permaneçam.

2.1.2 Princípio da Solidariedade Familiar

Sabe-se que o encargo e a responsabilidade de buscar a garantia de uma vida digna e saudável aos cidadãos são do Estado, entretanto, claro está que esse objetivo não consegue ser alcançado pelas medidas e programas assistencialistas do Governo. Por não conseguir suprir todas as necessidades existentes para a subsistência de um indivíduo, o Estado transfere este dever à família e seus componentes.

Nesse sentido, afirma Diniz:

Há uma tendência moderna de impor ao Estado o dever de socorrer os necessitados, através de sua política assistencial e previdenciária, mas com o objetivo de aliviar-se desse encargo, o Estado o transfere, mediante lei, aos parentes daqueles que precisam de meios materiais para sobreviver, pois os laços que unem membros de uma mesma família impõem esse dever moral e jurídico. (DINIZ, 2011, p. 615).

Antes o dever de auxílio aos parentes consangüíneos era algo advindo dos valores éticos e morais, em que o indivíduo se via moralmente obrigado a ajudar seus familiares, pelo simples fato de possuírem o mesmo sangue. Atualmente, essa transferência é justificada pela interpretação que se dá ao cuidado, afeto e ao respeito.

Aqui o cuidado é tido como um valor jurídico e unido ao vínculo afetivo que existe entre os integrantes de uma família e ao respeito que é o que se deve ter pelo outro, pelo próximo, passam a fundamentar a solidariedade entre os parentes, substituindo a obrigação objetiva do Estado.

Assim surge o dever de prestação alimentícia pelos pais ou, na falta deles, pelos parentes que devem suprir as lacunas essenciais para a sobrevivência do ser humano.

Segundo Gonçalves:

O dever de prestar alimentos funda-se na solidariedade humana e econômica que deve existir entre os membros da família ou parentes. Há um dever legal de mútuo auxílio familiar, transformado em norma, ou mandamento jurídico. Originariamente, não passava de um dever moral, ou uma obrigação ética, que no direito romano se expressava na equidade, ou no officium pietatis, ou na caritas. No entanto, as razões que obrigam a sustentar os parentes e a dar assistência ao cônjuge transcendem as simples justificativas morais ou sentimentais, encontrando sua origem no próprio direito natural. (GONÇALVES, 2015, p.507)

Desse modo, o Estado, através do Artigo 3º, I, da Constituição Federal, elege o Princípio da Solidariedade como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, e passa aos componentes de uma entidade familiar o dever de buscar meios que promovam um desenvolvimento geral e completo tanto físico quanto biopsíquico dos indivíduos.

2.1.3 Princípio da Paternidade Responsável

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 226, §7, passou a considerar a paternidade responsável como princípio constitucional, o qual fundamenta a obrigação de prestação alimentícia, advinda do poder familiar, que é imputada geralmente aos pais da criança.

Além da Carta Maior, o ordenamento jurídico brasileiro conta ainda com o Estatuto da Criança e do Adolescente, que tem como função guardar os direitos dos menores, e tem como prioridade absoluta a proteção integral destes, imputando à família o dever de assegurar a efetivação dos mesmos.

Um conceito resumido e objetivo acerca do aludido princípio foi apresentado em decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro:

Vigora no nosso ordenamento jurídico o Princípio da Paternidade Responsável, que se traduz, resumidamente, no direito que a prole tem de ver estabelecida a paternidade com todos os seus consectários, isto é, assistência, educação, guarda e conforto material e espiritual. (TJ/RJ, AI 00587642320138190000, RJ 0058764-23.2013.8.19.0000, Rel. Des. Leticia de Faria Sardas, 20ª Câmara Cível, j. 19.02.2014, DJe 14.04.2014.)

Vale salientar que a paternidade tem início desde a concepção e com ela nasce também a responsabilidade, que de forma alguma se refere apenas à parte financeira. A responsabilidade envolve também o afeto, o cuidado, a proteção, a convivência, o companheirismo, a amizade e confiança desenvolvidas durante o crescimento da prole.

O acompanhamento dos filhos pelos pais é justificável até que seja necessário. Os encargos e ônus originados do poder familiar devem ser prestados ao menor até o seu completo desenvolvimento, e a este deve ser assegurada a alimentação, saúde, educação, bem estar social, dentre outros direitos fundamentais.     

2.1.4. Princípio do Melhor interesse da Criança

Este princípio tem como ponto de partida a Convenção Universal dos Direitos da Criança, que estabelece que o menor, pela falta de maturidade física e mental, merece proteção especial, e cuidados maiores, inclusive no que compete à Lei, às políticas públicas e aos programas governamentais do Estado.

Dá-se a essa convicção o nome de Doutrina da Proteção Integral, que considera a criança interesse maior e primordial a ser observado tanto pelo olhar privado (parente/família) quanto pelo olhar público (sociedade/Estado).

Essa perspectiva nos remete a outra máxima importante que diz que os interesses das crianças devem ser considerados absolutamente prioritários, ou seja, devem ser satisfeitos com maior celeridade, com real prioridade e urgência, assim como manda o Artigo 3.1 da Convenção Universal dos Direitos das Crianças:

Artigo 3.1. Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança.

O ordenamento jurídico brasileiro incorporou o Princípio do Melhor interesse da Criança, englobando a Doutrina da Proteção Integral e a máxima do interesse de prioridade absoluta quando recepcionou e ratificou a supracitada Convenção em 24 de setembro de 1990.

Constitucionalmente, esse princípio se revela através dos direitos fundamentais de titularidade da criança e do adolescente, e está expresso nos termos do Art. 227 da Carta Magna:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

O Aludido artigo deixa claro que os direitos das crianças e adolescentes possuem absoluta prioridade, e devem ser salvaguardados por três “grupos” diferentes, a família, a sociedade e o Estado, os quais devem agir como garantidores do respeito a essa ordem.

Consolidando as diretrizes impostas pela Constituição de 1988, foi promulgado em 13 de Julho de 1990, o mais avançado diploma referente aos direitos dos menores, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, o qual dá proteção integral aos direitos fundamentais das crianças e estabelece medidas de fiscalização daqueles que são obrigados a garanti-los.

2.2 OBRIGAÇÃO ALIMENTAR – CARACTERÍSTICAS E PRESSUPOSTOS

Após verificar a origem principiológica da obrigação alimentar, iremos analisar as características e os pressupostos intrínsecos a esse mandamento jurídico que é imposto à família.

Fundada no parentesco, segundo o Artigo 1694 do Código Civil de 2002, a obrigação de prestar alimentos é na verdade um ‘dever familiar’, um dever moral convertido em obrigação jurídica de prestar auxílio, sustento e mútua assistência a quem necessita. 

De acordo com o referido artigo essa obrigação jurídica, que como já dito, é do Estado, passa a ser transferida aos ascendentes, descendentes, parentes colaterais até o segundo grau, e ainda os cônjuges e companheiros, estendendo sua aplicação a todos eles e aproximando, quanto as características e efeitos, qualquer espécie de alimentos decorrentes do Direito de Família.

2.2.1 Características da obrigação de prestar alimentos.

A doutrina afirma que essa obrigação de prestar alimentos é caracterizada pela: a) transmissibilidade, b) divisibilidade, c) condicionalidade, d) reciprocidade e e) mutabilidade, das quais passaremos a tratar a seguir: 

a)           A questão da transmissibilidade foi implantada com o Código Civil de 2002, pois no Diploma de 1916, apenas os atrasados seriam respondidos pelos sucessores por classificarem-se como dívida que onerava a herança. O Artigo 1700, do diploma mais atual diz: “A obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor, na forma do art. 1.694”.

No entanto, essa inovação do Novo Código Civil causa confusão no que diz respeito ao objeto da transmissão em si. Questiona-se, por exemplo, se a transmissão é da obrigação por completo ou apenas das prestações vencidas, ou ainda se o pagamento é feito com as forças da herança ou na proporção da necessidade do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.

Por conta de sua redação deveras genérica, muitos projetos de lei buscam que esta seja modificada, viabilizando-se uma melhor e mais fácil interpretação. Em sua obra, Gonçalves faz menção a uma dessas propostas:

Em virtude das dificuldades e perplexidades mencionadas, o Projeto de Lei n. 6920/2002 (atual Projeto de Lei 699/2011), apresentado ao Congresso Nacional pelo Deputado Ricardo Fiuza, propõe se dê ao aludido art. 1.700 do Código Civil a seguinte redação: “A obrigação de prestar alimentos decorrente do casamento e da união estável transmite-se aos herdeiros do devedor, nos limites das forças da herança, desde que o credor da pensão alimentícia não seja herdeiro do falecido”. (GONÇALVES, 2015, p.520-521)

Percebe-se nessa proposta a correta interpretação da norma, visto que se quem pleiteia os alimentos é herdeiro, não pode este receber alimentos e mais o seu quinhão após a morte do autor da herança. E ainda, se não houver herança deixada, o herdeiro que se considera necessitado não pode exigir que os demais herdeiros satisfaçam a dívida com recursos próprios.

Quanto à divisibilidade, no caso em que hajam vários obrigados, essa obrigação é divisível e cada devedor responde por sua quota-parte. Um exemplo é o que ocorre quando o pai pede pensão aos filhos, ou os netos pedem auxílio aos avós. Havendo mais de um filho, o pai não poderá exigir o cumprimento da obrigação apenas de um deles, se assim o fizer optará por receber apenas ¼ da pensão.

Essa também é uma questão inovadora advinda do Código de 2002, que em seu Artigo 1698, segunda parte, preceitua: “sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.”

Trata-se da possibilidade de intervenção de terceiro ou de chamamento ao processo onde qualquer das partes, inclusive o Ministério Público quando legitimado, pode, sem necessidade de anuência do requerente, chamar os demais co-obrigados para também figurarem como parte no processo.

Analisando com calma, existe uma ordem de preferência, na relação obrigacional de pai para filho, se o primeiro, comprovadamente, não tiver condições de suprir a obrigação, esta passa aos ascendentes imediatos, no caso os avós. Se estes também não puderem arcar com a responsabilidade, a ordem é passar a mesma para os descendentes do alimentante e por último, para seus irmãos.

Assim sendo, se os pais não tiverem condições de pagar pensão a seu filho, a obrigação incumbirá aos avós, entretanto, não serão obrigados apenas os avós paternos, todos os avós, tanto paternos quanto maternos ficarão obrigados. É tanto que se a genitora do menor alimentando propor ação de alimentos em face apenas dos avós paternos, estes poderão chamar os avós maternos para integrar a lide, e o juiz fixará a quota parte de cada um de acordo com as respectivas possibilidades.

Ressalte-se que a obrigação dos avós tem caráter complementar e só surge quando, esgotados todos os meios, chega-se a conclusão de que nenhum dos genitores do menor tem condições de prover o seu sustento, momento em que os avós assumem a responsabilidade e após fixado valor a ser pago, em caso de inadimplemento pode até levar à prisão dos mesmos.

Em meio a essa característica da divisibilidade, a Lei 10.741/2003, mais conhecida como Estatuto do Idoso, traz em seu corpo de normas uma exceção por afirmar, em seu Artigo 12, que a obrigação alimentar é solidária, podendo o idoso optar entre os prestadores. Essa regra vai totalmente contra o que prega o Código Civil, deixando insegurança quanto a obedecer a ordem de preferência e à divisibilidade ou não.

Carlos Roberto Gonçalves interpreta e explica a situação em sua obra:

O que se deve entender é que, mesmo no caso dos idosos, aplica-se a ordem preferencial estabelecida no art. 1696 do Código Civil. Se houver vários devedores da classe obrigada, preferencialmente, ao cumprimento da prestação alimentar, poderá o idoso optar entre os aludidos prestadores, na forma do art. 12 da mencionada Lei n. 10.741/2003, para cobrar o valor integral da pensão “de um ou de alguns dos devedores”, ou de todos (CC, art. 275). Desse modo a solidariedade se estabelece em cada classe. Não se pode acionar devedor de classe subseqüente sem antes provar a falta dos que lhe antecedem. (GONÇALVES, 2015, p.527)

c)            Superada a questão da divisibilidade, passemos a analisar porque se diz que a obrigação alimentar é condicional. Essa característica fundamenta-se principalmente pelo binômio necessidade/possibilidade que deve ser aplicado quando da fixação dos alimentos, como veremos melhor mais adiante.

O parágrafo primeiro do Artigo 1694 do Código Civil diz: “os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada”. Assim sendo, não há como exigir de quem não tem condições de adimplir a obrigação sem que seja prejudicado seu próprio sustento. Conclui-se também que, se caso o alimentando passe a ter condições de se manter sem o auxílio da pensão, a obrigação deve ser extinta.

d)           Quando o Código Civil, em seu Artigo 1696, diz: “O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros”, está a falar sobre a reciprocidade, afirmando expressamente que assim como tenho direito de pedir alimentos àqueles eleitos pela Lei, também tenho direito de prestá-los se caso um deles necessite e peça. 

Isso não quer dizer que essas pessoas devam entre si alimentos simultaneamente, a reciprocidade só indica que o devedor de hoje pode se tornar o credor de amanhã, pois os direitos coexistem.

e)           Os elementos que ensejam a obrigação de prestar alimentos, quais sejam a necessidade do reclamante e as possibilidades da pessoa obrigada, são variáveis e é nessa variabilidade que se funda a característica da Mutabilidade da obrigação.

A obrigação alimentar, de modo geral, se estende por longos períodos de tempo, tratando-se assim de uma relação jurídica continuativa, que pode vir a sofrer alterações devido a diversas circunstâncias fáticas. Por este motivo, a própria Lei de Alimentos diz em seu Artigo 15: “A decisão judicial sobre alimentos não transita em julgado e pode a qualquer tempo ser revista, em face da modificação da situação financeira dos interessados”.

A modificação ainda tem previsão no Código Civil que afirma em seu Artigo 1699 que “Se fixados os alimentos, sobrevier mudança na situação financeira de quem os supre ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar ao juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução ou majoração do encargo”.

Desse modo, de acordo com a situação fática que advir a fixação dos alimentos, o quantum fixado a ser pago poderá ser alterado. Um exemplo disso é quando o alimentando atinge a maioridade consegue um emprego e passa a ter condições de prover o próprio sustento, nesse caso é possível que o obrigado entre com um pedido de exoneração, visto que o auxílio não se faz mais necessário.

Outra hipótese ocorre quando o obrigado perde o emprego e passa a ficar impossibilitado de cumprir com a obrigação sem que ele possa arcar com as próprias necessidades. Nessa situação é possível que se impetre ação revisional de alimentos, e diante dos novos fatos e a diminuição das possibilidades do alimentante, o quantum a ser pago pode ser diminuído.

2.2.2 Pressupostos intrínsecos da obrigação de prestar alimentos

A doutrina elege como pressupostos da prestação de alimentos: a) existência de um vínculo de parentesco; b) necessidade do reclamante; c) possibilidade da pessoa obrigada; e d) proporcionalidade.

Como já visto, a família divide o encargo de cuidar e propiciar uma vida digna entre os parentes quando um destes não consegue sozinho se manter e viver dignamente através do seu próprio esforço e trabalho. Diante desta situação, o parente necessitado pode pedir auxílio a outro, e se este tiver condições de suportar o ônus sem se prejudicar, serão fixados os alimentos de acordo com o que manda o Artigo 1695 do Código Civil.

Quando da fixação dos alimentos, o juiz deve analisar cada caso concreto em sua individualidade, observando principalmente as provas referentes ao binômio necessidade X possibilidade, onde são verificadas as necessidades do reclamante e os recursos da pessoa obrigada.

Essa análise tem ligação direta com o princípio da proporcionalidade que segundo Barroso, (2009, p. 235) “cuida-se, aqui, de uma verificação da relação custo-benefício da medida, isto é, da ponderação entre os danos causados e os resultados a serem obtidos.” Afirma ainda que o princípio da proporcionalidade exige alguns requisitos, dentre eles o da proporcionalidade em sentido estrito “que é a ponderação entre o ônus imposto e o benefício trazido, para constatar se é justificável a interferência na esfera dos direitos dos cidadãos”.

O quantum fixado em sentença não é imutável. A Lei de alimentos afirma em seu texto que a decisão de alimentos não transita em julgado, o que a doutrina e jurisprudência criticam muito, pois a questão foi resolvida e não poderá ser reexaminada, salvo se houver alteração na situação financeira tanto de quem recebe os alimentos, quanto de quem os paga.

Maria Berenice Dias trata do assunto dizendo:

A sentença que decide sobre os alimentos passa em julgado em relação à situação de fato existente no momento em que é pronunciada, cessando seu efeito preclusivo quando, por eventos supervenientes, possa considerar-se alterado o estado de fato ou de direito precedentemente acertado. A sentença revisional não deixa de considerar a decisão judicial anterior: apenas adapta o valor dos alimentos aos novos fatos. Portanto, a sentença que decide alimentos faz, sim, coisa julgada. (DIAS apud SANTOS, 2013)

A possibilidade de se impetrar ação revisional de alimentos ou ação de exoneração só se dá havendo provas da modificação fática das necessidades e possibilidades das partes da ação de alimentos já julgada. Não sendo provada essa mudança, o quantum não poderá ser modificado e as ações terão de ser julgadas improcedentes ou extintas sem resolução do mérito.

O que autoriza a modificação do quantum é o surgimento de novos fatos que provoquem desequilíbrio na obrigação alimentar e as ações supracitadas buscam justamente reequilibrá-la, tudo isso em respeito ao princípio da proporcionalidade.


3 EXECUÇÃO/CUMPRIMENTO DE SENTENÇA ALIMENTÍCIA

É incontestável a urgência do direito a alimentos pelo fato destes servirem para garantir a sobrevivência e assegurar a vida. Por conta disso faz-se necessário que, confirmado o direito, fixado o valor, e não satisfeita a obrigação, o procedimento para cobrar o cumprimento desta seja mais célere e menos complexo.

Para isto, o Código de Processo Civil elege a fase de execução ou cumprimento de sentença, que recebeu algumas modificações com a entrada em vigor do novo Código de 2015. Fredie Didier (2010, p. 28) conceitua execução definindo suas duas espécies. Ele afirma: “A execução pode ser espontânea, quando o devedor cumpre voluntariamente a prestação, ou forçada, quando o cumprimento da prestação é obtido por meio da prática de atos executivos pelo Estado.”

Assim sendo, se o mandamento derivado do direito objetivo não for cumprido por livre e espontânea vontade, pode-se requerer que o cumprimento se dê de forma forçada, indo contra a vontade do devedor que desobedeceu a ordem judicial.

Câmara, em sua obra (2014, p. 160), define a execução forçada como sendo: “Atividade jurisdicional que tem por fim a satisfação concreta de um direito de crédito, através da invasão do patrimônio do executado”, e ainda explica que com esse instituto busca-se:

[...] através da substituição da atividade das partes (principalmente da atividade do executado), fazer-se atuar a vontade concreta do direito substancial, mediante a realização prática do direito de crédito existente segundo o direito material. (CÂMARA, 2014, p. 161)

Essa execução forçada é fundada nos princípios que regem o direito processual brasileiro, principalmente no princípio geral do Devido Processo Legal, do qual se extraem outros mandamentos que buscam garantir e proteger tanto o detentor do direito substancial, quanto àquele que o deve. Passemos a analisar os mais importantes princípios que dão base à execução forçada:

3.1 A FUNÇÃO JURISDICIONAL DA EXECUÇÃO FORÇADA E SEUS PRINCÍPIOS

No âmbito do processo de execução existem vários mandamentos jurídicos que buscam a real satisfação do crédito. São grandes diretrizes que informam e norteiam o sistema normativo no que se refere a essa espécie processual, visando sua interpretação e aplicação dar a quem tem direito a real tutela executiva.

Elegemos quatro princípios como sendo os mais importantes no que diz respeito à execução de alimentos, e os estudaremos a partir de agora.

3.1.1 Princípio da Efetividade

O princípio da Efetividade diz, em síntese, que todo direito que for reconhecido, deve consequentemente ser efetivado e para tanto, é preciso que o Estado faça uso de todos os meios executivos capazes de fazer com que a obrigação seja satisfeita.

É assim que se garante o direito fundamental à tutela executiva, a qual “consiste na exigência de um sistema completo de tutela executiva, no qual existam meios executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfação a qualquer direito merecedor de tutela executiva” (DIDIER, 2010, p. 47)

Vale salientar que a execução de alimentos classifica-se como uma execução específica ou especial, onde o objeto da obrigação não pode ser substituído, e através dela busca-se assegurar ao alimentando precisamente aquilo a que ele tem direito, exatamente, ou o mais próximo possível do que foi firmado judicialmente e está estatuído no título executivo.

Finalmente, o que podemos compreender pelo Princípio da Efetividade é que “a execução forçada, destinada que é a satisfazer o direito de crédito do exequente, só será efetiva à medida que se revelar capaz de assegurar ao titular daquele direito exatamente aquilo que ele tem direito de conseguir.” (CÂMARA, 2014, p. 165)

3.1.2 Princípio da Responsabilidade Patrimonial

Este princípio é uma conquista para a preservação dos direitos fundamentais e humanos, que protege o devedor e faz com que a execução atinja apenas o patrimônio deste, não podendo recair sobre a sua pessoa, o que está expresso no Artigo 789 do Código de Processo Civil: “O devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei.”

Em tempos remotos, a atividade executiva recaía sobre o próprio corpo do executado, a contração de dívidas e a falta de pagamento destas podiam gerar prisões, e era possível até que o devedor virasse escravo de seu credor a fim de que pudesse quitar a dívida.

Ainda na Constituição era previsto a possibilidade de prisão do depositário infiel, o que foi considerado ilícito pelo Supremo Tribunal Federal que editou a Súmula Vinculante de nº 11 e proibiu essa hipótese de prisão civil.

Atualmente, a responsabilidade executiva e o princípio referente a ela são relativizados, possuindo assim um caráter híbrido, permitindo que algumas medidas coercitivas, de execução indireta, como a coerção pessoal, sejam utilizadas.

É o que acontece com a prisão civil do devedor de alimentos. Como essa questão tem um caráter urgente, a lei possibilita que essa medida emergencial e extrema seja tomada, a fim de que a obrigação seja satisfeita com maior rapidez. Vale salientar que essa é a única hipótese em que a coerção pessoal pode ser utilizada, nos outros casos, observa-se sempre o princípio da responsabilidade patrimonial, atingindo somente o patrimônio e não à pessoa do devedor.

3.1.3 Princípio da Menor Onerosidade da Execução

O também conhecido como Princípio do Menor Sacrifício Possível do Executado está previsto no Artigo 805, do Código de Processo Civil, e afirma que: “Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado”.

Trata-se de uma cláusula geral inserida no ordenamento pelo legislador com o intuito de impedir que o exequente pratique abusos, e ainda buscando estabelecer um equilíbrio entre os interesses do exeqüente e do executado.

De fato esse princípio não pode ser analisado e aplicado de maneira isolada, é necessário que se faça uma ligação com os demais princípios que fundamentam a execução quando da sua aplicação ao caso concreto.

Renato Manucci fala dessa interação entre os princípios:

Trata-se de princípio que representa a aplicação da proporcionalidade no processo de execução, na medida em que busca garantir, a um só tempo, a efetividade da tutela executiva e a preservação do patrimônio do executado contra atos desnecessariamente invasivos. Em outros termos, a medida executiva pretendida deve revelar-se necessária e adequada para o atingimento da finalidade perseguida. (MANUCCI, 2016)

O parágrafo único do Artigo 805, por exemplo, é novidade trazida pelo Novo Código de 2015, e dá ao devedor a oportunidade de alegar que a medida fixada pelo juiz é mais gravosa para ele. Essa possibilidade é expressão de outro princípio, o da cooperação, pois o devedor que impugnar a medida decretada pelo juiz deve cooperar indicando os meios que sejam menos onerosos para que a execução seja efetiva.

É válido dizer que atendendo ao pedido do devedor, não se pode diminuir os interesses do credor, portanto, a aplicação desse princípio pressupõe que os demais meios apresentados sejam igualmente capazes de satisfazer a obrigação de maneira eficaz. Se assim não for, o meio antes determinado pelo juiz será mantido.

Além disso, o próprio juiz, analisando as provas e informações contidas nos autos, e verificando que existem meios menos gravosos e igualmente eficientes, pode de ofício aplicar o princípio, evitando que se pratiquem injustiças em face do executado e promovendo o equilíbrio de interesses.  

3.1.4 Princípio da Adequação

Este é um dos princípios fundamentais do direito processual, e a adequação é um dos requisitos essenciais para um bom resultado na execução, pois o meio executório que o credor utilizar para atingir o fim que deseja e que lhe é direito, deve se mostrar adequado em face do bem que é objeto da prestação devida.

O legislador deve fazer uma análise individual das hipóteses fáticas possíveis de acontecerem e adequar as regras processuais aos fins para os quais elas foram criadas, concretizando o que manda o imperioso princípio do Devido Processo Legal.

Um bom exemplo é a previsão da prisão civil como meio coercitivo, já que a prestação alimentícia ou os alimentos é um direito essencial do alimentando e merece proteção especial e procedimento mais célere objetivando seu cumprimento.

O Juiz também pode de ofício fazer essa análise e determinar as necessárias adaptações e que sejam praticados os atos que melhor se ajustem ao fim do processo, quando a tramitação processual não se mostrar adequada às especificidades da causa. Quando isso acontece o princípio da adequação passa a ser chamado de Princípio da Adaptabilidade do Processo.

É por conta deste princípio que existem procedimentos diferentes para cada causa específica, como é o caso da Execução de Alimentos. É preciso que se observe as diferentes características dos sujeitos envolvidos e também as peculiaridades do bem da vida pretendido e dar a cada situação específica o tratamento justo e adequado.

3.2 DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA QUE RECONHEÇA A EXIGIBILIDADE DE OBRIGAÇÃO DE PRESTAR ALIMENTOS

Anteriormente à Lei 13.105 de 2015, a fase do cumprimento de sentença já havia sido incorporada ao conjunto de normas jurídico-processuais do Brasil através da Lei 11.232 de 2005 que revogou dispositivos relativos à execução fundada em título judicial, e determinou outras providências para o mencionado rito.

A partir dessa lei, a execução passou a ser apenas uma etapa ou mesmo um complemento do processo de conhecimento, deixando de se processar em ação autônoma. Contudo, a citada lei de 2005 não fez qualquer menção ao rito para execução de alimentos, não fazendo nenhuma alteração a esse respeito no Código de Processo de 1973.

Por este motivo, muitas foram as interpretações e divergências doutrinárias acerca da ap

licação ou não dessa fase para a execução das prestações alimentícias não pagas, pois o antigo Art. 732 do Código de Processo Civil, dizia que a execução de sentença que fixasse os alimentos seria feita nos moldes da execução de quantia certa, a qual foi modificada pela Lei 11.232.

Existia também a dúvida com relação a execução sob pena de prisão, antes regulamentada pelo Art. 733 do CPC. Por tratar-se de medida excepcional, considerada muito rígida, indagava-se se esta merecia um rito especial para execução ou se a prestação poderia ser exigida nos próprios autos, sem a necessidade de uma nova citação. 

Surgido o impasse, apesar da omissão de qualquer referência por parte do legislador, os tribunais passaram a aplicar o cumprimento de sentença para as execuções de alimentos, seguindo a linha do processo sincrético, onde nos mesmos autos se processam as duas fases: primeiro o direito é reconhecido e posteriormente exigido. Essas decisões eram fundamentadas pela urgência e caráter emergencial dos alimentos, os quais devem ser atendidos de maneira mais célere.

Em meio a muitos anos de entendimentos diversos e nenhum posicionamento dos Tribunais Superiores a fim de pacificá-los, o Novo Código de Processo Civil de 2015 trata da matéria com muita atenção e cuidado. Os Artigos 513 a 538 regem especificamente a fase de cumprimento de sentença, fazendo parte do Título II que recebe o mesmo nome da fase, e deixa claro que apenas a sentença que determina os alimentos definitivos e que já tenha transitado em julgado pode ser executada nos mesmos autos em que tenha sido proferida, como prevê o Art. 531, § 2º.

A partir do Art. 528, o Código passa a tratar de maneira especial e exclusiva o procedimento para executar a sentença que fixou os alimentos, onde o juiz ordenará que se intime pessoalmente o executado, dando a ele o prazo de 03 (três) dias para pagar a dívida ou apresentar justificativa plausível que o esteja impossibilitando de realizar o pagamento.

Essa justificativa deve ser comprovada de fato, e a impossibilidade deve ser absoluta, segundo o § 2º do Art. 528, caso contrário, o juiz não a receberá e o devedor poderá ter aplicado contra ele todas as medidas executórias a fim de que seja possível a satisfação do débito.

No caso de decisão interlocutória que determinou o pagamento de alimentos provisórios, ou para as sentenças que ainda não transitaram em julgado, a execução deve ser pleiteada em autos apartados, mas o procedimento a ser utilizado é o mesmo.

Caso o devedor não pague e nem justifique aplica-se o que está previsto no Art. 831 do CPC, e penhora-se tantos bens quantos forem precisos para a quitação da dívida. Dependendo das circunstâncias o credor pode optar por pedir a prisão civil do devedor, caso excepcional que deve seguir algumas condições, por exemplo, só é permitido esse requerimento frente a 03 (três) últimas parcelas vencidas e as que se vencerem no curso do processo, como manda a Súmula 309 do STJ que será explicada mais adiante.

Tem-se ainda a possibilidade de executar os títulos extrajudiciais que versem sobre alimentos, como um acordo referendado por um Defensor Público, por exemplo. Este tem força executiva e pode sim ser exigida através da execução, tanto requerendo a penhora, quanto a prisão civil e os procedimentos são os mesmos do cumprimento de sentença, o juiz manda citar o devedor e dá a ele o prazo para pagar ou justificar sua impossibilidade, conforme o Art. 911 do CPC.

Romano elenca em seu artigo as possibilidades trazidas pelo novo CPC:

Assim, agora há quatro possibilidades para se executar os alimentos devidos. A distinção se em relação ao tipo de título (judicial ou extrajudicial) e tempo de débito (pretérito ou recente):

(i) cumprimento de sentença, sob pena de prisão (arts. 528/533);

(ii) cumprimento de sentença, sob pena de penhora (art. 528, § 8º);

(iii) execução de alimentos, fundada em título executivo extrajudicial, sob pena de prisão (arts. 911/912);

(iv) execução de alimentos, fundada em título executivo extrajudicial sob pena de penhora (art. 913). (ROMANO, 2016)

É indiscutível que a execução de alimentos merece procedimento rápido, o mais célere possível, e o novo Código de Processo Civil, reconhecendo essa particularidade, deu a ela especial tratamento, esclarecendo todos os pontos que antes eram temas de grandes discussões, pondo fim a tantas dúvidas geradas pela omissão do legislador ao editar o Código de 1973. 


4. A PRISÃO E A EXIGIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO DE PRESTAR ALIMENTOS

O Novo Código de Processo Civil de 2015 estabelece a forma de cumprimento de sentença para que seja reconhecida a exigibilidade da obrigação de prestar alimentos advinda de sentença judicial, e esta passa a não mais ser feita por meio de execução autônoma. Assim, o exeqüente pode exigir o cumprimento da obrigação desde logo, no entanto, se assim preferir, não poderá pleitear a prisão do devedor como meio forçoso ao pagamento, como afirma o Art. 528, § 8º da nova lei.

Por este motivo, trataremos acerca do instituto da prisão civil analisando seus aspectos jurídicos e fundamentos quando da sua utilização como meio mais célere para a obtenção do cumprimento e satisfação da obrigação alimentar.

4.1 A PRISÃO CIVIL POR DÍVIDA ALIMENTÍCIA E SEUS ASPECTOS JURÍDICOS

Em busca de preservar o direito à vida e à dignidade do credor, a ordem constitucional brasileira, com o Decreto 678, de 06 de novembro de 1992, recepcionou o Pacto de São José da Costa Rica, permitindo como medida excepcional a prisão do devedor de alimentos.

A prisão oriunda de descumprimento inescusável de obrigação alimentar é assunto sempre polêmico e atual. O Brasil, por ser um país ainda muito assolado pela desigualdade social, não consegue obter um encaixe perfeito das normas e regras para com as condutas e a realidade social, o que faz alguns crerem que a prisão civil do devedor de alimentos é norma de extrema rigidez, e outros entenderem-na ineficaz.

Outro fator importante e que atinge diretamente o tema em questão é o alto índice de natalidade do povo brasileiro. É certo que quanto mais dependentes o alimentante tiver, dependendo de sua condição financeira, mais difícil se torna o adimplemento das obrigações.

Preliminarmente, é válido salientar que nem todas as espécies de alimentos estão sujeitas à execução que possa resultar em prisão, como é o caso dos Alimentos Compensatórios, modalidade contemporânea no ordenamento jurídico brasileiro. Flávio Tartuce cita em sua obra o conceito formulado por Rolf Madaleno sobre alimentos compensatórios:

Uma prestação periódica em dinheiro, efetuada por um cônjuge em favor do outro na ocasião da separação ou do divórcio vincular, onde se produziu um desequilíbrio econômico em comparação com o estilo de vida experimentado durante a convivência matrimonial, compensando deste modo, a disparidade social e econômica com a qual se depara o alimentando em função da separação, comprometendo suas obrigações materiais, seu estilo de vida e a sua subsistência pessoal. (MADALENO, apud TARTUCE, 2014, p. 502).

Vê-se que essa espécie de alimentos não possui caráter de subsistência, servindo unicamente para sustentar a condição social anterior do cônjuge que, agora divorciado, encontra-se menos favorecido financeiramente. Por este motivo, não se faz necessária tamanha celeridade para o pagamento da dívida, prescindindo a aplicação de uma medida tão rígida como a prisão para forçar o adimplemento.

Tal entendimento já foi bastante discutido e aplicado pela jurisprudência, possibilitando a fixação desta espécie de alimentos, mas afastando a utilização de prisão como meio executório pela falta de seu pagamento, como se pode observar em decisão do Superior Tribunal de Justiça:

No caso dos autos, executa-se a verba correspondente aos frutos do patrimônio comum do casal a que a autora faz jus, enquanto aquele se encontra na posse exclusiva do ex-marido. Tal verba, nestes termos, reconhecida, não decorre do dever de solidariedade entre os cônjuges ou da mútua assistência, mas sim do direito de meação, evitando-se, enquanto não efetivada a partilha, o enriquecimento indevido por parte daquele que detém a posse dos bens comuns; A definição, assim, de um valor ou percentual correspondente aos frutos do patrimônio comum do casal a que a autora faz jus, enquanto aquele encontra-se na posse exclusiva do ex-marido, tem, na verdade, o condão de ressarci-la ou de compensá-la pelo prejuízo presumido consistente na não imissão imediata nos bens afetos ao quinhão a que faz jus. Não há, assim, quando de seu reconhecimento, qualquer exame sobre o binômio "necessidade-possibilidade", na medida em que esta verba não se destina, ao menos imediatamente, à subsistência da autora, consistindo, na prática, numa antecipação da futura partilha; Levando-se em conta o caráter compensatório e/ou ressarcitório da verba correspondente à parte dos frutos dos bens comuns, não se afigura possível que a respectiva execução se processe pelo meio coercitivo da prisão, restrita, é certo, à hipótese de inadimplemento de verba alimentar, destinada, efetivamente, à subsistência do alimentando; ([Grifo nosso] STJ, RHC 28.853/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. p/ Acórdão Min. Massami Uyeda, 3ª Turma, j. 01.12.2011, DJe 12.03.2012).

Desse modo, esclarecido está que a prisão é um instituto que deve ser aplicado no que diz respeito aos alimentos legais, ou seja, aqueles decorrentes do Art. 1694 do Código Civil de 2002, no intuito de forçar o devedor ao pagamento, garantindo o melhor interesse do menor (criança ou adolescente), por tratar-se de dívida alimentar, que atinge diretamente a sobrevivência do credor, e por isto sua adimplência possui caráter emergencial.

A Lei de Alimentos (Lei 5.478/1968) faz menção à possibilidade de decretação da prisão em seu Artigo. 19:

Art. 19: O juiz, para instrução da causa ou na execução da sentença ou do acordo, poderá tomar todas as providências necessárias para seu esclarecimento ou para o cumprimento do julgado ou do acordo, inclusive a decretação de prisão do devedor até 60 (sessenta) dias.

Observe-se que o legislador deixa bem claro que a prisão civil é uma medida de exceção, pois a regra é a liberdade do indivíduo. Deste modo faz-se um sopesamento dos direitos igualmente fundamentais em questão, prevalecendo o direito a uma vida digna do credor, sobre o direito à liberdade ambulatorial do devedor.

Por falar em liberdade, outro aspecto polêmico que foi e ainda é protagonista de grandes discussões é o que diz respeito ao regime prisional para cumprimento do prazo da prisão civil, pois se sabe que esta não é uma pena ou sanção, ou seja, essa prisão não deriva de condenação, e assim não seria justo que o devedor cumprisse-a da mesma maneira que um apenado.

Boa parte da doutrina e da jurisprudência assim entendia. Várias decisões de Tribunais já julgaram a favor de que o devedor ficasse preso em casa de albergue, sob o regime aberto, a fim de que pudesse trabalhar durante o dia com o intuito de conseguir rendimentos suficientes para pagar a dívida, como podemos ver na decisão de Habeas Corpus julgada pelo Tribunal do Estado de Rondônia:

Habeas corpus. Prisão civil decretada em processo de execução de pensão alimentícia. Prazo da segregação. Regime aberto. O prazo da prisão decorrente de inadimplemento da obrigação alimentar é de um a três meses, sendo que a fixação acima do mínimo deve ser convenientemente motivada. Ainda que a lei não estabeleça o regime legal de cumprimento da prisão por dívida alimentar, considerando a natureza civil do débito, a fim de viabilizar ao alimentante o exercício de sua atividade profissional, bem como o cumprimento da obrigação alimentar, fixa-se o regime aberto, com autorização para saídas diurnas. (TJ-RO – HC: 00118120720108220000 RO 0011812-07.2010.822.0000Câmara Criminal, Data de Publicação: Processo publicado no Diário Oficial em 07/10/2010.) 

Segundo os defensores desse entendimento, procedendo-se dessa forma, a medida se tornaria bem mais eficaz, já que o devedor não passaria o tempo de prisão decretado inerte, sem poder fazer qualquer esforço físico para conseguir recursos e pagar a dívida.

Entretanto, o Novo Código de 2015 é bem claro e objetivo ao afirmar no § 4º do Art. 528 que o regime para cumprimento da prisão oriunda de dívida alimentar é o regime fechado, ficando resguardado apenas o direito de separação dos presos comuns.

Trata-se de mecanismo mais enérgico, a fim de que o devedor inadimplente, sob ameaça de prisão em regime fechado, busque quitar sua dívida de maneira mais rápida, não deixando o credor sem o auxílio de que necessita.

Somente para os casos em que não haja local adequado, segue-se o que está expresso na Lei de Execuções Penais, em seu Art. 201: “Na falta de estabelecimento adequado, o cumprimento da prisão civil e da prisão administrativa se efetivará em seção especial da Cadeia Pública”.

Essa separação é uma medida acertada, pois apesar de ser estabelecido o regime mais gravoso, não é sensato deixar que o devedor de alimentos preso seja comparado àqueles que estão presos por agirem em desacordo com a Lei Penal. Aquele que tem sua liberdade privada por deixar de cumprir obrigação alimentar não pode ser colocado em convívio com indivíduos, em sua maioria, perigosos, até para preservar sua própria segurança, pois o sistema prisional brasileiro além de falido não consegue atingir o fim a que se propõe que é punir e reabilitar.

4.2 INTERPRETAÇÃO DA SÚMULA 309 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Existe uma grande discussão a respeito do lapso temporal necessário para requerer a satisfação da dívida por meio da prisão. A Súmula 309 do Superior Tribunal de Justiça, muito criticada quando editada, causa confusão pelo que afirma: “O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as 3 (três) prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo”.

O texto da norma, inicialmente, faz compreender que apenas após 3 (três) meses de desídia do devedor é que se poderia ajuizar ação de execução por meio da prisão. Apoiado nesta interpretação surgiu a figura do devedor contumaz, que não realiza o pagamento da pensão de maneira periódica, intercalando os meses e efetuando o pagamento somente quando se aproxima o terceiro mês de descumprimento, crendo que desta forma não poderia ser contra ele decretada a prisão em sede de execução de alimentos.

Entretanto, esta interpretação é equivocada, pois o que se entende é que o lapso de 3 meses corresponde ao período máximo e não o contrário, por serem  os alimentos legais indispensáveis à promoção do bem estar do alimentando e por isto merecerem exigência mais célere, conforme mostra o entendimento doutrinário:

É preciso interpretar a Súmula 309 do STJ no sentindo de não ser necessário que o devedor complete os três meses para que a prisão seja deferida. Um mês de inadimplência pode gerar a prisão do devedor, sendo os três meses apenas um parâmetro para a execução por meio da prisão. (TARTUCE, 2014, p. 532).

Talvez por conta destas celeumas doutrinárias e jurisprudenciais, o legislador ao incorporar o texto da súmula supracitada ao Novo CPC, fez um pequeno acréscimo incluindo a palavra “até” ao mesmo quando editou o Art. 528, §7º: “O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende até as 3 (três) prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo”.

Assim, percebe-se a tentativa de esclarecer o sentido da norma para que o período indicado na mesma seja interpretado como o máximo e não o mínimo a autorizar o ajuizamento da ação que permita o requerimento da prisão do devedor.

4.3 MEIOS ALTERNATIVOS DE EXECUÇÃO DE ALIMENTOS

Por se tratar de medida extrema e excepcional, antes de decretar-se a prisão civil, entende-se que é preciso que se esgotem os demais meios executivos com os quais se busca coagir o inadimplente a satisfazer sua dívida, deixando a prisão como última opção.

Fredie Didier explica em sua obra esta ordem de preferência entre os meios executórios:

Em primeiro lugar, deve ser determinado o desconto em folha. Não sendo possível o desconto em folha, cumpre alcançar rendas auferidas pelo devedor com aluguel ou outro tipo de rendimento. Não havendo rendas a serem alcançadas, procede-se a expropriação de bens suficientes à satisfação do crédito. Se ainda assim, não for possível obter a satisfação da obrigação, restará a determinação de prisão civil como medida coercitiva, destinada a forçar o pagamento. (DIDIER, 2010, p. 694).

O alimentando pode optar por pedir anteriormente à prisão, se ainda não requerido na sentença, o desconto em folha de pagamento, regulado no Art. 529, caput, do NCPC. Ressalte-se que esta alternativa dependerá da condição profissional do alimentante, não podendo ser aplicada se este não possuir remuneração fixa de caráter público ou privado.

Sobre essa questão a doutrina entende que se o devedor comprovadamente não detiver possibilidades financeiras para saldar a dívida, o requerimento de prisão torna-se ilegítimo, pois esse meio coercitivo só deve ser utilizado em casos de desídia, irresponsabilidade de quem é obrigado, segundo os ensinamentos de Gonçalves:

A falta de pagamento da pensão alimentícia não justifica, por si, a prisão do devedor, medida excepcional “que somente deve ser empregada em casos extremos de contumácia, obstinação, teimosia, rebeldia do devedor que, embora possua os meios necessários para saldar a dívida, procura por todos os meios protelar o pagamento judicialmente homologado”. (GONÇALVES, 2015, p. 574)

A prisão, portanto, não se destina àquele não tem condições de prestar os alimentos, mas sim àquele que podendo fazê-lo não o faz, ou no caso de não ter os recursos deixa de tomar as atitudes necessárias para obtê-los. Em alguns casos, não há dinheiro para os alimentos dos dependentes, mas há para a manutenção de caprichos, luxos, e outros motivos fúteis; em outras ocasiões, há patrimônio, mas o devedor não quer sacrificá-lo para honrar o compromisso; em outras hipóteses, o devedor omite-se porque não se conforma com a decisão judicial que lhe condenou a prestar alimentos; e, em muitas outras, simplesmente não paga para “não fazer a vontade” do alimentando ou de quem tem a sua guarda.

Alternativo à prisão, permite-se também que o débito seja satisfeito através de desconto nos rendimentos ou rendas, aos quais o devedor tenha direito. Aqui podem ser utilizados os valores referentes à locação de imóveis (aluguéis), ou retirada da quantia necessária de pensões e benefícios em nome do inadimplente. Porém existe uma condição para que esta medida seja utilizada, o valor descontado não poderá ultrapassar a porcentagem de 50% dos ganhos líquidos daquele, como bem preceitua o § 3º do Art. 529 da nova lei:

Art. 529, § 3º: Sem prejuízo do pagamento dos alimentos vincendos, o débito objeto de execução pode ser descontado dos rendimentos ou rendas do executado, de forma parcelada, nos termos do caput deste artigo, contanto que, somado à parcela devida, não ultrapasse cinquenta por cento de seus ganhos líquidos.

Outra grande novidade trazida pelo CPC de 2015 é a alternativa de protestar a decisão judicial, fazendo com que o nome do devedor seja inscrito no SPC e no SERASA, impossibilitando que com o “nome sujo” o devedor realize vários atos da vida civil, o que faria com que este procurasse de maneira mais rápida pagar a quantia devida, conforme o Art. 528, §1º que dispõe: “Caso o executado, no prazo referido no caput, não efetue o pagamento, não prove que o efetuou ou não apresente justificativa da impossibilidade de efetuá-lo, o juiz mandará protestar o pronunciamento judicial, aplicando-se, no que couber, o disposto no art. 517”.

Em relação ao devedor contumaz, citado no tópico anterior, esta medida foi aplicada recentemente e divulgada no Informativo 0579 do STJ, nos seguintes termos:

Em execução de alimentos devidos a filho menor de idade, é possível o protesto e a inscrição do nome do devedor em cadastros de proteção ao crédito. Não há impedimento legal para que se determine a negativação do nome de contumaz devedor de alimentos no ordenamento pátrio. Ao contrário, a exegese conferida ao art. 19 da Lei de Alimentos (Lei n. 5.478/1968), que prevê incumbir ao juiz da causa adotar as providências necessárias para a execução da sentença ou do acordo de alimentos, deve ser a mais ampla possível, tendo em vista a natureza do direito em discussão, o qual, em última análise, visa garantir a sobrevivência e a dignidade da criança ou adolescente alimentando. Ademais, o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente encontra respaldo constitucional (art. 227 da CF). Nada impede, portanto, que o mecanismo de proteção que visa salvaguardar interesses bancários e empresariais em geral (art. 43 da Lei n. 8.078/1990) acabe garantindo direito ainda mais essencial relacionado ao risco de vida que violenta a própria dignidade da pessoa humana e compromete valores superiores à mera higidez das atividades comerciais. Não por outro motivo o legislador ordinário incluiu a previsão de tal mecanismo no Novo Código de Processo Civil, como se afere da literalidade dos arts. 528 e 782. (STJ, REsp 1.533.206-MG, 4º Turma, DJe 1º/2/2016. REsp 1.469.102-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 8/3/2016, DJe 15/3/2016.)

Além do protesto, a jurisprudência, relativizando o teor da Súmula 309, já citada, tem determinado a prisão de devedor que tenha esse costume, alegando a inexistência de constrangimento ilegal quando é possível detectar que o devedor está utilizando artimanhas para frustrar a execução.

Outro ponto bastante discutido é a questão da proposição de ação revisional/exoneração de alimentos. Muitos pensam que a simples propositura destas ações obsta o pagamento das parcelas, como se a decisão anterior que fixou os alimentos ficasse suspensa e impassível de execução, o que não condiz com a verdade.

Os alimentos deverão ser prestados até o trânsito em julgado da decisão definitiva que os diminua ou exclua não impedindo que se promova a execução pela falta de sua prestação. No entanto, segundo o Art. 13, § 2º da Lei de Alimentos, os efeitos da sentença que reduz ou extingue a obrigação alimentícia retroagem à data da citação, deste modo, se proferida a sentença e por algum motivo as obrigações anteriores a ela não tiverem sido cumpridas, impossibilitado estará o credor de executar tais valores, por já existir decisão que os considera indevidos.

Tratando-se de execução de dívida pretérita, a prisão decretada anteriormente à sentença de redução ou exoneração de alimentos é lícita até o momento em que é prolatada a sentença que acolha os pedidos de redução ou extinção da obrigação, tendo a prisão de ser revogada. Isto porque, deve-se levar em consideração as regras de proporcionalidade, com a qual se faz a valoração dos direitos envolvidos.

No caso em questão, visto que as prestações pretéritas perderam seu caráter de essencialidade e sua tutela executiva configuraria mera recomposição patrimonial, prevalece a liberdade do indivíduo sobre o patrimônio, sendo inconcebível e ainda injustificável a utilização da prisão nesta situação.


5 A EFICÁCIA DA PRISÃO CIVIL NAS AÇÕES DE EXECUÇÃO DE ALIMENTOS

É incontestável a condição desigual na qual vive a sociedade brasileira. Essa desigualdade é principalmente social e econômica, e vem sendo acompanhada de um crescimento populacional considerável, o que torna tudo mais complicado, agravando as questões sociais como o desemprego, por exemplo.  

Nem todos os níveis de renda da sociedade permitem o atendimento de todas as necessidades básicas de qualquer cidadão, e assim sendo, muitos são os casos em que o indivíduo possui a obrigação de prestar alimentos, porém não pode cumpri-la.

Em conseqüência ao inadimplemento surgem as ações de execução de alimentos ou mesmo o requerimento de cumprimento de sentença que estão abarrotando o Judiciário brasileiro, e em sua maioria essas ações seguem o rito que autoriza o pedido de prisão do devedor.

Pode-se perceber que a prisão civil é de fato uma medida grave, bastante rígida, que leva o devedor a buscar todos os meios possíveis para conseguir pagar o débito alimentar e não ter sua liberdade ceifada. Contudo, questiona-se sua eficácia, principalmente quando é notório que nem todos aqueles que têm sua prisão decretada possuem condições financeiras suficientes de modo a pagar os alimentos, chegando ao fim que o já citado instituto almeja.

Entende-se por eficácia a qualidade de algo que cumpre as metas planejadas, atinge os resultados esperados, o que não podemos dizer que acontece com a aplicação da prisão para todos os casos de inadimplemento da obrigação alimentar, pois em algumas situações ela mais prejudica do que satisfaz os interesses do credor. 

É certo que a ideia de ser preso é uma ofensa aos princípios, valores, honra e reputação moral do indivíduo. Apesar da garantia de separação dos presos comuns, o regime de cumprimento da pena é o mais severo, além dos estabelecimentos pertencentes ao sistema penitenciário brasileiro apresentarem, em sua maioria, condições insalubres e até desumanas.

Por conta disso, em alguns casos, a decretação da prisão possui efeito quase que imediato, o devedor se vê apavorado com a possibilidade de ter sua liberdade cerceada, sua reputação manchada e consegue-se através desta, que o pagamento seja efetuado com celeridade, sendo a prisão nesse caso, a medida executória mais eficaz.

Entretanto, existem casos em que o pagamento não é realizado simplesmente por que o devedor não dispõe de condições financeiras para tal. Apesar de a fixação dos alimentos ser sempre baseada no binômio necessidade x possibilidade, observando o princípio da proporcionalidade, sabe-se que nem todos aqueles obrigados a prestar alimentos possuem condições de satisfazer a obrigação sem que sejam atingidas as suas próprias necessidades.

Ademais, deve-se analisar o fato de que a realidade situacional do indivíduo, principalmente no que diz respeito à questão financeira, está sujeita a constantes mudanças, e quem é empregado hoje, amanhã pode não usufruir da mesma renda.

Um bom exemplo disso foi o que aconteceu com um ex-jogador de futebol mencionado por Pinheiro em seu artigo:

[...] acompanhou-se através da mídia o drama do ex-jogador de futebol Zé Elias que foi preso por uma dívida oriunda de obrigação alimentícia no valor de aproximadamente R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais). Conforme o depoimento do ex-jogador, a prestação, cujo valor correspondia a R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), foi acordada enquanto aquele estava no auge de sua vida profissional. Desempregado, Zé Elias não mais conseguiu adimplir a obrigação e, mesmo tendo proposto ação revisional de alimentos, ficou preso por um período de 30 (trinta) dias. (PINHEIRO, 2014, p. 02)

Observa-se que na situação enfrentada pelo ex-atleta, a prisão se mostrou completamente ineficaz, e mesmo buscando a diminuição do quantum a ser pago através da revisão de alimentos, as prestações anteriores continuam vencidas, ou seja, o pedido de revisão em nada altera o procedimento de execução da obrigação.

Essa mudança na situação financeira é fato cada vez mais recorrente, principalmente no momento atual de crise em que o Brasil se encontra, onde vários empresários de sucesso estão vendo suas empresas falirem e além de todas as dívidas decorrentes do empreendimento, ainda precisam conseguir dinheiro para adimplir a dívida alimentícia sob o risco de ser preso. 

Nestes casos, a decretação da prisão torna-se um agravante da situação, já que estando encarcerado, o indivíduo fica impedido de conseguir renda através do trabalho, conseqüentemente não cumprindo com sua obrigação. Aqui, nota-se que não há o que ser feito a não ser esperar que finde o prazo da sanção (de um a três meses) e que o devedor seja solto ficando sujeito à nova decretação de prisão.

Diante dessa situação fática, a prisão não consegue atingir o objetivo de satisfação da obrigação, ficando o credor ainda atingido, gerando apenas discórdia e sentimento de vingança entre os genitores e família do alimentado.

O processo de separação dos pais em geral causa grande sofrimento para os filhos, a dívida alimentícia atinge direta e profundamente as relações afetivas familiares, e a prisão é mais utilizada como uma arma, com a qual geralmente a genitora ameaça o pai da criança para que ele também arque com as despesas do ou dos filhos, gerando revolta e rivalidade entre os pais dos menores que passam a viver em constante constrangimento familiar.

Fator que também atinge a eficácia da prisão civil é a superlotação dos ambientes em que se mantêm os presos, além da falta de segurança que os mesmo oferecem. Como é obrigatório que os presos civis fiquem separados dos presos comuns, algumas comarcas dispõem de poucas vagas para os primeiros.

Karinne Pinheiro menciona em seu artigo alguns números coletados no ano de 2011 no Estado de São Paulo:

Interessante salientar uma notícia divulgada, no ano de 2011, pelo Jornal da Tarde de São Paulo, que mostrou que o número de pais devedores de pensão alimentícia foragidos, no Estado de São Paulo, equivale a 20 vezes o número de presos em um centro de detenção provisória. O noticiário afirmou, ainda, que a Polícia Civil, no referido estado acumula, atualmente, 26.200 (vinte e seis mil e duzentos) mandados de prisão a serem cumpridos contra pais e mães que não pagam as prestações de alimentos devidas aos filhos. Os números são surpreendentes e apontam, além da ineficácia do próprio decreto prisional que permite que o devedor se esquive da ordem, os problemas administrativos a serem enfrentados pela polícia quando da execução daqueles. (PINHEIRO, 2014, p. 02)

São poucos os municípios que dispõe de local adequado até para os presos comuns, e apenas as cidades consideradas grandes contam com casa de albergue, onde geralmente ficam os presos civis. Infelizmente o índice de descumprimento de obrigação alimentar é altíssimo, e muitos mandados de prisão são expedidos para esse fim numa única semana.

Findo o prazo de 3 dias para pagamento ou justificação da falta deste, a prisão é decretada e é expedido mandado de prisão. Muitas vezes, quando o oficial de justiça vai dar-lhe cumprimento, verifica que não existem vagas para os presos civis, tendo de devolver o mandado com esta justificativa sem o seu cumprimento. Deste modo, resta frustrada a tentativa de coagir o devedor ao pagamento da dívida, pois não há meio hábil de efetuar a prisão.

Assim podemos entender que a prisão é medida parcialmente eficaz, e essa eficácia é determinada pela análise dos casos concretos.

Vejamos, quando o devedor possui condições de pagar e por pura irresponsabilidade não o faz, deixando de prestar assistência ao alimentado, desobedecendo a ordem judicial anteriormente determinada, a decretação de prisão deste devedor pode resultar em imediata quitação da dívida, pelo fato do mesmo possuir recursos e não querer ficar preso.

Entretanto, quando o alimentante deixa de pagar a pensão pelo fato de não possuir meios para tanto, essa medida não traz benefício algum ao credor. A dívida não é paga, o alimentado não tem seu crédito adimplido, e o devedor ainda fica impossibilitado de buscar recursos a fim de pagar o que deve, sofrendo restrições excessivas à sua dignidade.

Nos casos de impossibilidade momentânea comprovada, quando o devedor está desempregado, por exemplo, o ordenamento jurídico poderia oferecer alguma alternativa para que o devedor por esforço próprio pudesse buscar recursos que se destinassem ao pagamento do débito.

Em Portugal existe o Fundo de Garantia de Alimentos devidos a Menores, o qual é utilizado pelo Estado para pagar as prestações alimentícias devidas quando o alimentante está impossibilitado de pagar e quando quem detém a sua guarda também não tenha recursos suficientes para sua mantença.

Trata-se de medida mais efetiva, pois protege e garante a dignidade de sobrevivência do credor, observando-se o que diz o princípio do melhor interesse do menor e ainda evita a aplicação da medida rígida e extrema que é a prisão e o constrangimento do devedor que terá de ficar todo o período decretado pelo juiz preso, sabendo que não tem como pagar a dívida, colidindo com o direito fundamental de ir e vir de titularidade do alimentante.

Por conta disso, entende-se que o instituto da prisão civil deve ser aplicado de acordo com uma profunda e minuciosa análise de cada caso concreto. Pois nem sempre a prisão se revela o método mais eficiente, seja pela falta de condições do devedor, ou pelo não cumprimento do mandado de prisão justificado pela falta de local para ‘deixar’ o devedor preso.

Por tudo que foi alegado, conclui-se que deve ser observado qual o meio mais adequado e que levará, caso a caso, ao cumprimento da obrigação de maneira mais rápida e eficaz, atendendo ao melhor interesse do menor e à capacidade de pagamento pelo alimentante, utilizando-se a prisão como medida de exceção, utilizada em último caso somente nas hipóteses do não pagamento pela desídia e irresponsabilidade do devedor. 


6 CONCLUSÃO

A questão da possibilidade de decretar-se a prisão civil do devedor inadimplente com a obrigação alimentar é de fato medida polêmica e que causa grandes dúvidas na população, gerando também acaloradas discussões doutrinárias e divergentes posicionamentos jurisprudenciais.

É importante que sejam discutidas as regras e condições para a utilização dessa medida, visto que muitas mudanças foram feitas com o implemento do Novo Código de Processo Civil de 2015 ao ordenamento jurídico brasileiro, observando se esta é eficaz ou não.   

Aprovada pela Constituição Federal de 1988, justificada pela ratificação do Pacto de São José da Costa Rica, é certo que, apesar de se tratar de medida excepcional, sua aplicação é legítima no âmbito judicial executivo, com o objetivo de compelir o devedor a satisfazer sua obrigação de maneira mais célere.

No entanto, é preciso observar a situação desigual enfrentada pelos brasileiros no que se refere às condições econômicas e financeiras, e analisar se realmente a prisão do devedor é o melhor caminho para que o alimentado venha a ter o seu direito garantido.

O objetivo deste trabalho foi analisar a eficácia da prisão civil, fazendo uma comparação dos resultados da aplicação da prisão em cada caso concreto, observando-se todo o contexto social no qual está contido a figura do indivíduo-devedor, sem esquecer as necessidades do credor.

Verificando todo o arcabouço doutrinário e bibliográfico acerca do questionamento em que a eficácia da prisão civil está envolta, nota-se que esta é extremamente eficiente em determinadas situações, enquanto que em outras acaba por se tornar prejudicial tanto a quem sofre a sanção, quanto a quem deveria ter seu direito satisfeito através dela.

Quando a pensão deixa de ser paga por pura desídia do devedor, sendo que este possui recursos suficientes para quitar a dívida sem que as suas próprias necessidades sejam prejudicadas, a decretação da prisão mostra-se razoável para que o mesmo se veja coibido pela possibilidade de ter sua liberdade privada, fazendo com que o mesmo busque quitar o débito e se veja livre da ameaça de ser preso.

Em contrapartida, quando o inadimplemento ocorre por motivos alheios à vontade do devedor (desemprego, mudança desfavorável da situação financeira), a falta de subsídios que permitam o pagamento sem que o próprio sustento seja atingido faz com que a prisão seja completamente ineficaz. Nesse caso, o indivíduo ficaria preso, tendo sua dignidade agredida, e não poderia trabalhar ou tomar qualquer atitude para conseguir dinheiro e pagar a dívida. Desse modo, a única opção é esperar que passe o tempo decretado para a prisão e saindo do estabelecimento prisional, ficar sujeito à nova decretação.

Mesmo com a prisão decretada, mesmo com o devedor tendo sofrido a sanção mais rigorosa, tendo contra si o meio executório de natureza mais grave, estando preso sob o regime mais severo, o alimentado não teve o seu direito garantido, e a obrigação não foi cumprida, o que mostra a ineficácia do instrumento de coerção pessoal para esta realidade fática.

Por todo o exposto, conclui-se que a prisão civil do devedor de alimentos mostra-se medida parcialmente eficaz, e como se trata de instrumento de extrema rigidez, deve ser aplicado somente como última opção, depois de infrutíferos os demais meios executórios.

Cabe ao julgador observar as várias hipóteses de incidência, apreciando-as com moderação e cautela, analisando caso a caso, sempre fazendo a ponderação entre os direitos fundamentais envolvidos, além de priorizar o binômio necessidade/possibilidade, sem esquecer do princípio da proporcionalidade e aplicar a prisão apenas nos casos em que o devedor é malicioso e irresponsável.

É justo que o legislador busque outros meios de fazer com que, não satisfeita a obrigação pela impossibilidade do devedor, haja outra saída para que o credor não fique sem a garantia do seu direito.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALEXANDRINO, Laiane Castro; MORAES, Itamara. A eficácia da prisão civil nas ações de execução de alimentos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6314, 14 out. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/55616. Acesso em: 23 abr. 2024.