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Controle de inconstitucionalidade das leis e o papel da reclamação perante o STF.

Modificação das hipóteses de seu cabimento na jurisprudência atual da Corte: ADIN nº 2797 e Lei nº 10.628/02

Controle de inconstitucionalidade das leis e o papel da reclamação perante o STF. Modificação das hipóteses de seu cabimento na jurisprudência atual da Corte: ADIN nº 2797 e Lei nº 10.628/02

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O trabalho aprecia, de forma perfunctória, a teoria geral de inconstitucionalidade das leis, assim como a dupla função da reclamação nesta mesma seara, evidenciando doutrina e jurisprudência da Corte Constitucional.

I. Apresentação.

O presente trabalho pretende apreciar, de forma perfunctória, a teoria geral de inconstitucionalidade das leis, assim como a dupla função da reclamação nesta mesma seara, evidenciando doutrina e jurisprudência da Corte Constitucional.

Este primeiro enfoque abarcará tão apenas os aspectos relevantes para a construção da segunda parte, que enfocará a reclamação no âmbito das ações de controle concentrado e, mais especificamente, àquelas manejadas em virtude da ADIN 2797, proposta pela CONAMP (Associação Nacional dos Membros do Ministério Público), contra a inclusão dos parágrafos 1º e 2º no art. 84 do CPP pela Lei 10.628/02, que conferiu natureza criminal às ações de improbidade administrativa.

Por fim, se abordará, de maneira crítica, as implicações que tais mudanças podem trazer no quadro geral de controle de constitucionalidade.


II. Teoria Geral do Controle de Constitucionalidade. Considerações.

Todo sistema constitucional moderno baseia-se na organização normativa estratificada, elaborada pela teoria kelseniana, como imperativo estrutural de qualquer ordenamento jurídico. Em seu âmago está a adoção do princípio da supremacia constitucional, através do qual estabelece-se uma hierarquia de normas, com o fito de se permitir a avaliação de validade daquelas que se põem abaixo daquela tida por Fundamental, provendo-se, para tanto, um juízo de compatibilidade entre gênero e espécie.

Esta avaliação pode ser feita ou por órgão criado especificamente para tanto (idéia que ganhou corpo graças ao jusfilósofo acima mencionado, com base em cujo ideário foi instalado o Tribunal Constitucional da Áustria) ou ser empreendida no bojo da atividade jurisdicional, quer com exclusividade, pela mais alta Corte Estatal – em controle concentrado –, quer por meio do rito da judicial review norte-americana, que reconhece a todo membro do Judiciário a possibilidade de constituição da inconstitucionalidade, com eficácia limitada aos contendores particulares.

Nosso país adotou ambas as alternativas, que convivem sistêmicamente. José Afonso da Silva esboça, com propriedade, as múltiplas formas pelas quais estes lexemas podem ser inferidos:

"(...) à vista da Constituição vigente, temos a inconstitucionalidade por ação ou por omissão, e o controle de constitucionalidade é o jurisdicional, combinando os critérios difuso e concentrado, este de competência do Supremo Tribunal Federal. Portanto, temos o exercício do controle por via de exceção e por ação direta de inconstitucionalidade e ainda a referida ação declaratória de constitucionalidade. De acordo com o controle por exceção, qualquer interessado poderá suscitar a questão de inconstitucionalidade, em qualquer processo, seja de que natureza for, qualquer que seja o juízo." [1]

O que importa para o presente trabalho é o controle por ação direta de inconstitucionalidade e o controle difuso, tão somente. Estas modalidades, embora distintas, convivem em relativa harmonia, visto que possuem âmbitos de aplicação distintos. Para que isto possa ocorrer, são estipuladas duas regras salientes de calibração, quais sejam: (i) o controle concentrado tem esfera de legitimados restrita e vale contra todos – eficácia erga omnes –, vinculando uma dada conclusão interpretativa que se possa extrair de um texto, abstraído de qualquer aplicação factual, impondo tal resultado cognitivo por meio de norma geral e abstrata (cuja composição mais tarde se verá), que submete à obediência todo e qualquer juiz ou Tribunal do país, em efeito compatível com o stare decisis norte-americano; enquanto isto, o controle difuso (ii), instaurado pela parte ou pelo próprio magistrado, ex officio [2], julgando a aplicação da lei a casos concretos, faz com que o âmbito eficacial do decisum restrinja-se às partes, em pertinência a uma dada relação de direito material e processual. Tal prerrogativa, não obstante, deve ser manejada com parcimônia, cabendo ao juiz dela lançar mão apenas na hipótese de tal questão ser essencial para o desate da lide visto que, como pondera Lúcio Bittencourt, "o juiz deve abster-se de se manifestar sobre a inconstitucionalidade, toda vez que, sem isso, possa julgar a causa e restaurar o direito violado." [3]

Das duas sub-conclusões acima indicadas infere-se que esta teoria está profundamente assentada na necessidade diuturna da interpretação, como instância necessária de descobrimento dos significados propostos pelo Direito Positivo. A incidência, que constrói uma ponte entre o mundo ideal-normativo e o mundo-do-ser, não se dá por operação jurídica automática e infalível, carecendo, sempre, da atividade cognoscente de um sujeito que, para fazê-lo, deve dominar, previamente, o sentido do extrato textual que lhe é submetido. Por isto, estritamente sob a perspectiva lingüística, temos que não existem ações ou juízos exclusivamente declaratórios, visto que, para que estes sejam introduzidos na esfera da realidade jurídica, devem ser precedidos de ato criador: a razão.

O tema é importante, e para que dele tratemos, é adequado inaugurar novo tópico.


III. Texto e norma

Sob a ótica lingüística através da qual partimos agora para analisar o tema, o texto comporia a instância empírica da experiência jurídica, densificado, geralmente, num substrato físico, enquanto que a norma, por sua vez, seria formada por um comando prescritivo constituído por hipótese e conseqüência. Esta não é algo dado, mas construído, tomando por base os primeiros elementos. Tal qual na lingüística, onde o sentido não está no texto, mas se constrói a partir dele, no curso de uma interação [4], a norma é o resultado da interpretação dos textos. A interpretação é, portanto, atividade que se presta a transformar textos – disposições, preceitos, enunciados – em normas. [5] Ou, ainda, atribuir sentido ou significado a um texto normativo.

Não por outra razão salienta Arthur José Faveret Cavalcanti que "as normas são juízos, ou seja, entidades que só têm existência no interior de nossas mentes. Nas leis não estão normas, mas as palavras que formam as proposições mediante as quais as normas são expressas. Os textos de lei são, pois, os símbolos que exprimem as normas, mas não são as próprias normas. Interpretar nada mais é do que captar as normas a partir desses símbolos. Portanto, mesmo as leis claras precisam ser interpretadas. Aliás, para saber se uma lei é clara é preciso já tê-la interpretado. A clareza não é senão a facilidade de interpretação." [6]

A racionalidade do Direito, assim entendida, não comporta apenas uma operação unívoca. Para que se possa aplicar uma regra ou princípio jurídico, faz-se necessário um desdobramento cognitivo que, não obstante possa parecer até mesmo automático no dia-a-dia dos seus operadores, pode ser dividido didaticamente em duas fases: em primeiro lugar, tenderá o sujeito a aferir as interpretações possíveis dos objetos lingüísticos que lhe são fornecidos, de maneira abstrata, obedecendo a primados estruturais e a vetores axiológicos valorizados no sistema, razão pela qual sempre será possível distinguir entre interpretações possíveis e aquelas que não são admissíveis ante estes mesmos critérios. É o que Requena López chama de "condicionantes" de toda atividade de apreensão de sentido [7]. Num segundo momento, comparar-se-á o produto de tais indagações com a interpretação da realidade que nos é fornecida por meio de provas (documentos, testemunhos, perícias etc.) que se contém no processo – judicial ou administrativo – verificando-se uma manobra lógica de inclusão ou exclusão, tal qual se dá na teoria matemática dos conjuntos.

A estas duas fases, complementares, indica Faveret as alcunhas de interpretação e aplicação, que se distinguiriam da seguinte maneira: "a interpretação trata da relação entre a norma e as palavras que a expressam, e o seu objetivo é o de identificar o conteúdo da norma. A aplicação trata, porém, da relação entre a norma e o mundo exterior a ela, sendo o seu objetivo determinar aquilo que se subsume nos conceitos que formam a norma." [8]

Pelo exposto, e aplicando a visão da teoria da interpretação aqui sustentada à teoria do controle de constitucionalidade em nosso país, temos que na ação direta o Supremo Tribunal Federal se limita a aferir as condições prévias à aplicação da norma aos casos concretos, burilando e lapidando, por meio da argumentação jurídica, a riqueza sintática, semântica e pragmática dos termos legais, aferindo sua compatibilidade com as instâncias hierarquicamente superiores, abstraindo-se de qualquer incidência específica. Esta fase de cognição (termo entendido como algo mais amplo que interpretação e aplicação, isoladamente tratados), como já se viu, não é exclusiva daquela Corte, mas antecedente lógico de qualquer processo de apreensão.

Os demais magistrados empreendam o mesmo labor, que é inerente ao desempenho da jurisdição, e podem chegar, ainda nesta primeira fase, a deliberar sobre a inconstitucionalidade da norma. [9] Não obstante, tal incompatibilidade pode somente exsurgir em instante ulterior, quando da sua aplicação a um dado caso concreto [10], sendo este segundo desdobramento exclusivo dos aplicadores em geral, o que confirma a importância de se delinearem as duas instâncias distintas do racionalismo judicial.

Assim postas as coisas, impõe-se dizer que, enquanto Tribunal de Controle da Constitucionalidade das leis, o STF limita-se à interpretação do direito posto. Aos demais magistrados toca desenvolver atividade mais extensa, visto que além do passo anterior também cabem-lhes aplicar tais dispositivos a casos concretos, não sendo esta ulterior atribuição redutível à anterior.


IV. Âmbitos de eficácia das declarações de inconstitucionalidade.

Prosseguindo na dilucidação dos aspectos mais relevantes do tema há que se apontar que, dada a dualidade dos planos (da interpretação e da aplicação) em que se pode empreender a discussão jurídica da validade normativa no Estado Brasileiro, também a eficácia das decisões no sistema misto se faz presente, já que o Acórdão da Suprema Corte, no desempenho de argüição de inconstitucionalidade por via direta, não tem o condão de desconstituir as operações de incidência previamente executadas com base na porção textual que fora expungida do sistema jurídico, como resultado do julgamento da primeira ação. Os casos concretos, por isso mesmo, somente poderão ser atacados por outros meios, igualmente específicos e aptos a tal desconfirmação. A respeito, vejam-se as palavras de Leonardo Greco:

"parece-me claro que a declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade em controle concentrado de normas pelo Supremo Tribunal Federal não deve ter nenhuma influência sobre anteriores sentenças transitadas em julgado que tenham fundamento em entendimento contrário ao do STF sobre a questão constitucional.

A segurança jurídica, como direito fundamental, é limite que não permite a anulação do julgado com fundamento na decisão do STF. O único instrumento processual cabível para essa anulação, quanto aos efeitos já produzidos pela sentença transitada em julgado, é a ação rescisória, se ainda subsistir o prazo para a sua propositura." [11]

Da mesma forma expõem Eurico Diniz De Santi e Paulo Cesar Conrado, com as seguintes palavras:

"Por objetivar apenas a análise de direito, seu procedimento [do controle abstrato], diferentemente das ações individuais, (...) vem marcado por regras que ignoram a análise factual: i) os legitimados ativos nada têm a ver com os direitos que pudessem ser gerados pela lei; ii) a competência é exclusiva do STF que exerce, nesta ação, a função de guardião da Constituição ex vi do art. 102, caput da CF/88; iii) na inicial não se exige atribuição de valor à causa, indicação de provas, requerimento de citação nem identificação do réu; iv) não há defesa.

Não constitui direitos subjetivos, só produz o efeito jurídico de enunciar a inconstitucionalidade de determinada lei ou de parte dela com efeitos, em regra, ex tunc.

Interfere nos processos de positivação presentes (todos os processos administrativos ou judiciais em curso, ou seja, não atingidos pela coisa julgada) e futuros (não iniciados), servindo, em relação ao passado, apenas de fundamento jurídico para processos administrativos ou judiciais desde que ainda não consolidados pela decadência e pela prescrição." [12]

O STF, na Rcl 389-2/PR, também destacou tal distinção no voto do Relator, Min. Marco Aurélio, cujo trecho segue transcrito:

"O que deve ser tomado em linha de conta, como diretriz da questão, é que a ação direta de inconstitucionalidade, mediante a qual o controle concentrado é realizado, desenvolve-se num processo objetivo, sem partes, com vistas à proteção da ordem jurídica, no qual não há litígio que diga respeito a direitos individuais. Quando do julgamento da Rep. nº 1.016-SP, o Sr. Ministro Moreira Alves registrou que a representação de inconstitucionalidade, tem ‘caráter excepcional com acentuada feição política pelo fato de visar ao julgamento, não de uma relação jurídica concreta, mas da validade da lei em tese.’ E acrescentou S. Exa. Que não é ela ‘uma simples ação declaratória de nulidade, como qualquer outra, mas, ao contrário, um instrumento especialíssimo de defesa da ordem jurídica vigente estruturada com base no respeito aos princípios constitucionais vigentes’ (RTJ 95/993,999). (...) É que a decisão proferida no controle concentrado de constitucionalidade tem a natureza de norma, de norma em sentido negativo, porque ela afasta da ordem jurídica a norma incompatível com o ato normativo inicial. Destarte, a decisão ou ato praticado com base em norma inválida, porque assim declarada, em tese, pelo Supremo Tribunal Federal, também será inválido, mas a declaração dessa invalidez deverá ser buscada mediante a utilização das ações que integram o que Capelletti denomina de jurisdição constitucional das liberdades (‘La giurisdizione Constituzionale delle Libertà, Milano, 1955) – os remédios ou garantias constitucionais e que são, na Constituição vigente, o habeas corpus, o mandado de segurança individual e coletivo, o habeas data, o mandado de injunção e a ação popular – e as ações do processo ordinário." [13]


V. Conclusão parcial.

De todo o exposto até aqui, podemos sumariar as posições colhidas, estabelecendo critérios gerais e específicos pelos quais abordamos a matéria. Os primeiros seriam condensados em quatro, assim explicitados:

1. Para se aferir a validade das normas há que se conceber uma estrutura hierárquica com a qual o intérprete as organiza no sistema positivo de qualquer Estado.

2. Dentro deste contexto, a Constituição Federal é a norma-ápice, fundamento de validade de todos os demais textos pertinentes ao referido sistema.

3.Todas as normas gozam de presunção de constitucionalidade até que sejam extirpadas do ordenamento pela ação judicial, em exercício de poder sancionador.

4. A interpretação e a aplicação do Direito têm importante papel no controle constitucional, estipulando duas instâncias diferentes de aferição de validade normativa.

A respeito da distinção entre estas instâncias, extraímos os seguintes critérios específicos:

(i) o controle concentrado ou abstrato pode ser exclusivamente suscitado por aqueles legitimados pela Carta Política, enquanto que o difuso ou concreto pode sê-lo por qualquer parte, em demanda em curso, ou mesmo ex officio pelo magistrado.

(ii) no controle concentrado, o Tribunal Supremo não analisará fatos concretos, mas apenas a compatibilidade inerente aos sentidos textuais da lei impugnada, assim como o procedimento legislativo de sua formação, com os imperativos sistêmicos contidos no diploma constitucional. Neste caso, o pedido da ação direta implicará na constituição, em linguagem competente, da inconstitucionalidade da lei. Não haverá efeito condenatório direto deste julgamento.

(iii) o julgamento concentrado não implicará na desconstituição das decisões proferidas no controle inter partes, que deverão ser mantidas, ainda mais se já não houver possibilidade de manejar-se rescisória, por haver decaído o prazo para tanto.

(iv) no difuso, a invalidade será incidental, não fazendo coisa julgada, e limitando seus efeitos aos contendores da ação.

(v) em ambas as modalidades, estão em jogo importantes garantias fundamentais a balizar e influenciar nas decisões judiciais, em conflito principiológico.


VI. A reclamação – natureza jurídica, fundamentos de sua existência, rito e conseqüências processuais.

O primeiro tópico desta seção poderia levar um livro inteiro para ser esmiuçado, visto não se encontrar nenhuma unanimidade, quer na doutrina, quer na jurisprudência, a seu respeito.

Na reclamação 336, fixou o Min. Carlos Velloso um panorama a respeito de tal dissidência, manifestando que:

"a reclamação, qualquer que seja a qualificação que se lhe dê – ação (Pontes de Miranda, ‘Comentários ao Código de Processo Civil’, tomo V,/384, Forense), recurso ou sucedâneo recursal (Moacyr Amaral Santos, RTJ 56/546-548; Alcides de Mendonça Lima, ‘O Poder Judiciário e a Nova Constituição’, p. 80, 1989, Aide), remédio incomum (Orosimbo Nonato, apud Cordeiro de Mello, ‘O processo no Supremo Tribunal Federal’, vol. 1/280), incidente processual (Moniz de Aragão, ‘A correição parcial’, p. 118, 1969), medida de direito processual constitucional (José Frederico Marques, ‘Manual de Direito Processual Civil’, vol. 3°, 2ª parte, p. 199, item n. 653, 9ª ed., 1987, Saraiva) ou medida processual de caráter excepcional (Min. Djaci Falcão, RTJ 112/518-522) – configura, modernamente, instrumento de extração constitucional, inobstante a origem pretoriana de sua criação (RTJ 112/504), destinado a viabilizar, na concretização de sua dupla função de ordem político-jurídica, a preservação da competência e a garantia da autoridade das decisões do Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, I, ‘l’) e do Superior Tribunal de Justiça (CF, art. 105, I, ‘f’)." [14]

Cândido Rangel Dinamarco e Ada Pelegrini Grinover, em trabalhos relativamente recentes, engrossam as fileiras daqueles que a consideram "remédio processual" mediante o qual "se afasta a eficácia de um ato judicial viciado, se retifica o ato ou se produz sua adequação aos requisitos da conveniência ou da justiça" [15] ou "remédio processual constitucional", fundamentado no direito de petição (art. 5°, XXXIV, "a" da CF). [16]

Os testemunhos acima arrolados parecem demonstrar que a categorização precisa da reclamação, ainda que bosquejada exaustivamente, não tem sido alçada a status de grande importância, levando em conta que, ainda assim, vem ela agindo a contento para os fins que a nova Carta Política, em seus artigos 102, I, "l" e 105, I, "f", a positivou.

Trata-se de elemento que aglutina lenta criação pretoriana, em cabal demonstração de atividade de criação do direito pelos órgãos judiciais, respaldado na teoria dos poderes implícitos, segundo a qual "desde que um fim é reconhecido necessário, os meios são permitidos, todas as vezes que é atribuída uma competência geral para fazer alguma coisa, nela estão compreendidos todos os particulares poderes necessários para realizá-la", de acordo com lição de Madison. [17] Depois, veio a ser incorporado no Regimento Interno da Suprema Corte, até que chegasse a ser inserida na própria Carta Maior, com cunho processual-sancionatório, de molde a garantir o duplo fundamento para a qual foi concebida, quais sejam: a) preservar a competência da Corte Superior, do Supremo Tribunal Federal e ainda dos Tribunais Estaduais (art. 125, §1°); b) garantir a autoridade de suas decisões.

A distinção entre o plano da interpretação e o da aplicação já foi tratado no início deste trabalho, e deve ser recordado aqui para melhor conhecimento de nossa exposição, visto que, como afirmou o Min. Luiz Galotti, na Reclamação 22, há que se distinguir entre o desrespeito frontal à decisão da corte da mera interpretação em sede executiva.

Não por outra razão, já sustentou o Min. Moreira Alves, Relator designado na Reclamação 208-0, que "contra ato judicial que aplica norma declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal em representação de inconstitucionalidade não cabe reclamação, pela parte prejudicada naquela relação processual, sob o fundamento de, como terceiro interessado, visar a garantir a autoridade da decisão desta Corte" (DJ 06.12.91, p. 17.825). De igual maneira, o Min. Celso Mello no Agravo Regimental proferida na Reclamação 354, verberou: "a jurisprudência do STF firmou-se no sentido do não cabimento de reclamação na hipótese de descumprimento de decisão tomada em sede de controle de constitucionalidade, dada a natureza eminentemente objetiva do processo de ação direta" (DJ 28.05.91).

Em outro voto, a especificidade da Reclamação no bojo das ações de jurisdição constitucional fica ainda mais patente, como se extrai da seguinte passagem, abaixo transcrita, do mesmo Relator:

"O que deve ser tomado em linha de conta, como diretriz da questão, é que a ação direta de inconstitucionalidade, mediante a qual o controle concentrado é realizado, desenvolve-se num processo objetivo, sem partes, com vistas à proteção da ordem jurídica, no qual não há litígio que diga respeito a direitos individuais. Quando do julgamento da Rep. n° 1.016-SP, o Sr. Ministro Moreira Alves registrou que a representação de inconstitucionalidade, que é, hoje, a ação direta de inconstitucionalidade, tem ‘caráter excepcional com acentuada feição política pelo fato de visar ao julgamento, não de uma relação jurídica concreta, mas da validade da lei em tese.’ E acrescentou S. Exa. não é ela ‘uma simples ação declaratória de nulidade, como qualquer outra, mas, ao contrário, um instrumento especialíssimo de defesa da ordem jurídica vigente estruturada com base no respeito aos princípios constitucionais vigentes.’ (RTJ 95/993,999). Daí a inadmissibilidade da reclamação para o fim de garantir a autoridade da decisão proferida na ação direta de inconstitucionalidade. Dado que a reclamação é cabível em dois casos – para preservar a competência da Corte e para garantir a autoridade de suas decisões (C.F., art. 102, I, l) – estou em que ela poderá ser admitida, em princípio, no primeiro caso, vale dizer, para preservar a competência do Supremo Tribunal, não, entretanto, na segunda hipótese. É que a decisão proferida no controle concentrado de constitucionalidade tem a natureza de norma, de norma em sentido negativo, porque ela afasta da ordem jurídica a norma incompatível com o ato normativo inicial. Destarte, a decisão ou ato praticado com base em norma inválida, porque assim declarada, em tese, pelo Supremo Tribunal Federal, também será inválido, mas a declaração dessa invalidez deverá ser buscada mediante a utilização das ações que integram o que Cappelletti denomina de jurisdição constitucional das liberdades (‘La Giurisdizione Costituzionale delle Liberta, Milano, 1955) – os remédios ou garantias constitucionais e que são, na Constituição vigente, o hábeas corpus, o mandado de segurança individual e coletivo, o hábeas data, o mandado de injunção e a ação popular – e as ações do processo ordinário." [18]

É exatamente por esta ambivalência intrínseca em que se movimenta a reclamação que contribui para que não se alcance a univocidade quanto à sua natureza jurídica. De nossa parte, e sem querer pacificar o tema, vislumbramo-la como ação que instaura relação processual entre o prejudicado, a corte ou magistrado desobediente, e o STF, obedecendo a rito sumário, garantido o contraditório, e que tem por objetivo o exercício da jurisdição, que não se esgota no proferimento do julgado, mas se perpetua até o adimplemento do que poderíamos chamar de "direitos acessórios constitucionais" (para aproveitar teoria elaborada no Direito Privado Obrigacional/Contratual). [19]

A sua riqueza procedimental é tão grande, ainda que pouco se tenha escrito a respeito, que admite a concessão de medidas liminares (vide Rcl 208, Rel. para acórdão Min. Moreira Alves e Rcl 389, Rel. Min. Paulo Brossard), servindo também como legítima instância de reconsideração, pelo relator de Adin, acerca da necessidade de cautelar na ação principal (vide sobre este aspecto acessório a Rcl 2.063, Rel. Min. Ellen Gracie Northfleet).


VII. O uso das reclamações perante o STF no caso da Lei 10.628/ 2001.

No caso da ADIN 2797, ajuizada pela CONAMP (Associação Nacional dos Membros do Ministério Público), que atacou a constitucionalidade do parágrafo 2º do art. 84 do CPP, introduzido pela Lei 10.628/2001, por razões que não cabem na singeleza do trabalho, o Presidente em exercício do STF, Min. Ilmar Galvão, este resolveu negar o pleito liminar, não sendo apresentado qualquer óbice pelo Relator ao exercício do controle difuso de constitucionalidade no bojo de sua sustentação, entendendo ele não haver relevância suficiente na assertiva de que aquela iria tumultuar a tramitação das ações ora em tramitação. Muito menos foi conferido juízo positivo cautelar de validade da norma atacada, o que foi expressamente deixado para o crivo do Plenário.

Após tal decisão, a Corte, em um primeiro momento, se dividiu, tendo por leading case favorável à tese de que, ainda que sem a liminar referida, não poderia ser contrariada a presunção de constitucionalidade da lei, a Reclamação 2381, Relatada pelo Min. Ayres Britto, nos seguintes termos: "até o julgamento final da ação direta, portanto, a lei sob referência integra o ordenamento jurídico pátrio, uma vez que o pedido de medida cautelar visando à suspensão da norma impugnada foi denegado. (...) Ante o exposto, já ressalvado que a lei em causa prossegue vigorando, e dela se depreende que é do Supremo Tribunal Federal a competência para processar e julgar ação de improbidade ajuizada em face de Senador da República, defiro a medida liminar postulada para sobrestar o andamento do procedimento objeto da presente reclamação."

Outros Ministros seguiram a mesma orientação, como Gilmar Mendes, na Reclamação 2819, havendo outros que, embora a adotassem, promoveram algumas variações tópicas, como o Min. Nélson Jobim, na Rcl 2538, que ressalvou que o parâmetro judicial somente é válido no caso de "competência especial por prerrogativa de função só se estende, após cassada a investidura determinante, se a imputação for relativa a atos administrativos do agente"; e do Ministros Cezar Peluso na Rcl 2645, que não ordenou a avocação dos autos investigatórios, limitando-se a ordenar a suspensão processual.

O Min. Celso de Mello, na Rcl 2657, muito embora assumisse a tese acima esboçada, em sua linha mais geral, valendo-se do que chamou de "princípio do colegiado", antecipou seu voto na Adin para, desde já, dizer-se prócere da inconstitucionalidade da Lei 10.628/02, em momento de incongruência e perplexidade para o mundo jurídico, sendo seguido pelo Min. Marco Aurélio que, na ocasião do julgamento do Habeas Corpus 85675, também antecipou o voto pela inconstitucionalidade do diploma legal, muito embora acabasse por ordenar a suspensão de investigação criminal contra o ex-governador do Rio de Janeiro, Sr. Garotinho, que estava sendo empreendida pelo TJRJ.

De outro lado, capitaneando os dissidentes, minoria na Corte, o Min. Carlos Velloso, no leading case oposto, Rcl 2702, negou seguimento à Reclamação aduzindo que "não tenho como ocorrente, no caso, os pressupostos constitucionais da reclamação: usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal ou desrespeito a sua decisão. É que a decisão do Ministro Galvão simplesmente indeferiu a medida cautelar. Não foi declarada, com tal decisão, a constitucionalidade da lei. Indeferida a cautelar, a lei tem vigência, é certo. Todavia, o fato de órgãos do judiciário deixarem de aplicá-la, sobre o fundamento de que é ela inconstitucional, não significa que estaria sendo descumprida a decisão do Supremo Tribunal Federal. O contrário, vale dizer, tivesse o Supremo Tribunal Federal deferido a cautelar, para o fim de suspender a eficácia da lei, e se fosse ela aplicada por órgão do Judiciário, aí, sim, estaria sendo descumprida a decisão do Supremo Tribunal, tendo em vista o seu efeito vinculante."

Estes argumentos geraram mudança de opinião de alguns Ministros, como Marco Aurélio, que na Rcl 2658 decidiu também por negar-lhe seguimento, marcando, nitidamente, a distinção entre o indeferimento da medida liminar em Adin e a declaração de constitucionalidade da lei atacada pela mesma Adin, dizendo que tais argumentos não são idênticos. Também a Min. Ellen Gracie, modificando sua posição anterior, também acabou por negar seguimento ao remédio constitucional na Rcl 3061.

O Min. Sepúlveda Pertence também negou o trânsito de tais medidas, ao fundamento de boa-fé processual, asserindo que estas somente deveriam ter cabimento quando as decisões que declararam incidentemente a inconstitucionalidade ou negaram vigência à alteração normativa, estivessem sendo atacadas por recursos. Alertou, textualmente, na Rcl 2748: "sequer há notícia nos autos de que tenha manifestado [o reclamante] recurso ao Tribunal paulista. A reclamação não substitui recursos previstos no Código de Processo Civil, nem se pode presumir que – se interposto o agravo da decisão reclamada – o juízo insistirá na orientação adotada."

O fato mais espantoso deu-se com a mudança do pensamento do Relator do leading case da corrente oposta, Min. Ayres Britto quando, na Rcl 2725, negando o que já houvera dito, ressalvou que "o Supremo Tribunal Federal, ao examinar o pedido de medida liminar na ADI 2.797, deliberou por indeferi-la. E da exegese do § 1º do art. 11 da Lei 9.868/99 infere-se que apenas as decisões concessivas das medidas acautelatórias formuladas nas ações diretas de inconstitucionalidade é que se dotam de efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração federal, estadual, distrital e municipal."

Como se vê, houve opiniões para todos os gostos e medidas. A situação somente veio a se pacificar, refletindo a posição majoritária do plenário da Corte quando do julgamento do Agravo Regimental na Reclamação 2381, vencedora a primeira tese, estando o julgado assim ementado: "enquanto não sobrevier o julgamento de mérito da ADI 2.797, é desta colenda Corte, nos termos do artigo 84, § 2º, do Código de Processo Penal (redação dada pela Lei nº 10.628/2002), a competência para processar e julgar ação de improbidade administrativa a ser ajuizada em face de Senador da República."

Não obstante, há que se ressalvar que a atual posição do Supremo impõe mudanças graves e sérias, não só à autoridade de seus julgamentos prévios, mas também às lições, consolidadas em mais de dois séculos da existência do Tribunal Constitucional.

A diretiva viola, frontalmente, a conclusão adotada no Agravo Regimental da Rcl 2810 que afirmou em sua súmula: "o indeferimento de liminar em ação direta de inconstitucionalidade, pouco importando o fundamento, não dá margem à apresentação de reclamação" tendo em vista que a Adin trabalha no plano interpretativo e a Rcl, no dos desvios da aplicação, voltada para regular uma relação processual inter partes.

Da mesma maneira, há que se destacar o teor do julgado no RE 22271, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, onde se afirmou que "medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade: indeferida – ao contrário do que sucede na hipótese de concessão (cf. RE 168.277 (QO), Galvão, 4.2.98) – não se suspende, em princípio, o julgamento dos processos em que incidentemente se haja de decidir a mesma questão de inconstitucionalidade."

Da mesma maneira, na Questão de Ordem levantada na Rcl 2.063, Relatora Min. Ellen Gracie, foi assentado que "o pedido, nos termos em que formulado, pretendia atribuir efeito vinculante à decisão que indefere medida liminar em ação direta de inconstitucionalidade, efeito esse que ela não tem."


VIII. Conclusão.

As posições instáveis, adotadas por alguns integrantes do STF, violando premissas consolidadas de Teoria Geral do Direito Constitucional, com enfoque no Controle de Constitucionalidade das Leis, geraram muito mais insegurança jurídica do que a estabilidade que os próprios Ministros alegaram defender com a avocação de uma série de ações e inquéritos envolvendo autoridades públicas investigadas ou acionados por atos de improbidade.

Ademais, criou a corte perigoso precedente, que modifica inteiramente a informação doutrinária sobre a qual repousa o controle de constitucionalidade, dando a entender que a manifestação negativa acerca de liminar em Adin imporia a presunção, já agora indesconstituível, de conformidade constitucional, o demonstra não apenas uma violação de lógica jurídica mas mesma da lógica formal, na medida em que o nada, o vazio, estaria a gerar conseqüências, rompendo com o nexo imputacional encarecido pela tradicional escola kantiana.

Aplicável a tese a tributos, por exemplo, basta que se ajuíze uma ADC ou Adin, com reclamo de liminar, para que, não sendo esta deferida, tal conseqüência seja mais gravosa do que a própria análise positiva da matéria, visto que os contribuintes seriam obrigados ao pagamento da exação, sem que lhes fosse permitido o legítimo acesso ao judiciário para o questionamento da constitucionalidade do tema, em ofensa a garantia individual insculpida na Carta Maior.

Ademais, tal pensamento dá ensejo à deturpação do uso de tais ações que, ao invés de buscarem a defesa do Estado de Direito, passariam a representar, em boa parte, um "ganho de tempo" para a arrecadação fiscal, ou mesmo um estímulo à adoção de atos ímprobos, na medida em que a tramitação das ações perante o STF é muito mais morosa do que em outras instâncias, e poderia mesmo ensejar a prescrição das ações de repetição de indébito ou de reparação civil, respectivamente. Veja-se, à guisa de exemplo, o que ocorre com a Adin 2797 que, após mais de três anos de sua propositura, somente conseguiu, até hoje, colher a manifestação de seu Relator (noticiada no Informativo 362, 20 a 24 de setembro de 2004).

Com isto, concluímos o trabalho ressalvando que: a) inexiste qualquer decisão com efeito erga omnes do STF obstando o andamento de Ações Civis Públicas ou Inquérito Civis, sendo livres os magistrados de 1º e 2º graus de formarem o livre convencimento a respeito da constitucionalidade da Lei 10.628/2002; b) apenas as ações que foram impugnadas por meio de Reclamação, e que tiveram Medida Cautelar deferida em seu bojo, é que devem permanecer paralisadas, cabendo aplicação plena da lei em comento, visto ser a Reclamação processo subjetivo, que apenas vale inter partes; c) lamentar que a matéria, porque afeta à vida de políticos, possa ter levado a uma interpretação instável pelos membros da Corte, propiciando que a maioria de seus membros violentassem tão gravemente uma posição tranqüila da jurisprudência, em flagrante caso de casuísmo judiciário.


Notas

1 Curso de Direito Constitucional Positivo, 20ª ed., Malheiros, p. 51. Grifos do original.

2 Entendemos que o controle de constitucionalidade é inerente à função jurisdicional e que, assim como cabe ao juiz aplicar a lei ao caso concreto, ainda quando ausente a referência a dispositivo legal pela parte, ou quando esta indicação é equivocada, também é prerrogativa daquele selecionar os textos que entenda válidos e aptos a serem incluídos em seu silogismo sentencial, não estando obrigado a manipular elementos impertinentes ao sistema do Direito Positivo, quer por vício de forma ou conteúdo. De idêntica maneira, aponta Ronaldo Polletti que "o juiz singular, ao sentenciar, aplica a um caso concreto o comando abstrato contido na norma. Para isso, ele precisa escolher a norma, bem como, interpretá-la. Quando ele deixa de aplicar uma lei, por entendê-la contrária à Constituição, estará, pelo seu juízo, aplicando esta última e declarando a primeira inconstitucional. Não aplica a lei, formalmente válida, pois, contrária à Lei Maior, ela não é lei. A fundamentação de sua decisão, e ela própria, consubstanciam uma declaração de inconstitucionalidade." Controle de constitucionalidade das leis, 2ª ed., Forense, 1995, p. 198.

3 O controle jurisdicional da constitucionalidade das leis, 2ª ed., Forense, p. 118.

4 O texto e a construção dos sentidos, Ingedore Villaça Koch, Ed. Contexto, 2001, p.25.

5 Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do direito, Eros R. Grau, 2ª ed., Ed. Malheiros, 2003, p. 23.

6 A estrutura lógica do direito, 2ª ed., Renovar, 2003, p. 71.

7 Sobre la función, los medios y los límites de la interpretación de la Constitución, Comares, 2001, p. 13.

8 Op. cit., p. 74.

9 Polletti, op. cit., p. 198: "Inexiste diferença ontológica entre declaração de inconstitucionalidade e sentença, onde não se aplicou lei formalmente válida por entendê-la inconstitucional seu prolator. A diferença é de eficácia, quanto aos efeitos, daquela decisão dos tribunais e daqueloutra pelos juízes singulares ou pelo Supremo Tribunal. A função da Suprema Corte é igual a dos tribunais e juízes, apenas o Supremo dá a última palavra."

10 Como exemplo de regras que podem não ser inconstitucionais em sentido amplo, mas apenas em determinadas aplicações particulares, temos o exemplo do art. 1º da Lei 9.494/97, que proibiu a concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública, caso esgotem o objeto da lide, cuja conformidade com a Carta Magna foi atestada, liminarmente, na ADC 4, acórdão publicado no DJ 21.05.99. Não obstante, mesmo após esta decisão, com eficácia vinculante, segundo consta da ementa do julgado, o STJ, por mais de uma vez, desconsiderou a proibição daquela corte, confirmando decisões de primeiro e segundo graus que: (i) deferiram tutela antecipada contra a União por considerar "líquido e certo o direito dos hospitais ao percebimento dos valores de repasse dos montantes de conversão em URVs, fixada pelo Banco Central" (Resp 441466/RS, DJ 09.06.2003, p. 179, Rel. Luiz Fux); (ii) que ordenou não fosse sustado tratamento médico "caracterizada a necessidade premente da continuidade de tratamento" de saúde (Resp 396815/RS, DJ 15.04.2002, p. 184, Rel. Garcia Vieira); (iii) para que "candidato, aprovado em concurso público, freqüente curso de formação" (Resp 505022/MG, DJ 23.08.2004, p. 264, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca); (iv) quando ordenada a reinclusão de "parcela remuneratória ilegalmente suprimida" (Resp 447192/RS, DJ 4.11.2002, p. 254, Rel. Félix Fischer); (v) nas "ações previdenciárias que visem benefício" rural (Resp 200686/PR, DJ 17.04.2000, p. 76, Rel. Gilson Dipp).

11 Eficácia da declaração erga omnes de constitucionalidade ou inconstitucionalidade em relação à coisa julgada anterior. In Problemas de processo judicial tributário, 5º v., Dialética, 2002, p. 205.

12 Controle Direto de Inconstitucionalidade e repetição do indébito tributário, Rev. Dialética de Direito Tributário, n. 86, 2002, p. 29/30.

13 Controle Direto de Inconstitucionalidade e repetição do indébito tributário, Rev. Dialética de Direito Tributário, n. 86, 2002, p. 29/30.

14 RTJ v. 134-03, p. 1033.

15 A reclamação no processo civil brasileiro, Revista Forense, v. 99, nº 366, p. 14.

16 A reclamação para a garantia da autoridade das decisões dos tribunais, Revista Consulex, 15 de junho de 2002.

17 Apud José da Silva Pacheco, A "reclamação" no STF e no STJ de acordo com a nova Constituição, RT 646, p. 20.

18 Reclamação 389,

19 O Min. Amaral Santos, RTJ 56/546, estabeleceu como requisitos da reclamação: "existência de uma relação processual em curso" e "um ato que se ponha contra a competência do Supremo Tribunal ou que contrarie decisão deste proferida nessa relação processual", aos quais deve ser juntada a ausência de trânsito em julgado da decisão cujo descumprimento se alega, como se evidencia do Agravo Regimental na Reclamação 1.901/SP (atual súmula 734).


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GOMES, Mário Soares Caymmi. Controle de inconstitucionalidade das leis e o papel da reclamação perante o STF. Modificação das hipóteses de seu cabimento na jurisprudência atual da Corte: ADIN nº 2797 e Lei nº 10.628/02. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 689, 25 maio 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6768. Acesso em: 18 abr. 2024.