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Saúde: conceito e atribuições do Sistema Único de Saúde

Saúde: conceito e atribuições do Sistema Único de Saúde

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INTRODUÇÃO

            Diante do enunciado do art. 196 da CF, o qual considera a saúde como resultante de condições biológicas, sociais e econômicas, quais são as atribuições do Sistema Único de Saúde, como setor da Administração Pública? É o que pretendemos discutir neste trabalho.

            O direito à saúde, nos termos do art. 196 da CF, pressupõe que o Estado deve garantir não apenas serviços públicos de promoção, proteção e recuperação da saúde, mas adotar políticas econômicas e sociais que melhorem as condições de vida da população, evitando-se, assim, o risco de adoecer. Nesses termos quais as atribuições do SUS e o que compete a outros setores da Administração Pública? Quais os limites para a satisfação desse direito, de conceito tão amplo? A Administração Pública, na saúde, deve garantir tudo para todos?

            Quanto a garantir saúde para "todos", dúvidas não há, tendo em vista que a Constituição determina seja o seu acesso universal. E o que cabe no "tudo"? Se inúmeras são as causas que determinam e interferem com a saúde, qual a incumbência da saúde como um setor da Administração Pública?

            E no SUS, quais os medicamentos que devem ser garantidos? Quais exames, equipamentos, tecnologias, produtos que devem ser incorporados? Essas questões são de difícil demarcação, exigindo do Poder Público, da sociedade, dos conselhos de saúde, estudos e decisões complexas por lidar, em última instância, com a vida humana, direito fundamental e indisponível.

            Pretendemos aqui, instigar e lançar o desafio da discussão desse tema que necessita ser aprofundado pelos estudiosos e especialistas em saúde pública, principalmente quando o Sr. Procurador Geral da República, Dr. Cláudio Fonteles -- na ADIn n. 3087-6/600-RJ [01] -- opinou pela constitucionalidade de Lei Estadual, defendendo a tese de que gastos com alimentação devem ser realizados com os recursos da saúde por ser a alimentação uma das causas que interfere com a saúde humana.


DA CONCEITUAÇÃO DO DIREITO À SAUDE

            Com a Constituição de 1988, o direito à saúde foi elevado à categoria de direito subjetivo público, num reconhecimento de que o sujeito é detentor do direito e o Estado o seu devedor, além, é obvio, de uma responsabilidade própria do sujeito que também deve cuidar de sua própria saúde e contribuir para a saúde coletiva [02]. Hoje, compete ao Estado garantir a saúde do cidadão e da coletividade.

            Diante do conceito trazido pela Constituição de que "saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação", abandonou-se um sistema que apenas considerava a saúde pública como dever do Estado no sentido de coibir ou evitar a propagação de doenças que colocavam em risco a saúde da coletividade [03] e assumiu-se que o dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais, além da prestação de serviços públicos de promoção, prevenção e recuperação. A visão epidemiológica da questão saúde-doença, que privilegia o estudo de fatores sociais, ambientais, econômicos, educacionais que podem gerar a enfermidade, passou a integrar o direito à saúde.

            Esse novo conceito de saúde considera as suas determinantes e condicionantes (alimentação, moradia, saneamento, meio ambiente, renda, trabalho, educação, transporte etc.), e impõe aos órgãos que compõem o Sistema Único de Saúde o dever de identificar esses fatos sociais e ambientais e ao Governo o de formular políticas públicas condizentes com a elevação do modo de vida da população.

            Em trabalho [04] escrito anteriormente, havia comentado que não se deve entender a saúde apenas como fenômeno puramente biológico, uma vez que ela também é resultante de condições sócio-econômicas e ambientais, devendo a doença ser considerada, no dizer de Giovanni Berlinguer [05], como ‘um sinal estatisticamente relevante e precocemente calculável, de alterações do equilíbrio homem-ambiente, induzidas pelas transformações produtivas, territoriais, demográficas e culturais, incontroláveis nas suas conseqüências, além de sofrimento individual e de desvio duma normalidade biológica ou social’.

            Assim, não se pode mais considerar a saúde de forma isolada das condições que cercam o indivíduo e a coletividade. Falar, hoje, em saúde sem levar em conta o modo como o homem se relaciona com o seu meio social e ambiental é voltar à época em que a doença era um fenômeno meramente biológico, desprovido de qualquer outra interferência que não fosse tão somente o homem e seu corpo.

            Corroborando essa tese, trazemos novamente relato de Giovanni Berlinguer [06] sobre o sistema de saúde nacional da Inglaterra, que é universal e igualitário. Descreve o autor que, numa pesquisa feita naquele país, ficou demonstrado que a mortalidade infantil em seu conjunto regrediu consideravelmente; entretanto, essa regressão não se alterou, durante vinte e cinco anos, entre as cinco classes da população. A explicação, afirma o autor, deve estar no fato de que são as "condições de trabalho, de ambiente e de higiene, que eliminam ou reduzem a eficácia da extensão e da profundidade das atividades sanitárias" e essas condições, esclarece ele, não se alteraram, naquele país, no decorrer dos vinte e cinco anos.

            Mesmo que o sistema de saúde tenha atuação preventiva e curativa absolutamente iguais, as pessoas que vivem em situação precária, fatalmente serão mais acometidas de doenças e outros agravos, ainda que o sistema de saúde lhes ofereça um excelente serviço de recuperação.

            Daí dizer-se que sem redução das desigualdades sociais, sem a erradicação da pobreza e a melhoria do modo de vida, o setor saúde será o estuário de todas as mazelas das más políticas sociais e econômicas. E sem essa garantia de mudança dos fatores condicionantes e determinantes não se estará garantido o direito à saúde, em sua abrangência constitucional.

            Por isso o direito à saúde, nos termos do art. 196 da CF pressupõe a adoção de políticas sociais e econômicas que visem: a) à redução do risco de doenças e outros agravos; e b) ao acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde para a sua promoção, proteção e recuperação. [07]

            Entretanto, a amplitude da dicção do art. 196 e essa nova forma de conceituar saúde nos leva a refletir sobre qual será o campo de atuação do Sistema Único de Saúde, como setor da Administração Pública, na prestação de serviços que garantam a redução do risco de doença e de outros agravos e o acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

            O primeiro enunciado do artigo – execução de políticas sociais e econômicas protetivas da saúde [08] – vincula-se a planos e programas do Estado Federal (norma programática) que devem assegurar ao indivíduo e à coletividade tudo aquilo que possa ser considerado essencial para a satisfação da saúde física, mental, psicológica, moral e social: --morar bem, ter salário digno, ter mais lazer, boa educação, alimentação suficiente, segurança, previdência etc.

            Nesse ponto, a fluidez dessa determinação constitucional exige demarcação, tendo em vista a sua vastidão, subjetividade e correlação com uma infinidade de outras áreas de prestação de serviços públicos, para que possamos, no interior da Administração Pública, delimitar o campo de atuação do Sistema Único de Saúde, definido constitucionalmente (art. 198 da CF) como o conjunto de ações e serviços públicos, organizados em rede regionalizada e hierarquizada, de execução das três esferas do governo [09].

            O direito à saúde -- como serviço público colocado à disposição da coletividade pelo SUS, – não pode pretender garantir ao indivíduo a melhoria de sua renda, de sua moradia, de sua alimentação, educação, sob o argumento de que a Constituição assevera que o direito à saúde deve ser efetivado mediante a adoção de políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de adoecer. Esses fatores são determinantes para o bem estar físico, mental e social do cidadão, mas não estão a cargo do setor saúde.

            Afirmamos em obra anterior [10] que o "direito à saúde assim considerado permitiria, por exemplo, que pessoas sujeitas ao estresse, a síndromes urbanas, à ansiedade, à predisposição genética para certas doenças pudessem acionar o Estado exigindo um trabalho menos estressante, uma cidade sem medos, meio urbano silencioso e solidário, e toda a sorte de exames e cuidados para a prevenção de doenças de herança genética", sob a invocação do direito à saúde, onerando o Sistema Único de Saúde.

            Desse modo, entendemos que para a melhor compreensão do disposto no art. 196 é preciso desdobrá-lo em duas partes, como mencionado acima:

            a) a primeira de linguagem mais difusa que corresponde a programas sociais e econômicos que visem à redução coletiva de doenças e seus agravos, com melhoria da qualidade de vida do cidadão. Esta primeira parte diz respeito muito mais à qualidade de vida, numa demonstração de que saúde tem conceito amplo que abrange o bem estar individual, social, afetivo, psicológico, familiar etc. e não apenas a prestação de serviços assistenciais; e

            b) a segunda parte, de dicção mais objetiva, obriga o Estado a manter, na forma do disposto nos arts. 198 e 200 da Constituição e na Lei n. 8.080/90, ações e serviços públicos de saúde que possam promover a saúde e prevenir, de modo mais direto, mediante uma rede de serviços regionalizados e hierarquizados, os riscos de adoecer (assistência preventiva) e recuperar o indivíduo das doenças que o acometem (assistência curativa).

            Vê-se, pois, a dificuldade da delimitação do termo "saúde" quando adentramos nos campos: a) da prestação de serviços públicos de saúde a serem realizados pelos órgãos e entidades que compõem o SUS; b) do financiamento da saúde; e c) das condições sociais e econômicas que interferem com a saúde.


O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE

            Pela dicção dos arts. 196 e 198 da CF, podemos afirmar que somente da segunda parte do art. 196 se ocupa o Sistema Único de Saúde, de forma mais concreta e direta, sob pena de a saúde, como setor, como uma área da Administração Pública, se ver obrigada a cuidar de tudo aquilo que possa ser considerado como fatores que condicionam e interferem com a saúde individual e coletiva. Isso seria um arrematado absurdo e deveríamos ter um super Ministério e super Secretarias da Saúde responsáveis por toda política social e econômica protetivas da saude.

            Se a Constituição tratou a saúde sob grande amplitude, isso não significa dizer que tudo o que está ali inserido corresponde a área de atuação do Sistema Único de Saúde.

            Repassando, brevemente, aquela seção do capítulo da Seguridade Social, temos que: -- o art. 196, de maneira ampla, cuida do direito à saúde; -- o art. 197 trata da relevância pública das ações e serviços de saúde, públicos e privados, conferindo ao Estado o direito e o dever de regulamentar, fiscalizar e controlar o setor (público e privado); -- o art. 198 dispõe sobre as ações e os serviços públicos de saúde que devem ser garantidos a todos cidadãos para a sua promoção, proteção e recuperação, ou seja, dispõe sobre o Sistema Único de Saúde; -- o art. 199, trata da liberdade da iniciativa privada, suas restrições (não pode explorar o sangue, por ser bem fora do comércio; deve submeter-se à lei quanto à remoção de órgãos e tecidos e partes do corpo humano; não pode contar com a participação do capital estrangeiro na saúde privada; não pode receber auxílios e subvenções, se for entidade de fins econômicos etc.) e a possibilidade de o setor participar, complementarmente, do setor público; -- e o art. 200, das atribuições dos órgãos e entidades que compõem o sistema público de saúde. O SUS é mencionado somente nos arts. 198 e 200.

            A leitura do art. 198 deve sempre ser feita em consonância com a segunda parte do art. 196 e com o art. 200. O art. 198 estatui que todas as ações e serviços públicos de saúde constituem um único sistema. Aqui temos o SUS. E esse sistema tem como atribuição garantir ao cidadão o acesso às ações e serviços públicos de saúde (segunda parte do art. 196), conforme campo demarcado pelo art. 200 e leis específicas.

            O art. 200 define em que campo deve o SUS atuar. As atribuições ali relacionadas não são taxativas ou exaustivas. Outras poderão existir, na forma da lei. E as atribuições ali elencadas dependem, também, de lei para a sua exeqüibilidade.


DOS OBJETIVOS E ATRIBUIÇÕES DO SUS

            Em 1990, foi editada a Lei n. 8.080/90 que, em seus arts. 5º e 6º [11], cuidou dos objetivos e das atribuições do SUS, tentando melhor explicitar o art. 200 da CF (ainda que, em alguns casos, tenha repetido os incisos daquele artigo, tão somente).

            São objetivos do SUS: a) a identificação e divulgação dos fatores condicionantes e determinantes da saúde; b) a formulação de políticas de saúde destinadas a promover, nos campos econômico e social, a redução de riscos de doenças e outros agravos; e c) execução de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, integrando as ações assistenciais com as preventivas, de modo a garantir às pessoas a assistência integral à sua saúde.

            O art. 6º, estabelece como competência do Sistema a execução de ações e serviços de saúde descritos em seus 11 incisos.

            O SUS deve atuar em campo demarcado pela lei, em razão do disposto no art. 200 da CF e porque o enunciado constitucional de que saúde é direito de todos e dever do Estado, não tem o condão de abranger as condicionantes econômico-sociais da saúde, tampouco compreender, de forma ampla e irrestrita, todas as possíveis e imagináveis ações e serviços de saúde, até mesmo porque haverá sempre um limite orçamentário e um ilimitado avanço tecnológico a criar necessidades infindáveis e até mesmo questionáveis sob o ponto de vista ético, clínico, familiar, terapêutico, psicológico.

            Será a lei que deverá impor as proporções, sem, contudo, é obvio, cercear o direito à promoção, proteção e recuperação da saúde. E aqui o elemento delimitador da lei deverá ser o da dignidade humana.

            Lembramos, por oportuno que, o Projeto de Lei Complementar n. 01/2003 -- que se encontra no Congresso Nacional para regulamentar os critérios de rateio de transferências dos recursos da União para Estados e Municípios – busca disciplinar, de forma mais clara e definitiva, o que são ações e serviços de saúde e estabelecer o que pode e o que não pode ser financiado com recursos dos fundos de saúde. Esses parâmetros também servirão para circunscrever o que deve ser colocado à disposição da população, no âmbito do SUS, ainda que o art. 200 da CF e o art. 6º da LOS tenham definido o campo de atuação do SUS, fazendo pressupor o que são ações e serviços públicos de saúde, conforme dissemos acima. (O Conselho Nacional de Saúde e o Ministério da Saúde [12] também disciplinaram o que são ações e serviços de saúde em resoluções e portarias).


O QUE FINANCIAR COM OS RECURSOS DA SAÚDE?

            De plano, excetuam-se da área da saúde, para efeito de financiamento, (ainda que absolutamente relevantes como indicadores epidemiológicos da saúde) as condicionantes econômico-sociais. Os órgãos e entidades do SUS devem conhecer e informar à sociedade e ao governo os fatos que interferem na saúde da população com vistas à adoção de políticas públicas, sem, contudo, estarem obrigados a utilizar recursos do fundo de saúde para intervir nessas causas.

            Quem tem o dever de adotar políticas sociais e econômicas que visem evitar o risco da doença é o Governo como um todo (políticas de governo), e não a saúde, como setor (políticas setoriais). A ela, saúde, compete atuar nos campos demarcados pelos art. 200 da CF e art. 6º da Lei n. 8.080/90 e em outras leis específicas.

            Como exemplo, podemos citar os servidores da saúde que devem ser pagos com recursos da saúde, mas o seu inativo, não; não porque os inativos devem ser pagos com recursos da Previdência Social. Idem quanto as ações da assistência social, como bolsa-alimentação, bolsa-família, vale-gás, renda mínima, fome zero, que devem ser financiadas com recursos da assistência social, setor ao qual incumbe promover e prover as necessidades das pessoas carentes visando diminuir as desigualdades sociais e suprir suas carências básicas imediatas. Isso tudo interfere com a saúde, mas não pode ser administrada nem financiada pelo setor saúde.

            O saneamento básico é outro bom exemplo. A Lei n. 8.080/90, em seu art. 6º, II, dispõe que o SUS deve participar na formulação da política e na execução de ações de saneamento básico. Por sua vez, o § 3º do art. 32, reza que as ações de saneamento básico que venham a ser executadas supletivamente pelo SUS serão financiadas por recursos tarifários específicos e outros da União, Estados, DF e Municípios e não com os recursos dos fundos de saúde.

            Nesse ponto gostaríamos de abrir um parêntese para comentar o Parecer do Sr. Procurador Geral da República, na ADIn n. 3087-6/600-RJ, aqui mencionado.

            O Governo do Estado do Rio de Janeiro, pela Lei n. 4.179/03, instituiu o Programa Estadual de Acesso à Alimentação – PEAA, determinando que suas atividades correrão à conta do orçamento do Fundo Estadual da Saúde [13], vinculado à Secretaria de Estado da Saúde. O PSDB, entendendo ser a lei inconstitucional por utilizar recursos da saúde para uma ação que não é de responsabilidade da área da saúde, moveu ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de cautelar.

            O Sr. Procurador da República (Parecer n. 5147/CF), opinou pela improcedência da ação por entender que o acesso à alimentação é indissociável do acesso à saúde, assim como os medicamentos o são e que as pessoas de baixa renda devem ter atendidas a necessidade básica de alimentar-se.

            Infelizmente, mais uma vez confundiu-se "saúde" com "assistência social", áreas da Seguridade Social, mas distintas entre si. A alimentação é um fator que condiciona a saúde tanto quanto o saneamento básico, o meio ambiente degradado, a falta de renda e lazer, a falta de moradia, dentre tantos outros fatores condicionantes e determinantes, tal qual mencionado no art. 3º da Lei n. 8.080/90 [14].

            A Lei n. 8.080/90 ao dispor sobre o campo de atuação do SUS incluiu a vigilância nutricional e a orientação alimentar [15], atividades complexas que não tem a ver com o fornecimento, puro e simples, de bolsa-alimentação, vale-alimentação ou qualquer outra forma de garantia de mínimos existenciais e sociais, de atribuição da assistência social ou de outras áreas da Administração Pública voltadas para corrigir as desigualdades sociais. A vigilância nutricional deve ser realizada pelo SUS em articulação com outros órgãos e setores governamentais em razão de sua interface com a saúde. São atividades que interessam a saúde, mas as quais, a saúde como setor, não as executa. Por isso a necessidade das comissões intersetoriais previstas na Lei n. 8.080/90.

            A própria Lei n. 10.683/2003, que organiza a Presidência da República, estatuiu em seu art. 27, XX ser atribuição do Ministério da Saúde: a) política nacional de saúde; b) coordenação e fiscalização do Sistema Único de Saúde; c) saúde ambiental e ações de promoção, proteção e recuperação da saúde individual e coletiva, inclusive a dos trabalhadores e dos índios; d) informações em saúde; e) insumos críticos para a saúde; f) ação preventiva em geral, vigilância e controle sanitário de fronteiras e de portos marítimos, fluviais e aéreos; g) vigilância em saúde, especialmente quanto às drogas, medicamentos e alimentos; h) pesquisa científica e tecnológica na área da saúde. Ao Ministério da Saúde compete a vigilância sobre alimentos (registro, fiscalização, controle de qualidade) e não a prestação de serviços que visem fornecer alimentos às pessoas de baixa renda.

            O fornecimento de cesta básica, merenda escolar, alimentação a crianças em idade escolar, idosos, trabalhadores rurais temporários, portadores de moléstias graves, conforme previsto na Lei do Estado do Rio de Janeiro, são situações de carência que necessitam de apoio do Poder Público, sem sombra de dúvida, mas no âmbito da assistência social [16] ou de outro setor da Administração Pública e com recursos que não os do fundo de saúde. Não podemos mais confundir assistência social com saúde. A alimentação interessa à saúde, mas não está em seu âmbito de atuação.

            Tanto isso é fato que a Lei n. 8.080/90, em seu art. 12, estabeleceu que "serão criadas comissões intersetoriais de âmbito nacional, subordinadas ao Conselho Nacional de Saúde, integradas pelos Ministérios e órgãos competentes e por entidades representativas da sociedade civil", dispondo seu parágrafo único que "as comissões intersetoriais terão a finalidade de articular políticas e programas de interesse para a saúde, cuja execução envolva áreas não compreendidas no âmbito do Sistema Único de Saúde". Já o seu art. 13, destaca, algumas dessas atividades, mencionando em seu inciso I a "alimentação e nutrição".

            O parâmetro para o financiamento da saúde deve ser as atribuições que foram dadas ao SUS pela Constituição e por leis específicas e não a 1º parte do art. 196 da CF, uma vez que os fatores que condicionam a saúde são os mais variados e estão inseridos nas mais diversas áreas da Administração Pública, não podendo ser considerados como competência dos órgãos e entidades que compõe o Sistema Único de Saúde.


DA INTEGRALIDADE DA ASSISTÊNCIA

            Vencida esta etapa, adentramos em outra, no interior do setor saúde - SUS, que trata da integralidade da assistência à saúde. O art. 198 da CF determina que o Sistema Único de Saúde deve ser organizado de acordo com três diretrizes, dentre elas, o atendimento integral que pressupõe a junção das atividades preventivas, que devem ser priorizadas, com as atividades assistenciais, que também não podem ser prejudicadas.

            A Lei n. 8.080/90, em seu art. 7º (que dispõe sobre os princípios e diretrizes do SUS), define a integralidade da assistência como "o conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema".

            A integralidade da assistência exige que os serviços de saúde sejam organizados de forma a garantir ao indivíduo e à coletividade a proteção, a promoção e a recuperação da saúde, de acordo com as necessidades de cada um em todos os níveis de complexidade do sistema.

            Vê-se, pois, que a assistência integral não se esgota nem se completa num único nível de complexidade técnica do sistema, necessitando, em grande parte, da combinação ou conjugação de serviços diferenciados, que nem sempre estão à disposição do cidadão no seu município de origem. Por isso a lei sabiamente definiu a integralidade da assistência como a satisfação de necessidades individuais e coletivas que devem ser realizadas nos mais diversos patamares de complexidade dos serviços de saúde, articulados pelos entes federativos, responsáveis pela saúde da população.

            A integralidade da assistência é interdependente; ela não se completa nos serviços de saúde de um só ente da federação. Ela só finaliza, muitas vezes, depois de o cidadão percorrer o caminho traçado pela rede de serviços de saúde, em razão da complexidade da assistência [17].

            E para a delimitação das responsabilidades de cada ente da federação quanto ao seu comprometimento com a integralidade da assistência, foram criados instrumentos de gestão, como o plano de saúde e as formas de gestão dos serviços de saúde.

            Desse modo, devemos centrar nossas atenções no plano de saúde, por ser ele a base de todas as atividades e programações da saúde, em cada nível de governo do Sistema Único de Saúde, o qual deverá ser elaborado de acordo com diretrizes legais estabelecidas na Lei n. 8.080/90: epidemiologia e organização de serviços (arts. 7º VII e 37) [18]. O plano de saúde deve ser a referência para a demarcação de responsabilidades técnicas, administrativas e jurídicas dos entes políticos.

            Sem planos de saúde -- elaborados de acordo com as diretrizes legais, associadas àquelas estabelecidas nas comissões intergovernamentais trilaterais [19], principalmente no que se refere à divisão de responsabilidades -- o sistema ficará ao sabor de ideologias e decisões unilaterais das autoridades dirigentes da saúde, quando a regra que perpassa todo o sistema é a da cooperação e da conjugação de recursos financeiros, tecnológicos, materiais, humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, em redes regionalizadas de serviços, nos termos dos incisos IX, b e XI do art. 7º e art. 8º da Lei n. 8.080/90.

            Por isso, o plano de saúde deve ser o instrumento de fixação de responsabilidades técnicas, administrativas e jurídicas quanto à integralidade da assistência, uma vez que ela não se esgota, na maioria das vezes, na instância de governo-sede do cidadão. Ressalte-se, ainda, que o plano de saúde é a expressão viva dos interesses da população, uma vez que, elaborado pelos órgãos competentes governamentais, deve ser submetido ao conselho de saúde, representante da comunidade no SUS, a quem compete, discutir, aprovar e acompanhar a sua execução, em todos os seus aspectos.

            Lembramos, ainda, que o planejamento sendo ascendente, iniciando-se da base local até a federal, reforça o sentido de que a integralidade da assistência só se completa com o conjunto articulado de serviços, de responsabilidade dos diversos entes governamentais.

            Resumindo, podemos afirmar que, nos termos do art. 198, II, da CF, c/c os arts. 7º, II e VII, 36 e 37, da Lei n. 8.080/90, a integralidade da assistência não é um direito a ser satisfeito de maneira aleatória, conforme exigências individuais do cidadão ou de acordo com a vontade do dirigente da saúde, mas sim o resultado do plano de saúde que, por sua vez, deve ser a conseqüência de um planejamento que leve em conta a epidemiologia e a organização de serviços e conjugue as necessidades da saúde com as disponibilidades de recursos [20], além da necessária observação do que ficou decidido nas comissões intergovernamentais trilaterais ou bilaterais, que não contrariem a lei.

            Na realidade, cada ente político deve ser eticamente responsável pela saúde integral da pessoa que está sob atenção em seus serviços, cabendo-lhe responder civil, penal e administrativamente apenas pela omissão ou má execução dos serviços que estão sob seu encargo no seu plano de saúde que, por sua vez, deve guardar consonância com os pactos da regionalização, consubstanciados em instrumentos jurídicos competentes [21].

            Nesse ponto, temos ainda a considerar que, dentre as atribuições do SUS, uma das mais importantes -- objeto de reclamações e ações judiciais -- é a assistência terapêutica integral. Por sua individualização, imediatismo, apelo emocional e ético, urgência e emergência, a assistência terapêutica destaca-se dentre todas as demais atividades da saúde como a de maior reivindicação individual. Falemos dela no tópico seguinte.


DA INTEGRALIDADE DA ASSISTÊNCIA TERAPÊUTICA

            A assistência terapêutica integral compreende o conjunto de ações e serviços que visam ao tratamento das doenças e agravos à saúde, subseqüentes ao procedimento diagnóstico, destinadas a garantir ao indivíduo a proteção do seu potencial biológico e psicossocial e a recuperação de sua saúde.

            O cidadão tem o direito de obter do serviço público de saúde, após o diagnóstico, a atenção terapêutica individualizada, de acordo com as suas necessidades. Para cada caso, segundo as suas exigências, e em todos os níveis de complexidade dos serviços. Entretanto, esse direito deve pautar-se por alguns pré-requisitos, dentre eles, o de o cidadão, livremente, ter decidido pelo sistema público de saúde e acatar os seus regramentos técnicos e administrativos.

            O direito à integralidade da assistência terapêutica não pode ser aleatório e ficar sob a mais total independência reivindicatória do cidadão e da liberdade dos profissionais de saúde indicarem procedimentos, exames, tecnologias não incorporadas no sistema, devendo a conduta profissional pautar-se por protocolos, regulamentos técnicos e outros parâmetros técnico-científico-biológico [22]. E esses documentos, orientadores do sistema, devem ser elaborados de forma a serem capazes de conjugar tecnologia, recursos financeiros e as reais necessidades terapêuticas, sem acrescentar o que possa ser considerado supérfluo ou desnecessário ou retirar o essencial ou relevante.

            Gilson Carvalho, em palestra proferida no Ministério da Saúde, em junho/2005, declarou que a integralidade sonhada e inscrita na lei e na Constituição pressupunha, para os ideólogos da Reforma Sanitária:

            - "a integralidade incluindo promoção, proteção e recuperação da saúde;

            - a integralid

            10.O plano de saúde deve ser o instrumento balizador das responsabilidades públicas de cada ente governamental, sendo a expressão viva da participação da comunidade na formulação da melhor política de saúde para aquela população.


Referência Bibliográfica:

            Berlinguer, Giovanni – Medicina e Saúde, Editora Hucitec.

            Santos & Carvalho – Comentários à Lei Orgânica da Saúde – Editora Unicamp – 3ª edição, ano 2002.

            Carvalho, Gilson – Conferência proferida no Ministério da Saúde, em junho de 2005, intitulada "O financiamento da saúde".

            Drumont, José Paulo – MBE – Novo Paradigma Assistencial e Pedagógico – Editora Atheneu.

            Roudinesco, Elizabeth - A saúde totalitária – Folha de S.Paulo, 23.1.2005.

            Nascimento, Miguel Castro Tupinambá – A nova ordem social e a nova Constituição – Editora Aide.

            Silva, Plácido – Vocabulário Jurídico, Editora Forense – 18ª. Edição.


Notas

            01 Ação Direta de Inconstitucionalidade movida pelo PSDB contra a Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro e Governador do Estado do Rio de Janeiro, em razão da edição da Lei Estadual n. 4.179/03, que incluiu nos gastos com saúde o Programa Estadual de Acesso à Alimentação.

            02 Art. 2º, § 2º, da Lei n. 8.080/90 – "O dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade". O direito à saúde obriga a todos, indistintamente, por envolver questões de cunho coletivo e direitos difusos. Ninguém tem o direito de prejudicar a saúde de outrem.

            03 O Estado passou a se preocupar com saúde quando percebeu o perigo social de doenças transmissíveis, contagiosas que poderiam devastar populações inteiras; daí a preocupação anterior com a prevenção e tratamento de doenças contagiosas como a cólera, a hanseníese, a tuberculose e com outros cuidados que competiam à polícia sanitária.

            04 Saúde e Meio Ambiente – Intersetorialidade – OPAS/2004.

            05 Giovanne Berlinguer - Medicina e Política, Editora Hucitec, 3a. ed.

            06 Giovane Berlinguer, op. cit.

            07 Os mais diversos ministérios se incumbem de ações e serviços que dizem respeito à saúde quando conceituada com a amplitude do disposto no art. 196: meio ambiente, cidades, desenvolvimento regional, minas e energia, educação etc.

            08 O art. 3º da Lei n. 8.080/90 estatui que a saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais; os níveis de saúde da população expressam a organização social e econômica do País.

            09 A intersetorialidade na saúde é tão relevante que a Lei n. 8.080/90 em seu art. 12 determinou fossem criadas comissões intersetoriais, de âmbito nacional, subordinadas ao Conselho Nacional de Saúde, com a finalidade de articular projetos e programas de interesse para a saúde.

            10 Comentários à Lei Orgânica da Saúde, Editora da Unicamp, 2002, 3ª. Edição.

            11 Não vamos adentrar aqui na confusa redação desses artigos, em especial do "caput" do art. 6º, mas apenas consignar a má técnica legislativa que acaba por dificultar a hermenêutica.

            12 Resolução CNS n. 322/2003 e Portaria MS n. 2.047, de 5.11.2002.

            13 Alias, essa questão do que são ações e serviços de saúde ganhou duas posições extremas, com a quais não estamos de acordo. O TCU, em 2000, emitiu o Parecer 600, manifestando entendimento diametralmente oposto ao exarado pelo Sr. Procurador da República. O TCU veda a aplicação de recursos da saúde pelos Estados e Municípios em atividade-meio (cursos, combustível para ambulância, computador, recursos humanos etc.), só admitindo sejam os recursos das transferências obrigatórias da União para Estados e Municípios aplicados em serviços de saúde considerados como atividade-fim (ex.: cirurgia, medicamento, equipamento médico etc.). De um lado, tudo o que condiciona a saúde deve ser financiado com os recursos da saúde; de outro, somente aquilo que é objeto fim da atividade da saúde pode ser financiado com recurso dos fundos de saúde. As duas posições são extremadas.

            14 " Art. 3º. A saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais; os níveis de saúde da população expressam a organização social e econômica do País".

            15 Portaria MS 710/1999 – Dispõe sobre a Segurança Alimentar

            A presente Política Nacional de Alimentação e Nutrição integra a Política Nacional de Saúde, inserindo-se, ao mesmo tempo, no contexto da Segurança Alimentar e Nutricional. Dessa forma dimensionada – e compondo, portanto, o conjunto das políticas de governo voltadas à concretização do direito humano universal à alimentação e nutrição adequadas – esta Política tem como propósito a garantia da qualidade dos alimentos colocados para consumo no País, a promoção de práticas alimentares saudáveis e a prevenção e o controle dos distúrbios nutricionais, bem como o estímulo às ações intersetoriais que propiciem o acesso universal aos alimentos.

            3. DIRETRIZES

            Para o alcance do propósito desta Política Nacional de Alimentação e Nutrição, são definidas como diretrizes:

            estímulo às ações intersetoriais com vistas ao acesso universal aos alimentos; garantia da segurança e da qualidade dos alimentos e da prestação de serviços neste contexto; monitoramento da situação alimentar e nutricional; promoção de práticas alimentares e estilos de vida saudáveis; prevenção e controle dos distúrbios nutricionais e de doenças associadas à alimentação e nutrição; promoção do desenvolvimento de linhas de investigação; e desenvolvimento e capacitação de recursos humanos.

            3.1. Estímulo às ações intersetoriais com vistas ao acesso universal aos alimentos

            Na condição de detentor dos dados epidemiológicos relativos aos aspectos favoráveis e desfavoráveis da alimentação e nutrição, em âmbito nacional, o setor Saúde deverá promover ampla articulação com outros setores governamentais, a sociedade civil e o setor produtivo, cuja atuação esteja relacionada a determinantes que interferem no acesso universal aos alimentos de boa qualidade.

            16 Lembramos, ainda, que a saúde é de acesso universal, sem condicionantes para o seu exercício (art. 196 da CF) e que a assistência social protege as pessoas mais necessitadas, pobres, carentes (art. 203 da CF), garantindo-lhes dignidade e mínimos sociais e existenciais; a previdência social tem por fim assegurar aos trabalhadores filiados ao Regime Geral de Previdência Social benefícios previdenciários. As três áreas compõem a Seguridade Social, mas são distintas, inclusive quanto ao seu financiamento e objeto.

            17 Um município pode responsabilizar-se, exclusivamente, em razão de suas características epidemiológicas, populacional e de organização administrativa, pelos serviços denominados de atenção básica; outros poderão obrigar-se a responder pela atenção assistencial de média e alta complexidade e assim por diante.

            18 Nos termos do art. 37 da Lei 8.080/90, o Conselho Nacional de Saúde, em função das características epidemiológicas e da organização de serviços, deve estabelecer diretrizes a serem observadas na elaboração dos planos de saúde.

            19 Essas comissões no SUS tem sido denominadas, por portarias do Ministério da Saúde, de Comissões Intergestores Tripartites, quando tecnicamente, o mais correto seria comissões intergovernamentais trilaterais ou bilaterais, por se tratar de acordos entre entes políticos autônomos.

            20 Observar o disposto na EC 29/2000 que vincula percentuais de receitas públicas para a saúde, lembrando que esses percentuais são pisos e não tetos dos gasto com saúde.

            21 Desde o advento da Lei Orgânica da Saúde, não houve regulamentação de diversos de seus dispositivos que pudessem organizar o sistema público de saúde e explicitar a integralidade da assistência, a integralidade da assistência terapêutica, a assistência farmacêutica, os critérios de rateio dos recursos da saúde, e em especial, as regras gerais da regionalização etc., ensejando, assim, a exaustiva e prolixa emissão de portarias ministeriais invasoras, na maioria das vezes, da competência estadual para editar legislação suplementar, na área da saúde; por outro lado, os estados também se omitiram na edição de normas organizadoras do sistema estadual, principalmente sobre a regionalização, permitindo que, na lacuna, as portarias ministeriais passassem a ocupar o campo da regulamentação estadual.

            22 Os profissionais de saúde podem indicar uma terapêutica não protocolizada, desde que apresente a necessária justificativa técnica, científica, biológica, a qual deverá ser analisada, prontamente, por câmaras técnicas específicas.

            23 "Medicina Baseada em Evidências - inicio Canadá - década de 80 -- Universidade McMaster - constitui-se em: a) levantamento do problema e formulação da questão; b) pesquisa da literatura correspondente; c) avaliação e interpretação dos trabalhos coletados mediante critérios bem definidos; d) utilização das evidências encontradas, em termos assistenciais, de ensino ou elaboração científica". - José Paulo Drumont in "MBE - Novo paradigma assistencial e pedagógico - ed. Atheneu

            24 Frase cunhada pelo seu autor Gilson Carvalho: Complexo Industrial, Comercial e Midiático de Saúde (CICMS).

            25 O aparato tecnológico – que se interliga com o capitalismo e a necessidade de consumo – tem cerceado o direito de se morrer em paz. Incutiu-se na mente e corações das pessoas que sempre há uma intervenção médica ou hospitalar que poderá impedir ou retardar a morte, ainda que sem a menor qualidade de vida e a um preço moral elevado, além de custos estratosféricos.

            26A Lei Complementar Paulista n. 791/95 (Código de Saúde) introduz a eqüidade como forma de suprir as deficiências do tratamento igualitário de casos e situações, inserindo-a dentre as diretrizes e bases do SUS.

            27 "A saúde totalitária" -- artigo publicado na Folha de S.Paulo, em 23.1.2005.

            28 Lembrar sempre dos valores mínimos preconizados na EC 29/2000 e não admitir, jamais que esse mínimo seja descumprido.

            29 Tupinambá Miguel Castro do Nascimento, A Ordem Social e a Nova Constituição, Ed. Aide.

            30 Em termos gerais, conceitua-se subvenção como uma ajuda pecuniária dada a pessoa física ou jurídica para sua proteção. Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico, 18ª ed., Editora Forense, leciona que "Juridicamente, a subvenção não tem o caráter nem de paga nem de compensação. É mera contribuição pecuniária destinada a auxilio ou favor de uma pessoa, ou de uma instituição para que se mantenha ou para que execute os serviços ou obras pertinentes a seu objeto. Ao Estado, em regra, cabe o dever de subvencionar instituições que realizem serviços, ou obras de interesse público, o qual, para isso, dispõe em leis especiais as normas que devem ser atendidas para a concessão, ou obtenção, de semelhantes auxílios, geralmente anuais".

            31 § 2º, do art. 199 da CF: "É vedada a destinação de recursos públicos para auxílios e subvenções às instituições privadas com fins lucrativos".

            32 O Projeto de Lei n. 5.235/2005 é inconstitucional. Esse projeto de lei, encaminhado pelo Executivo ao Congresso Nacional, em regime de urgência, fere o § 2º do art. 199 da CF.

            33 De todo modo, acreditamos que a vedação imposta pela Constituição não impede outras formas de apoio econômico na área da saúde. Poderão existir outros, que não o auxilio e a subvenção, como forma de incentivo ao incremento da produção de determinados serviços e bens, como exemplo, o financiamento público para a produção de produtos e bens considerados como de interesse para a saúde. Outras formas não estão proibidas, tanto que a Lei n. 8.080/90, em seu art. 46, dispõe que o SUS estabelecerá mecanismos de incentivos à participação do setor privado no investimento em ciência e tecnologia. O que está vedado expressamente pela Constituição são os auxílios e as subvenções.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Lenir. Saúde: conceito e atribuições do Sistema Único de Saúde. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 821, 2 out. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7378. Acesso em: 28 mar. 2024.