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Monitória efetiva ou cobrança especial?

Uma proposta para que o processo monitório atinja seus objetivos

Monitória efetiva ou cobrança especial? Uma proposta para que o processo monitório atinja seus objetivos

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SUMÁRIO: 1. Introdução – 2. A intenção legislativa com a previsão da "Ação" Monitória – 2.1. Monitória: Ação, Processo, Procedimento ou Tutela? – 3. Diferenças básicas entre cobrança, monitória e execução – 3.1. Entroncamento entre cobrança e monitória – 4. Embargos Monitórios: ônus processual ou mera opção? – 4.1. Natureza jurídica dos embargos monitórios – 4.2. Natureza jurídica da decisão que julga os embargos monitórios e o recurso cabível – 5. Da matéria alegável nos embargos à execução do mandado monitório convertido em sentença judicial – 6. Conclusão.


1. INTRODUÇÃO

            A lei, [01] em nosso sistema, é fonte principal de direito [02]; vincula a todos e ninguém pode descumpri-la sob a alegação de desconhecê-la. Mas, mesmo assim, é comum ouvir-se que determinadas leis no Brasil "não pegam", como se fosse algo "opcional". Não existe lei que "não pega", mas sim projetos legislativos mal elaborados, transformados em lei de forma equivocada, cuja aplicação é desvirtuada ou que não possui os meios de coação adequados ao resultado. Muitos concentram suas críticas, justificando a duração exagerada do processo unicamente à lei, esquecendo-se que não raramente a interpretação dessa pela doutrina e, principalmente, pela jurisprudência tem o condão de aniquilar uma boa lei e a tentativa de dar maior efetividade à jurisdição.

            Mais de 08 (oito) anos após a promulgação da Lei 9.079 de 14 de julho de 1995, a qual introduziu a "Ação" [03] Monitória no nosso ordenamento, apesar da exultante satisfação inicial dos responsáveis pelo projeto de adoção da Monitória no Processo Civil brasileiro, os resultados práticos mostraram-se pífios, muito aquém do esperado, por diversas razões, sendo opinião comum a de que a monitória no Brasil "não pegou".

            Exatamente por isso, pretendemos apresentar uma nova ótica de interpretação do processo monitório, sem que, nem mesmo, seja necessária qualquer forma de mudança legislativa, bastando mera adequação procedimental [04], como modo de devolver o processo monitório ao Processo Civil pátrio nos moldes em que foi concebido, como um processo célere e efetivo, a favor de credores com um "quase" título executivo, algo que realmente se situe entre um pedido de cobrança pelo procedimento comum ordinário e a execução direta.


2.A INTENÇÃO LEGISLATIVA COM A PREVISÃO DA "AÇÃO" MONITÓRIA

            A crise do processo civil, cuja duração ultrapassa em muito o tempo mínimo necessário para a satisfação do direito reclamado em juízo, impõe ao legislador imprimir constantes reformas no Código de Processo Civil, assim como introduzir, modificar e adequar procedimentos.

            O processo executivo é bastante insatisfatório e o processo comum ordinário de cobrança ainda pior, pois obriga o credor a suportar a morosidade e um longo período até a obtenção do título executivo judicial e, após, ainda ter que enfrentar um processo de execução também lento. Como via de meio entre os dois processos, o legislador introduziu em nosso ordenamento, por meio da Lei nº 9.079/95, a chamada "Ação" Monitória, [05] com o fito claro de permitir àqueles com um "quase" título executivo extrajudicial obter uma célere realização de seu direito. [06]

            Diz-se "quase título" pelo fato de que o processo monitório adotado no Brasil, artigo 1.102a, foi o "documental", [07] reservado a quem possui prova escrita para exigir pagamento em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel, sem eficácia, porém, de título executivo, ao invés do "puro", [08] no qual basta a afirmação do autor em juízo da existência do crédito para a expedição da ordem pelo juiz. Além dessa diferença comprobatória, importa desde já ressaltar que esses dois sistemas se diferenciam também pela conseqüência que a apresentação de embargos pelo devedor acarreta, uma vez que no "documental" haverá somente a suspensão da ordem de pagamento ou entrega, enquanto no "puro" se torna ineficaz o mandado monitório, seguindo-se amplo contraditório e sentença.

            Para a conclusão a que se chegará neste capítulo, alguns aspectos são de vital importância. Dentre esses pontos de relevo, destacamos inicialmente a adoção do sistema monitório documental e a clara previsão contida no caput do artigo 1.102c, no sentido de que a apresentação de embargos "suspende a eficácia do mandado inicial".

            Um segundo aspecto conclusivo é a interessante regra contida no parágrafo 1º do artigo 1.102c que, associando a grande probabilidade do direito afirmado pelo autor com a expedição do mandado monitório mediante decisão fundamentada do juiz, estatuiu, numa clara tentativa de compor as partes, a isenção do devedor que cumpre o mandado no prazo de quinze dias legalmente fixado, desonerando-o de custas e honorários advocatícios, tal como se tivesse cumprido a obrigação extrajudicialmente Essa situação é vantajosa para ambas as partes, pois desonera o devedor ao mesmo tempo que concede ao credor a brevidade na solução da pendência, apesar do encargo judicial.

            Não se pode olvidar que, nos primeiros meses de vigência da lei, os devedores, como prática comum, valeram-se desse benefício legal sempre que não possuíam razões mínimas para opor embargos; todavia, passado o tempo, com as primeiras decisões recebendo o recurso que julga os embargos monitórios no efeito suspensivo, tornou-se raro o aproveitamento desta isenção, porquanto é mais vantajosa a demora do recurso. [09]

            Como terceiro ponto sintomático, destacamos a intenção do legislador em deixar claro ser o processo monitório diverso do processo de execução, tanto que no artigo 1.102c, parágrafo 2º, previu que a apresentação dos embargos pelo devedor independem de segurança do juízo e são processados nos mesmos autos. Na intenção de ser ainda mais claro – talvez o grande "pecado" legislativo - acrescentou-se no referido parágrafo, ao fim, a expressão "pelo procedimento ordinário". [10] Adiantamos, desde já, que entendemos que o legislador quis tão-somente deixar claro a forma pela qual se processariam os embargos, não como muitos supõem, transformar o processo monitório em um pedido de cobrança pelo procedimento comum ordinário a partir daí. [11]

            Ora, o que pretendeu o legislador foi explicar que estes embargos monitórios eram diferentes dos embargos à execução, tanto que determinou o processamento nos mesmos autos e independente de segurança do juízo, razão pela qual quis deixar claro que a parte instrutória e de processamento seria idêntica à utilizada no procedimento ordinário mas, em absoluto, intencionou com isto encerrar o processo monitório.

            A adoção de procedimento ordinário não pode descaracterizar o processo monitório, assim como a adoção subsidiária do Código de Processo Civil pela C.L.T., pela lei do Mandado de Segurança ou de Locação, não descaracteriza aqueles procedimentos diferenciados. É inconcebível que a interpretação da lei resulte em algo ilógico, inócuo e totalmente contraprodutivo, em total confronto à mens legis.

            Por fim, atente-se para a redação do parágrafo 3º do artigo 1.102c, o qual se refere à "rejeição" dos embargos, para definir a constituição de pleno direito do título executivo judicial, de modo igual e no mesmo sentido do caput do artigo 1.102c. [12] Assim, tanto na hipótese de não apresentação de embargos, como na de "rejeição", o mandado monitório converte-se em título executivo judicial de pleno direito e inicia-se a execução na forma prevista no Livro II, Título II, Capítulo II e IV.

            Em momento algum, referiu-se o legislador à procedência ou improcedência dos embargos monitórios, mas tão somente à "rejeição".

            Exatamente diante da conversibilidade do mandado monitório em título executivo judicial, pautando-se na expressa previsão contida no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, deve o juiz compreender o caráter diferenciado do mandado monitório e fundamentar sua decisão, ao invés de simplesmente determinar a citação. [13] O deferimento traz, na verdade, uma decisão sobre o direito alegado pelo credor, em conformidade com a clara disposição do artigo 1.102b, no sentido de que cabe ao juiz ao receber o processo monitório, analisar se o documento apresentado como prova da obrigação é hábil para a decisão de expedir o mandado para pagamento ou entrega da coisa. [14]

            Deste modo, inevitável concluir-se que:

            1º - o processo monitório adotado no Brasil é o documental e a apresentação dos embargos monitórios apenas suspende o mandado inicial;

            2º - a demora que o devedor obtém com o efeito suspensivo do recurso que ataca a decisão que julga os embargos monitórios é mais interessante que a própria isenção de custas e honorários;

            3º - nitidamente o efeito do recurso que ataca a decisão dos embargos monitórios tem conseqüência direta no mal resultado da monitória no país;

            4º - não há diferença na lei para a situação de não apresentação de embargos monitórios e para a de rejeição, porquanto, em ambas, ocorre a conversão do mandado inicial em título executivo.

            2.1.MONITÓRIA: AÇÃO, PROCESSO, PROCEDIMENTO OU TUTELA?

            Diversas são as formas como os operadores do direito se referem à Monitória, assim como ampla é a discussão acerca de se tratar propriamente de uma "ação", tal qual faz menção a própria lei que a introduziu, ou se seria um "processo", "procedimento" ou, ainda, uma "tutela".

            No nosso sentir é um processo!

            Justificamos nossa posição lembrando que é discussão superada na doutrina a desnecessidade de se nomearem as ações, uma vez que a ação é somente o exercício do direito constitucional do acesso à justiça, previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal. [15] Assim, é de se lamentar a denominação dada de "ação" monitória [16], como se estivéssemos em um sistema de ações típicas.

            Igualmente, sendo a tutela a exteriorização da prestação jurisdicional, por meio da qual o juiz garante o direito da parte e profere sua decisão, mesmo que seja para declarar que o autor não tem razão, será sempre única e dependente do pedido, razão pela qual também não concordamos com a existência de uma tutela monitória, como se fosse algo único e diferente das demais. [17] Há, na verdade, somente o pronunciamento do juiz em conformidade com o pedido monitório e o direito provado pelas partes.

            Destarte, entendemos que é o pedido monitório que gera um processo que segue o procedimento especial previsto no Código de Processo Civil para o desenrolar da Monitória no processo civil pátrio. [18]

            Portanto, entre "ação", "tutela", "procedimento", preferimos mencionar "processo" monitório, com suas peculiaridades e especificidades. Talvez, o grande problema de interpretação [19] e utilização da monitória por parte da doutrina e da jurisprudência decorra exatamente deste fato, qual seja, de relutar em aceitar o processo especial monitório como algo particular e com objetivos próprios, que não se encaixam e não podem ser explicados de modo igual a outros institutos processuais. [20]


3.DIFERENÇAS BÁSICAS ENTRE COBRANÇA, MONITÓRIA E EXECUÇÃO

            O rol dos títulos executivos extrajudiciais previstos no artigo 584 do Código de Processo Civil é extenso e visa exatamente à mais célere satisfação do credor. Contudo, quem não possui título executivo extrajudicial é obrigado a socorrer-se do processo comum ordinário para, por meio de um pedido condenatório, obter um título executivo judicial.

            Alguns títulos executivos extrajudiciais perdem sua eficácia pelo tempo ou por mera irregularidade formal. Para esses credores que já possuíram título extrajudicial ou para aqueles em que a prova escrita apresenta grande presunção da obrigação foi previsto o processo monitório, a permitir a rápida satisfação.

            Deste modo, imaginando-se, por exemplo, uma obrigação pecuniária, o credor que já possui título pede a citação do devedor para que, no prazo de 24 horas, pague o valor devido ou para que nomeie bens à penhora, enquanto aquele que não tem título, nem prova pré-constituída pede a citação do devedor para que apresente resposta e acompanhe o processo até final decisão que poderá condená-lo a pagar o valor que o credor entende como devido. Exatamente como uma via de meio, surgiu o processo monitório para quem não tem título, mas possui prova escrita que leve à presunção firme da existência do crédito. [21]

            3.1.ENTROCAMENTO ENTRE COBRANÇA E MONITÓRIA

            Tratando-se a cobrança, a monitória e a execução de três gêneros diferentes, torna-se totalmente incongruente restringir o processo monitório somente à possibilidade do devedor cumprir a obrigação quando citado ou quedar-se inerte, pois transforma a monitória em algo efêmero que, dependendo da conduta do devedor, passa-se direto à execução ou simplesmente se torna um pedido de cobrança, com completo desvirtuamento e aniquilação desse importante instituto processual.

            Entendemos que, mesmo que apresentados os embargos monitórios, ainda assim não se pode transformar o que até ali não era um pedido de cobrança, num processo comum ordinário, como se aquela verossimilhança inicial tivesse desaparecido completamente. Da forma como os juízes processam a monitória após a apresentação dos embargos monitórios, em realidade, deixa de existir o processo monitório tal como concebido, transmudando-se numa simples cobrança.

            A monitória da forma como é processada atualmente no país, assemelha-se mais ao puro, [22] tendo-se em vista que a apresentação dos embargos monitórios tem o condão de encerrar o processo monitório e jogá-lo na vala comum de um pedido condenatório, porquanto a simples apresentação dos embargos monitórios, ainda que totalmente desprovidos de lógica e fundamentação jurídica, permite ao devedor impedir o rápido início do processo de execução, destruindo a força do mandado monitório que estava prestes a se tornar título executivo judicial.

            O que temos hoje, da forma como nossos juízes processam a monitória e do modo como a jurisprudência se formou, está muito longe da monitória efetiva e histórica, não passando de mera cobrança especial, um processo monitório pífio, distante de atingir seus objetivos iniciais idealizados.

            A intenção legislativa do processo monitório é exatamente de situá-lo neste limbo entre a demorada e improdutiva cobrança e a expropriatória execução. Dá-se mais ao credor, mas sem onerar-se demais o devedor [23].


4.EMBARGOS MONITÓRIOS: ÔNUS PROCESSUAL OU MERA OPÇÃO?

            Muitos são os pontos de discórdia na doutrina acerca do processo monitório, dentre tantos podemos destacar: a) se os embargos monitórios têm natureza jurídica de ação constitutiva negativa (desconstitutiva) ou de contestação; b) se o devedor que não apresenta os embargos monitórios pode alegar toda a matéria de defesa ou somente aquelas previstas no artigo 741 do Código de Processo Civil.

            Outrossim, é ponto de absoluta concordância que, quando convertido o mandado inicial em título executivo judicial, o processo monitório prossegue com a intimação do devedor e não com a citação, ao contrário do que ocorre na execução decorrente de sentença em processo de conhecimento, na qual o executado é citado para cumprimento do julgado, iniciando-se processo distinto, só que nos mesmos autos. [24]

            Não se encontra na doutrina posição que afirme claramente que a apresentação de embargos monitórios seja mera opção do devedor, mas muitos defendem a possibilidade do devedor, realizada a penhora, opor embargos à execução e alegar toda a matéria que poderia ter sido deduzida em embargos monitórios, ignorando o claro texto do artigo 1.102c, que prevê a formação de título executivo judicial.

            Deste modo, parece-nos que se a formação do título executivo judicial, conseqüência do não cumprimento de ônus processual (embargos monitórios), não impede a ampla manifestação e a defesa alegável em embargos à execução, mutatis mutandis, é o mesmo que opinar no sentido de que o devedor tem a opção de escolher o momento que melhor lhe aprouver para apresentar suas alegações consistindo, portanto, em posição favorável a de ser a apresentação dos embargos monitórios mera opção do devedor.

            Na realidade, para justificar a possibilidade de embargos à execução plenos, no caso de não apresentação de anteriores embargos monitórios, os defensores dessa opinião fazem uma correlação com igual opinião quanto à possibilidade de ajuizamento de ação independente e autônoma para o devedor que perde o prazo para a apresentação dos embargos à execução.

            Discordamos veementemente de ambas as opiniões!

            Tem o credor de pensão alimentícia o prazo de 02 (dois) anos para executar as pensões não pagas. [25] O trabalhador tem somente 02 (dois) anos após a extinção do contrato de trabalho para exigir seus sagrados direitos trabalhistas desrespeitados pelo empregador. [26] Perde-se uma propriedade se não cuidar de protegê-la de quem injustamente a possua em determinado tempo, dependendo do caso. Assim, não se pode aceitar e nem entender por qual razão a apresentação dos embargos do devedor no processo de execução e dos embargos monitórios no processo monitório é mera opção do devedor ou por que a citação na execução ou na monitória pode ser simplesmente ignorada pelo devedor sem qualquer conseqüência.

            Para não submeter o devedor à eterna incerteza, a prescrição atinge até credores que deveriam ter proteção especial pela magnitude do direito que têm, tal como o credor de alimentos e o trabalhador, motivo pelo qual se torna incompreensível que o devedor, exatamente na posição inversa, tenha direito ilimitado de escolha para decidir qual o melhor momento para apresentar suas alegações em juízo.

            Nossa opinião, portanto, é no sentido de que a oposição de embargos monitórios é ônus processual e a sua não apresentação acarreta a perda do direito visando a obstar a formação do título executivo judicial e, conseqüentemente, impede que o devedor possa alegar esta matéria, que deveria ter sido deduzida por embargos monitórios, futuramente na fase executória do processo monitório.

            4.1.NATUREZA JURÍDICA DOS EMBARGOS MONITÓRIOS

            Sendo irrefutável que a apresentação dos embargos monitórios constitui ônus processual ao devedor, [27] sob pena de conversão do mandado monitório em título executivo judicial, resta a discussão sobre a natureza jurídica destes embargos.

            A nosso ver, a grande falha de interpretação da doutrina e da jurisprudência está em tentar encaixar os embargos monitórios nas fórmulas pré-existentes ou de compará-los à contestação do processo de conhecimento ou aos embargos no processo de execução. Como dito anteriormente, o processo monitório foi constituído com suas próprias características e peculiaridades, razão pela qual os argumentos de lado a lado são frágeis e não convencem os defensores da corrente oposta.

            Temos, assim, que os embargos monitórios não são ação desconstitutiva [28] nem contestação [29], mas uma medida impugnativa própria e específica do processo monitório, algo semelhante à figura jurídica da objeção de pré-executividade. [30] Encarados desta forma, fica muito mais fácil a compreensão quanto a nossa opinião acerca do recurso cabível para atacar a decisão que rejeita os embargos monitórios.

            Não é demais ressaltar que a discussão entre "ação desconstitutiva" ou "contestação" é meramente acadêmica e doutrinária, sem relevantes proveitos práticos, porquanto os defensores de ambas as correntes são uníssonos em afirmar que é o mandado monitório que se constitui em título executivo judicial. [31]

            Deste modo, apesar da praxe dos juízes em julgar "procedentes" ou "improcedentes" os embargos monitórios, temos que, na verdade, de sentença não se trata pois, se assim fosse, executar-se-ia o título executivo judicial formado pela decisão (rectius – sentença como título executivo judicial). [32]

            Se for encarada como contestação, por corolário lógico, a sentença haveria de ser o título executivo, tal como no processo de conhecimento. Se for ação desconstitutiva, como justificar que o julgamento de improcedência dos embargos constitui o mandado monitório em título executivo judicial?

            Neste sentido, é que entendemos que a natureza jurídica dos embargos monitórios é de medida impugnativa incidental, [33] a qual será rejeitada (nos termos da lei) para formar o título executivo, oriundo do mandado monitório, ou acolhida para extinguir o processo monitório (aí, sim, sentença).

            42.NATUREZA JURÍDICA DA DECISÃO QUE JULGA OS EMBARGOS MONITÓRIOS E O RECURSO CABÍVEL

            Mais importante, porém, do que definir os embargos monitórios como contestação, ação desconstitutiva ou medida impugnativa incidental – como aqui propomos - é indagar qual a natureza jurídica da decisão que julga os embargos monitórios opostos.

            Outra vez a doutrina é unânime em defini- -la como sentença, sujeita, portanto, ao recurso de apelação, recebido no efeito suspensivo e devolutivo. Algumas opiniões, novamente tentando encaixar o processo monitório nos modelos pré-existentes defendem que, em paralelo ao previsto no artigo 520, inciso V, do Código de Processo Civil, deveria a apelação ser recebida somente no efeito devolutivo, posição repelida pela jurisprudência. [34]

            Em coerência com nossa postura de que os embargos monitórios são medida impugnativa incidente, que suspende a eficácia do mandado monitório, sem suspender o próprio processo monitório, entendemos que, a rejeição dos embargos monitórios, apresenta-se como decisão interlocutória a desafiar o recurso de agravo de instrumento, haja vista que se constitui de uma decisão tomada dentro do processo monitório que, rejeitando os embargos monitórios, acarreta no normal prosseguimento à busca do objetivo final, que é a célere satisfação do credor. [35]

            Todavia, ainda que repelida a posição exposta, de todo modo, opinamos que o recurso que deve atacar a decisão que rejeita os embargos é o de agravo de instrumento, [36] ainda que como sentença seja considerada. Isto porque esta decisão que rejeita os embargos monitórios não põe fim ao processo monitório, tanto que o devedor é somente intimado em prosseguimento, como já afirmado anteriormente. Ora, se é uma sentença que não põe fim ao processo, em consonância com o que ocorre na sentença que extingue liminarmente a reconvenção, a oposição ou a declaratória incidental, as quais são julgadas sem por fim ao processo original em que foram propostas, de igual modo a "sentença" que julga os embargos monitórios não deveria motivar a interposição do recurso de apelação, mas sim o de agravo de instrumento. [37]

            Não se pode olvidar que se trata de argumento jurídico, em total conformidade com o espírito legislativo e com a redação do artigo 1.102 do Código de Processo Civil. Mais que isto, não haverá prejuízo à jurisdição ou às partes, uma vez que: a) o tribunal terá que julgar de todo modo um recurso, agravo ou apelação; b) o réu, se algum motivo justo e de direito tiver a impedir o início da execução, poderá valer-se, excepcionalmente, do efeito suspensivo do agravo e, ao autor, para quem afinal foi concebido o processo monitório, realmente passará a ser um processo rápido e justo.

            Destarte, a fim de tornar o processo monitório efetivo e útil, opinamos que a decisão que julga os embargos monitórios deve desafiar o recurso de agravo de instrumento e não a apelação como atualmente ocorre. [38]


5.DA MATÉRIA ALEGÁVEL NOS EMBARGOS À EXECUÇÃO DO MANDADO MONITÓRIO CONVERTIDO EM SENTENÇA JUDICIAL

            O artigo 1.102c do Código de Processo Civil é expresso quanto à conversão do mandado monitório em título executivo judicial no caso de não apresentação dos embargos monitórios (caput) ou de rejeição destes (§ 3º).

            O artigo 741 do Código de Processo Civil elenca taxativamente sobre o que podem versar os embargos do devedor para atacar título executivo judicial.

            Todavia, de modo incompatível ao sistema, respeitáveis juristas defendem que, nos embargos à execução do devedor que não tiver oposto os embargos monitórios, poderá ser alegada toda e qualquer defesa [39], tal como se tratasse de título executivo extrajudicial (artigo 745 do C.P.C.). [40]

            Além de ser interpretação que afronta claramente o texto de lei, entendemos ser um contra-senso e totalmente improdutivo defender-se o devedor que, apesar de regularmente citado em processo monitório, ou seja, no qual havia fundado documento comprobatório da obrigação, simplesmente ignora a ordem judicial, não a cumpre [41] nem apresenta seus argumentos para desfazer a presunção, permitindo a formação de título executivo judicial, a dar início ao conseqüente processo de execução, para só então desconstituí-lo, gozando da benesse de alegar toda a defesa que já poderia ter feito.

            Será realmente correto entender como não "preclusivo" o prazo para apresentação dos embargos monitórios? Quem paga por este desperdício de acionamento da máquina judiciária de iniciar o processo executivo, expedir mandado, realizar penhora e instrução para provar aquilo que poderia ter sido demonstrado no processo monitório, anteriormente à formação do título? E mais, por que dar esta oportunidade ao devedor da monitória que se cala diante da ordem contida no mandado monitório e não estender o mesmo privilégio ao réu revel no processo de conhecimento?

            Os que defendem a possibilidade de ampla alegação de matéria fática nos embargos à execução, ainda que a lei seja expressa em tratar-se de título executivo judicial, alegam que não se poderia falar em preclusão, muito menos em revelia no processo monitório por não haver expressa intimação do devedor quanto a esses efeitos, o que também não nos parece verdadeiro, uma vez que o devedor é citado dos termos da petição inicial e intimado a pagar ou apresentar embargos no prazo de quinze dias, sob pena de conversão do mandado monitório em título executivo judicial.

            Vale notar que, a pena que o legislador previu para o devedor que não se manifesta judicialmente, que não cuida de proteger seus interesses no processo monitório, é ainda maior que a da revelia no processo comum de conhecimento, a qual somente induz verdadeiros os fatos alegados, mas não conduz necessariamente à procedência do pedido inicial. [42]

            Se não bastassem os argumentos de ordem jurídica e de efetividade do processo, imaginemos as seguintes situações práticas: na primeira, um réu, citado no processo monitório, contrata advogado para oposição dos embargos monitórios, sendo que o profissional não realiza um serviço jurídico competente, deixando de apresentar as provas e argumentos que seu cliente possuía; no segundo caso, o réu não releva a menor importância a uma ordem judicial de cumprimento da obrigação e nem apresenta seus argumentos, pelo contrário, simplesmente a ignora, deixando que a jurisdição se ocupe e prossiga e, muito tempo após, quando intimado da penhora, vem a juízo e, aí sim, alega tudo aquilo que deveria tê-lo feito inicialmente, enquanto o outro, diligente e interessado, mas que não contou com a defesa de um bom profissional, terá sua defesa limitada ao artigo 741 do Código de Processo Civil.

            Deste modo, não nos parece coerente e lógico diferenciar o devedor que apresenta embargos monitórios daquele que não o faz, muito menos se pode entender como justificável ignorar o claro texto de lei contido no artigo 1.102c do Código de Processo Civil, que prevê a formação de título executivo judicial em ambos os casos [43].

            Não se trata, em absoluto, de defender a existência de coisa julgada [44] na transformação imediata do mandado monitório em título executivo judicial, tampouco de querer estender os efeitos da preclusão para fora do processo monitório [45], mas tão-somente de aplicar o expresso texto de lei e de dar isonomia ao réu que apresentou embargos monitórios e não colocá-lo em situação inferior àquele devedor desinteressado e que simplesmente ignora um mandado judicial.

            O devedor não poderá rediscutir a dívida, não por existência propriamente de coisa julgada, mas por ser este o critério claro adotado pelo legislador ao instituir a monitória no ordenamento pátrio [46].


6.CONCLUSÃO

            O estudo do direito comparado, principalmente em tema como a monitória, é de essencial importância ao intérprete da lei, porém o modelo comparativo não deve servir para ser aplicado no nosso sistema, algo entendido em outra cultura, em outra época ou por outras razões. Lamentavelmente, nota-se em alguns escritos sobre o processo monitório a simples repetição de argumentos utilizados na Itália, na Alemanha ou em outros países, sem a devida adaptação ao sistema brasileiro.

            A título de esclarecimento, nossa maior preocupação com o processo monitório decorre da má utilização prática deste importante instituto de aceleração de formação do título executivo judicial. Entendemos que as alterações aqui sugeridas auxiliariam em muito para a real efetividade do processo monitório, em especial a utilização do agravo de instrumento para atacar a decisão que "rejeitar" os embargos monitórios. Vale lembrar, por óbvio, a decisão que acolher os embargos julgará extinto o processo monitório e será, portanto, sentença a desafiar, aí sim, o recurso de apelação.


B I B L I O G R A F I A

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            YARSHELL, Flávio Luiz. Tutela Jurisdicional. São Paulo: Atlas, 1998.


NOTAS

            01 "Regra escrita, geral, abstrata, impessoal, que tem por conteúdo um direito objetivo no seu sentido material e, no sentido formal, todo ato ou disposição emanada do Poder Legislativo. A lei, como norma jurídica, deve ser entendida, em seu sentido material, como todo ato normativo imposto coativamente pelo estado aos particulares, regrando as relações entre ambos e dos particulares entre si". Marcio Fernando Elias Rosa, Sinopses Jurídicas – Direito Administrativo, p. 6.

            02 "Chamam-se fontes formais do direito os meios de produção ou expressão da norma jurídica. Tais meios são a lei (em sentido amplo, abrangendo a Constituição), os usos-e-costumes e o negócio jurídico". A.C. de Araújo Cintra e outros, Teoria geral do processo, p. 92.

            03 Infeliz mais uma vez a técnica legislativa ao tratar a monitória como "ação". Sob o enfoque se a Monitória é ação, processo, procedimento ou tutela, discorreremos mais adiante no item 8.4.2.

            04 "Mas mediante alteração legislativa pelo menos outras três providências poderiam ser adotadas: a) expressa previsão de mecanismo de autorização da execução provisória, antes ou no curso de embargos ao mandado; b) negação de efeito suspensivo para a apelação contra a sentença de rejeição dos embargos ao mandado (isso se, antes, não vier a ser adotada, como regra geral no processo civil, a apelação com efeito meramente devolutivo); c) eliminação dos embargos de devedor, na fase executiva do processo monitório". Eduardo Talamini, Tutela monitória, p. 198.

            05 "Verifica-se que, apesar do instituto ter sido inserido em sede adequada, continuou o legislador a seguir o vezo de nominar as ações que se desenrolam mediante procedimento especial". José Rogério Cruz e Tucci, Ação monitória, p. 58.

            06 "Eliminar-se-ia de uma vez por todas a idéia de que ele é mero apêndice preparatório do processo de execução, destinado a ‘corrigir’ títulos executivos ‘imperfeitos’". Eduardo Talamini, Tutela monitória, p. 197.

            07 "Apesar de ter sido modelado à luz do procedimento d’ingiunzione italiano, o processo monitório brasileiro não representa uma cópia fiel daquele, havendo entre eles importantes pontos de distanciamento (Capítulo II, n. 10)". Antonio Carlos Marcato, O processo monitório brasileiro, p. 117.

            08 "Recebe a denominação, no idioma de origem, de ‘Mahnverfahren’ e corresponde ao modelo reconhecido na doutrina como procedimento monitório puro, originando-se diretamente do praeceptum ou mandatum de solvendo cum clausula justificativa, do direito medieval italiano, e mediatamente dos iudiculi commonitorii, do direito franco". Elaine Harzheim Macedo, Do procedimento monitório, p. 45.

            09 "Dificilmente se saberá, mediante dados objetivos, qual a amplitude e a vantagem concreta no emprego do procedimento monitório no Brasil. Já na primeira metade do século, Chiovenda destacava que a relevância prática do procedimento monitório estava subordinada à raridade da interposição de embargos, e mencionava estatísticas de países europeus, que indicavam percentagens satisfatórias de processos em que não se interpunha oposição (Instituições..., I, p. 259). Na França e Alemanha, são também estatísticas que autorizam, respectivamente, Perrot (Il procedimento..., p. 717 e 732) e Vincent e Guinchard (Procédure..., p. 604 e 607) a afirmar o sucesso da procédure d’injonction e Beneti (Ação..., p. 23) e Schönke (Derecho..., p. 363), o do Mahnverfahren. Não se desenvolvendo pesquisas desse tipo em grande escala no Brasil, demorará bastante para que se possa ter idéia pelo menos aproximada do seu efetivo uso e, mais ainda, de sua eficácia concreta. Mas isso não impede que se dêem sugestões para torná-las mais eficiente". Eduardo Talamini, Tutela monitória, p. 196.

            10 "Todavia, ainda consoante o caput do art. 1.102c, oferecidos os embargos pelo réu, dentro daquele prazo de 15 dias, inaugura-se um procedimento incidental de cognição exauriente, regrado certamente pelas normas do procedimento comum ordinário (art. 1.102c, § 2º)". José Rogério Cruz e Tucci, Ação monitória, p. 64.

            11 "O parágrafo segundo ganhou, apenas, em relação ao esboço inicial, a determinação de adoção do procedimento ordinário para a hipótese de oposição através de embargos, permanecendo, no mais, segundo sua redação original". Elaine Harzheim Macedo, Do procedimento monitório, p. 79.

            12 "Não é de estranhar-se, pois, que, preocupado com a efetividade do processo, o legislador não se tenha limitado à divisão das categorias, processo de conhecimento e processo de execução, quando criou a ação monitória". Vicente Greco Filho, Comentários ao procedimento sumário, ao agravo e à ação monitória, p. 51.

            13 "Possibilita, em outras palavras, a obtenção de um provimento judicial inaudita altera parte, que se traduz no mandado monitório, com contraditório eventual e diferido, ficando a cargo do réu provocar, mediante a oposição de embargos, a instauração de processo de cognição plena (Nota Introdutiva e Capítulo III, n. 11)". Antonio Carlos Marcato, O processo monitório brasileiro, p. 117.

            14 "Esse pronunciamento judicial, especialmente em caso de deferimento do pedido, deve atender ao disposto no art. 93, inc. IX, da Constituição Federal, explicitando o juiz, de modo tanto quanto possível minudente, as razões de seu convencimento impositivo de uma determinada sanção (condenação) ao devedor". José Rogério Cruz e Tucci, Ação monitória, p. 62-63.

            15 "Como corolário do ônus de demandar, decorrente da regra do art. 262 do Código de Processo Civil, cumpre ao autor provocar a jurisdição por meio de petição inicial, que consiste no ato introdutório da demanda de natureza civil". José Rogério Cruz e Tucci, Ação monitória, p. 61.

            16 "Portanto, rompendo com o sincretismo contido na óptica do direito romano, cindiu-se o conceito da actio, para se distinguir a existência do direito, de um lado, e o poder de invocar a respectiva declaração ou atuação, de outro lado. Daí por que se dizer que o direito contemporâneo já não está assentado em um sistema de ações, mas de direitos, em que já não vigora aquela idéia de tipicidade; não ao menos com aquela dimensão outrora verificada. Não se aceita – sob o ângulo conceitual – a correspondência necessária entre direito e ação, tal qual descrita, entre nós, pelo art. 75 do Código Civil". Flávio Luiz Yarshell, Tutela jurisdicional, p.64-65.

            17 "Rogério Tucci, por exemplo, vê o instituto do procedimento monitório como forma de tutela jurisdicional diferenciada, sempre presente a necessidade de obtenção de prestação jurisdicional eficaz, dotado de limitação da cognição não tanto pela prova documental a ser apresentada pelo autor, mas porque ausente o contraditório em sua fase inicial, expedida ordem inaudita altera parte"."...é forma de tutela diferenciada, na busca de soluções jurisdicionais abreviadas no tempo". Elaine Harzheim Macedo, Do procedimento monitório, p. 107.

            18 "É que, como explica Antonio Carlos Marcato, a especificidade procedimental resulta, em várias hipóteses, da exigência de uma tutela jurisdicional mais rápida, tendo-se em vista as características que envolvem o litígio submetido à apreciação jurisdicional, assim como das imposições das pretensões nele contidas, ou seja, ‘o conflito de interesses a ser dirimido apresenta particularidades que escapam ao alcance de um tratamento processual comum, daí por que os procedimentos especiais se ajustam às peculiaridades das exigências das relações jurídicas nele deduzidas’". José Rogério Cruz e Tucci, Ação monitória, p. 59.

            19 "A forma adotada no Brasil contém peculiaridades que a destacam de figuras análogas do direito anterior ou estrangeiro, de modo que, sem prejuízo dos subsídios que o estudo comparativo possa trazer, deve o texto legal ser interpretado em seu contexto atual e de acordo com as finalidades que o informam". Vicente Greco Filho, Comentários ao procedimento sumário, ao agravo e à ação monitória, p. 49.

            20 "Já no que se refere à sua estrutura, tal demanda é veiculada mediante procedimento especial, em razão da sumariedade da cognição e de outros aspectos que o conotam". José Rogério Cruz e Tucci, Ação monitória, p. 60.

            21 "Mesmo presentes essas características, temos que nos render à conclusão de Calamandrei de que no bojo deste procedimento encontra-se uma pretensão do mesmo porte de uma sentença condenatória. O procedimento monitório prepara a execução forçada. Cuida-se de iter célere para obter um título executivo judicial, cuja celeridade nada mais é que homenagem do legislador ao juízo de verossimilhança, de credibilidade". Elaine Harzheim Macedo, Do procedimento monitório, p. 109.

            22 "Há, em comum, nos dois modelos mais utilizados do procedimento monitório puro, as seguintes características: ordem condicionada de pagamento fulcrada apenas na afirmação unilateral do autor, independentemente de qualquer prova pré-constituída; a mera oposição retira todo e qualquer império do comando injuncional, dando margem a um contraditório novo, buscando efeito condenatório, conforme provocação do credor". Elaine Harzheim Macedo, Do procedimento monitório, p. 88.

            23 Essa, aliás, é exatamente a forma prescrita no C.P.C., conforme artigos 612 e 620, ou seja, a execução se realize no interesse do credor, mas pelo modo menos gravoso ao devedor.

            24 "Se o réu opôs embargos ao mandado monitório e, apesar disso, operou-se a sua convolação em mandado executivo, bastará que ele seja intimado da sentença, ato que inaugura a fase executiva". Antonio Carlos Marcato, O processo monitório brasileiro, p. 111. Aliás, de forma totalmente coerente e correta a nosso ver, o autor afirma que nem mesmo o réu que deixou de apresentar embargos monitórios será citado, por já ter sido citado inicialmente e por não se ter início a uma nova fase do processo monitório, não um processo de execução.

            25 Artigo 206, parágrafo 2º, do Código Civil (Lei 10.406/2002).

            26 Artigo 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal.

            27 "...ao devedor-embargante é imposto o ônus de provar o fato constitutivo do direito deduzido (art. 333, I), com todas as conseqüências que advêm desse encargo". José Rogério Cruz e Tucci, Ação monitória, p. 64.

            28 "Poderá o réu também opor os embargos referidos no art. 1.102b, que têm natureza jurídica de ação, dão vida a um processo autônomo e representam a única oportunidade de reação ao mandado monitório, prestando-se, assim, à veiculação de qualquer defesa, substancial ou processual, ressalvadas apenas as exceções rituais (Capítulo III, n. 22)". Antonio Carlos Marcato, O processo monitório brasileiro, p. 119.

            29 "Tem-se discutido qual a natureza desses ‘embargos’. Indaga-se se são forma de defesa, ‘contestação’ no próprio bojo do processo monitório, ou demanda (‘ação’) autônoma de reconhecimento da inexistência do crédito e de impugnação ao mandado monitório, a exemplo dos embargos à execução. Sustentam tratar-se de ‘ação’, entre outros: Dinamarco, A reforma..., p. 230-231 e 243; Cruz e Tucci, Ação..., p. 64; Greco F.º, Comentários..., p. 54; Ernane F. dos Santos, Novos perfis..., p. 44; Marcato, O processo, p. 94-96; Fischmann, Comentários..., 14, p. 414. Afirmam ter a forma de ‘contestação’, entre outros: Guerra, Ação..., p. 50-51; Fornaciari Jr., A reforma..., p. 214; Carreira Alvim, Procedimento..., p. 53, 88 e 94; Shimura, Ação..., p. 271-272. Eduardo Talamini, Tutela monitória, p. 146.

            30 "A despeito de se identificarem com verdadeira contestação, até porque inexiste ainda título executivo a ser desconstituído, não há dúvida de que os ‘embargos ao mandado’, à luz do disposto no art. 1.102c, correspondem a uma ação incidental sui generis". José Rogério Cruz e Tucci, Ação monitória, p. 64.

            31 "O título executivo é, pois, o próprio mandado inicial, o decreto injuntivo, cuja eficácia, porém, fica suspensa até efetivar-se a condição suspensiva, consistente na não-oposição dos embargos no prazo legal, ou, ainda, pela rejeição dos embargos via sentença proferida no bojo da ação incidental". Elaine Harzheim Macedo, Do procedimento monitório, p. 110.

            32 Interessante destacar dois trechos da obra Ação Monitória, de José Rogério Cruz e Tucci: "Todavia, preenchendo a petição inicial as imposições legais, o julgador deverá, in limine litis, a teor do art. 1.102b, proferir decisão fundamentada..." p. 62. "Desse modo, a sentença de improcedência do pedido formulado nos ‘embargos monitórios’ não constitui título algum, mas torna eficaz a decisão liminar". p. 67.

            33 "Em verdade, não se cuida de mera defesa (contestação) nem de ação incidental que objetiva atacar a execução, mas de ação incidental com características próprias cujo oferecimento independe da segurança do juízo". João Batista Lopes, Aspectos da ação monitória, in Revista de Processo Nº 83, p. 24.

            34 "Considerando que os embargos são opostos (e, se recebidos, processados) nos autos do processo já pendente, surge uma dificuldade prática no processamento do apelo do réu (os autos do processo monitório não poderão ser encaminhados ao tribunal, sob pena de paralisar-se o seu curso), podendo ser adotada, diante dessa contingência, qualquer das soluções preconizadas por Vicente Greco Filho: ‘extrair traslado para a subida da apelação, extrair carta de sentença para o prosseguimento da execução (ainda que o que se executa não seja sentença, mas o documento ao qual se somaram o preceito judicial e o fato da rejeição ou improcedência dos embargos) ou processar a continuidade da execução em autos suplementares, onde houver’. Evidente que qualquer dessas soluções também será adequada para o processamento da apelação interposta contra a sentença de improcedência total ou parcial dos embargos ao mandado". Antonio Carlos Marcato, O processo monitório brasileiro, p. 101.

            35 Exatamente neste mesmo sentido aqui defendido, José Rogério Cruz e Tucci afirma: "Nicoletti, por outro lado, prefere dizer que a oposição do demandado, por ser deduzida perante o mesmo juízo de primeiro grau, afigura-se como simples continuação do procedimento monitório strictu sensu, dando ensejo à abertura de uma nova fase. Estar-se-ia, assim, diante de um procedimento unitário, dividido em duas fases processuais: a primeira, especial, é concluída por uma decisão, cuja eficácia fica aguardando o desfecho da segunda. Nessa mesma linha de raciocínio, Goldschmidt assevera que a conversão em procedimento ordinário que se verifica a partir da resistência do devedor nada mais representa do que a continuação do procedimento monitório". Ação monitória, p. 50-51.

            36 Interessante que em complemento à posição defendida – conforme transcrito na nota 34, mas tão-somente como modo alternativo de processamento da apelação, Antonio Carlos Marcato, também faz a defesa do Agravo de Instrumento para atacar esta decisão: "Em razão dessas dificuldades, poderá até prevalecer o entendimento de que o recurso cabível será o de agravo, tal como ocorre na hipótese de indeferimento liminar da reconvenção". O processo monitório brasileiro, p. 101, nota 105.

            37 "Indeferimento liminar e recurso. Como o processo é o conjunto formado pela ação principal e reconvenção, o indeferimento liminar desta última se caracteriza como decisão interlocutória, desafiando o recurso de agravo de instrumento." Nelson Nery Junior, Código de Processo Civil Comentado, p. 703, Nota 31.

            38 Neste mesmo sentido temos a lição de Arruda Alvim: "A antecipação da tutela será formalmente por uma decisão, mas substancialmente trata-se de sentença. Julgamos predominar a forma, e por isso é que o recurso é o de agravo de instrumento". Manual de Direito Processual Civil, p. 404, nota 83.

            39 "Defende, nessa esteira, que a ausência de embargos na fase monitória leva, por ocasião da execução forçada, à aceitação dos embargos plenários, a teor do art. 745 do Código de Processo Civil, liberando-se ao embargante – agora com o ônus de assegurar o juízo – ‘além das matérias previstas no art. 741, qualquer outra que lhe seria lícito deduzir como defesa no processo de conhecimento’. Para essa corrente, a ausência de uma declaração sentencial expressa enseja o reconhecimento da inexistência de coisa julgada, podendo ser discutido, agora em sede de embargos à execução, o que não foi discutido antes, no curso do procedimento monitório". Elaine Harzheim Macedo, Do procedimento monitório, p. 124.

            40 "E, nesse caso, entendemos que, a despeito da execução ser lastreada em título judicial, não prevalecem os argumentos teóricos que justificam a limitação objetiva imposta pelo art. 741, uma vez que tal título não adveio de um processo judicial onde se viabilizou o mais amplo contraditório entre as partes". José Rogério Cruz e Tucci, Ação monitória, p. 68. Em sentido contrário e defendendo sequer a possibilidade de apresentação de embargos na fase executiva, Eduardo Talamini diz: "Assim, por mais célere que seja a constituição de ‘título executivo’, o processo se afunilará a seguir, na fase executiva, com todas as suas mazelas e deficiências. Nesse ponto, a eliminação (de jure condendo) da possibilidade de embargos à execução pode contribuir para a aceleração dessa segunda fase do processo, mas não bastará". Tutela monitória, p. 201. Já Antonio Carlos Marcato defende que os embargos sejam restritos à matéria do 741 do C.P.C.: "Poderá o executado valer-se dos embargos à execução, limitados, contudo, às matérias indicadas no art. 741 do Código de Processo Civil (Capítulo III, n. 30)". O processo monitório brasileiro, p. 120.

            41 "Os embargos, portanto, quando tenha ficado inerte o demandado no processo da ação monitória, serão de cognição plenária, a teor do disposto no art. 745 do Código de Processo Civil, podendo o embargante suscitar, ‘além das matérias previstas no art. 741, qualquer outra que lhe seria lícito deduzir como defesa no processo de conhecimento’, inclusive e principalmente aquela concernente a fato superveniente, assegurando-se-lhe, destarte, todos os meios regulares de oposição ao processo executivo". José Rogério Cruz e Tucci, Ação monitória, p. 69.

            42 "Artificial seria, por outro lado, criar ficção de que, embargada, a monitória se tornaria ação ordinária e a sentença que julgasse os embargos improcedentes seria condenatória, passando a constituir-se, então, no título executivo. Com tal ginástica mental, no entanto, a monitória nada mais seria do que procedimento comum, com efeitos muito mais drásticos do que o normal, pois a revelia, que, em princípio, faz apenas reputarem-se verdadeiros os fatos alegados, caracterizada, na monitória, pela não-interposição dos embargos, conduziria necessária e incondicionalmente à procedência do pedido, sem qualquer outra apreciação probatória". Ernane Fidelis dos Santos, Ação monitória, p. 88-89.

            43 "...o procedimento monitório puro, no qual basta a afirmação do autor para que o juiz determine a expedição do mandado de pagamento ou de entrega de coisa, mas em que, em contrapartida, a oposição de embargos ou defesa torna totalmente ineficaz o preceito, seguindo-se o procedimento contraditório amplo com sentença; e o procedimento monitório documental, que exige para a expedição do mandado a existência de prova escrita do débito, mas em que a apresentação dos embargos somente suspende a eficácia do preceito, prosseguindo sua execução na hipótese de rejeição". Vicente Greco Filho, Comentários ao procedimento sumário, ao agravo e à ação monitória, p. 50.

            44 Sobre a coisa julgada no processo monitório, Eduardo Talamini afirma que: "Desse modo, a sentença que vier a concluir pela inexistência do crédito (seja quando o embargante provar cabalmente que o crédito não existia; seja quando ele derrubar o juízo de verossimilhança e o embargado não conseguir através de outras provas demonstrar a existência do crédito) fará coisa julgada material quanto à própria inexistência do crédito e não apenas quanto à impossibilidade de emprego de ação monitória. Ficará obstado pela coisa julgada o emprego de qualquer nova ação tendente à cobrança daquele mesmo crédito (mesma causa de pedir, pedido e partes) e não apenas a repropositura de ação monitória". Tutela monitória, p. 166.

            45 "Para alguns, a omissão do embargado não acarreta o efeito da revelia, enquanto outros não descartam o julgamento antecipado dos embargos," ‘por analogia com a revelia no processo de cognição (art. 330, n. II), embora isto não importe na obrigatoriedade de decisão em favor do embargante, que, muito bem, pode não ter razão em suas pretensões’". Antonio Carlos Marcato, O processo monitório brasileiro, p. 105.

            46 "O procedimento monitório é o instrumento para a constituição do título judicial a partir de um pré-título, a prova escrita da obrigação, em que o título se constitui não por sentença de processo de conhecimento e cognição profunda, mas por fatos processuais, quais sejam a não-apresentação dos embargos, sua rejeição ou improcedência". Vicente Greco Filho, Comentários ao procedimento sumário, ao agravo e à ação monitória, p. 52.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HOFFMAN, Paulo. Monitória efetiva ou cobrança especial? Uma proposta para que o processo monitório atinja seus objetivos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 978, 6 mar. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8052. Acesso em: 19 abr. 2024.