Capa da publicação Modelo de Sentença em Ação Indenizatória: morte por eletrocussão.
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Sentença - Indenização - Morte por eletrocussão

01/03/2017 às 20:40
Leia nesta página:

Caso versa sobre pleito de indenização por danos materiais e morais em razão da morte por eletrocussão de indivíduo, figurando no polo passivo sua companheira e filhas.

SENTENÇA

Vistos, etc.

Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO ajuizada por JOSEFA OLIVEIRA SILVA SANTOS, EDNA SANTOS DA CRUZ e MARIA ALCINA OLIVEIRA DA CRUZ, devidamente qualificadas nos autos, em desfavor da COELBA – COMPANHIA DE ELETRICIDADE DO ESTADO DA BAHIA S/A, também identificada no feito.

Alegam as autoras serem, respectivamente, companheira e filhas de Edvaldo Alves da Cruz, falecido em 17/10/2012, vítima de eletropressão por descarga elétrica na Avenida Beirute, s/n, bairro Nova Brasília, nesta cidade. Aduzem as demandantes que o de cujus, quando transitava pela avenida acima nominada, fora surpreendido com a queda de um cabo de eletricidade, que despencou do poste, vindo a atingir o mesmo, o qual veio a óbito.

Pugnam, deste modo, seja a empresa requerida condenada ao pagamento de uma pensão mensal aos requerentes no importe de 02 (dois) salários mínimos, a título de lucros cessantes, além do ressarcimento pelos gastos funerários no montante de R$ 2.550,00 (dois mil quinhentos e cinquenta reais) e pagamento da quantia de 1.700 (mil e setecentos) salários mínimos em face dos danos morais suportados.

Devidamente citada, a empresa acionada ofertou peça de contestação às fls. 40/63, levantando, em sede preambular, as teses de ilegitimidade passiva e ativa, requerendo ainda a denunciação da lide à seguradora Fairfax Brasil Seguros Corporativos. No mérito, defende a inexistência de ato ilícito praticado, alegando ainda, de forma subsidiária, a isenção de responsabilidade pela ocorrência de força maior, tendo o acidente ocorrido em virtude da ventania e fortes chuvas que alcançaram a região no dia dos fatos. Por fim, advoga a tese de não comprovação dos danos morais e materiais sofridos, requerendo, destarte, o julgamento de improcedência da demanda.

Réplica às fls. 96/97.

Indeferimento do pleito de denunciação da lide às fls. 98/101, tendo este Juízo admitido, por outro lado, o chamamento ao processo da seguradora (art. 101, inciso II, do CDC).

Agravo retido apresentado às fls. 108/112.

Laudo pericial adunado às fls. 142/160.

A Fairfax Brasil Seguros Corporativos S/A apresentou contestação às fls. 216/227, aduzindo, em apertada síntese, não terem as autoras se desincumbido do ônus de provar que o ato lesivo derivou de fato comissivo/omissivo da denunciante, não devendo se aplicar as regras de responsabilidade objetiva. Sustenta ainda tratar-se de caso fortuito e força maior, em razão dos ventos e chuva que assolaram a cidade no fatídico dia, devendo, em caso de ser julgada procedente a demanda, serem os valores fixados abatidos da pensão recebida do INSS. Por fim, defende que, caso seja estipulada indenização, sejam respeitadas as cláusulas contratuais estabelecidas entre denunciante e denunciado.

As autoras manifestaram-se acerca da contestação às fls. 283/284.

Audiência de instrução realizada no dia 29 de março de 2016 (termo de fls. 303).

Memoriais apresentados pelas autoras às fls. 306/312 e pela requerida às fls. 313/330.

Vieram-me os autos conclusos.

É o relatório.

Fundamento e decido.

Inicialmente, deve ser afastada a tese de ilegitimidade passiva da demandada, por suposta inexistência de relação jurídico material entre as partes. Alegar-se que a inclusão no polo passivo da ação deu-se de forma aleatória, e que não há sequer demonstração da ocorrência dos fatos, beira o absurdo, constituindo fato notório a circunstância de que a rede elétrica existente no Estado da Bahia é mantida pela requerida, devendo a responsabilidade pelos eventos danosos ser devidamente verificada quando da análise do mérito.

Na precisa lição do Professor JOSE FREDERICO MARQUES, sobre a legitimação para agir, nos ensina que "aquele que pede a tutela jurisdicional em relação a um litígio deve ser o titular da pretensão formulada ao Judiciário, e deve apresentá-la em face de quem é o sujeito passivo dessa mesma pretensão". (in Manual de Direito Processual Civil, 1º volume, 1ª ed. atual, Saraiva, 1997, p. 237).

No mesmo sentido é o escólio de Humberto Theodoro Júnior:

"Legitimados ao processo são os sujeitos da lide, isto é, os titulares dos interesses em conflito" (…). Como as demais condições da ação, o conceito da letigimatio ad causam só deve ser procurado com relação ao próprio direito de ação, de sorte que a legitimidade não pode ser senão a titularidade da ação" (in "Curso de Direito Processual Civil" - 25ª ed. - Rio de Janeiro: Forense, 1998, vol. 1, p. 57/58).

Para trazer ao contexto de sua aplicação, observo que o Código de Processo Civil adotou a teoria da asserção na análise da ilegitimidade ad causam. Seguindo essa linha, transcrevo parte do voto do ministro do Superior Tribunal de Justiça, Humberto Martins, no RESP. nº 879.188 – RS:

“De início, mostra-se saudável a lembrança de que a doutrina moderna, bem como, em decisões recentes, também o Superior Tribunal de Justiça, têm entendido que o momento de verificação das condições da ação se dá no primeiro contato que o julgador tem com a petição inicial, ou seja, no instante da prolação do juízo de admissibilidade inicial do procedimento. Trata-se da aplicação da teoria da asserção, segundo a qual a análise das condições da ação seria feita à luz das afirmações do demandante contida em sua petição inicial. Assim, basta que seja positivo o juízo inicial de admissibilidade, para que tudo o mais seja decisão de mérito”.

Diante do exposto, rejeito a preambular aventada.

De igual modo, não merece guarida jurídica a preliminar de ilegitimidade ativa da primeira acionante. De fato, como acima exposto, adotou o Código de Processo Civil a tese da asserção, de modo que as condições da ação devem ser analisadas à luz das afirmações deduzidas em Juízo, razão pela qual a condição de companheira pertine ao próprio mérito da demanda, mostrando-se prematura a sua análise em sede preambular.

No mérito, a responsabilidade civil da concessionária de energia elétrica mostra-se patente.

Primeiramente, esclareça-se que não há que se discutir a respeito da existência da culpa da demandada, pois como se trata de concessionária de serviço público, a responsabilidade é objetiva, à luz do art. 37 § 6º, da CF/88. A concessionária de serviço público responde com base no nexo causal pelos prejuízos que produzir, salvo se existir alguma exclusão de responsabilidade, como por exemplo, culpa exclusiva da vítima.

Comentando o § 6º, do artigo 37 da Constituição Federal, explicou Hely Lopes Meirelles:

O exame desse dispositivo - refere-se ao § 6º do art. 37 da CF- revela que o constituinte estabeleceu para todas as entidades estatais e seus desmembramentos administrativos a obrigação de indenizar o dano causado a terceiros por seus servidores, independentemente da prova de culpa no cometimento da lesão. Firmou, assim, o principio objetivo da responsabilidade sem culpa pela atuação lesiva dos agentes públicos e seus delegados. Em edições anteriores, influenciados pela letra da norma constitucional, entendemos excluídas da aplicação desse princípio as pessoas físicas e as pessoas jurídicas que exercem funções públicas delegadas, sob a forma de entidades paraestatais ou de empresas concessionários ou permissionárias de serviços públicos. Todavia, evoluimos no sentido de que também estas respondem objetivamente pelos danos que seus empregados, nessa qualidade, causarem a terceiros, pois, como dissemos precedentemente (cap. VI, item I), não é justo e jurídico que a só transferência da execução de uma obra ou de um serviço originariamente público a particular descaracterize sua intrínseca natureza estatal e libere o executor privado das responsabilidades que teria o Poder Público se executasse diretamente, criando maiores ônus de prova ao lesado.”(MEIRELLES, Hely Lopes. DIREITO ADMINISTRATIVO BRASILEIRO. 21. ed. São Paulo: Malheiros, p. 565).

Ainda sobre o tema, vale expor lição extraída da obra “Tratado de Responsabilidade Civil”, de Ruy Stoco, 5ª ed., 2001, p. 881:

“Entendemos, contudo, que a força atrativa da disposição contida no § 6º, art. 37, da Constituição Federal, é preponderante. Em casos que tais a concessionária dos serviço públicos de geração de energia elétrica responde, objetivamente, sem indagação de culpa ou sua mera presunção, nos limites da teoria do risco administrativo, pelos atos que seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros. (...)

In casu, a alegação de força maior ou caso fortuito mostra-se impertinente, considerando-se que as provas carreadas aos autos não demonstram a ocorrência de chuvas ou ventania extraordinária, capazes de romper os cabos de eletricidade.

Ao revés, o expert nomeado por este Juízo consignou, às fls. 142/150, que “os fatos das chuvas e ventos terem ocorrido por si só não influenciariam na ocorrência do acidente (…)”, tendo ainda concluído que o fio energizado no qual a vítima teve contato havia rompido de um poste de iluminação pública (fls. 156).

Outrossim, a testemunha Ronaldo Borges Dourado (mídia de fls. 305) afirmou, em sua oitiva em Juízo, ter visualizado o fio partido solto, ligado ao poste de iluminação pública. Registrou ainda que a referida fiação já havia se partido anteriormente, tendo sido emendado pela concessionária. Consignou, por fim, que não chovia nem ventava muito anteriormente ao evento fatídico, não tendo havido qualquer evento extraordinário da natureza apto a causar o desligamento da fiação do poste.

Por sua vez, o Sr. Pedro Roberval Souza Novais (mídia de fls. 305) informou que o fio já vinha faiscando há muito tempo, tendo sido realizada uma emenda no mesmo, após um rompimento anterior. Afirmou ainda que choveu um pouco antes do acidente, não tendo se prolongado muito.

Deste modo, não se extrai dos autos que houve culpa por parte da vítima que não poderia antever a descarga elétrica ao aproximar-se do local, não podendo adotar nenhuma atitude para evitar o acidente.

Em casos similares assim vem pronunciando os tribunais pátrios:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. MORTE POR CHOQUE ELÉTRICO EM FIO DE ALTA TENSÃO CAÍDO NO SOLO. CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR. INOCORRÊNCIA. ACONTECIMENTO DANOSO PREVISÍVEL E EVITÁVEL POR PARTE DA CEEE. CARACTERIZAÇÃO DO NEXO CAUSAL. DEVER DE REPARAR CONFIGURADO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. I. Preliminar de ilegitimidade passiva afastada, ante a responsabilidade solidária da CEEE após a sua cisão parcial. II. Inocorrência de caso fortuito e força maior, pois a tempestade não foi a causa adequada do evento morte do pai do autor e sim a conduta omissiva e negligente da ré, que, diante dos vários chamados dos moradores, não substituiu o poste e nem retirou, imediatamente, o fio de alta tensão caído no meio da via pública. Dano evitável e previsível. Evidenciado o nexo causal entre a omissão da ré em fornecer um serviço de qualidade, consubstanciada na má condição do poste com fio de alta tensão e na sua queda decorrente de tempestade. III. Manutenção da sentença que reconheceu a responsabilidade civil da demandada. Apelo improvido. Unânime. (TJ/RS Apelação Cível nº 70011522265, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Odone Sanguiné, julgado em 24/08/2005).

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RESPONSABILIDADE CIVIL. MORTE POR ELETROCUSSÃO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇOS PÚBLICOS. A companhia estadual de energia elétrica – CEEE responde objetivamente pelos danos causados ao transeunte, considerando o defeito na prestação de seus serviços. Presente a responsabilidade indenizatória oriunda da queda de fio de energia, que veio a ocasionar choque elétrico e morte do filho dos autores. Dano moral inconteste. São devidos os prejuízos materiais comprovados e pensionamento aos pais pela falta da contribuição do filho na economia familiar. Apelo da ré desprovido. Recurso adesivo provido, em parte. (TJ/RS Apelação Cível nº 70008903734, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Artur Arnildo Ludwig, julgado em 25/08/2004).

A companhia fornecedora de energia elétrica é obrigada a reparar o dano causado a terceiro se não adotou as devidas providências para regular conservação das instalações externas de sua rede de distribuição.” (TJPI – Cs. Reunidas – EInfrs. 98.000814-0 – Rel. Brandão de Carvalho – J. 07.04. 2000 – RT 781/360)

No caso sob debate, a conduta omissa da COELBA, concessionária de serviço público responsável pela transmissão e fornecimento de energia elétrica no Estado da Bahia, fora responsável pela ocorrência do evento danoso. A conservação e manutenção da rede elétrica e fiação, bem como dos postes de luz são obrigações legais da requerida. Havia, pois, o dever de agir. A não-atuação da concessionária expôs todos os cidadãos do Município a grande risco, culminando no falecimento do Sr. Edvaldo Alves da Cruz.

Fixada a responsabilidade da concessionária de energia elétrica, mister se faz avaliar a obrigação da segunda demandada no caso em comento.

Pela análise das cláusulas de exclusão estampadas nos documentos de fls. 229/250 e 251, verifica-se que nenhuma das hipóteses ali elencadas efetivou-se no caso concreto, aplicando-se, in casu, o enunciado sumular 537 do STJ, nos seguintes termos:

”Em ação de reparação de danos, a seguradora denunciada, se aceitar a denunciação ou contestar o pedido do autor, pode ser condenada, direta e solidariamente junto com o segurado, ao pagamento da indenização devida à vítima, nos limites contratados na apólice”.

Questão importante a ser enfrentada diz respeito à condição de companheira da primeira acionante, de forma a se verificar se a mesma faz jus ao recebimento de eventuais parcelas indenizatórias.

Compulsando-se os autos, constata-se que a demandante não logrou comprovar a existência de união estável ao tempo da morte da vítima. A foto adunada aos autos às fls. 18, nitidamente antiga, não serve de prova da sua condição de companheira, mormente em se considerando que a maioria dos documentos acostados aos autos, como a certidão emitida pelo Departamento de Polícia do Interior (fls. 24/25) e a guia de exame médico (fls. 28), consignam o estado civil do de cujus como sendo separado. Outrossim, a certidão de óbito de fls. 26 informa ser o falecido solteiro. Corrobora a tese aqui defendida o fato de ter sido a morte da vítima comunicada por sua filha Edna Santos da Cruz (fls. 26), tendo ela ainda arcado com os custos do serviço funerário.

Não obteve êxito ainda a primeira demandante em arrolar testemunhas que pudessem robustecer as informações trazidas na exordial, atendo-se as oitivas aos fatos ocorridos no fatídico dia, não tendo os arrolados discorrido sobre a eventual existência de união estável.

Não comprovada a existência de união estável ao tempo da morte, bem como a dependência financeira da autora em relação ao falecido, deve ser afastado o direito à percepção de indenização por danos morais, bem como de pensão. A propósito, confira-se:

TJ-RS - Apelação Cível AC 70064160609 RS (TJ-RS) Data de publicação: 15/06/2015 Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. ACIDENTE DE TRABALHO. AUTARQUIA ESTADUAL. MORTE DO OBREIRO. AÇÃO AJUIZADA PELA EX-ESPOSA DA VÍTIMA. CASAL SEPARADO DE FATO. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ÀINDENIZAÇÃO. A ex-esposa do falecido, dele separada de fato há mais de três anos à época do acidente, não faz jus à indenização por danos morais pela morte do ex-marido, ausente demonstração de que o casal tenha retomado a convivência amorosa. Improcedência, também, da pretensão ao recebimento de pensão por morte, quando inexiste prova da dependência econômica da ex-esposa com relação à vítima. Lições doutrinárias e precedentes jurisprudenciais. Sentença de improcedência confirmada. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70064160609, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Roberto Lessa Franz, Julgado em 28/05/2015).

Relativamente aos danos materiais pleiteados, tendo a segunda demandante arcado com os gastos dos serviços funerários, deve a mesma ser ressarcida da quantia despendida, no montante indicado na nota fiscal de fls. 32.

É incontestável o dano moral suportado pelas duas últimas autoras, diante da morte do genitor. Não custa ressaltar que é pacífico o entendimento de que a perda trágica e repentina de um ente querido é fato suficiente para ensejar a condenação em danos morais, por ser plenamente presumível que a angústia e a dor causadas pela ausência do falecido são sentimentos essencialmente subjetivos e que afetam exclusivamente o patrimônio real do indivíduo, uma vez que será privado para sempre da presença afetiva e do convívio daquele.

Yussef Said Cahali consigna:

“Não se cuida, assim, de ressarcir os danos materiais, apenas, como despesas com o tratamento da vítima, e seu funeral; mas sim de propiciar aos seus familiares ainda uma compensação pecuniária reparatória do dano moral, que lhes possibilite, para satisfação pessoal e conforto espiritual, tributar à memória do falecido e o preito de saudade e reverência póstuma. (Dano e Indenização , São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980, p. 42).

Os danos de ordem moral, na espécie, não reclamam prova robusta e são perfeitamente perceptíveis das circunstâncias do caso concreto, sendo de evidente sensibilidade e intelecção a grande dor produzida pelo inesperado e antecipado óbito de um ente familiar. A obrigação de reparar dano extrapatrimonial possui dupla finalidade: compensar o dano experimentado pela vítima e punir o ofensor, como bem leciona Carlos Roberto Gonçalves:

“Tem prevalecido, no entanto, o entendimento de que a reparação pecuniária do dano moral tem duplo caráter: compensatório para a vítima e punitivo para o ofensor. Ao mesmo tempo que serve de lenitivo, de consolo, de uma espécie de compensação para atenuação do sofrimento havido, atua como sanção ao lesante, como fator de desestímulo, a fim de que não volte a praticar atos lesivos á personalidade de outrem.” (Responsabilidade Civil; Saraiva; 8ª ed.; p. 566; 2003).

Não bastasse tanto, o dano moral deve ficar ao prudente arbítrio do julgador, de forma a compensar o dano, levando-se em conta as condições financeiras das partes. Em casos similares, tem o Superior Tribunal de Justiça fixado, em regra, o montante de 300 (trezentos) a 500 (quinhentos) salários mínimos, por familiar, a título de danos morais.

Ilustre-se com os seguintes jugados:

STJ - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL AgRg no REsp 1362073 DF 2013/0004943-8 (STJ) Data de publicação: 22/06/2015 Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE AÉREO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. PATAMAR RAZOÁVEL EM CONSONÂNCIA COM OS VALORES ESTIPULADOS POR ESTA CORTE EM CASOS ANÁLOGOS. SÚMULA 07/STJ. TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA. RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL. DATA DA CITAÇÃO. 1. A jurisprudência desta Corte Superior tem arbitrado, em regra, para as hipóteses de dano-morte, a indenização por dano moral em valores entre 300 e 500 salários mínimos. Montante arbitrado pelo Tribunal de origem que não representa condenação exorbitante. 2. Termo inicial dos juros de mora. Responsabilidade civil contratual. Contrato de transporte. Inteligência do artigo 405 do Código Civil. Dissídio entre o acórdão recorrido e a orientação desta Corte Superior. Modificação do marco inicial para a data da citação. 3. AGRAVO REGIMENTAL PARCIALMENTE PROVIDO.

STJ - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO AgRg no Ag 1195992 SP 2009/0093362-8 (STJ) Data de publicação: 17/02/2014 Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. MORTE DE MARIDO E PAI DOS AUTORES. DANO MORAL.INDENIZAÇÃO. REVISÃO DO VALOR. IMPOSSIBILIDADE. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. REFORMATIO IN PEJUS. 1. Admite a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, excepcionalmente, em recurso especial, reexaminar o valor fixado a título de indenização por danos morais, quando ínfimo ou exagerado. Valor estabelecido pela instância ordinária que não excede o fixado, em regra, pelos mais recentes precedentes desta Corte, de 500 salários-mínimos por familiar vitimado, em moeda corrente. 2. Os juros de mora devem ser mantidos nos termos em que determinado pelo Tribunal estadual não se aplicando, especificamente, ao caso ao Súmula 54/STJ, em virtude do princípio que veda a reformatio in pejus. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.

No que toca aos danos materiais, deve-se afastar, inicialmente, a tese de que eventuais valores fixados devam ser abatidos da pensão estabelecida pelo INSS, visto se tratarem de instâncias diversas de ressarcimento.

Aqui, importante destacar que a verba não merece qualquer desconto nos termos do apelo das partes. Conforme sedimentada jurisprudência, a percepção de pensão da entidade de seguridade social não elide a responsabilidade dos requeridos. A origem distinta não obsta a cumulação das verbas.

Nem mesmo se o dano fosse oriundo de acidente de trabalho, há exclusão da responsabilidade pelo ilícito (cf. Art. 121, da Lei8.213, de 1991). A natureza patronal da aposentadoria do INSS não serve de excludente da responsabilidade, tampouco de abatimento das verbas.

Neste sentido, iterativa a jurisprudência (REsp nº 750667/RJ e REsp nº 575839/ES), exemplifico: “A percepção de benefício previdenciário não exclui o pagamento de pensão mensal como ressarcimento por incapacidade decorrente de ato ilícito” (AgRg no Ag nº 1239557 RJ. Rel. Min. Maria Isabel Gallotti T4. J. 09.10.2012).

No tocante à pensão mensal vitalícia em favor das duas últimas autoras (danos materiais decorrentes da perda laborativa da vítima), impõe-se a sua fixação de acordo com a média mensal dos rendimentos de seu genitor, à base de 2/3 (dois terços) de sua remuneração, até a idade limite de 25 (vinte e cinco) anos, uma vez que se presume 1/3 (um terço) correspondente aos gastos da vítima (cf. STJ, REsp. 88973/PR), marco a partir do qual a pensão deve se limitar a 1/3 (um terço) dos rendimentos do falecido, perdurando tal obrigação até a data em que a vítima atingiria idade correspondente à expectativa média de vida do brasileiro, prevista na data do óbito, segundo a tabela do IBGE, ou até o falecimento dos eventuais beneficiários, se tal fato ocorrer primeiro.

Observo que o entendimento jurisprudencial dominante é no sentido de que, no caso de morte de genitor (a), é devida pensão aos filhos, mesmo que a vítima não exerça trabalho remunerado, ou não reste comprovado o valor dos rendimentos auferidos mensalmente, sendo, neste caso, adotado como base de cálculo o valor do salário-mínimo.

A propósito:

STJ - RECURSO ESPECIAL REsp 1201244 RJ 2010/0129627-2 (STJ) Data de publicação: 13/05/2015 Ementa: RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL.MORTE DE FILHO MENOR. QUEDA DE COMPOSIÇÃO FERROVIÁRIA. DANOS MORAIS E MATERIAIS PRETENDIDOS PELA MÃE E PELO PADRASTO DA VÍTIMA. MAJORAÇÃO DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. POSSIBILIDADE NO CASO DA GENITORA. VALOR IRRISÓRIO. FIXAÇÃO DE INDENIZAÇÃO SUBSTANCIALMENTE INFERIOR EM PROL DO PADRASTO. POSSIBILIDADE. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA Nº 7/STJ. DANOS MATERIAIS. PENSIONAMENTO MENSAL EM BENEFÍCIO DA GENITORA DA VÍTIMA. FAMÍLIA DE BAIXA RENDA. PRESCINDIBILIDADE DA PROVA DE EXERCÍCIO DE ATIVIDADE REMUNERADA PELO MENOR. 1. Ação indenizatória promovida pela mãe e padrasto de menor (15 anos) falecido em virtude de queda de composição férrea na qual viajava e que, de modo inadequado, trafegava com as portas abertas. 2. Recurso especial que veicula a pretensão dos autores (i) de fixação de pensionamento mensal a título de danos materiais e (ii) de majoração das indenizações arbitradas pela Corte local a título de reparação pelos danos morais suportados pela mãe (R$ 83.000,00) e pelo padrasto (R$ 5.000,00) do falecido menor. 3. Em se tratando de família de baixa renda, é devida a indenização por danos materiais, sob a forma de pensionamento mensal, em prol dos genitores de menor de idade falecido em decorrência de ato ilícito, independentemente da comprovação de que este exercia, quando em vida, atividade remunerada. 4. Consoante a jurisprudência desta Corte, a pensão mensal em tal situação deve ser fixada no patamar de 2/3 (dois terços) do salário mínimo, desde os 14 anos de idade da vítima (data em que o direito laboral admite o contrato de trabalho), devendo ser reduzida para 1/3 (um terço) do salário após a data em que esta completaria 25 anos (quando possivelmente constituiria família própria, reduzindo a sua colaboração no lar primitivo), perdurando tal obrigação até a data em que a vítima atingiria idade correspondente à expectativa média de vida do brasileiro, prevista na data do óbito, segundo a tabela do IBGE.

Assim, levando-se em consideração que a segunda demandante, Edna Santos da Cruz, conta atualmente com 25 (vinte e cinco) anos de idade, são devidas as parcelas vencidas, na proporção de 2/3 (dois terços) do salário mínimo, desde a data do acidente (17/10/2012) até o momento em que a mesma completou 25 (vinte e cinco) anos (24/2/2015), data a partir da qual serão devidos apenas no montante de 1/3 (um terço) do salário mínimo vigente, tendo como termo final a data em que o de cujus completaria 74 (setenta e quatro) anos de idade (17/06/2034), ou até o falecimento da beneficiária, se tal fato ocorrer primeiro.

Relativamente à terceira acionante, Maria Alcina Oliveira da Cruz, que tem atualmente 22 (vinte e dois) anos de idade, são devidas as parcelas vencidas, na proporção de 2/3 (dois terços) do salário mínimo, desde o dia do acidente (17/10/2012) até a presente data, devendo, ao completar 25 (vinte e cinco) anos de idade, passar a receber a pensão na proporção de 1/3 (um terço) do salário mínimo vigente, tendo como termo final a data em que o de cujus completaria 74 (setenta e quatro) anos de idade (17/06/2034), ou até o falecimento da beneficiária, se tal fato ocorrer primeiro.

Por todo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão autoral, condenando as requeridas, solidariamente, ao pagamento do montante de R$ 352.000,00 (trezentos e cinquenta e dois mil reais), correspondente a 400 (quatrocentos) salários mínimos, a cada uma das duas últimas demandantes, a título de danos morais, corrigidos a partir do arbitramento (súmula 362 do STJ) e juros de mora desde o evento danoso (súmula 54 do STJ), bem como ao pagamento das parcelas vencidas da pensão estabelecida em sede de fundamentação, com juros e correção a partir do vencimento de cada montante, além das parcelas vincendas, devendo ainda ressarcir a segunda demandante no importe de R$ 2.250,00 (dois mil duzentos e cinquenta reais), com correção monetária e juros de mora a partir do efetivo prejuízo (23/12/2012).

Com o escopo de garantir o efetivo pagamento das parcelas alimentares, antecipo os efeitos da tutela, em sede de sentença, neste ponto, determinando que a empresa requerida inclua as beneficiárias em folha de pagamento, no prazo de 10 (dez) dias, sob pena de incidência de multa diária no importe de R$ 2.000,00 (dois mil reais), bem como apuração do delito de desobediência.

Condeno as requeridas, solidariamente, ao pagamento de 2/3 (dois terços) das custas processuais e a primeira demandante ao pagamento do terço restante, cujo valor deverá ser certificado pelo cartório, suspendendo, entretanto, a exigibilidade, em relação à autora, em razão da gratuidade deferida (fls. 37).

Condeno ainda as demandadas, solidariamente, ao pagamento dos honorários advocatícios às duas últimas autoras, estes fixados no total de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, visto estarem ambas patrocinadas pelo mesmo causídico. Condeno, por fim, a primeira demandante ao pagamento de honorários, que ora arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, suspendendo, entretanto, a exigibilidade, em razão da gratuidade deferida (fls. 37).

P.R.I.

Considerando-se o enunciado sumular n° 410 do Superior Tribunal de Justiça, intime-se a concessionária de energia elétrica também por carta com aviso de recebimento.

 09 de maio de 2016.

CÍCERO DANTAS BISNETO

JUIZ DE DIREITO

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Sobre o autor
Cicero Dantas Bisneto

Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia. Ex-Procurador do Estado do Estado de São Paulo. Especialista em Direito Civil pela Universidade Federal do Estado da Bahia

Informações sobre o texto

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