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Réplica em ACP contra taxa de iluminação pública: legitimidade do MP

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01/05/2000 às 00:00
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4. DA TAXA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA COMO RELAÇÃO DE CONSUMO

          Diversos arestos, bem como parte da doutrina, têm propugnado pela distinção existente entre os conceitos de contribuinte e consumidor.

          Tal distinção merece mitigação, no nosso entender, no tocante à taxa de iluminação pública.

          Senão vejamos.

          A Constituição Federal, em seu artigo 145, II, afirma que:

          Art. 145 - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:I – omissis....;

          II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;

          E o Código Tributário Nacional, em seu artigo 77, reafirma:

          ART.77 - As taxas cobradas pela União, pelos estados, pelo Distrito Federal ou pelos municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.

          Em ambos dispositivos fica explícito que a taxa é uma contraprestação paga pelo consumidor-contribuinte pelo exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis.

          No mesmo diapasão, o Código de Defesa do Consumidor determina que:

          Art. 3º - Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

          O olhar perfunctório sobre o dispositivo leva o intérprete a entender que o Poder Público, quando vendedor de produtos ou prestador de serviços, traduz-se em fornecedor para o CDC.

          Mas adverte José Geraldo Brito Filomeno:

          "Quando aqui se tratou do conceito de fornecedor, ficou consignado que também o Poder Público, enquanto produtor de bens ou prestador de serviços, remunerados não mediante a atividade tributária em geral (impostos, taxas e contribuições de melhoria), mas por tarifas ou ‘preços públicos’, se sujeitará às normas ora estatuídas, em todos os sentidos e aspectos versados pelos dispositivos do novo Código do Consumidor, sendo, aliás, categórico o seu art. 22." (Cf.: Código Brasileiro....., p. 87/88).

          Na exata observação do doutrinador citado, a "taxa" de iluminação pública não constitui, às escâncaras, verdadeiramente uma taxa, posto que, e aí reside sua inconstitucionalidade e ilegalidade, não é serviço público específico e divisível.

          Em amparo à tese, com a maestria de sempre, Sacha Calmon Navarro Coêlho, verbera:

          "O nosso posicionamento já foi antecipado. A nós interessa o regime jurídico adotado pelo legislador com escora, é claro, constitucional. Assim:

          a) quando o Estado exerce poder de polícia é de taxa e só dela que se pode cogitar;

          b) quando o Estado diretamente presta serviço público stricto sensu, o caso é, também, de taxa;

          c) quando o Estado, porém, engendra instrumentalidades, para em regime de Direito Privado, embora sob concessão, prestar serviços de utilidades tais como fornecimento de gás, luz, transporte, energia, telefonia etc. (atividade econômica), admitimos em casos tais a adoção do regime de preços. (In Curso de Direito Tributário Brasileiro, Ed. Forense, 1999, p. 417)

          Dessarte, não havendo especificidade, assim como divisibilidade, a "taxa" de iluminação pública não passa de mero preço em cujas relações jurídicas incide as normas do Código de Defesa do Consumidor.

          "Por outro lado, considera-se específico o serviço que pode ser destacado em unidades autônomas para a sua prestação, e divisível o que suscetível de utilização, separadamente, por parte de cada usuário. Não pressupõe a cobrança de taxa a prestação de serviços em caráter geral...." (Cf.: Manual de Direito Tributário, Adilson Rodrigues Pires, Ed. Forense, 4ª edição, p. 26)

          Como demonstrado, não se tratando de relações jurídicas tributárias; da mesma forma, havendo relevância social na demanda, legítimo o Ministério Público para aviar ação civil pública para a defesa de interesses individuais homogêneos posto que espécie de interesses sociais.

          Do Mérito

          Como cediço, a jurisprudência ampara a tese da inconstitucionalidade e ilegalidade da "taxa" invectivada.

          Permitimo-nos a transcrição a título de ilustração:

          AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DEFESA DE INTERESSES E DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS – TAXA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA – POSSIBILIDADE – A Lei nº 7.345, de 1985, é de natureza essencialmente processual, limitando-se a disciplinar o procedimento da ação coletiva e não se entremostra incompatível com qualquer norma inserida no Título III do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90). É princípio de hermenêutica que, quando uma lei faz remissão a dispositivos de outra lei de mesma hierarquia, estes se incluem na compreensão daquela, passando a constituir parte integrante do seu contexto. O artigo 21 da Lei nº 7.345, de 1985 (inserido pelo artigo 117 da Lei nº 8.078/90), estendeu, de forma expressa, o alcance da ação civil pública à defesa dos interesses e "direitos individuais homogêneos", legitimando o Ministério Público, extraordinariamente e como substituto processual, para exercitá-la (artigo 81, parágrafo único, III, da Lei nº 8.078/90). Os interesses individuais, in casu (suspensão do indevido pagamento de taxa de iluminação pública), embora pertinentes a pessoas naturais, se visualizados em seu conjunto, em forma coletiva e impessoal, transcendem a esfera e interesses puramente individuais e passam a constituir interesses da coletividade como um todo, impondo-se a proteção por via de um instrumento processual único e de eficácia imediata – "a ação coletiva". O incabimento da ação direta de declaração de inconstitucionalidade, eis que, as Leis Municipais nos 25/77 e 272/85 são anteriores à Constituição do Estado, justifica, também, o uso da ação civil pública, para evitar as inumeráveis demandas judiciais (economia processual) e evitar decisões incongruentes sobre idênticas questões jurídicas. Recurso conhecido e provido para afastar a inadequação, no caso, da ação civil pública e determinar a baixa dos autos ao Tribunal de origem para o julgamento do mérito da causa. (STJ – REsp 49.272-6 – RS – Rel. Min. Demócrito Reinaldo – DJU 17.10.94)

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          TAXA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA – ILEGALIDADE – É ilegal a cobrança de taxa em razão da prestação do serviço de iluminação pública, por seu caráter genérico e indivisível, prestado à coletividade como um todo, sem benefício direto para determinado contribuinte. (STJ – REsp 38.186 – RJ – 2ª T – Rel. Min. Peçanha Martins – DJU 24.03.97)

          Por tratar-se de matéria apenas de direito e tendo em vista a fundamentação exposta, requer o Ministério Público o julgamento antecipado da lide, para se julgar pela procedência do pedido inicial.

          Governador Valadares, 20 de fevereiro de 2000.

RENATO FRANCO DE ALMEIDA
Promotor de Justiça


NOTA

  1. Santos, Moacyr Amaral, Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, ed. Saraiva, 3º vol., p.25/26
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Sobre o autor
Renato Franco de Almeida

promotor de Justiça em Governador Valadares (MG), pós-graduado em Direito Público, professor da Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce (FADIVALE)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Renato Franco. Réplica em ACP contra taxa de iluminação pública: legitimidade do MP. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 41, 1 mai. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16204. Acesso em: 29 mar. 2024.

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