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A jurisdição na Grécia do período clássico e no Direito Romano.

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Agenda 13/10/2022 às 18:25

4. OUTRAS CONSIDERAÇÕES E CONCLUSÕES

A ideia do uso de meios adequados de solução de conflitos, em especial dos chamados meios autocompositivos, vem se desenvolvendo há um bom tempo no País, e o excesso de processos no Poder Judiciário, com tempo de resolução médio de vários anos, acabou por deixar clara a necessidade de uma mudança jurídica e cultural. No entanto, a ideia de jurisdição parecia um empecilho à efetiva aplicação de novos meios juridicamente válidos, o que se deve, em parte, a ideologias como a legalidade e a estatalidade, sendo alguns de seus efeitos largamente sentidos pela sociedade, como a renúncia à ideia de coisa pública, o alto custo de manutenção da máquina pública, a ilegitimidade dos representantes, o excesso burocrático e a ausência, nas decisões, de efetiva participação do povo, transformado em povo-ícone, como acentua Darci Guimarães Ribeiro (RIBEIRO, 2010, p. 96-98):

Quando entramos no discurso democrático, o primeiro termo aberto é o povo. Não há dúvida que tal elemento deve integrar o conceito de democracia, na medida em que a própria palavra nasce para referi-lo. Contudo, qual o papel do povo no discurso democrático? Seria o pressuposto para a atuação do Estado? Seria ele mero símbolo para validar o discurso da democracia? [...] muitas são as definições possíveis de povo [...]: povo como meio de legitimar o Estado, povo-ativo (participante das decisões políticas); povo como instância global de atribuição de legitimidade, povo-ícone; e o povo como destinatário das decisões e atuações públicas. Convém destacar, inicialmente, que a maioria das constituições modernas menciona a palavra povo como pilar de sustentação do Estado Democrático. Isto é, o Estado Democrático de Direito busca sua justificação pretende sua legitimação a partir do povo. Nessa perspectiva, tal definição de povo o enquadra na célebre frase de Lincoln the government of the people na medida em que o governo está instituído por ele o povo-legitimador. Tal povo não é palpável, verificável, é apenas fonte de validade do poder estatal. Por outro lado, aquele que irá ditar os caminhos do Estado no que tange às suas estruturas políticas vigentes, é o denominado povo-ativo. Aquele que se constitui no legítimo destinatário dos direitos políticos e tem soberanamente a prerrogativa de, tempo a tempo, alterar os que representam seus desidérios através do processo eleitoral. Enfim, povo ativo é o titular dos direitos políticos e aquele que possibilita o governo do povo, the government of the people, le gouvernement du peuple. Porém, o mais presente povo é o mais sorrelfo deles. É aquele que é invocado, mas nunca se vê. É aquele cuja legitimidade não se faz presente no sistema. É o denominado povo-ícone. E se traduz naquela imagem de povo que é verbalizada pelos seus representantes e cujas decisões não são atribuíveis ao próprio povo em termos de direito vigente, mas, tão somente, como palavra vã de falsa legitimidade. Em outros termos, se é o povo quem dita os critérios de escolha e decisão do Estado que deverá sempre agir em consonância com o ordenamento jurídico então toda a resolução estatal deve subsumir-se aos textos democraticamente postos e, em não o fazendo, teríamos o uso da palavra povo como meio para tornar válido algo que na origem não o é.

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Temos que o povo-ícone é resultado da democracia, sendo a razão pela qual as decisões estatais (governamentais) frequentemente atendem apenas interesses de grandes empresas, de corporações ou de movimentos sociais, e, raramente, de todos os indivíduos. A icônica (sem ironia) frase de Abraham Lincoln faz-nos pensar que os pais-fundadores dos Estados Unidos não desejavam a democracia, mas a res publica do ideal romano. Não por acaso Platão tinha a democracia como uma forma degenerada de governo ou tendente à degeneração. O povo ícone somente pode transformar-se em povo ativo a partir do momento em que tomar consciência da sua necessária participação na vida pública, e isso inclui a participação na própria jurisdição, uma espécie de autojurisdição, pacífica e obediente às normas legislativas, provida a partir do ato justo e racional e da composição com o outro. Eis a nova jurisdição do acordo.


REFERÊNCIAS

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução: Edson Bini. 4. ed. São Paulo: Edipro, 2014.

BORGES, Guilherme Roman. O direito constitutivo: um resgate greco-clássico do Νόμιμον ἔθορ como Εὐηαξία Νόμιμη e Δικαζηηκή Ἄζκηζη. 2011. Tese (Doutorado em Direito)Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Justiça em números 2021. Brasília: CNJ, 2021.

CRETELLA JR., José. Curso de direito romano: o direito romano e o direito civil brasileiro no Novo Código Civil. 31. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

JUSTINIANO I. Digesto de Justiniano: livro segundo: jurisdição. Tradução: José Isaac Pilati. Florianópolis: Ed. da UFSC/FUNJAB, 2013.

SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Jurisdição e execução na tradição romano-canônica. 2. ed. rev. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

RIBEIRO, Darci Guimarães. Da tutela jurisdicional às formas de tutela. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2010.

Sobre o autor
Tarciano José Faleiro de Lima

Auditor-Fiscal do Município de Porto Alegre. Pós-graduado em Direito Público e Gestão Pública. Professor. Escritor.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Tarciano José Faleiro. A jurisdição na Grécia do período clássico e no Direito Romano.: Aportes históricos para os meios adequados de solução de conflitos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 7043, 13 out. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/100567. Acesso em: 23 nov. 2024.

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