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A ética do advogado na fixação dos honorários convencionais

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Agenda 17/03/2008 às 00:00

III. PRINCÍPIOS ÉTICOS ATINENTES AO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA: DIREITOS, GARANTIAS E DEVERES BASILARES DO ADVOGADO

A classe dos profissionais da advocacia, exatamente pela importância de sua atividade, deve representar uma categoria que faculta a instrumentalização da justiça. Vê-se, por esse ângulo, que a importância da atuação do advogado para a manutenção do Estado Democrático de Direito, fundado na soberania, na cidadania, na dignidade da pessoa humana, nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, bem como no pluralismo político, foi formalmente reconhecida pelo Direito Brasileiro.

Deste modo, firmou-se, constitucionalmente, o papel indispensável do advogado para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária que objetiva desenvolver-se erradicando a pobreza e a marginalização, reduzindo as desigualdades sociais e regionais, além de promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

No que tange ao regramento infraconstitucional, o próprio Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil, dispõe, conforme texto do seu artigo 1º, que "o exercício da advocacia exige conduta compatível com os preceitos deste Código, do Estatuto, do Regulamento Geral, dos Provimentos e com os demais princípios da moral individual, social e profissional".

Assim, no que tange ao exercício desse múnus público, tem-se que o raciocínio do advogado deve se medir não somente pelos regramentos legais, mas também pelas necessidades sociais e pelas condições do exercício da cidadania do país. Esse é o primeiro compromisso ético do profissional militante da advocacia, que é, a um só tempo, uma obrigação para com a classe a qual representa, para com o cliente e para com a sociedade. Neste sentido, as majestosas lições do causídico Antonio Claudio Mariz de Oliveira:

Os advogados, por sua vez, nos dias atuais, devem, mais do que nunca, assumir a dimensão social da profissão. O seu ranço elitista, extremamente individualista, deve ser definitivamente afastado, pois outros são os tempos, outras são as necessidades, outro é o país, outra, pois, deve ser a postura, voltada para o contexto social em que se encontram inseridos [18]

3.1. Direitos e garantias do profissional da advocacia

Em razão da função social desempenhada pelo advogado, tendo em vista o papel que lhe atribuiu a sociedade e o Estado Democrático de Direito, indispensável se torna garantir condições adequadas para o exercício de seu mister. Assim, o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil – Lei nº. 8.906/94 – em seus artigos 6º e 7º ocupa-se em definir direitos e garantias ao exercício da advocacia, introduzindo um avanço, sob o ponto de vista da técnica legislativa, na medida em que deu uma precedência a tais disposições em relação ao corpo legislativo.

Destarte, mais do que destinados à categoria, tais prerrogativas garantem a toda a sociedade o perfeito exercício da garantia constitucional de um direito à postulação, por intermédio do qual a parte exerce o contraditório e a ampla defesa. Se houvesse obstáculos ao exercício da advocacia no Estado de Direito, o advogado não poderia defender a contento seu cliente.

Outrossim, destacaremos apenas algumas das garantias concedidas aos profissionais advocatícios, em especial as que digam respeito à sua atuação ética, tendo em vista a amplitude com que se inserem no ordenamento jurídico pátrio.

3.1.1 Inviolabilidade no exercício da advocacia

A norma constitucional que determina a indispensabilidade do causídico para a administração da justiça e a inviolabilidade de seus atos e manifestações quando do desempenho do múnus público ecoa no Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, que também se refere, no artigo 2º, ao que determina o preceito da Lei Maior.

De forma complementar,o artigo 7º, em seu parágrafo 2º, estabelece imunidade profissional para o advogado, não constituindo injúria, difamação ou desacato puníveis quaisquer demonstrações de sua parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a entidade de classe, pelos excessos que cometer.

Deste modo, o Estatuto cumpre sua função jurídica de norma regulamentadora da disposição constitucional. Assim, não há instituição legal de inviolabilidade, o que não seria técnico, mas mera reafirmação da previsão da Constituição Federal, passando, em seguida, a sua regulamentação. Além disso, é instituída por lei a imunidade profissional do advogado. Em ambos os casos, inviolabilidade e imunidade são justificadas pela função social da advocacia, e do advogado, e pelo tipo de atuação que dele se espera.

Destarte, é preciso lembrar que o processo é, via de regra, o encontro de pretensões antagônicas e, de conseqüência, de enforques e versões opostas da realidade pensada, seja em relação ao fato em si ou como tal circunstância é narrada e posteriormente submetida à avaliação e convencimento do Magistrado. Para bem representar seu cliente, é necessário, por óbvio, que o causídico esteja munido de liberdade para alegar e argumentar.

De modo semelhante ao acima relatado, registrem-se as palavras do doutrinador Gladston Mamede:

Seria absurdo incriminar o advogado pelos fatos que, sem a intenção (dolo) de lesar a parte alheia ou criar-lhe prejuízo indevido, narra conforme lhe foi transmitido pelo cliente, criando em seu espírito um temor que representaria uma lesão à garantia constitucional de que goza seu representado de acesso ao Judiciário, contraditório e ampla defesa. Em fato, se o advogado censura na narrativa do cliente determinados pontos relevantes, por temer as conseqüências para si de os submeter ao Judiciário, estar-se-ia [sic] retirando do cidadão um meio e um recurso necessários para concretizá-la. Coerente com esta situação, o inciso I, do artigo 142 do Código Penal prevê que ‘não constituem injúria ou difamação punível a ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou por seu procurador’. Seria absurdo se o advogado não pudesse pôr em dúvida a veracidade de um documento, se não pudesse questionar uma assinatura (...) isso representaria exigir-lhe o dever de investigações preliminares sobre as alegações do cliente, o que a lei não faz e a Constituição da República não permite. [19]

3.1.1.1 Inviolabilidade do escritório e das comunicações

De acordo com o inciso II do artigo 7º, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, o advogado tem direito a ter respeitada, "em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, de seus arquivos e dados, de sua correspondência e de suas comunicações". Em boa medida, tais direitos encontram guarida em garantias constitucionais genéricas, mas ganham contornos específicos no âmbito da advocacia. É o que se passa com a garantia assegurada pela Constituição de 1988 de inviolabilidade domiciliar, inserta no artigo 5º. XI, bem como a inviolabilidade das comunicações, cuja previsão se infere da norma do artigo 5º, XII.

Assim, quando o legislador menciona o escritório ou local de trabalho, cria uma referência ampla, no sentido de que, independentemente do local em que o advogado trabalhe, ele será inviolável. Pode ser todo um prédio, um andar, uma sala ou um conjunto de salas, ou até mesmo um ambiente em casa.

Considerando-se ainda que o legislador também se referiu à inviolabilidade dos arquivos e dados do advogado, estarão eles acobertados pela regra em todo e qualquer ambiente e situação onde se encontrem. Se numa apreensão de documentos ou de computadores do constituinte são levados documentos ou máquinas nas quais se encontrem arquivos ou dados pertencentes ao causídico, são eles invioláveis, em respeito à garantia constitucional e legal, cabendo ao Judiciário verificar a veracidade e a adequabilidade do argumento para, reconhecida sua procedência, impedir a utilização dos dados como prova, face à ilicitude de sua obtenção, bem como determinar a indenização pelos danos econômicos ou morais que se tenham verificado.

O mesmo se aplica aos meios de comunicação, sendo assim invioláveis os procedimentos de comunicação estabelecidos pelo advogado no exercício de sua profissão, sejam constituídos por qualquer meio, inclusive telefônico e afins, como se lê no texto do Estatuto.

3.1.1.2 Exceções ao princípio da inviolabilidade

Existem hipóteses excepcionais em que se pode violar o ambiente profissional do advogado e suas comunicações. Um delas é por intermédio de medida judicial de busca e apreensão, que deverá ser decretada por Magistrado, no exercício de sua competência e respeitadas as regras do devido processo legal, sempre no âmbito de previsão legal.

Para além dessa exceção, deve-se ressaltar aquelas que, de modo supletivo, estão arroladas na Constituição Federal, visando proteger direitos e interesses da coletividade, de terceiros, bem como precaver-se de situações extraordinárias. Assim, no que diz respeito à inviolabilidade do local de trabalho do causídico, excepcionam-se, ainda, as situações de flagrante delito ou desastre, prestação de socorro, ou por determinação judicial, a exemplo da penhora e do cumprimento do mandado de prisão. Deve-se, também, respeitar as situações de legítima defesa própria, como na fuga, ou te terceiros, além dos casos de estado de necessidade.

No plano da inviolabilidade das comunicações, deve-se levar em conta as disposições constantes da Lei nº. 9.296/96, que autoriza a interceptação telefônica, mas tão somente se a investigação disser respeito à pessoa do advogado, nunca em relação a seus clientes. Ademais, havendo gravações, somente poderão ser utilizadas como prova aquelas que se refiram ao objeto específico de averiguação em torno do qual se inserir o causídico.

3.1.2 Independência do advogado

O Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil preceitua como requisito de inscrição prestar compromisso perante o conselho, no qual se insere o direito de desempenhar sua atividade com independência.

O conceito de independência, que se impõe como prerrogativa da profissão do advogado, compreende a ausência de toda forma de ingerência, interferência de vínculos e pressões advindas do exterior tendenciosos a influenciar, desviar ou distorcer a ação do ente profissional na consecução de seus fins institucionais e a atividade exercida pelos colegiados no desempenho de sua profissão.

Procurando criar condições para essa independência, mas também visando a impedir a captação de eventual clientela favorecida pelo exercício de funções públicas, o que configuraria uma concorrência desleal com a classe, o legislador pátrio estatuiu tipos de incompatibilidades e impedimentos decorrentes da investidura em cargos e funções públicas, a teor do que dispõe o artigo 28, da Lei nº. 8.906/94, considerando incompatíveis com a advocacia as seguintes funções e cargos, ainda que exercidos em causa própria:

Art. 28. A advocacia é incompatível, mesmo em causa própria, com as seguintes atividades:

I - chefe do Poder Executivo e membros da Mesa do Poder Legislativo e seus substitutos legais;

II - membros de órgãos do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos tribunais e conselhos de contas, dos juizados especiais, da justiça de paz, juízes classistas, bem como de todos os que exerçam função de julgamento em órgãos de deliberação coletiva da administração pública direta e indireta;

III - ocupantes de cargos ou funções de direção em Órgãos da Administração Pública direta ou indireta, em suas fundações e em suas empresas controladas ou concessionárias de serviço público;

IV - ocupantes de cargos ou funções vinculados direta ou indiretamente a qualquer órgão do Poder Judiciário e os que exercem serviços notariais e de registro;

V - ocupantes de cargos ou funções vinculados direta ou indiretamente a atividade policial de qualquer natureza;

VI - militares de qualquer natureza, na ativa;

VII - ocupantes de cargos ou funções que tenham competência de lançamento, arrecadação ou fiscalização de tributos e contribuições parafiscais;

VIII - ocupantes de funções de direção e gerência em instituições financeiras, inclusive privadas [20].

Não incidem na incompatibilidade do inciso III supramencionado os que não detenham poder de decisão sobre interesses de terceiro, a juízo do Conselho competente da Ordem dos Advogados do Brasil, bem como a administração acadêmica diretamente relacionada ao magistério jurídico. Em relação ao inciso II do artigo 28, consta do Regulamento Geral de Advocacia que a disposição legal não se aplica aos advogados que participam dos órgãos nele referidos, na qualidade de titulares ou suplentes, representando a categoria dos advogados, ficando, entretanto, impedidos de exercer a advocacia perante os órgãos que atuam, enquanto durar a investidura. Vale ressaltar, por oportuno que a incompatibilidade permanece mesmo que o ocupante do cargo ou função deixe de exercê-lo temporariamente.

Por incompatibilidade, entende o legislador o conflito total de qualquer atividade, função ou cargo público, com o exercício da advocacia, enquanto que o impedimento consiste num conflito parcial com o desempenho das atividades atinentes ao advogado.

Destarte, configuram impedimento ao exercício do munus público da advocacia os seguintes cargos, a par do que dispõe o artigo 30, parágrafo único, da Lei 9.806/94:

Art. 30. São impedidos de exercer a advocacia:

I - os servidores da administração direta, indireta e fundacional, contra a Fazenda Pública que os remunere ou à qual seja vinculada a entidade empregadora;

II - os membros do Poder Legislativo, em seus diferentes níveis, contra ou a favor das pessoas jurídicas de direito público, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações públicas, entidades paraestatais ou empresas concessionárias ou permissionárias de serviço público [21].

3.1.3 Igualdade entre juízes e promotores

Estabelece o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil não haver hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público. Deste modo, a todos corresponde o direito, assim como o dever de tratarem-se reciprocamente com consideração e respeito. A compreensão muitas vezes hierarquizada da sociedade retira do profissional da advocacia a devida legitimidade que lhe confere o Estado Democrático de Direito, por intermédio de disposição constitucional.

Para Gladston Mamede, a igualdade entre o advogado e os demais componentes do poder jurisdicional deve ser efetivada por meio do respeito mútuo, que lhes permite um combate saudável para que o causídico possa cumprir sua função social, que é a defesa sos interesses do cliente. Nas palavras do emérito doutrinador:

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Em virtude do artigo 6º do Estatuto, tem-se a afirmação legal de um poder-dever que não se dirige apenas aos advogados e membros do parquet. Dever de não pretenderem-se uns acima dos outros, assim como o dever de não se pretenderem [sic] uns abaixo dos outros; simultaneamente, o poder de não aceitar pretensões ilegítimas de superioridade. Sendo o Estatuto uma lei federal, estabelece-se uma regra geral definidora da inexistência de posições hierárquicas, bem como do dever de respeito mútuo, o que não se confunde com apatia: o advogado deve respeitar os outros agentes e participantes processuais, mas não está privado de combatividade; pelo contrário, essa combatividade é um dever seu, para com a classe e para com o cliente, como se afere do artigo 2º do Estatuto. Mas um dever que obrigatoriamente será exercido por polidez e civilidade [22].

Neste sentido, embora o advogado tenha posição igualitária em relação aos partícipes do processo, permite-se ao Juiz, no exercício de suas funções, a titularização de determinados poderes de modo a coibir abusos praticados não somente pelo causídico, como também pelo membro do Ministério Público. Exemplo disso é a possibilidade de o Magistrado ordenar a retirada de audiência daquele que faltar com o decoro durante sua realização, bem como supressão dos escritos injunriosos ou de baixo calão utilizados pelo profissional jurídico no decorrer do processo.

3.1.4 Comunicação com o cliente

É fundamental que o patrono tenha acesso àquele cujo interesse pretende amparar para que haja, efetivamente, um momento de discussão e troca de informações entre ambos, de modo a que o profissional jurídico possa instruir-se sobre o fato, e, em contrapartida, instruir o defendido.

Nesse ínterim, o Estatuto da categoria garante ao advogado o direito de se comunicar, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração, com o cliente preso, detido ou recolhido em estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados incomunicáveis. Antes de mais nada, reconhece a norma inserta no inciso III do artigo 7º da mencionada lei que não se deve confundir defesa com representação, considerando-se, em inúmeros casos, o fato de que o profissional da advocacia é chamado para examinar a situação do cliente que se encontra preso e, na urgência das circunstâncias, a procuração é elemento de valor irrisório, face à gravidade do ato de coação, cuja legalidade ou não caberá ao causídico investigar e questionar.

Desta forma, basta o advogado apresentar-se como defensor do preso para ter o direito de se entrevistar com ele. Não pode a autoridade que mantém o cliente em custódia impedir o exercício pelo causídico de seu direito de comunicação pessoal e reservada com aquele, sob a alegação de que o mesmo está incomunicável.

É evidente que, sendo proibida a incomunicabilidade até mesmo em situações excepcionais, nas quais o Governo deve tomar medidas enérgicas para preservar a ordem pública ou a paz social, podendo por isso restringir direitos, obviamente não poderá retirar a comunicabilidade do preso em situações de normalidade. Com efeito, a Constituição vigente assegura ao preso a assistência da família e de advogado, determinando que sua prisão seja comunicada imediatamente ao Juiz competente e a quem o preso indique. Não havendo nenhuma ressalva a esses direitos nos dispositivos constitucionais, não pode a lei possibilitar a incomunicabilidade do preso em hipótese alguma.

3.1.5 Livre ingresso e permanência em repartições públicas, judiciárias ou não

O artigo 7º, inciso VI, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil estabelece a favor dos profissionais da advocacia um direito de livre acesso a diversos recintos, quais sejam:

Art. 7º. omissis

VI - ingressar livremente:

a) nas salas de sessões dos tribunais, mesmo além dos cancelos que separam a parte reservada aos magistrados;

b) nas salas e dependências de audiências, secretarias, cartórios, ofícios de justiça, serviços notariais e de registro, e, no caso de delegacias e prisões, mesmo fora da hora de expediente e independentemente da presença de seus titulares;

c) em qualquer edifício ou recinto em que funcione repartição judicial ou outro serviço público onde o advogado deva praticar ato ou colher prova ou informação útil ao exercício da atividade profissional, dentro do expediente ou fora dele, e ser atendido, desde que se ache presente qualquer servidor ou empregado;

d) em qualquer assembléia ou reunião de que participe ou possa participar o seu cliente, ou perante a qual este deva comparecer, desde que munido de poderes especiais; [23]

A norma acima transcrita garante ao causídico, ainda, permanecer sentado ou em pé em todos os ambientes listados, como bem queira, podendo retirar-se quando desejar, sem que para tanto deva pedir licença. O ingresso nas salas de sessões de tribunais e nas dependências do juízo, mesmo quando não participe das causas, é direito que segue tradição já consagrada em outros ordenamentos jurídicos atuais.

A vivência do foro e dos litígios é fator de interesse fundamental do profissional da advocacia que ali se apresenta como parte dos trabalhos judiciários, acompanhando de perto os debates. Ressalte-se que o trânsito livre dos causídicos inclui o espaço reservado aos magistrados, exigindo-se, entretanto, certa prudência no uso de tal prerrogativa, não podendo o advogado atrapalhar os trabalhos realizados.

As dependências das secretarias, cartórios, ofícios de justiça, serviços notoriais e de registros são, por igual, franqueadas aos advogados, independentemente da presença de seus titulares e ainda que fora do ohrário de expediente, bastando que haja algum serventuário para atendê-lo.

Outrossim, é possível que se exija do causídico que permaneça do lado de fora do balcão para ser atendido, desde que se admita, expressamente, a possibilidade de ingresso no interior da serventia quando justificada, como nas hipóteses de autos volumosos ou de difícil manuseio, bem assim quando houver tumulto ou falta de espaço nos balcões.

No que diz respeito ao livre ingresso do profissional da advocacia nas delegacias e prisões, direito que, por igual, pode ser exercido a qualquer hora, registrando-se, neste sentido, a possibilidade de o causídico acessar tais instituições mesmo fora do horário de expediente, e mesmo que não estejam presentes seus titulares. Neste tocante, portanto, a norma tem seu sentido amplificado, não aceitando limitações de qualquer natureza, reconhecendo-se, justamente nos momentos mais inusitados, como as madrugadas, que a atuação do advogado torna-se mais urgente e a prerrogativa torna-se efetiva.

Ressalte-se, por oportuno, que poderá ainda o advogado adentrar livremente em qualquer assembléia ou reunião, mesmo sendo privada e de acesso considerado restrito, da qual participe o cliente ou possa participar, ou, até mesmo, naquelas em que deva comparecer, devendo, no entanto, apresentar procuração com poderes especiais para tal.

Por fim, no que tange à permanência do advogado no ambiente cujo acesso lhe é livre, tem-se que o mesmo pode se ausentar do local sem para isso requerer licença da autoridade que o preside ou de qualquer funcionário. Neste diapasão, o dispositivo do inciso VII do artigo 7º, do Estatuto da classe vem para evitar que o profissional da advocacia seja alvo do arbítrio do responsável pelo recinto onde ingressa no exercício de suas funções, uma vez que, na qualidade de representante da parte, o causídico não se submete aos trabalhos da repartição, salvo se houver procedimento específico que se lhe aplique.

3.1.6 Audiência com o Magistrado

O legislador federal, por meio do Estatuto da Advocacia, reconheceu aos profissionais da classe também a possibilidade de o causídico dirigir-se diretamente ao magistrado nas salas e gabinetes de trabalho, sem necessidade de prévia audiência ou de se estabelecer condições para tal. A justificativa para esta prerrogativa encontra arcabouço nas situações em que somente por intermédio de conversa com o juiz o advogado consegue obter a informação para ele necessária, ou ainda, nos casos em que pretenda explicar a urgência ou a especificidade do ato que pratique ou venha a praticar.

Com obviedade, deve-se atentar para os cuidados que a disposição legal comporta, tendo em vista as ocasiões em que o magistrado não pode receber o profissional da advocacia imediatamente à sua solicitação. Neste ínterim, embora as situações excepcionais justificam adiar, por instantes, a entrevista entre o advogado e o magistrado, não devem ser utilizadas como escusa para postergar, indefinida ou exageradamente, o recebimento do causídico as razões que pretenda trazer à baila. Por tais motivos, exige-se, tanto do juiz, quanto do profissional da advocacia, além do indispensável bom senso, a compreensão do papel e dos deveres de cada um.

3.1.7 Possibilidade de manifestação

Como a palavra é um dos instrumentos priviliegiados do labor advocatício, deciciu o legislador protegê-la, por meio do Estatuto da categoria, elevando a possibilidade de manifestação ao jaez de prerrogativa do advogado, quer no alusivo às sustentações orais, às intervenções pela ordem, e por fim, no que diz respeito às reclamações contra o desrespeito à norma jurídica. O privilégio de se manifestar é protegido pelas normas contidas nos incisos IX a XII do artigo 7º, da Lei nº. 8.906/94, que assim dispõe:

Art. 7º. omissis.

IX - sustentar oralmente as razões de qualquer recurso ou processo, nas sessões de julgamento, após o voto do relator, em instância judicial ou administrativa, pelo prazo de quinze minutos, salvo se prazo maior for concedido;

X - usar da palavra, pela ordem, em qualquer juízo ou tribunal, mediante intervenção sumária, para esclarecer equívoco ou dúvida surgida em relação a fatos, documentos ou afirmações que influam no julgamento, bem como para replicar acusação ou censura que lhe forem feitas;

XI - reclamar, verbalmente ou por escrito, perante qualquer juízo, tribunal ou autoridade, contra a inobservância de preceito de lei, regulamento ou regimento;

XII - falar, sentado ou em pé, em juízo, tribunal ou órgão de deliberação coletiva da Administração Pública ou do Poder Legislativo;

XIII - examinar, em qualquer órgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou da Administração Pública em geral, autos de processos findos ou em andamento, mesmo sem procuração, quando não estejam sujeitos a sigilo, assegurada a obtenção de cópias, podendo tomar apontamentos; [24]

No que tange à possibilidade de sustentação oral nos Tribunais, a disposição de lei encerra em si seu conteúdo, bastando justificá-la na característica de impessoalidade com que chegam os processos após o curso na primeira instância, sendo, portanto, outorgada ao advogado exprimir seus argumentos oralmente, de modo a conferir-lhes a devida ênfase.

De outro turno, a intervenção pela ordem se pode ser utilizada caso o advogado perceba a existência de equívocos ou dúvidas em relação aos fatos debatidos naquele momento, ou acerca dos documentos que componham ou não os autos, bem como quanto às afirmações feitas e influenciem no julgamento. Também podem ser formuladas acusações ao próprio causídico ou censuras ao exercício de suas funções, caso em que este também se utilizará da medida de ingerência.

Finalmente, é garantido ao advogado reclamar, de forma escrita ou verbal, contra a inobservância de preceito de lei, regulamento ou regimento, dirigindo-se o causídico a qualquer tribunal, juízo ou autoridade. A esse direito corresponde a obrigação da autoridade em receber a reclamação formulada pelo profissional advocatício, devendo a mesma constar de documento ou ser reduzida a termo na ata da assembléia realizada.

3.1.8 Exame e vista de autos e inquéritos, findos ou em andamento, e retirada do cartório

Nos incisos XIII a XVI do artigo 7º do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil estão discriminadas garantias processuais para o desempenho da atividade do causídico ligadas às faculdades de examinar, ter vista e retirar autos de inquéritos, processos administrativos ou judiciais, finalizados ou em curso, mesmo sem procuração.

Sendo o advogado o representante dos interesses da parte que contrata seus serviços, a execução de seu trabalho exige que lhe sejam franqueados, incondicionalmente, os autos, com base nos quais pode o profissional argumentar, peticionar e provocar a atuação do Estado-juiz na consecução dos objetivos propostos ao cliente.

Estabelece o artigo 7º ser direito do advogado analisar, em qualquer órgão público, autos de processos findos ou em andamento, bem como obter cópia de suas peças, mesmo que não tenha procuração. Estende-se, também, aos profissionais da advocacia, a possibilidade de examinar autos de flagrante e de inquéritos, estejam eles em curso ou não, independente de apresentar o instrumento de mandato e ainda que os autos estejam conclusos à autoridade, podendo, ademais, tomar apontamentos. A faculdade de exame de autos de processo administrativo, judicial ou inquisitório limita-se tão somente pela hipótese de estarem cobertos pelo manto do segredo de justiça.

Para além do exame de autos, garante o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil o direito do profissional a ter vista dos processos judiciais ou administrativos, quer no cartório ou repartição competente, quer por retirada dos autos respectivos pelo prazo legal. Em contrapartida ao direito simples de exame, o direito de vista pressupõe representação, até mesmo por se constituir em ato processual. Frise-se, a este respeito, a abrangência da prerrogativa aos procedimentos administrativos, evidenciada pelo artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal.

De outro diapasão, a possibilidade de retirada dos autos se dá tanto no curso do processo quanto depois de sua conclusão, sendo certo afirmar que a vista, neste caso, alcançará tão somente aqueles que possuem procuração nos autos, e será concedida, em situações extraordinárias, pelo próprio Magistrado, considerando a finalidade do causídico em remover os autos da repartição em que se encontrem.

Destarte, exame, vista e retirada de processos são prerrogativas que não abarcam os feitos que tramitem, ou tenham tramitado, em segredo de justiça ou sigilosamente. Registre-se que, quanto à retirada dos autos de cartório, faculta-se ao Magistrado indeferi-la nos casos em que constarem do processo documentos originais ou de difícil restauração, ou quando ocorrer situação cuja relevância justifique a permanência dos autos no cartório, secretaria ou repartição.

Observe-se que o direito de vista fora do cartório deve ser exercitado no prazo, seja ele legal ou assinalado pela autoridade que preside o feito. Assim,se o advogado deixa de devolver os autos no prazo determinado, fazendo-o apenas depois de ter sido intimado para tal, o presidente do feito poderá condená-lo a não mais retirá-los, passando a exercer a vista no lugar em que se encontrar o processo até o fim deste.

3.2. Deveres do profissional da advocacia

Não se encontra no Estatuto da Advocacia um capítulo especificamente dedicado à listar os deveres do advogado, ao contrário dos direitos e prerrogativas, cuja disciplina se infere da redação dos artigos 6º e 7º do referido diploma legal. Porém, se é certo que o exercício da profissão outorga direitos e garantias aos inscritos, não menos certo é que se lhes atribui, de igual modo, diversas obrigações, positivas ou negativas.

Necessário, neste tocante, observar que a profissão jurídica, em especial a do causídico, impõe ao profissional deveres de dúplice natureza, quais sejam, as obrigações jurídicas e as obrigações ético-profissionais. Enquanto as primeiras constituem deveres oriundos de preceitos e normas de caráter coercitivo, as últimas defluem como inferência da própria finalidade institucional especificadora e determinante de todo o campo de atuação da Ordem dos Advogados do Brasil.

No que se refere à profissão advocatícia, os deveres de natureza jurídica do advogado são prescritos através de normas revestidas de força coercitiva, as quais se encontram esparsas no corpo da lei adjetiva civil, em alguns dispositivos do Código Penal e, ainda, por intermédio de dispositivos contidos no Estatuto vigente, os quais sancionam com penas disciplinares condutas proibidas ao profissional.

Já os deveres de natureza moral encontram-se expressos no Código de Ética e Disciplina da Advocacia, sendo certo afirmar que sua violação acarreta a pena de censura, razão pela qual os preceitos nele consignados devem ser considerados não como simples recomendações de comportamento, mas como regras a serem cumpridas com o rigor exigido pelo compromisso prestado quando do ingresso na entidade de classe.

Não pretendemos com este estudo, contudo, esgotar as obrigações atinentes ao exercício do mister advocatício, passando a discorrer tão somente os deveres indispensáveis para melhor elucidação do conteúdo da presente pesquisa.

3.2.1 Deveres de natureza institucional

Toda e qualquer instituição, ao se propor a determinada finalidade, compromete-se com os meios que lhe permitem alcançar tal desígnio. No que se refere à Ordem dos Advogados do Brasil, o legislador houve por bem explicitar os elementos de sua finalidade nos termos do artigo 44, do Estatuto da categoria:

Art. 44. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade:

I - defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas;

II - promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil. [25]

Assim, constitui dever fundamental de cada um dos integrantes da Ordem dos Advogados do Brasil trabalhar para que se atinjam os objetivos enunciados pelo dispositivo da lei regulamentadora de sua atividade profissional. Não se deve entender, contudo, que a norma legal esgote em seu conteúdo as obrigações do profissional advocatício, uma vez que outros deveres podem ser conhecidos através de normas específicas, tais como o Código de Ética e Disciplina da instituição.

Partindo do pressusposto de que a advocacia é uma função essencial à aplicação da justiça e que a Constituição é, além de norma fundamental do ordenamento jurídico pátrio, "o horizonte dos valores supremos da opção política da nação" [26], tem-se que a legitimidade do exercício das atribuições do advogado só será plena na medida em que este profissional atue na defesa do texto constitucional.

Deste modo, a Lei Maior assegura ao advogado o paradigma de validade e legitimidade de todas as relações jurídicas e os direitos subjetivos a serem pleiteados, razão mais que suficiente para que exerça seu mister assegurando a máxima eficácia e o aperfeiçoamento dos dispositivos constitucionais, não lhe competindo, neste ínterim, infringir a norma fundamental, embasado por julgamentos de valoração subjetiva. Ponderando tais considerações, inclusive, o constituinte originário da Carta de 1988 deferiu ao Conselho da Ordem dos Advogados do Brasil a competência para propor eventual ação direta de inconstitucionalidade, nos moldes de seu artigo 103, inciso VII.

De forma negativa, isto é, esperando-se um não fazer por parte do profissional da advocacia, observa-se a obrigação de defender a ordem jurídica do Estado Democrático de Direito, evitando comportamentos nocivos à manutenção desta organização política. Neste sentido, incumbe ao advogado não militar contra literal disposição de lei, salvo se ocorrer a hipótese excepcional de fazê-lo motivado por boa-fé ou pelo direito de arguir inconstitucionalidade da legislação, ou até mesmo com fundamento na injustiça da norma ou por pronunciamento judicial anterior.

Para o doutrinador Elcias Ferreira da Costa, a norma do artigo 44 do Estatuto limita a atuação do advogado na defesa da ordem jurídica aos momentos em que esta seja fundada no denominado Estado democrático de Direito, excluindo da esfera de obrigações do profissional advocatício amparar regime jurídico diverso, a exemplo dos regimes de exceção, que se confrontam com a realidade jurídico-institucional da democracia legislativa:

[...]

Analogicamente se pode entender que o dever de defender a Constituição da República se observa, quando se apontam os vícios de constitucionalidade de ato normativo, oriundo de qualquer dos poderes.

Com mais precisão do que o texto do anterior Estatuto, o legislador do Estatuto vigente, delimitou o conceito de ordem jurídica ao de ordem jurídica do Estado democrático de Direito, com o que liberou a Ordem dos Advogados do Brasil do dever de defender uma ordem jurídica que viesse a ser estabelecida sobre os escombros da legitimidade ou sobre a supressão de algum dos direitos humanos fundamentais. [27]

Neste sentido, dizer que a Ordem dos Advogados do Brasil esta comprometida com a defesa dos direitos humanos e com a implementação da chamada justiça social equivale a dizer que a entidade e seus inscritos têm o dever de batalhar pela aplicação dos preceitos fundamentais da Carta Magna, à luz de seus artigos 1º e 2º. [28]

A efetiva forma de cumprir tal obrigação enseja-se não somente quando o causídico, remunerado profissionalmente, pleiteia em juízo o que se considera justo e de direito da parte por ele representada, mas também na oportunidade em que oferece gratuitamente seus préstimos laborais na defesa dos necessitados, ao invés de esperar que a Defensoria Pública, abarrotada por seus feitos, esteja sempre presente e eficaz na assistência judiciária.

Destarte, entendeu por bem o legislador da disciplina da advocacia esmerar-se em uma tradição de solidariedade e compromisso aos necessitados, entendendo que o causídico deve ter, acima de tudo, uma vocação social e solidária, tal qual esposado no artigo 11, do Anteprojeto do atual Código de Ética e Disciplina, que não foi utilizado na confecção do texto definitivo por razões fáticas:

Sempre obediente aos limites traçados por seu órgão de classe, o advogado deverá ser justo e leal na determinação de valor de seus serviços, o que poderá levá-lo a nada reivindicar, se legítima a causa e sem recursos o constituinte. [29]

Também constituem deveres institucionais do causídico pelejar pela rápida administração da justiça, bem como contribuir para o aperfeiçoamento das instituições jurídicas, mediante a adoção de iniciativas de que resultem sugestões para aprimorar o corpo legislativo do país, seja em fase de elaboração ou após seu efetivo ingresso no ordenamento jurídico.

3.2.2 Deveres de natureza ético profissional e os dez mandamentos de Santo Ivo (decálogo do advogado)

Fundamentais para a compreensão do conteúdo do presente estudo, as obrigações ético-profissionais do advogado consistem em valores que devem ser exercidos disciplinarmente por aqueles a que se impõem, constituindo, deste modo, matéria ampla no que tange ao exercício da função constitucional de representante dos interesses de seu cliente e indispensável à efetivação dos direitos a este assegurados pelo ordenamento positivo brasileiro.

Tais deveres encontram-se, em parte, insculpidos no artigo 2º do Código de Ética da Ordem dos Advogados do Brasil, que assim preleciona:

Art. 2º O advogado, indispensável à administração da Justiça, é defensor do estado democrático de direito, da cidadania, da moralidade pública, da Justiça e da paz social, subordinando a atividade do seu Ministério Privado à elevada função pública que exerce.

Parágrafo único. São deveres do advogado:

I - preservar, em sua conduta, a honra, a nobreza e a dignidade da profissão, zelando pelo seu caráter de essencialidade e indispensabilidade;

II - atuar com destemor, independência, honestidade, decoro, veracidade, lealdade, dignidade e boa-fé;

III - velar por sua reputação pessoal e profissional;

IV - empenhar-se, permanentemente, em seu aperfeiçoamento pessoal e profissional;

V - contribuir para o aprimoramento das instituições, do Direito e das leis;

VI - estimular a conciliação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios;

VII - aconselhar o cliente a não ingressar em aventura judicial;

VIII - abster-se de:

a) utilizar de influência indevida, em seu benefício ou do cliente;

b) patrocinar interesses ligados a outras atividades estranhas à advocacia, em que também atue;

c) vincular o seu nome a empreendimentos de cunho manifestamente duvidoso;

d) emprestar concurso aos que atentem contra a ética, a moral, a honestidade e a dignidade da pessoa humana;

e) entender-se diretamente com a parte adversa que tenha patrono constituído, sem o assentimento deste.

IX - pugnar pela solução dos problemas da cidadania e pela efetivação dos seus direitos individuais, coletivos e difusos, no âmbito da comunidade. [30]

3.2.2.1 Observação dos preceitos do Código de Ética Profissional

Um Código de Ética, pela própria designação, indica um conjunto de condutas a serem observadas naquela esfera de normatividade diversa da positivação jurídica, tendo em vista o aspecto coercitivo desta, em detrimento do caráter tão somente regulamentador daquela. Todavia, a partir do momento em que decidiu o legislador, por meio de norma positiva, dispor sobre as obrigações éticas do profissional advocatício no exercício de suas funções e sancionar a transgressão de seus dispositivos a uma pena de censura, elevou tais deveres à categoria de norma jurídica, atribuindo-lhe uma coercibilidade que, como mero preceito moral, não lhe é própria.

Aliás, coerentemente com o espírito da lei, segundo a qual se criou uma entidade com o objetivo precípuo de selecionar os detentores de idoneidade e dignidade tais para pertencer ao quadro de integrantes e afastar da atividade profissional os considerados indignos, os quais poderiam contribuir para o desprestígio da classe, o legislador houve por bem atribuir força coercitiva aos dispositivos do Código de Ética, motivo pelo qual impõe-se ao advogado a observância de seus preceitos:

Art. 1º. O exercício da advocacia exige conduta compatível com os preceitos desteCódigo, do Estatuto, do Regulamento Geral, dos Provimentos e com os demais princípios da moral individual, social e profissional. [31]

Frise-se, neste diapasão, que a legislação em comento tratou inclusive de estabelecer em seu bojo um título dedicado ao processo disciplinar, de modo a coibir práticas não condizentes com a postura devida a um profissional da advocacia.

3.2.2.2 Preservação da atividade

O primeiro dever do advogado é sempre proceder de forma que o torne merecedor de respeito, contribuindo, assim, para o prestígio da classe da advocacia. Essa atuação exprime-se não apenas no respeito às normas deontológicas ou na abstenção de comportamentos rotulados como infracionais, mas também em um particular cuidado com sua atuação, a qualidade de seu trabalho, seu comportamento. Se o profissional não respeita tais balizas, mais do que macular o próprio nome, denigre toda a classe, face a uma tendência social de generalização.

Outrossim, mais do que o saber técnico, utilizado no exercício profissional, o advogado deve estar apto a contribuir para o aprimoramento das instituições, do Direito e das leis, conforme determina o artigo 2º do Código de Ética e Disciplina, transcrito em momento oportuno nos tópicos anteriores. Neste ínterim, deve o causídico pugnar pela solução dos problemas da cidadania e pela efetivação de seus direitos individuais, coletivos e difusos, no âmbito da comunidade. Afinal, deve o profissional da advocacia ter sempre em mente que, acima de qualquer coisa, "o Direito é um meio de mitigar as desigualdades para o encontro de soluções justas e que a lei é um instrumento para garantir a igualdade de todos", como disposto no artigo 3º do Código de Ética.

Neste quadro, a sociedade como um todo reserva ao militante advocatício um papel essencial, transformando-o para além do que mero defensor de interesses do cliente, uma vez que a ele incumbe a defesa do próprio Direito, assim também da democracia, por intermédio da qual "manifestará toda a grandeza de seu mister" [32].

3.2.2.3 Sigilo profissional

O sigilo profissional é, sem dúvida, uma das conseqüências mais importantes da concessão de prerrogativas que a sociedade e o Estado Democrático de Direito deferem à classe dos causídicos. Entendendo-se, neste sentido, como direito do advogado, não se deve olvidar que à privatividade deste múnus, bem como à inviolabilidade que a Constituição Federal defere aos advogados corresponde, via de conseqüência, o respeito naturalmente devido ao cliente, que confia à pessoa de seu representante convencional suas confidências.

Assim, a caracterização da responsabilidade jurídica e moral pelo sigilo da profissão pressupõe exata delimitação das matérias que incidem na compreensão do preceito, entendendo a doutrina constituir objeto de sigilo profissional tudo quanto deva ser reservado aos limites da defesa, bem como o que possa prejudicar a moral ou até mesmo o patrimônio do cliente caso seja divulgado.

Ademais, deve-se obter como pressuposto que não só a ética implica na obrigação do profissional em guardar segredo acerca das afirmações que lhe faz seu mandante. À semelhança das normas de cunho ético-profissional, a própria ordem jurídica também assume o corolário do sigilo como valor essencial, a teor do que dispõe o Código Penal, em seu artigo 154; o Código de Processo Civil, em seu artigo 207; a lei substantiva civil, pela regra do artigo 144, donde se verifica que o dever se segredo, além de preceito natural, decorre da própria ordem pública e não de mero ajuste entre cliente e advogado. De acordo com Elcias Ferreira da Costa:

[...]

Deve, entretanto, o advogado saber distinguir entre assuntos confidenciais, mas que são necessários à defesa, e assuntos confidenciais sob a condição imposta de não serem revelados. De qualquer forma, nenhuma matéria pode ser revelada, a não ser na medida em que forem necessárias à defesa. [33]

Portanto, conclui-se que, sendo oadvogado um confidente, um ouvinte privilegiado das intimidades de seu cliente, respeitar tais confidências e ser fiel ao cliente é dever do causídico, o que impõe recusar-se a depor como testemunha sobre qualquer fato que esteja protegido pelo sigilo profissional, assim como em processo no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato realizado com pessoa de quem seja ou foi advogado, mesmo que tenha sido autorizado ou solicitado pelo constituinte, previsão que, na norma, deixa expresso o caráter obrigacional da recusa.

O zelo e preservar o sigilo oriundo da profissão deve levar o advogado a recusar o patrocínio da causa, quando tenha sido convidado também pela parte contrária e dela recebido confidências em caráter sigiloso, tal como disposto no artigo 20, do Código de Ética e Disciplina:

Art. 20. O advogado deve abster-se de patrocinar causa contrária à ética, à moral ou à validade de ato jurídico em que tenha colaborado, orientado ou conhecido em consulta; da mesma forma, deve declinar seu impedimento ético quando tenha sido convidado pela outra parte, se esta lhe houver revelado segredos ou obtido seu parecer. [34]

3.2.2.4 Zelo e probidade no exercício da profissão

O dever de exercer o labor advocatício com zelo e probidade encontra-se insculpido no inciso II do supracitado artigo 2º do Código de Ética e Disciplina. Neste diapasão, entende-se, sem dificuldade, que em face da elevada finalidade da advocacia, o seu desempenho nos moldes do que preceitua a sociedade acarreta consigo todas as virtudes necessárias.

Exigir que o causídico exerça com zelo seu mister pressupõe que o profissional seja vocacionado para ela, sinta-se gratificado em poder exercê-la e encontre nela motivação de orgulho e entusiasmo. Para Elcias Ferreira da Costa, "quem procura uma profissão apenas como instrumento apto para obter sua sustentação econômica, jamais exercê-la-á com entusiasmo e com zelo e, rarissimamente, com eficiência" [35]

De outro turno, no exercício da profissão, a probidade implica um conjunto de virtudes que caracterizam a personalidade do advogado, que deve ser inatacável em sua honradez, reputação e dignidade, tanto no trato com os que o procuram profissionalmente, como com os colegas e autoridades. Assim, a probidade compreende, entre outros aspectos, a sinceridade e a veracidade no relacionamento com o cliente em juízo, o respeito para com a pessoa do cliente e com seus problemas, a responsabilidade profissional, a administração do cliente e a lealdade processual, os quais serão tratados com maior especificidade no curso desta seção.

3.2.2.5 Sinceridade e veracidade

Estabelece o Código de Ética e Disciplina que o advogado tem a obrigação de "informar o cliente, de forma clara e inequívoca, quanto a evntuais riscos da sua pretensão e das conseqüências que poderão vir da demanda" Também em juízo as atitudes do profissional da advocacia, no que diz respeito à veracidade de suas informações e à sinceridade de suas afirmações pode influir fortemente na persuasão do julgador, motivo pelo qual o diploma legal ora mencionado explicitou em seu artigo 6º a proibição ao causídico de "expor os fatos em juízo falseando deliberadamente a verdade ou estribando-se na má-fé".

Contudo, a verdade como fundamento da sentença justa, e a veracidade das partes como pressuposto para o discernimento certo e justo do órgão judicante não implicam dizer que o advogado deva ficar obrigado a delatar aspectos desfavoráveis, porventura implicados na causa entregue ao seu patrocínio, podendo o causídico omitir a verdade, uma vez que ninguém está obrigado a confessar o próprio ilícito, bem como considerando-se o dever de sigilo do profissional quanto às informações sobre a pessoa de seu cliente. Relativamente ao poder de persuasão que reveste a palavra do advogado compromissado com a verdade sobre o convencimento do magistrado, observa Garçon:

Quando o juiz sabe que o letrado que tem na sua presença é um homem escrupuloso, incapaz de o enganar, dispensa-lhe uma confiança que lhe confere uma autoridade incontestada. O julgador acredita na palavra de quem nunca se mostrou complacente consigo mesmo e que é incapaz de atraiçoar a sua consciência. A confiança que, por tais motivos, outorga ao advogado é a melhor recompensa de sua honestidade e confere-lhe um crédito ilimitado. [36]

3.2.2.6 Respeito e trato para com a pessoa do cliente

Quando o cliente se depara com o advogado, este deve se portar não como um julgador da conduta daquele, mas, ao contrário, deve se dispor na condição de servidor da sociedade e patrono das necessidades de quem lhe procura. Antes de tudo, o causídico está obrigado a zelar pelo estabelecimento e preservação de uma relação de confiança com seu representado, o que não implica abrir mão de sua isenção técnica, sendo certo afirmar que, sentindo o advogado não mais existir confiança entre ele e seu cliente, é seu dever profissional renunciar ao mandato.

Ademais, a relação de confiança estabelecida entre representante e representado deve se pautar inclusive na prestação de contas por parte daquele, a fim de determinar maior credibilidade aos serviços prestados, uma vez que demonstra um efetivo esforço do profissional na consecução dos objetivos pretendidos pela parte.

Ainda, no que se refere ao trato com o cliente, observa-se que o profissional da advocacia deve se imbuir de muita consideração com aquele que busca seu auxílio, uma vez que este avalia seu caso como sendo sempre o de maior importância no contexto de atribuições do causídico, circunstância a ser sopesada pelo profissional, que não se deve furtar à atender seu mandante. Ressalte-se, neste sentido, que ainda nos caos de renúncia do mandato outorgado o patrono deve proceder com a máxima discrição, a fim de não criar embaraços à parte ou até mesmo ao defensor que posteriormente há se constituir.

3.2.2.7 Administração do cliente e lealdade processual

Por administração do cliente, a doutrina tem entendido aquela atuação do advogado que consiste em assumir a direção técnica dos interesses do constituinte, sem se deixar levar pelas emoções que costumam envolver as partes e, sobremaneira, recusando-se a assisti-lo em pretensões insustentáveis ou a procrastinar a lide com expedientes desleais.

Para que cumpra, de fato, sua função social, necessário é que o profissional advocatício esteja precavido para não se deixar levar pelas emoções e impulsos sentimentais do cliente, lembrando sempre quem exerce o papel de patrono e quem é parte na demanda.

Assim, a administração do cliente se enseja no caso de o advogado ter obrigação de afastar seu constituinte de uma arriscada aventura judicial, seja porque destituída de sólida fundamentação probatória ou porque controverso o amparo legal da prestensão, constituindo ambas as hipóteses apresentadas como situações de desproporção entre o desgaste, não só psicológico como econômico e o êxito da causa.

Insere-se na administração do cliente a circunstância de o causídico não se sujeitar à imposição de cliente que pretenda ver com ele atuando outros advogados, nem aceitar indicação para que outro profissional trabalhe com ele no processo.

De outro turno, o conceito de probidade no exercício da profissão implica em um dever de lealdade do advogado para com seu cliente, entendendo-se como tal não somente os comportamentos que o profissional costuma ter em suas relações pessoais, mas também o dever conduzir-se segundo as normas de boa educação, exercendo inclusive seu mister em harmonia com o sentimento de auto-responsabilidade, mantendo a palavra dada e agindo abertamente.

Considerando o conceito de lealdade processual apresentado, tem-se, de lado oposto, a deslealdade profissional, quando as atitudes do advogado revelam-no despido de valores éticos para com o cliente e até mesmo para com a sociedade e para com o Estado-juiz, uma vez que sempre se vai presumir a boa-fé por parte do causídico.

3.2.2.8 Responsabilidade profissional

Tendo em vista que o exercício da advocacia pressupõe um múnus público, não se pode olvidar que tal função vem imbuída de uma carga de responsabilidade, sem a qual o cliente não poderia reclamar os prejuízos a ele causados pelo profissional, em detrimento da causa a que se propôs patrocinar.

O militante advocatício, trabalhando graciosa ou onerosamente, atuando como autônomo, como celetista ou como estatutário, a favor de quem o contratou o a favor de terceiro, está obrigado, contratualmente, ao bom desempenho de suas atividades próprias, adequadas à conclusão do negócio ou à defesa dos interesses do cliente. Essa obrigação, embora num primeiro momento pareça meramente um produto de contrato, é também uma obrigação legal, isto é, um dever para a sociedade e, destarte, para com o próprio cliente.

Importante registrar que a responsabilidade do advogado é uma obrigação de meio, e não de fim, não estando ele passível de responsabilização tão somente pelo insucesso na demanda. Silvio Venosa afirma que "o advogado está obrigado a usar de sua diligência e capacidade profissional na defesa da causa, mas não se obriga pelo resultado, que sempre é falível e sujeito às vicissitudes instrínsecas do processo". [37]

Assim, para que o profissional da advocacia seja considerado como parte legitimada a figurar no pólo passivo de eventual ação de perdas e danos, necessário que se comprove se o comportamento do causídico fugiu, razoavelmente, ao que dele se poderia esperar nas circunstâncias.

3.2.2.9 Recusa em patrocinar causa considerada ilegal, injusta ou imoral

Prescreve o Código de Ética e Disciplina que "deve o advogado abster-se de patrocinar causa contrária à ética, à moral e à validade do ato jurídico em que tenha colaborado, orientado ou conhecido em consulta". Temos, pois, implícitas no texto da lei quatro espécies de causas deontologicamente inaceitáveis pelo advogado, quais sejam, a lide ilícita, que se caracteriza pela contrariedade à lei; a causa ilegal, ou seja, aquela que simplesmente não tem amparo legal, ou a que positivamente viola o texto legal, tal como a causa de cunho ilícito; a imoral, aquela cuja conduta, pretensão ou objetivo fere os valores vigentes numa sociedade e, conseqüentemente, fere os bons costumes; e, por fim, a causa injusta, consistente na demanda cuja conduta ou pretensão viola o direito subjetivos privado ou público, ou obstaculiza a concreção do mesmo.

3.2.2.10 Decálogo do advogado

Os advogados, como patronos de interesse alheios, que trabalham a cargo das exigências do cliente e dos prazos a que se submetem, sempre na dependência com o juiz, o escrivão, o promotor e o oficial de justiça, sentiram, em primeiro lugar, a necessidade de mandamentos de ética profissional. Tiveram o decálogo mais antigo, elaborado pelo bretão Yves Hélory, discípulo de São Francisco de Assis, mais conhecido como Santo Ivo, o qual passa a ser abaixo transcrito:

I – O advogado deve pedir a ajuda de Deus nas suas demandas, pois Deus é o primeiro protetor da Justiça;

II – Nenhum advogado aceitará a defesa de casos injustos, porque são perniciosos à consciência e ao decoro;

III – O advogado não deve onerar o cliente com gastos excessivos;

IV – Nenhum advogado deve utilizar, no patrocínio dos casos que lhe são confiados, meios ilícitos ou injustos;

V – Deve tratar o caso de cada cliente como se fosse seu próprio;

VI – Não deve poupar trabalho nem tempo para obter a vitória do caso de que se tenha encarregado;

VII – Nenhum advogado deve aceitar mais causas do que o tempo disponível lhe permite;

VIII – O advogado deve amar a Justiça e a honradez tanto como as meninas dos olhos;

IX – A demora e a negligência de um advogado causam prejuízo ao cliente e quando isso acontece deve indenizá-lo;

X – Para fazer uma boa defesa, o advogado deve ser verídico, sincero e lógico. [38]

Continuando as ponderações acerca do tema do presente estudo, o quarto capítulo aborda o tratamento dispensado ao relacionamento entre o advogado e seus cliente, aludindo ao já mencionado direito do profissional à remuneração pelos serviços prestados, e demonstrando como deve ser o comportamento do causídico no momento da estipulação contratual da verba honorária.

Sobre o autor
Warlei Marques Ponte

Pós-graduando em Direito Público em Brasília (DF)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PONTE, Warlei Marques. A ética do advogado na fixação dos honorários convencionais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1720, 17 mar. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11061. Acesso em: 19 nov. 2024.

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