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A prescrição do Plano Verão.

Solução da imprensa x solução jurídica

Agenda 12/12/2008 às 00:00

1. INTRODUÇÃO

O presente estudo visa, sem qualquer pretensão de esgotar o tema, contribuir para a formação de entendimento no que diz respeito à data exata da ocorrência da prescrição do direito de reaver as diferenças de índices inflacionários do Plano Verão.

Isto porque, a exemplo do ocorrido com relação ao Plano Bresser, a imprensa vem, a nosso entender equivocadamente, indicando o dia 31.12.2008 como o termo final para que os poupadores ingressem com ação de cobrança, visando a correta aplicação de índices inflacionários decorrentes do referido plano econômico.


2. DO PRINCÍPIO DA "ACTIO NATA" (ART. 189 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002) – PRESCRIÇÃO DO PLANO VERÃO QUE SOMENTE OCORRERÁ EM FEVEREIRO DE 2009

Inicialmente, cumpre destacar que segundo o entendimento jurisprudencial pacífico, aplica-se aos contratos de cadernetas de poupança o prazo prescricional vintenário, nos termos dos artigos 177 do C.C. de 1916, combinado com o artigo 2.028 do C.C. de 2002.

Uma vez definido o prazo prescricional como vintenário, a única dúvida existente repousa no momento em que começa a fluir tal prazo e, conseqüentemente, a data do seu encerramento.

Consoante preconiza o artigo 189 do Código Civil de 2002, violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição.

Referido dispositivo é conhecido doutrinariamente como princípio da "actio nata", segundo o qual a contagem do prazo prescricional somente se inicia com o nascimento da pretensão ou da ação.

Sobre esse aspecto fundamental da questão, segue o entendimento doutrinário que tratou do tema na oportunidade do Plano Bresser (junho de 1987):

A prescrição tem início, ou curso, somente no momento em que nasce o direito de ação e isso só ocorreu na data em que a diferença (correção monetária) deixou de ser paga, ou seja, entre 1 e 15 de junho de 1987. [01] (grifo nosso)

No mesmo sentido, segue o trecho de um recente acórdão proferido pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que expressou o seguinte entendimento:

[...]

Por outro lado, não prospera a alegação de ocorrência de prescrição vintenária na presente hipótese, quanto ao Plano Bresser.

Eduardo de Souza Floriano ("Prazo prescricional para requerer as perdas da poupança com o Plano Bresser".) assim dispõe sobre o tema:

"A imprensa nacional, de forma unânime, elegeu, sabe-se lá porquê, o dia 31 de maio de 2007 como prazo final para o ajuizamento de ações visando buscar as perdas ocorridas pela equivocada aplicação de índice de correção nas contas poupança com vencimento em 1º a 15 de junho de 1987, durante o chamado Plano Bresser.

Todavia, diferente do que tem sido veiculado, o termo inicial de contagem do prazo prescricional, para o direito em debate, não é a data em que ocorreram os referidos expurgos inflacionários, conforme já manifestado pelo STJ no Recurso Especial N° 693.932 - MG (2004/0141391-0).

Em nosso sistema jurídico, o prazo prescricional está submetido ao princípio da actio nata, (art 189 do Código Civil/2002), segundo o qual a prescrição se inicia com o nascimento da pretensão ou da ação.

Nas palavras do inigualável Pontes de Miranda citado nos Embargos de Divergência em RESP N° 327.043 - DF (2001/0188612-4), assim se define o referido princípio:

"um princípio universal em matéria de prescrição: o princípio da actio nata, segundo o qual a prescrição se inicia com o nascimento da pretensão ou da ação (Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, Bookseller Editora, 2.000, p. 332)"

Este é, também, o entendimento do STJ exarado no Recurso Especial 816.131 -SP.

PROCESSUAL CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO. DESISTÊNCIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. DATA DA EFETIVA CONSTATAÇÃO DO DANO. PRINCÍPIO DA ACTIO NATA.

1. Em nosso sistema, o prazo prescricional está submetido ao princípio da actio nata, segundo o qual a prescrição se inicia com o nascimento da pretensão ou da ação.

Ê a partir da ciência do dano que nasce uma das condições da ação, que é o interesse de agir. Entre os requisitos da prescrição, encontra-se a existência de uma ação exercitável Logo, não se pode exigir do consumidor/poupador que exercite a ação antes da equivocada aplicação do índice de correção previsto na res. 1338/87. Neste sentido se manifestou o Colendo TJMG.

Número do processo: 2.0000.00.380438-4/000(1)

Relator: VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE

Data da publicação: 01/03/2003

Ementa: 1 - Seguro - Prazo prescricional - Início.

Ao aceitar a Seguradora o pedido de pagamento do seguro feito pelo segurado, interrompe-se o prazo prescricional, seja pela expressa disposição que prevê a interrupção pela condição suspensiva (art. 170, I, CC), que então se estabelece, seja pelo princípio da actio nata (art. 118, CC), pois seria contraditório, contra a lógica, e até impossível, que começasse a correr a prescrição antes de nascer o direito à ação. Não pode prescrever o que ainda não existe. Inevitável a conclusão de que a prescrição só começa a correr a partir do momento em que o segurado toma conhecimento da negativa da Seguradora.

No caso concreto, para se saber quando iniciou para os consumidores a pretensão de receber dos Bancos a restituição dos prejuízos sofridos (pela equivocada incidência de índice de correção), faz-se necessário distinguir quando ocorreu a violação do direito e o momento em que o sujeito lesado teve a ciência dessa violação.

Pode-se concluir que, na verdade, o termo inicial para a contagem do prazo prescricional, in casu, é aquele em que deveriam ser aplicados os corretos índices de correção, pois dali nasce o direito de acionar a ré por alguma diferença havida.

Assim, considerando que a resolução 1.338/87 do BACEN fora publicada em 15 de junho de 1987 e que os índices de correção foram aplicados equivocadamente entre 1º a 15 de julho de 1987, conclui-se que a efetiva lesão ao direito dos consumidores/poupadores somente ocorreu neste último período (julho de 1987), sendo este, portanto o termo inicial da prescrição para o caso em tela (restituição das perdas do plano Bresser), sendo este entendimento corroborado pela jurisprudência do TJMG.

Número do processo: 1.0024.06.989961-5/001(1)

Relator: CAETANO LEVI LOPES

Data da publicação: 13/04/2007

Ementa: Remessa oficial e apelações cíveis voluntárias. Ação de cobrança. Caderneta de poupança. Plano Bresser (junho de 1987) e Plano Verão (janeiro de 1989). Prescrição vintenária. Incidência do IPC. Diferenças de correção monetária devidas. Juros e correção monetária sobre as diferenças. Termo inicial Honorários advocatícios. Arbitramento correto. Custas processuais. Estado de Minas Gerais. Imunidade. Sentença parcialmente reformada. 1. A prescrição de direito pessoal, regida pelo Código Civil de 1916, ocorre em vinte anos. 2. As cadernetas de poupança anteriores a 15.06.1987 e a 15.01.1989 devem ser remuneradas, respectivamente, no mês de junho de 1987 pelo índice de 26,06% e no mês de janeiro de 1989, pelo índice de 42,72% referente ao IPC, para fins de correção dos valores depositados. 3. A correção monetária visa apenas a manter o valor real da moeda corroído pela inflação. Assim, deve incidir sobre as diferenças, desde as datas de sua verificação. 4. Os juros de mora relativos à cobrança de expurgos inflacionários são devidos a partir da citação. 5. Os honorários advocatícios, vencida a Fazenda Pública, são arbitrados por eqüidade, com base no art. 20, § 4o, do CPC. Atendidos os pressupostos, confirma-se o arbitramento. 6. O Estado de Minas Gerais é imune ao pagamento de custas processuais. 7. Remessa oficial e apelações cíveis voluntárias conhecidas. 8. Sentença que determinou o pagamento de diferenças de índices de correção monetária aplicados em cadernetas de poupança parcialmente reformada em reexame necessário para excluir a condenação do segundo apelante voluntário no pagamento de custas processuais, prejudicados os recursos voluntários. Desta forma, verifica-se que o início do prazo prescricional somente ocorrerá, para a restituição dos valores referentes ao plano Bresser, à partir da data de vencimento de cada conta poupança no mês de julho de 1987, momento em que o consumidor/poupador teve ciência da equivocada aplicação dos índices de reajuste".

Não se pode esquecer que, no caso do Plano Bresser, a modificação dos indexadores se deu na primeira quinzena de junho de 1987, o que afetou a remuneração de julho.

No presente caso, portanto, o prazo prescricional para a restituição dos valores referentes ao Plano Bresser se iniciou na data de vencimento das contas poupança do autor, no mês de julho de 1987 (fls. 10/5).

A ação de cobrança, por sua vez, foi distribuída no dia 31 de maio de 2007, e, portanto, antes do término do prazo prescricional (fls. 02), que ocorreria em julho.

Não há que se falar, portanto, em prescrição vintenária.

Passa-se à análise do plano econômico.

[...] [02] (grifo nosso)

No caso do Plano Verão, que foi elaborado pela Medida Provisória n. 32, de 15.01.1989 (posteriormente convertida na lei 7.730/89), o ponto de partida não é diferente, conforme se demonstrará a seguir.

É indubitável que os descumprimentos contratuais ocorreram no mês de fevereiro de 1989 (ocasião em que se aplicou o índice apurado em janeiro de 1989).

Nesta toada, temos que a cobrança da diferença de correção monetária não depositada no mês de fevereiro de 1989, prescreve somente no mesmo dia do mês de fevereiro de 2009, porque, somente na mesma data é que se completa o prazo de 20 (vinte) anos (art. 177, do CC/1916, combinado com o art. 2.028 do CC/2002) – prescrição vintenária.

Para espancar dúvidas, é salutar transcrever o artigo 132 do Código Civil, em especial o seu § 3º. Vejamos:

Art. 132. Salvo disposição legal ou convencional em contrário, computam-se os prazos, excluído o dia do começo, e incluído o do vencimento.

§ 1o Se o dia do vencimento cair em feriado, considerar-se-á prorrogado o prazo até o seguinte dia útil.

§ 2o Meado considera-se, em qualquer mês, o seu décimo quinto dia.

§ 3o Os prazos de meses e anos expiram no dia de igual número do de início, ou no imediato, se faltar exata correspondência.

§ 4o Os prazos fixados por hora contar-se-ão de minuto a minuto.

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Ora, ocorrendo o ato lesivo no mês de FEVEREIRO de 1989, podemos afirmar seguramente que, nos termos do ordenamento jurídico pátrio, somente a partir de então (do descumprimento contratual das instituições financeiras) é que deve ser contado o prazo prescricional de 20 (vinte) anos.

Por se tratar de prescrição vintenária, o prazo para reclamar diferença de índice inflacionário aplicado, a título de exemplo, em 05.02.1989 se encerra no dia 05.02.2009, ou seja, somente após 20 (vinte) anos do descumprimento contratual, mas jamais em 31.12.2008, como vem publicando a imprensa.

Com o merecido respeito às opiniões em contrário, afirmar que o prazo prescricional se extinguirá no dia 31.12.2008 é proferir afirmativa desamparada de qualquer fundamento lógico ou legal, pois o ilícito contratual das instituições financeiras não ocorreu no dia 31.12.1988, mas sim nos dias dos aniversários das contas em FEVEREIRO de 1989, prescrevendo, portanto, somente nos respectivos dias de FEVEREIRO DE 2009 (após 20 anos).

Isto porque, como a ninguém é dado precisar acontecimentos futuros, no dia 31.12.1988 os poupadores sequer tinham conhecimento do percentual que seria apurado de inflação no período (janeiro de 1989).

Se não bastasse isso, no dia 31.12.1988 os poupadores sequer sonhavam que o governo implementaria um Plano Econômico (Verão – 15 de janeiro de 1989) e que as instituições financeiras iriam aplicar as disposições do referido plano de forma incorreta em um dos dias de fevereiro de 1989, ferindo o direito adquirido dos mesmos.

Desta forma, concluímos que o direito dos poupadores à cobrança da diferença de correção monetária do Plano Verão não prescreve em 31 de dezembro de 2008 como vem divulgando, de forma infeliz, a imprensa brasileira, mas sim na data correspondente ao aniversário da conta poupança no mês de fevereiro de 2009.


Notas

  1. COLELLA, Luiz Eduardo, Consultor Jurídico in: http://conjur.estadao.com.br/static/text/56122,1 (01/06/2007).
  2. Apelação nº 7.235.859-3. 21ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Data do Julgamento: 07.05.2008. v.u.
Sobre o autor
Bruno Januário Pereira

Advogado em São Paulo. Bacharel pela Faculdade de Direito da Alta Paulista. Pós-graduando em Direito Processual Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina, Instituto LFG e IBDP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Bruno Januário. A prescrição do Plano Verão.: Solução da imprensa x solução jurídica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1990, 12 dez. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12069. Acesso em: 22 nov. 2024.

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