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O resgate da dignidade humana do idoso através do trabalho

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Agenda 25/05/2011 às 16:22

4 INOVAÇÕES NO RECONHECIMENTO DA DIGNIDADE NA VELHICE NO ESTATUTO DO IDOSO

Polettini (2010) expõe que, na Revolução Industrial, houve grande exploração dos trabalhadores, uma vez que estes não possuíam nenhum direito ou garantia social, e eram tratados como máquinas competitivas. Assim, este conceito de trabalhador surgido naquela época desperta, na mente, a idéia de um grande desgaste físico e de total exploração do ser humano. A sociedade capitalista, daquele tempo, agravou as condições de trabalho, de maneira que as lutas por melhores condições laborais culminaram no surgimento de um conjunto de normas de proteção aos trabalhadores. Portanto, em conseqüência desta concepção inicial de trabalhador, concluiu-se que seria uma crueldade fazer com que o idoso permanecesse trabalhando, pois isso acarretaria num total desgaste físico e psicológico do mesmo, ou seja, um cenário de injustiça e de desmerecimento. Então, a saída do idoso do mercado de trabalho e, consequentemente, a sua aposentadoria e ociosidade, era vista como um prêmio, como um descanso merecido depois dos duros anos de sacrifício.

Todavia, segundo as alegações de Polettini (2010), a relação trabalhista passou por diversas transformações e a capacidade intelectual valorizou-se no mercado de trabalho. Isso abriu um novo espaço favorável para a inclusão dos trabalhadores idosos, privilegiando o alicerce do Estado Democrático: o princípio da dignidade da pessoa humana.

A fim de dar seqüência às garantias constitucionais, o legislador ordinário criou o Estatuto do Idoso, através da Lei nº 10.741/2003, a qual regulamenta os direitos das pessoas com idade igual ou superior a sessenta anos. É verdade que este estatuto mostrou um papel transformador para a realidade social, uma vez que garantiu aos idosos a facilitação ou a sua continuidade no mercado de trabalho. Assim, no seu Capítulo VI, tratou especificamente do direito à profissionalização e ao trabalho.

É verdade que garantias concretas para inserir-se o idoso no mercado laboral precisam ser estabelecidas pelas leis, pois o labor proporciona ao idoso a sensação de ser socialmente útil, mantendo sua integridade e valorização, além de ser dignificante para o ser humano.

Nessa conjuntura, Santin (2007) traz que a Lei n° 10.741, de 1° de outubro de 2003, o Estatuto do Idoso, fora aprovado, a fim de garantir direitos para a melhoria da qualidade de vida e o bem-estar das pessoas idosas brasileiras, ou seja, aquelas com mais de sessenta anos de idade. Esta norma trouxe, ao longo dos seus 118 artigos, inovações capazes de introduzir profundas mudanças sociais, econômicas, culturais e políticas no País. Entre as disposições trazidas pelo Estatuto do Idoso, observa-se a predominância de direitos sociais voltados, por exemplo, à saúde, à previdência, à assistência social, à renda mínima, à educação, à moradia e ao trabalho.

Ressalta-se que o artigo 28, II do Estatuto do Idoso prevê políticas que deverão ser desenvolvidas, a fim de preparem os trabalhadores para a aposentadoria, com a antecedência mínima de um ano, as quais acontecerão através de esclarecimentos acerca dos direitos sociais e da cidadania dos idosos e, também, através de estímulos a projetos sociais.

O Estatuto do Idoso prevê, ainda, que os currículos dos vários níveis do ensino formal deverão apresentar conteúdos voltados ao processo de envelhecimento, ao respeito e à valorização dos idosos, a fim de contribuir para a eliminação de preconceitos, além de produzir conhecimentos acerca do assunto.

Quanto ao direito ao trabalho e à profissionalização, ressalta-se a obrigação estatal na definição de políticas que criem postos de trabalho, assim como uma satisfação àqueles que não conseguirem se inserir no mercado trabalhista, com políticas de renda mínima. Ademais, existe o estímulo a programas profissionalizantes especializados para os idosos, bem como o estímulo às empresas privadas para a admissão de idosos.

Os artigos 26 ao 28 do Estatuto do Idoso, os quais se referem ao direito ao labor ou de encontrar trabalho, devem ser vistos relativamente à sua condição peculiar, ou seja, aos limites físico e intelectual decorrentes naturalmente da idade. Veda-se, no entanto, a discriminação por motivos etários, salvo os casos, unicamente, em que a natureza do cargo exigir tal exceção. Além disso, nos concursos públicos, a idade mais elevada deve ser o primeiro critério de desempate.

Polettini (2010) afirma que a igualdade entre o trabalhador jovem e o idoso apenas é observada, de forma concreta, se houver o atendimento de certas circunstâncias especiais, pelo empregador, as quais respeitem as condições físicas, intelectuais e psíquicas do trabalhador idoso, conforme o artigo 26 do Estatuto do Idoso. Além disso, este deve ser protegido contra os trabalhos penosos, insalubres ou em sobrejornada. Assim, as diferenças da pessoa idosa, na relação trabalhista, apenas devem ser invocadas como forma de protegê-lo e, não, como maneira de excluí-lo.

O Estatuto do Idoso defende, explicitamente, o direito de envelhecer, ao dispor, no artigo 8°, que "o envelhecimento é um direito personalíssimo e a sua proteção um direito social". Destarte, vivenciar a velhice é exercer um direito personalíssimo cuja proteção consiste num direito social.

O referido estatuto determina, no artigo 2°, que o "idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana". A intenção do legislador, nesse artigo, foi a de ratificar que, ao idoso, não se excluiu a fruição dos direitos fundamentais, evitando-se, assim, atitudes discriminatórias em virtude da sua idade.

O artigo 10 do mencionado estatuto aduz, ainda, que "é obrigação do Estado e da sociedade, assegurar à pessoa idosa a liberdade, o respeito e a dignidade, como pessoa humana e sujeito de direitos civis, políticos, individuais e sociais, garantidos na Constituição e nas leis." Então, é dever não apenas do Estado, mas, também, da sociedade, certificar aos idosos a dignidade da pessoa humana.

D´Urso (2010)ressalta a necessidade das entidades representativas dos idosos unirem-se, formando uma forte união, a fim de cobrar do Estado a sua obrigação quanto ao cumprimento dos direitos dos idosos contidos no Estatuto do Idoso. Isso se justifica pela razão de que, embora o estatuto seja bom e aplicável, urge que o Estado cumpra-o, fiscalize a sua aplicação e puna aqueles que descumprirem os seus preceitos. Ou seja, o Estatuto do Idoso é um grande avanço, porém todos desejam tê-lo integralmente cumprido e não em parte, de forma que a cobrança, em face do Estado, deve ser constante. Além disso, um trabalho maciço deve ser realizado junto à sociedade, por meio da imprensa escrita, televisiva, campanhas educacionais junto às escolas, passeatas, palestras de conscientização em todos os níveis sociais, a fim de informar e apontar as dificuldades vividas pelos idosos e cobrar que a lei seja cumprida.

Silva (2005) ressalta que o Estatuto do Idoso é o resultado das mudanças históricas, políticas e sociais que o Brasil tem atravessado, exaltando conquistas almejadas, mas, por muitos, esquecidas. Contudo, não se pode olvidar que toda a sociedade tem o dever de integrar o idoso no sistema social, não apenas valorizando as conquistas de seus direitos, mas criando mecanismos de controle capazes de garantir a sua aplicação.

Ramos (2004) reflete que, enquanto os idosos não se conscientizarem de que todos, autoridades e cidadãos, precisam agir, proativamente, para efetivar o Estatuto do Idoso na prática, nenhum esforço para a sua elaboração terá contribuído para mudar a realidade. É preciso criar a percepção de que a lei sozinha não é capaz de transformar o cenário, isto é, a norma necessita da disposição de todos para torná-la eficaz.

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Finalmente, constata-se que o Estatuto do Idoso é um diploma jurídico criado, com vistas a concretizar o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana voltado, particularmente, às pessoas acima de sessenta anos de idade.

4.1 PROGRAMAS DE INCLUSÃO DO TRABALHADOR IDOSO NAS EMPRESAS

Polettini (2010) assevera que, em termos legislativos, os idosos encontram-se bem amparados pela Carta Política de 1988 e pelo Estatuto do Idoso. Estes diplomas legais devem servir como embasamento para uma verdadeira transformação nos hábitos da sociedade. Assim, verifica-se que diversas iniciativas no campo privado, a fim de recolocar os idosos no mercado de trabalho já estão sendo realizadas. Constata-se que já existem grandes empresas, modificando suas políticas de recursos humanos, com o fim de se adaptarem às conseqüências do envelhecimento geral da população e de gozarem das vantagens que os idosos oferecem. Não obstante, é fato real que ainda há muito a ser feito e a ser concretizado nesta área. A realidade revela que o patamar ideal a ser atingido para a garantia deste direito fundamental inerente a todo cidadão e, especialmente, ao idoso, ainda se encontra distante.

Uyehara (2010) alega que, entre as empresas que contratam idosos, pode-se citar: "Pizza Hut", "Bob´s", o Grupo Pão de Açúcar, o Instituto Butantã e Biscoitos Festiva.

Uyehara (2010) continua que a empresa "Pizza Hut" contrata, aproximadamente, trinta idosos nos restaurantes por meio do "Programa Atividade". Aqui, os funcionários laboram entre quatro e oito horas por dia, e recebem, além da remuneração, convênios médico e odontológico, cesta básica, seguro de vida e alimentação. Na rede "Bob´s", também existe o "Programa de Trabalho para a Terceira Idade" o qual inclui, além da remuneração de um salário-mínimo, o plano de saúde. O Grupo Pão de Açúcar conta com o "Programa Terceira Idade", a fim de empregar quem já passou da faixa etária dos sessenta anos. Desde 1997, este grupo já contratou mil e quinhentos funcionários idosos que trabalham entre quatro e seis horas por dia em atividades de atendimento ao cliente, apoio à área de vendas, empacotamento e entrega de mercadorias. O referido grupo valoriza a experiência de vida dos idosos, a sua liderança natural exercida sobre os trabalhadores mais jovens e a capacidade que eles têm para ouvir. O Instituto Butantã busca, como requisitos indispensáveis para se preencher a vaga de monitor no "Museu do Instituto Butantã", as seguintes qualidades: carisma, boa vontade, didática e paciência. A fundação oferece, além do salário por vinte horas semanais, em sistema de rodízio, almoço, cesta básica, registro em carteira profissional e assistência médica às idosas contratadas para a monitoria. Cerca de duzentos mil visitantes por ano visitam o museu, mas, durante a semana, a freqüência maior é de estudantes e de turistas, estrangeiros e brasileiros, diversificando-se o público nos finais de semana. Enfim, a empresa Biscoitos Festiva emprega profissionais idosos e experientes para todas as áreas da fábrica, ou seja, tanto para a produção, quanto para o setor administrativo.

Polettini (2010) acrescenta que grandes corporações como a rede de supermercados Sendas, o Grupo Pão de Açúcar e o Banco Santander são, também, exemplos de empresas que aderiram à política de contratação de idosos. Como exemplo, a rede "Bob´s" implantou o "Programa Melhor Idade", admitindo funcionários aposentados, para exercerem a função de anfitrião da loja e prestarem um atendimento personalizado ao consumidor. No caso do Banco Santander, esta contratação visionou o pré-atendimento dos servidores da prefeitura nas agências bancárias. Então, o que se observa é que as organizações estão encontrando maneiras, a fim de aproveitarem os idosos em suas atividades empresarias. Neste aspecto, as organizações, ao empregarem os mais velhos, aliam a juventude à experiência, além de recuperarem a auto-estima profissional dos idosos, criando um ambiente com o moral elevado.

De acordo com Alves (2010), as empresas obtêm retorno através da contratação de profissionais com mais de sessenta e cinco anos de idade. Assim, constata-se que, aos poucos, as empresas começam a valorizar atributos como experiência de vida e simpatia, no momento de escolher seus funcionários. Algumas empresas iniciaram programas de recrutamento e seleção de trabalhadores mais velhos, como propostas de responsabilidade social, porém os resultados práticos devolveram um bom retorno aos negócios, e conquistaram os clientes. O Grupo Pão de Açúcar, Bob’s e Pizza Hut são alguns exemplos de empresas que obtiveram sucesso por meio dessas contratações, e estão expandindo o número de vagas. As referidas organizações afirmam que contratam essas pessoas, pois elas apresentam bom desempenho, e conferem resultados bem satisfatórios. Para estas empresas, os pontos fortes desses profissionais consistem em um nível maior de compromisso com o trabalho, além do sucesso que têm entre os clientes. O programa da rede "Bob´s" começou, inclusive, a criar um plano de carreira para esses funcionários da terceira idade, a fim de que eles possam ter a oportunidade de ascensão.

Polettini (2010) aduz que as razões que motivam as admissões de trabalhadores idosos são: o baixo custo em prepará-los; o conhecimento que ostentam e as experiências que podem transferir aos mais jovens, facilitando-lhes a conquista de melhores posições no mercado. Ademais, a contratação de idosos também traz lucros para as empresas, porque, a depender do tipo de função, eles agregam valor econômico ao negócio, são mais atenciosos com os clientes e, em geral, desenvolvem uma relação de confiança junto à clientela e aos funcionários. Portanto, contratando-se trabalhadores mais experientes como consultores, como conselheiros ou como chefes, as empresas mantêm seus rendimentos, e se beneficiam da sabedoria adquirida pelos idosos ao longo de suas vidas.

Constata-se, então, a necessidade de se criar mais programas de recolocação profissional para idosos, já que o trabalho para este grupo da população funciona como uma forma de se estimular o raciocínio, melhorar a auto-estima e aumentar a sua renda para sustento próprio e de sua família. Ademais, a criação de programas voltados aos idosos, no campo laboral, funciona, também, como forma de garantir a sua dignidade, fundamento do Estado Democrático de Direito.

Todavia, para que isso se concretize, eficientemente, na prática, os preconceitos e os paradigmas devem ser quebrados, e os empresários devem confiar na experiência profissional dos mais velhos, a fim de que possam beneficiar-se de resultados satisfatórios.

Destarte, se as empresas não seguirem a tendência atual de contratação de trabalhadores idosos, perderão preciosos conhecimentos, e serão obrigadas a buscar pessoas capacitadas num mercado laboral cada vez mais restrito.

Enfim, apesar dos resultados favoráveis obtidos por algumas empresas, conforme exposto antes, não se pode olvidar que ainda há muito a ser efetivado nesta área, pois a discriminação e o preconceito ainda impedem que a maioria das organizações confie seus negócios a esses funcionários. A cultura brasileira precisa ser mudada, para que os méritos desses trabalhadores sejam reconhecidos pelos empresários. A realidade do mercado de trabalho revela que o padrão ideal a ser alcançado para a garantia plena do direito fundamental ao labor inerente aos idosos, infelizmente, ainda se encontra distante, nos dias hodiernos.

4.2 TRABALHO VOLUNTÁRIO ENTRE IDOSOS

Conforme Ackermann (2006), não é preciso ser jovem para se fazer trabalho voluntário, uma vez que disposição, ânimo e solidariedade são os requisitos indispensáveis nesta tarefa. Contudo, sabe-se que é, principalmente, entre os idosos, que este tipo de trabalho cresce, cada vez mais, no mundo inteiro. Assim, além de ser uma oportunidade para as pessoas mais velhas se manterem ocupadas, tem, também, um nobre objetivo: ajudar o próximo.

Souza e Lautert (2008) afirmam que vários documentos já foram publicados no Brasil e na Organização das Nações Unidas (ONU), a fim de despertar as pessoas para a participação em atividades voluntárias, sobretudo, jovens e idosos, para que invistam seu tempo livre na promoção da solidariedade e da cidadania.

Souza e Lautert (2008) continuam que o voluntariado é uma prática em crescente expansão entre os idosos, mormente, entre os aposentados, atuando como um mecanismo para se manterem socialmente ativos e se afastarem dos preconceitos advindos da aposentadoria, além de outros benefícios. Assim, considera-se o serviço voluntário uma ferramenta para se alcançar um envelhecimento ativo e saudável. Nos Estados Unidos, na Europa e na Ásia, por exemplo, esse assunto é debatido há várias décadas, sendo, inclusive, alvo de estudos de profissionais da área de saúde contrariamente à realidade brasileira. Estes países acreditam que o trabalho voluntário serve como uma estratégia para a promoção da saúde, especialmente, a dos idosos, e, portanto, investem em pesquisas acerca das conseqüências do voluntariado na saúde e na qualidade de vida das pessoas.

A Lei nº 9.608, de 18 de fevereiro de 1998 regulamenta o voluntariado, definindo-o como: "a atividade não remunerada, prestada por pessoa física a entidade pública de qualquer natureza, ou a instituição privada de fins não lucrativos, que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive mutualidade".

Assim, consoante a legislação brasileira, o trabalho voluntário caracteriza-se como uma atividade prestada sem remuneração, cujas finalidades podem ser: cívicas, culturais, educacionais, científicas, recreativas ou de assistência social, incluindo-se a mutualidade. Em termos gerais, o serviço voluntário é qualquer atividade onde a pessoa oferta, espontânea e livremente, o seu tempo, a fim de beneficiar outros indivíduos, grupos ou organizações, sem receber retribuição financeira.

Souza e Lautert (2008) expõem que o desenvolvimento desse serviço no Brasil atrela-se à fundação da Santa Casa de Misericórdia em Santos, São Paulo, em 1532, a qual se voltava à assistência social com vínculo religioso. Devido a essa característica, o modelo do voluntariado brasileiro difundiu-se com base na caridade, no humanitarismo e no caráter filantrópico. Esse é um fato, inclusive, que, até os dias de hoje, constitui-se como um componente presente na motivação e nos objetivos das instituições que o desenvolvem. Atualmente, o voluntariado relaciona-se, também, com as Organizações Não-Governamentais e com outros grupos, por exemplo, as Universidades da Terceira Idade, as quais apresentam o trabalho voluntário como uma alternativa criativa e concreta, para aproveitar o potencial dos idosos. Algumas dessas estimulam e propõem ao idoso o voluntariado através da realização de atividades culturais, físicas, artísticas e sociais, conforme sejam as suas habilidades, desejos e inclinações. Então, com esses incentivos, muitas pessoas encontram a possibilidade de se manterem ativas, mormente, após a aposentadoria, através do preenchimento do tempo disponível, auxiliando outros indivíduos. Destarte, considera-se o voluntariado como uma forma de ajuda mútua onde os idosos que o realizam, ao mesmo tempo em que se sentem úteis e inseridos na sociedade, também auxiliam outras pessoas, de maneira que essa troca reflete-se na saúde e na qualidade de vida dos voluntários.

O idoso, geralmente, aposentado, possui mais tempo disponível, e costuma sofrer as conseqüências da solidão, por diversos motivos: por não ter mais familiares próximos, ou pela falta da oportunidade de se conviver, assiduamente, com filhos e netos. Ademais, numa cultura que supervaloriza a juventude, o idoso sente-se discriminado e inútil. Dessa forma, o trabalho voluntário apresenta-se como uma grande oportunidade que o idoso possui de se manter saudável, motivado e mais participante da sociedade, além de permanecer ativo, física e intelectualmente.

É verdadeiro considerar que sua experiência e habilidades, quando aproveitadas em programas bem planejados, são de grande valor para a comunidade. Ademais, não se deve esquecer o valor cultural, o qual representa a reinserção do idoso na sociedade, demonstrando às crianças e aos jovens o quanto essas pessoas acumularam experiências ao longo da vida, e o quanto podem, ainda, transmiti-las.

De acordo com Souza e Lautert (2008), a ONU, através das propostas do Plano de Ação Internacional para o Envelhecimento, apresenta a participação dos idosos na comunidade, por meio do voluntariado, como um dos objetivos e compromissos a serem cumpridos pelos países dispostos a manter uma sociedade de inclusão para todas as idades. O referido documento reconhece que a contribuição social das pessoas mais velhas vai além de suas atividades econômicas, uma vez que muitas de suas valiosas contribuições não se medem em termos econômicos. Como exemplos, existem os cuidados voltados aos membros da família e a realização de serviços voluntários no meio comunitário, servindo para aumentar e manter o bem-estar pessoal e coletivo.

Observa-se, contudo, que, para isso, é necessário ofertar oportunidades e programas de apoio, a fim de estimular os idosos a participarem de atividades voluntárias. Assim, espaços devem ser abertos para a socialização dos mesmos, por meio da criação de ambientes favoráveis à prestação desses serviços, reconhecendo-se o valor público dessa atividade.

Dessa maneira, oferecer oportunidades para o desenvolvimento de programas, envolvendo o trabalho voluntário entre os idosos é um desafio a ser enfrentado pelo Brasil, uma vez que muitos deles são afastados do mercado de trabalho e da vida social. Destarte, deve-se mudar o paradigma que julga os velhos como um fardo social para uma concepção que veja os idosos como ativos participantes da sociedade, com integração comunitária, além de contribuinte ativo e beneficiário do seu desenvolvimento.

Entretanto, Souza e Lautert (2008) aduzem que as dificuldades encontradas nos países em desenvolvimento, como no caso do Brasil, não devem deixar de ser consideradas. A realidade é que, enquanto nos países desenvolvidos, os voluntários, geralmente, são pessoas que têm condições de prover suas necessidades básicas, tais como: moradia, salário, alimentação, segurança, serviço de saúde, entre outras, nos países em desenvolvimento, tais garantias são privilégios de uma pequena parcela da população. Por isso, muitos idosos vêem-se obrigados a terem, mesmo após aposentados, novas atividades remuneradas, com a finalidade de garantirem sua sobrevivência, ou de complementarem a renda familiar, criando-se, assim, limitações ao desenvolvimento e ao estímulo de trabalhos voluntários. Dessarte, ante as carências dos povos dos países em desenvolvimento, o estímulo e a organização do trabalho voluntário pressupõem investimentos maiores que nos países desenvolvidos. Isso se justifica, porque é preciso, primeiramente, responder às necessidades dos próprios voluntários que, embora demonstrem boa vontade e ânimo, algumas vezes, possuem grandes carências, e, de forma freqüente, não diferem da clientela que se dispõem a ajudar. Portanto, enfatiza-se que não se deve intitular ou impor o voluntariado como uma solução igual para todas as pessoas. Ou seja, considera-se esse serviço altruístico como uma alternativa eficaz para alguns idosos e não para todos, já que se admite a heterogeneidade e a diversificação entre as pessoas, que se mostra ainda mais acentuada entre os idosos.

Por essa razão, alguns idosos são sujeitos ativos na atividade voluntária, dedicando-se e se doando ao próximo mais necessitado que eles, enquanto que outros, impedidos por suas condições pessoais, são passivos e destinatários deste serviço, ou seja, recebem a dedicação e a solidariedade dos outros idosos, numa recíproca que traz resultados positivos para ambos os lados.

Leão e Alves (2010) relatam que se constatou que os idosos que realizam trabalho voluntário obtêm vários proveitos e ganhos positivos, como a construção de um círculo social e solidário, além da recuperação em sentir-se útil, através do senso de utilidade. A repercussão social das tarefas que desempenham contribui para a formulação de uma representatividade positiva do voluntariado, sem contar as repercussões disso sobre a vida deles. A unanimidade dos idosos que foram objeto de estudo neste artigo afirma que auferem mais benefícios com o trabalho voluntário que doam, porque passam a fazer projetos para as suas vidas e ampliam o seu círculo de amizades. Afirmam, também, que desfrutam de uma sensação inigualável de prazer, quando ajudam o seu próximo.

Leão e Alves (2010) continuam que os idosos resgatam valores, antes, julgados perdidos, quando ajudam na melhoria das condições de vida das pessoas em condições de vulnerabilidade social e aprendem a aceitar melhor os outros, melhorando a convivência social. Então, percebe-se que o serviço voluntário é uma forma de se ampliarem as relações sociais, sejam estas relacionadas ao trabalho, à família ou à afetividade. Ademais, existe uma reciprocidade nessa ação de altruísmo, uma vez que os ganhos e a satisfação pessoal advindos das atitudes em relação ao outro se fazem presentes. Neste sentido, portanto, a natureza dos serviços realizados objetiva reduzir as carências afetivas e as de natureza sócio-econômica.

Portanto, ao se estimular o trabalho voluntário entre os idosos, objetiva-se assegurar a sua dignidade e o seu valor, para que sejam protagonistas de sua auto-realização, por meio da promoção de seu desenvolvimento físico, mental, social, espiritual, cognitivo e cultural. Além disso, visa-se a promover o convívio das pessoas mais velhas com as outras gerações, estimulando-se, assim, uma velhice ativa e em busca de uma longevidade digna. Também se valoriza a sua história, as suas experiências, a sabedoria adquirida ao longo do viver, respeitando-as como guardiãs de uma memória coletiva. Não se pode esquecer, ainda, a inclusão social e laborativa advinda através deste trabalho voluntário, mesmo que este não seja remunerado.

Por fim, ratifica-se que saber aproveitar o potencial do idoso através do serviço voluntário é, também, uma ferramenta para retirá-lo das exclusões social e trabalhista, resgatando-lhe a auto-estima e auxiliando-o a praticar, sabiamente, a sua cidadania. Sabe-se que a população idosa, a cada ano que passa, aumenta em número e em proporção, adquirindo idades mais avançadas, apresentando melhor saúde e mais independência. Então, o idoso necessita de alternativas, a fim de acrescentar-lhe satisfação e prazer de viver, para desfrutar os anos conquistados com dignidade humana, um dos fundamentos da República Federativa do Brasil a qual se constitui como Estado Democrático de Direito.

Sobre a autora
Juliana Vasconcelos de Castro

Possui mestrado e especialização em Direito Constitucional pela Universidade de Lisboa onde atualmente estuda doutoramento em Direito Privado Romano. Membro da Associação Nacional de Advogados de Direito Digital, onde atua em grupos de trabalho em startups, healthtechs e relações de trabalho digital. Sócia-fundadora do Juliana Vasconcelos Advogados, nas áreas de Direito Digital e de Startups. Compliance officer. Palestrante, docente e autora de e-books e de livros jurídicos.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CASTRO, Juliana Vasconcelos. O resgate da dignidade humana do idoso através do trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2884, 25 mai. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19188. Acesso em: 25 dez. 2024.

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