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A exclusão política do servidor da Justiça Eleitoral e as razões pelas quais não houve a recepção do artigo 366 do Código Eleitoral Brasileiro

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Agenda 03/10/2011 às 15:48

4 OS DIREITOS POLÍTICOS E AS PREVISÕES CONSTITUCIONAIS DE ELEGIBILIDADE DOS MAGISTRADOS, MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO E DOS MILITARES

Segundo Alexandre de Morais, Direitos Políticos são um conjunto de regras que disciplinam as formas de atuação da soberania popular. São direitos subjetivos que investem o indivíduo no status activae civitatis, permitindo-lhe o exercício concreto da liberdade de participação nos negócios políticos do Estado, de maneira a conferir os atributos da cidadania (MORAIS, 2010).

A soberania popular, conforme prescreve o art. 14, caput, da Constituição Federal, será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos e, nos termos da lei, mediante: plebiscito, referendo, iniciativa popular.

O direito de sufrágio é a essência do direito político, expressando-se pela capacidade de eleger e de ser eleito. Assim, o direito de sufrágio apresenta-se em seus dois aspectos:

- capacidade eleitoral ativa (direito de votar – alistabilidade);

- capacidade eleitoral passiva (direito de ser votado – elegibilidade).

A capacidade eleitoral ativa consiste em forma de participação da pessoa na democracia representativa, por meio da escolha de seus mandatários. É condição necessária para o exercício da capacidade eleitoral passiva, sendo um de seus requisitos o alistamento eleitoral.

Já o alistamento eleitoral consiste em procedimento administrativo, instaurado perante os órgãos competentes da Justiça Eleitoral visando a verificação do cumprimento dos requisitos constitucionais e das condições necessárias à inscrição como eleitor (MORAIS, 2010). Como visto, trata-se de um dos requisitos necessários para que o cidadão tenha condições de elegibilidade, conforme o art. 14, § 3º, da Constituição Federal.

4.1 Elegibilidade

Elegibilidade é a capacidade eleitoral passiva consistente na possibilidade de o cidadão pleitear determinados mandatos políticos, mediante eleição popular, desde que preenchidos certos requisitos (MORAIS, 2010).

Essas condições são previstas na própria Constituição Federal, em seu art. 14, § 3º, a seguir reproduzido:

§ 3º São condições de elegibilidade, na forma da lei:

I – a nacionalidade brasileira;

II – o pleno exercício dos direitos políticos;

III – o alistamento eleitoral;

IV – o domicílio eleitoral na circunscrição;

V – a filiação partidária;

VI – a idade mínima de:

a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da República e Senador;

b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal;

c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz;

d) dezoito anos para Vereador.

Conforme se pode extrair da norma, verifica-se que o cidadão, ao se pretender candidato a cargos políticos, deverá atender tanto aos requisitos genéricos, elencados nos incisos, quanto aos requisitos específicos da idade mínima em função do cargo pretendido.

Além disso, vale mencionar que a Constituição de 1988 prevê, para alguns cargos públicos, em virtude à sua relevância na Administração Pública e, algumas limitações no tocante à habilitação ao exercício da cidadania passiva. Caso contrário, tais essas prerrogativas gerariam uma situação de desequilíbrio no jogo político, uma vez que detentores de elevados cargos públicos gerariam graves prejuízos ao Estado Democrático de Direito. É o caso dos Magistrados, Militares e Membros do Ministério Público.

Com relação aos demais servidores públicos, leis infraconstitucionais tratam de criar mecanismos jurídicos que possibilitem sua candidatura sem, no entanto, se aproveitarem das prerrogativas funcionais, tornando, assim, a disputa política equilibrada.

Prevê, ainda, a exigência de Lei Complementar que defina os casos de inelegibilidade, conforme norma do art. 14, § 9º:

§ 9º Lei Complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

Conforme se pode extrair do comentário acima, um dos fins pretendidos pelo constituinte é proteger a probidade administrativa, preservando-lhe a neutralidade, a moralidade e a honestidade na execução de seus fins, sempre agindo no interesse público.

4.2 Inelegibilidade

Denomina-se incompatibilidade o impedimento decorrente do exercício de cargo, emprego ou função públicos. No que concerne a cargo eletivo, ela surge com o exercício do mandato. Esse impedimento é causa de inelegibilidade, fundando-se no conflito existente entre a situação de quem ocupa um lugar na organização político-estatal e a disputa eleitoral.

A inelegibilidade suscitada pela incompatibilidade só pode ser superada com a desincompatibilização. Esta consiste na desvinculação ou no afastamento do cargo, emprego ou função públicos, de maneira a viabilizar a candidatura.

Nas hipóteses de desincompatibilização, o agente público pode escolher entre manter-se no cargo, emprego ou função e não se candidatar ou sair candidato e, nesse caso, afastar-se temporariamente ou definitivamente, sob pena de tornar-se inelegível, já que estará impedido de ser candidato.

A finalidade desse instituto é evitar o quanto possível que candidatos ocupantes de cargos públicos coloquem-se a serviço de suas candidaturas, comprometendo não só os desígnios da Administração Pública como também o equilíbrio e a legitimidade da eleição.

As hipóteses de desincompatibilização são definidas na Constituição ou em lei complementar, que fixam prazos para que o agente público afaste-se do cargo, emprego ou função que ocupa.

4.3 Dos Magistrados

O art. 95, parágrafo único, inciso III, e o art. 73, § 3°, c/c o art. 75, todos da nossa Carta Magna, vedam o exercício de atividade partidária aos magistrados e membros dos Tribunais de Contas, seja da União, dos Estados ou de Municípios.

Todavia, apesar de haver disposição constitucional que veda expressamente a atividade partidária dessas autoridades, o que não ocorre no caso dos servidores da Justiça Eleitoral, o Tribunal Superior Eleitoral regulamentou a matéria de forma a viabilizar a participação dessas autoridades na disputa democrática dos cargos eletivos, senão vejamos, in verbis:

Magistrados e Membros do Tribunal de Contas, por estarem submetidos à vedação constitucional de filiação partidária, estão dispensados de cumprir o prazo de filiação fixado em lei ordinária, devendo satisfazer tal condição de elegibilidade até seis meses antes das eleições, prazo de desincompatibilização estabelecido pela Lei Complementar n° 64/90. (Resolução n° 19.978, 25/09/1997). (grifado).

O magistrado ou membro de Tribunal de Contas que pretenda disputar algum mandato eletivo precisa se aposentar ou pedir exoneração do cargo no prazo de desincompatibilização de 06 (seis) meses, exigindo-se a filiação partidária somente a partir desta data. Os militares com mais de 10 anos de caserna e os membros do Ministério Público, como já vimos, também possuem regulamentação jurisprudencial própria, que viabilizam a elegibilidade mediante licença para exercer atividade partidária, apesar de disposição constitucional expressa vedando o exercício de atividade partidária por todos eles.

4.4 Dos Membros do Ministério Público

A Constituição da República, em seu art. 128, II, e, com redação dada pela EC nº 45/2004, vedou ao membro do Ministério Público o exercício de atividade político-partidária.

Essa vedação é causa absoluta de inelegibilidade, pois os membros do Ministério Público não poderão filiar-se a partidos políticos, nem tampouco disputar qualquer cargo eletivo, salvo se estiverem aposentados ou exonerados.

Ademais, a alínea j, II, do art. 1º da LC nº 64/90, exige que, nos 6 (seis) meses anteriores ao pleito, o membro do Ministério Público afaste-se de suas funções para disputar cargo eletivo. Salienta-se que o afastamento exigido pela norma, em consonância com a vedação constitucional alterada pela EC nº 45/2004, deverá ser em caráter definitivo.

4.5 Dos Militares

Dispõe o art. 142, § 3º, V, da Constituição que "o militar, enquanto em serviço ativo, não pode estar filiado a partidos políticos". Apesar do mandamento proibindo a filiação do militar a partidos políticos, não está aquele alijado do exercício da cidadania plena, uma vez que o ordenamento criou mecanismos jurídicos que o possibilitem de participarem passivamente do jogo eleitoral.

Assim, o TSE entende que a filiação partidária não é exigível do militar da ativa que pretenda concorrer a cargo eletivo, bastando o pedido de registro de candidatura após prévia escolha em convenção partidária (TSE - Res. nº 22.156/2006). Desse modo, não é necessário que o militar-candidato esteja filiado a partido, sendo suficiente que detenha cidadania ativa.

O pedido de registro de candidatura, apresentado pelo partido, com a anuência expressa do candidato, após a realização da convenção, servirá como suprimento da prévia filiação partidária, não se exigindo, para os ocupantes destes cargos públicos, o prazo mínimo de 1 (um) ano de filiação.

Se o agregado não for eleito, retorna às atividades normais após a necessária desfiliação partidária; caso eleito, passará automaticamente para reserva remunerada, a partir da sua diplomação, pressuposto essencial para a posse no cargo eletivo, permitindo-se a opção pela remuneração mais vantajosa.

Entretanto, o art. 14, § 8º, da Constituição Federal, prevê:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

[...]

§ 8º O militar alistável é elegível, atendidas as seguintes condições:

I – se contar menos de dez anos de serviço, deverá afastar-se da atividade;

II – se contar mais de dez anos de serviço, será agregado pela autoridade superior e, se eleito, passará automaticamente, no ato da diplomação, para a inatividade.

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Logo, a partir do registro de candidatura, o militar em atividade será afastado definitivamente, se contar menos de 10 (dez) anos de serviço sendo, pois, desligado da organização a que pertence. Entretanto, se tiver mais de 10 (dez) anos de serviço, será agregado. O afastamento e a agregação só ocorrerão com o deferimento do registro de candidatura (Resoluções do TSE nº 20.169/2002 e nº 20.318/2002).

Na condição de agregado, o militar deixa de ocupar vaga na escala hierárquica da organização a que serve, embora continue a figurar no respectivo registro militar, sem número, no mesmo lugar que até então ocupava. Não sendo eleito, retorna à caserna, reassumindo seu posto. Se eleito, passa, automaticamente, à inatividade no ato da diplomação.

4.6 Dos Demais Servidores Públicos

O servidor público efetivo, estatutário ou não, deve desincompatibilizar-se. Apesar de afastado, preserva-se o direito à percepção de vencimento integrais. O afastamento é temporário. Em regra, a desincompatibilização deverá ocorrer 3 (três) meses antes das eleições, conforme previsto no art. 1º, II, l, da Lei Complementar nº 64/90.


5 A SITUAÇÃO DO SERVIDOR PÚBLICO ELEITORAL NO EXERCÍCIO PASSIVO DOS SEUS DIREITOS POLÍTICOS

Segundo o art. 366 do Código Eleitoral, "Os funcionários de qualquer órgão da Justiça Eleitoral não poderão pertencer a diretório de partido político ou exercer qualquer atividade partidária, sob pena de demissão". A norma, cuja redação não dá margem a diversidade de interpretações, determina que os servidores da Justiça Eleitoral deverão necessariamente exonerar-se de seus cargos pelo menos 1 (um) ano antes do pleito, prazo mínimo exigido para a filiação partidária.

Com base nisso, o Ministro Sálvio Figueiredo vislumbrou "a busca constante da moralidade que deve presidir os pleitos eleitorais" (TSE - Ac. n. 19.928 de 10/09/2002), enquanto o Ministro Fernando Neves entende ser "mais que razoável que aqueles que participam da organização do pleito e do processamento e julgamento dos feitos eleitorais não possam ter nenhuma atividade político-partidária" (TSE - Res. n. 20.921 de 23/10/2001).

O alcance pela moralidade nos pleitos eleitorais que se busca com a vedação dada aos servidores eleitorais é relativa, conforme já debatido no item 3.1.1 deste trabalho, uma vez que a desincompatibilização visa justamente garantir a candidatura de servidores públicos a cargos políticos sem o benefício das prerrogativas de seus cargos.

Tutela-se com a desincompatibilização a isonomia entre os pré-candidatos ao pleito eleitoral específico, bem como a lisura das eleições contra a influência do poder político e/ou econômico e a captação ilícita de sufrágio, porque incide uma presunção jure et de jure que o incompatível utilizará em seu benefício a máquina da Administração Pública (RAMAYANA, 2005, p. 107)

Muitas vezes, tem-se visto a defesa da tese, por parte dos Tribunais Eleitorais, da vedação do exercício de atividade político-partidário por servidores eleitorais, dando uma interpretação extensiva à norma do art. 366, limitando ainda mais o direito à cidadania. O tema será tratado mais adiante.

De fato, a mercê das pesquisas que se tem feito pela jurisprudência sobre a questão do servidor público eleitoral como partícipe da disputa eleitoral, observa-se uma heterogeneidade de pensamentos na solução jurídica levadas ao judiciário.

Vejamos, por exemplo, o seguinte acórdão, de relatoria do Ministro Sálvio de Figueiredo:

DIREITO ELEITORAL. SERVIDOR DA JUSTIÇA ELEITORAL. FILIAÇÃO. CANDIDATURA. REGISTRO. PRAZO. CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE NÃO SATISFEITA. RECURSO DESPROVIDO.

I- A filiação partidária com antecedência mínima de um ano das eleições é condição de elegibilidade sem a qual não poderá frutificar pedido de registro (art. 18 da Lei nº 9.096/95).

II- O servidor da Justiça Eleitoral, que não pode "exercer qualquer atividade partidária, sob pena de demissão", para candidatar-se a cargo eletivo, deverá afastar-se do serviço público com tempo hábil para cumprimento da exigência de filiação partidária. (BRASÍLIA, TSE. RESPE - RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 19.928. Relator(a) Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, 2002) (Grifamos).

Observa-se que o Relator, na citada ementa, entendeu, naquele julgado, que a atividade eleitoral passiva de servidor eleitoral somente poderá ocorrer mediante seu afastamento do serviço público em tempo hábil para cumprimento da exigência de filiação partidária, conforme aplicação do artigo 38 da Constituição Federal.

Segundo Hely Lopes Meirelles (2004, p. 440-441):

O exercício de mandatos eletivos por servidor público não é vedado na Constituição Federal, cujo art. 38 regula a situação dos servidores da Administração direta, autárquica e fundacional investidos em mandato eletivos.

As duas principais regras que defluem da norma constitucional são: 1ª) o servidor público pode exercer mandato eletivo federal, estadual ou municipal sem perder o cargo, emprego ou função, devendo apenas afastar-se, com prejuízo da remuneração; 2ª) o tempo de serviço do servidor afastado para exercer mandato eletivo será contado para todos os efeitos legais, exceto para promoção por merecimento.

A lei 8.112/90, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, prevê, em seu Capítulo V do Título III, as hipóteses de afastamento dos servidores públicos, dentre os quais se destaca o afastamento para exercício de mandado eletivo. Percebe-se que o colegiado do TSE entendeu, naquele momento, que o caso é de afastamento, não de demissão do servidor da Justiça Eleitoral para que se filie ao partido político no prazo genérico para habilitação ao registro de candidatura.

O acórdão enfrentou questão em dois focos principais: a ausência de disciplinamento constitucional da condição de elegibilidade para os servidores públicos da Justiça Eleitoral e a isonomia entre os servidores públicos em geral. Todavia, os estatutos dos servidores públicos adotam como regra geral o prazo de três meses de desincompatibilização. Assim, a r. decisão está a exigir prazo de um ano de desincompatibilização, considerando o disposto do art. 366 do Código Eleitoral (RAMAYANA, 2005).

Mas a questão não possui um direcionamento claro, definido, uma vez que há decisões no sentido de que o simples afastamento não é suficiente a sanar a incompatibilidade, sendo necessária a efetiva exoneração do pretendente, conforme ementa a seguir:

ELEIÇÕES 2008. RECURSOS ESPECIAIS. 1) INTERPOSIÇÃO ANTERIOR Á PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. AUSÊNCIA DE RATIFICAÇÃO. RAZÃO DE DECIDIR. NÃO COMPROVAÇÃO ANTERIOR. NÃO CONHECIMENTO. 2) REGISTRO DE CANDIDATURA. VEREADOR. SERVIDOR DA JUSTIÇA ELEITORAL. FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. EXONERAÇÃO. CARGO. NECESSIDADE. PROVIMENTO.

I - Obsta o conhecimento do especial sua interposição antes da publicação oficial, sem comprovação da ciência anterior das razões de decidir.

II - Na linha da jurisprudência deste Tribunal, o servidor da Justiça Eleitoral que pretenda filiar-se a partido político deve exonerar-se do cargo que ocupa, sendo necessário, ainda, observar o prazo a que alude o artigo 9º da Lei nº 9.504/97, caso pretenda candidatar-se.

III - Recurso especial da Coligação e outros não conhecido. Recurso especial eleitoral do Ministério Público conhecido e provido.

(BRASÍLIA, TSE. RESPE - RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 35.354 - Manaus/AM. Relator Min. Fernando Gonçalves) (Grifamos).

Neste caso, a Corte Superior da Justiça Eleitoral entendeu se tratar de caso de pedido de exoneração por parte do servidor eleitoral caso este opte por disputar cargos políticos.

Como se vê, o tema ainda não se encontra definitivamente esgotado, uma vez que a jurisprudência do TSE tem oscilado entre a necessidade ou não de exoneração do servidor para o exercício da cidadania plena, uma vez que estão envolvidos, na questão, garantias e princípios que são a base do ordenamento pátrio, tais como a da moralidade, da cidadania, da isonomia, legalidade, dentre outros.

5.1 Foi o artigo 366 do Código Eleitoral recepcionado?

A questão que se pretende verificar é se o art. 366 do Código Eleitoral encontra-se válido em nosso ordenamento ou se este não fora recepcionado pela Constituição Federal de 1988.

Recepção consiste no acolhimento que uma nova constituição posta em vigor dá às leis e atos normativos editados sob a égide da Carta anterior, desde que compatíveis consigo. O fenômeno, além de receber materialmente as leis e atos normativos compatíveis com a nova Carta, também garante a sua adequação à nova sistemática legal (MORAIS, 2010).

Em nosso sistema jurídico, uma norma somente poderá ser considerada válida no ordenamento ou por meio de sua construção conforme um processo previsto constitucionalmente, ou através de sua recepção, aproveitando-se tudo aquilo que esteja conforme a Constituição vigente.

É sabido que o atual Código Eleitoral foi promulgada em 1965, quando o Brasil estava sob um regime que limitava as liberdades individuais. Isso quer dizer que seu teor foi profundamente influenciado pelos valores reinantes naquela época, muitos dos quais são incompatíveis com os princípios que nortearam a construção do atual ordenamento.

Naqueles tempos, o Brasil foi governado em estado de exceção, por meio de edições sucessivas de Atos Institucionais, recurso adotado pelo regime para instituir "ordens" emanadas do governo com o fim de suprimir garantias constitucionais vigentes e impor a austeridade militar com o argumento de salvaguardar a nação dos perigos da "subversão".

Diante das evidentes ilegalidades impostas pelos Atos Institucionais, que, dentre outras coisas, atribuíram ao governo o poder de legislar sobre qualquer assunto e onde a representatividade estava bastante limitada devido à instituição do bipartidarismo, questiona-se a validade da construção normativa daquele período, uma vez que foram elaboradas em um momento em que as garantias constitucionais estavam suspensas.

Assim, não seria ilegítima a "promulgação" do Código Eleitoral vigente por ter sido ele construído neste contexto de exceção? Afinal, houve a usurpação da competência legislativa garantida pela Constituição de 1946, vigente até então e que acabou suspensa pelo famigerado Ato Institucional nº 5, em 1968, e, finalmente, substituída por Emenda Constitucional, em 1969, que passou a ser chamada de "Constituição" e que, dentre outras coisas, incorporou o AI 5, e o desrespeito às regras do processo legislativo que validam a elaboração das leis.

No entanto, ao que tudo indica, o TSE acabou por adotar as ideias de Kelsen, para quem o fundamento de validade da norma não importa, mas, sim, a pertinência de seu conteúdo com os preceitos da Lei Fundamental, para justificar a recepção do Código Eleitoral pela atual Constituição.

Deve-se a Kelsen a teorização do fenômeno da recepção, pelo qual se busca conciliar a ação do poder constituinte originário com a necessidade de se obviar vácuos legislativos.

Kelsen sustenta que as leis anteriores, no seu conteúdo afinadas com a nova Carta, persistem vigentes, só que por fundamento novo. A força atual desses diplomas não advém da Constituição passada, mas da coerência que os seus dispositivos guardam com o novo diploma constitucional. Daí Kelsen dizer que "apenas o conteúdo dessas normas permanece o mesmo, não o fundamento de sua validade".

O importante, então, e que a lei antiga, no seu conteúdo, não destoe da nova Constituição. Pouco importa que a forma de que o diploma se revista não mais seja prevista no novo Texto Magno. Não há conferir importância a eventual incompatibilidade de forma com a nova Constituição. A forma é regida pela lei da época do ato (tempus regit actum), sendo, pois, irrelevante para a recepção.

Assim, mesmo que o ato normativo se exprima por instrumento diferente daquele que a nova Carta exige para a regulação de determinada matéria, permanecerá em vigor e válido se houver a concordância material, i.e, de conteúdo, com as novas normas constitucionais (MENDES, 2008, p. 203-204).

De qualquer modo, cabe ao intérprete ponderação na interpretação do Código Eleitoral, uma vez que muitas de suas normas perderam sua validade frente aos novos valores, muitos deles paradoxais àqueles que inspiraram sua construção original e que foram abarcados pela atual Constituição. O problema repousa em saber o que se encontra válido e o que não mais pode ser considerado! A jurisprudência, pelo menos no tocante ao seu artigo 366, ainda não chegou a uma conclusão definitiva quanto à sua pertinência no ordenamento.

Mas, e o que vem a ser a validade de uma norma?

Segundo Tércio Sampaio Ferraz Júnior, "validade é uma qualidade da norma que designa sua pertinência ao ordenamento, por terem sido obedecidas as condições formais e materiais de sua produção e consequente integração no sistema" (FERRAZ JÚNIOR, 2007).

Conforme dito anteriormente, essa pertinência poderá ser alcançada também através da recepção da norma anterior pelo ordenamento vigente, se em conformidade com os valores que o norteiam.

No tocante ao Código Eleitoral, a despeito das considerações a respeito de sua elaboração, pode-se dizer que, segundo entendimento do TSE, as normas relativas à organização e competência da Justiça Eleitoral foram recepcionadas até que seja produzida Lei Complementar que as regulamente, conforme se depreende do fragmento de decisão a seguir citado:

"Mandado de segurança impetrado pelo Partido dos Democratas - DEM contra ato do Presidente da Câmara dos Deputados. Natureza jurídica e efeitos da decisão do Tribunal Superior Eleitoral - TSE na Consulta n. 1.398/2007. Natureza e titularidade do mandato legislativo. Os partidos políticos e os eleitos no sistema representativo proporcional. Fidelidade partidária. Efeitos da desfiliação partidária pelo eleito: perda do direito de continuar a exercer o mandato eletivo. Distinção entre sanção por ilícito e sacrifício do direito por prática lícita e juridicamente conseqüente. Impertinência da invocação do art. 55 da Constituição da República. Direito do impetrante de manter o número de cadeiras obtidas na Câmara dos Deputados nas eleições. Direito à ampla defesa do parlamentar que se desfilie do partido político. Princípio da segurança jurídica e modulação dos efeitos da mudança de orientação jurisprudencial: marco temporal fixado em 27-3-2007. (...) Mandado de segurança contra ato do Presidente da Câmara dos Deputados. Vacância dos cargos de Deputado Federal dos litisconsortes passivos, Deputados Federais eleitos pelo partido Impetrante, e transferidos, por vontade própria, para outra agremiação no curso do mandato. (...) Resposta do TSE a consulta eleitoral não tem natureza jurisdicional nem efeito vinculante. Mandado de segurança impetrado contra ato concreto praticado pelo Presidente da Câmara dos Deputados, sem relação de dependência necessária com a resposta à Consulta n. 1.398 do TSE. O Código Eleitoral, recepcionado como lei material complementar na parte que disciplina a organização e a competência da Justiça Eleitoral (art. 121 da Constituição de 1988), estabelece, no inciso XII do art. 23, entre as competências privativas do Tribunal Superior Eleitoral - TSE ‘responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas em tese por autoridade com jurisdição federal ou órgão nacional de partido político’.

[...]"

(MS 26.604, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 4-10-07, Plenário, DJE de 3-10-08). No mesmo sentido: MS 26.602, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 4-10-07, Plenário, DJE de 17-10-08; MS 26.603, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 4-10-07, DJE de 19-12-08 (Grifado).

Desse modo, em se tratando das demais matérias, naquilo que não conflita com a Constituição, o Código deverá ser tratado como lei ordinária.

Assim, a partir desse entendimento, a norma que trata da proibição da filiação do servidor da Justiça Eleitoral a partido político, que, por via reflexa, afeta-lhe o exercício da cidadania eleitoral plena, tornando-o inelegível, não pode ser tratada por lei ordinária por falta de previsão legal, uma vez que, segundo o art. 14, § 9º, com a redação dada pela Emenda Constitucional de Revisão nº 4 de 1994:

art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

[...]

§ 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta (grifado).

Conforme estabelecido constitucionalmente, as inelegibilidades somente poderão ser tratadas pela própria Constituição ou por lei complementar.

Mas o artigo 366 do Código Eleitoral foi ou não recepcionada? A pergunta somente poderá ser respondida mediante verificação dos princípios afetos ao caso. E, em se tratando de princípios constitucionais igualmente válidos, não se deve esquecer da ocorrência de antinomias entra eles, o que necessitará a aplicação de algumas regras de interpretação, propostas por Jorge Miranda, citado por Moraes (2010), para a sua correta adequação:

- a contradição dos princípios deve ser superada, ou por meio da redução proporcional do âmbito de alcance de cada um deles, ou, em alguns casos, mediante a preferência ou a prioridade de certos princípios;

- deve ser fixada a premissa de que todas as normas constitucionais desempenham uma função útil no ordenamento, sendo vedada a interpretação que lhe suprima ou diminua a finalidade;

- os preceitos constitucionais deverão ser interpretados tanto explicitamente quanto implicitamente, a fim de colher-se seu verdadeiro significado.

Sob o aspecto do princípio Democrático, a norma em questão encontra alguns obstáculos para a sua permanência no ordenamento pátrio.

Segundo a conceituação de Marcos Ramayana (2005, p. 26):

A democracia, em síntese conceitual, exprime-se como um governo do povo, sendo um regime político que se finca substancialmente na "soberania popular", compreendendo-se os direitos e garantias eleitorais, as condições de elegibilidade, as causas de inelegibilidade e os mecanismos de proteção disciplinados em lei para impedir as candidaturas viciadas e que atentem contra a moralidade pública eleitoral, exercendo-se a divisão das funções e dos poderes com aceitação dos partidos políticos, dentro de critérios legais preestabelecidos, com ampla valorização das igualdades públicas.

Completa o citado autor que:

(...) democracia designa um modo de vida numa sociedade em que se acredita que cada indivíduo tem direito a participar livremente dos valores dessa sociedade. Num sentido mais limitado, democracia é a oportunidade dos membros da sociedade de participarem livremente das decisões em qualquer campo, individual ou coletivo. no seu sentido mais restrito, o termo designa a oportunidade dos cidadãos de um Estado de participarem livremente das decisões políticas mais específicas que lhe afetam a vida individual ou coletiva.

Tem-se, assim, que qualquer norma que impossibilite o livre acesso do indivíduo à participação das decisões relevantes para a vida em sociedade, não contribuindo com a expansão do princípio democrático, deverá ter sua validade denegada justamente por não estar em inconformidade com o Estado Democrático de Direito.

Mediante o princípio da Isonomia, verifica-se que a exclusão do servidor eleitoral da atividade política o distancia dos demais servidores públicos não impedidos constitucionalmente ou por Lei Complementar. Na verdade, trata-se de inelegibilidade sui generis, uma vez que não se enquadra entre os magistrados, membros do Ministério Público e militares, nem entre os demais servidores da Administração Pública. E aqui não vale a máxima de Rui Barbosa, "tratar os iguais igualmente e os desiguais na medida de sua desigualdade", uma vez que não há relatividade na desigualdade em questão.

José Afonso da Silva (2005) ensina que:

A igualdade do direito de ser votado constitui outro aspecto do princípio da igualdade do sufrágio. Caracteriza a desigualdade do direito da elegibilidade o fato de criarem-se condições discriminatórias para que alguém possa ser eleito a determinado cargo eletivo. Em princípio, pois, todo eleitor deverá ser elegível para cumprimento de mandatos, nas mesmas condições.

Entretanto, o TSE já se posicionou sobre a questão por meio da Resolução nº 21.570/2003, que proíbe ao servidor da Justiça Eleitoral a filiação partidária, e da Resolução nº 22.088/2005, regulamentando que o "servidor da Justiça Eleitoral deve se exonerar para cumprir o prazo legal de filiação partidária, ainda que afastado do órgão de origem e pretenda concorrer em estado diverso de seu domicílio profissional".

A propósito, a Justiça Eleitoral é o único ramo do Poder Judiciário que legisla, por meio de Resoluções, sobre sua matéria, conforme determina o artigo 23, IX, do Código Eleitoral, naquilo que julgar conveniente para a execução deste diploma legal. O problema é que esta Justiça Especializada vem regulamentando matérias que extrapolam seus limites, em franca usurpação da competência legislativa constitucionalmente atribuída ao Poder Legislativo. Neste sentido é a Resolução do Tribunal Superior Eleitoral de nº 14.623/98, que fixa as atribuições da Polícia Federal quando à disposição da Justiça Eleitoral, e a Resolução nº 22.376/06, que dispõe sobre a apuração de crimes eleitorais. Diante disso, seria o caso de se julgarem inconstitucionais as Resoluções legisladas por esta Especializada, no tocante às matérias que extrapolam de sua competência.

Por fim a Constituição Federal garante a plenitude de liberdade de associação para fins lícitos, conforme se pode extrair de seu inciso XVII do art. 5º. Por se tratar de uma garantia constitucional, somente a própria poderia tratar das exceções, o que não ocorre no caso dos servidores da Justiça Eleitoral.

Dessa monta, verifica-se que a norma contida no art. 366 do Código Eleitoral não se adequa a alguns dos mais relevantes princípios que norteiam o atual ordenamento brasileiro, contrapondo-se a eles, fazendo com que a matéria não conduza a um entendimento unânime pelos Tribunais quanto à sua validade, conforme se verifica em seus julgados.

Veja-se, por exemplo, a resposta afirmativa à Consulta nº 2.305/99, dada pelo Tribunal Regional Eleitoral de Tocantins:

(...) não há vedação a filiação partidária, para efeitos de candidatura de servidor da Justiça Eleitoral, quando realizado no período que a lei eleitoral exige para concorrer a cargo eletivo" e que "é possível o retorno do servidor da Justiça Eleitoral à função que desempenhava antes da candidatura, desde que haja prévio cancelamento da filiação.

Em contrapartida, o Tribunal Superior Eleitoral respondeu à Consulta nº 1.164 que:

(...) o servidor da Justiça Eleitoral, para candidatar-se a cargo eletivo, necessariamente terá que se exonerar do cargo público em tempo hábil para o cumprimento da exigência legal de filiação.

E no julgamento do REsp nº 19.928, a maioria dos Ministros, com a ressalva do Ministro Sepúlveda Pertence, negou-lhe provimento por entenderem que:

(...) o servidor da Justiça Eleitoral, que não pode 'exercer qualquer atividade partidária, sob pena de demissão', para candidatar-se a cargo eletivo, deverá afastar-se do serviço público com tempo hábil para cumprimento da exigência de filiação partidária.

Conforme se vê, a falta de unanimidade entre os julgadores demonstra se tratar de matéria controversa em nosso sistema normativo.

De fato, diante ao seu descompasso com os valores resguardados pela atual Constituição Federal, é de se acreditar que a proibição contida na norma em análise não pode ter sido recepcionada, trazendo, com isso, grande prejuízo à uma classe de brasileiros, alijados de seu pleno exercício de cidadania, no sentido de reconhecimento desses indivíduo como pessoas integradas à sociedade estatal.

5.2 Interpretação extensiva do artigo 366 do Código Eleitoral pela jurisprudência.

Em recente questão, o Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe negou provimento ao Recurso Eleitoral nº 2.593/2008, sendo vencido o Relator, aceitando o argumento do Procurador Regional Eleitoral:

(...) seria indispensável que ela tivesse se exonerado da função na Justiça Eleitoral, a despeito de estar afastada, haja vista que o seu direito de pleitear cargo público é peremptoriamente vedado, em decorrência da sua impossibilidade de exercer atividade político-partidária, que inclui a indispensável filiação partidária, simultaneamente com a função. Não havendo cumprido tal requisito, olvidou em preencher um requisito indireto de elegibilidade (Grifado).

Verifica-se que aquele Tribunal Regional, em seu julgamento, acabou por estender a interpretação do art. 366 do Código Eleitoral ao aceitar a tese do Procurador Regional Eleitoral de que a vedação prevista pela lei aos servidores da Justiça Eleitoral não se limita apenas à atividade partidária, mas, também, à atividade política.

Deve-se ressaltar que, diante à limitação imposta por Lei Ordinária por recepção às garantias constitucionalmente previstas a uma parcela de seu funcionalismo, não pode a Corte Máxima da Justiça Eleitoral estender-lhe mais ainda as limitações.

No entanto, em decisão prolatada à Petição nº 1.025/2001, os Ministros do Tribunal Superior Eleitoral indeferiu pedido da Associação dos Servidores do Tribunal Superior Eleitoral - ASSERTSE que fosse permitido ao funcionário da Justiça Eleitoral o exercício da atividade política, com o seguinte fundamento:

De fato, é mais que razoável que aqueles que participam da organização do pleito e do processamento e julgamento dos feitos eleitorais não possam ter nenhuma atividade político-partidária. Penso que essa é uma decorrência inafastável da condição de servidor da Justiça Eleitoral, na medida em que, administrando eleições, deve permanecer totalmente isento, sem demonstrar explícito interesse por essa ou aquela agremiação.

De outra parte, não vejo como desvincular a filiação partidária das atividades político-partidárias, a que se refere o art. 366 do Código Eleitoral.

Apesar do posicionamento assumido pela Corte, deve-se ressaltar que ela não foi unânime, uma vez que o Ministro Sepúlveda Pertence, em voto vencido, argumenta que:

"embora consciente das razões de alta conveniência da proibição afirmada pela maioria, não me animo a estabelecer restrição de direitos políticos que - ao contrário de outras hipóteses (...) – nem impôs nem previu que a impusesse a lei".

Em Acórdão nº 434/2008 do Recurso Eleitoral nº 2.593 do Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe, o Relator Carlos Rebêlo Júnior, em voto vencido, faz uma interessante observação sobre o assunto, a cujos argumentos nos alinhamos:

"(...) que a fundamentação sentencial prendeu-se à terminologia 'atividade político-partidária'. Eis sutil ampliação, dado que a norma especifica bem: atividade partidária. Não se desconhece que haja decisões pretorianas caracterizando a filiação como atividade partidária.

Bem examinado, a filiação partidária é uma condição de elegibilidade constitucional, em outras palavras, requisito para o exercício de direito político. Esta exigência não deixa de ser uma excrescência que aumenta o chamado déficit democrático.

Para melhor elucidar, vejamos uma definição:

Os direitos políticos são a faculdade ou a garantia que tem o cidadão de integrar ou participar, direta ou indiretamente, da organização administrativa do Estado, por via eletiva ou de nomeação, do modo como previsto em lei.

Esse conjunto de normas assegura 'o direito subjetivo de participação no processo político e nos órgãos governamentais'.

Parece hialino que a atividade política não se confunde com a partidária. Conquanto, em alguns casos, o exercício de algumas tarefas na organização do Estado dependa de que a sua postulação seja antecedida de filiação partidária.

Tanto isto é diferente, que, por exemplo, quando se trata de vedação ao magistrado, a norma constitucional menciona 'atividade político-partidária".

A vedação ao servidor não tem o mesmo alcance, pois que se trata, singelamente, de 'atividade partidária'. Aqui, portanto, se dá o fenômeno inverso: o próprio legislador introduziu a distinção. Fazê-la, portanto, no caso, não é resultado de interpretação, mas do próprio e literal texto normativo.

Assim, não está vedado ao servidor eleitoral a atividade política. A filiação partidária para eventual postulação de cargos eletivos é um requisito que não confunde com a própria atividade política".

Sobre o autor
Vinícius Nunes Conrado

Contador formado pela UFMG, Técnico Judiciário do TRE-MG. Atualmente, cursando Direito na PUCMINAS.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CONRADO, Vinícius Nunes. A exclusão política do servidor da Justiça Eleitoral e as razões pelas quais não houve a recepção do artigo 366 do Código Eleitoral Brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3015, 3 out. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20127. Acesso em: 23 dez. 2024.

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