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A legitimidade democrática da jurisdição constitucional brasileira

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CONCLUSÃO

Ao fim e ao cabo do presente estudo, pode-se concluir que a legitimidade democrática do Supremo Tribunal Federal em se pronunciar amiúde sobre temas controversos da realidade nacional tem como fundamento a própria Constituição de 1988 que, sob os influxos do paradigma neoconstitucionalista, rompeu com o positivismo formal, abrindo as “janelas” do Direito para uma reflexão sintonizada com a realidade e os valores que orbitam em torno da questão jurídica, abrindo também, por conseguinte, as “portas” do Judiciário para demandas cada vez mais complexas do ponto de vista moral e ético. Tudo isso, necessário dizer, ampliou a visibilidade de nossa Corte Constitucional, que passou a ter um controle social mais efetivo, aproximando-se dos poderes populares. Saliente-se que tal visibilidade soaria estranha não exercesse a Jurisdição Constitucional um poder eminentemente político, como todos os outros, estando, contudo, encarregada de dar a última palavra sobre o texto constitucional e de garantir direitos fundamentais.

Outra constatação que pode ser feita é a de que as decisões que vêm sendo tomadas pela Corte Suprema, ainda que muitas vezes contrárias ao senso-comum majoritário e à grande mídia, não têm rompido com o consenso social. Dito de outro modo, as decisões do Supremo Tribunal Federal podem até contrariar a sociedade analisada de maneira quantitativa – ou mesmo qualitativamente, quando contraria segmentos sociais – mas tais decisões não têm causado abalos ou crises de identidade social que coloquem em xeque a legitimidade do Supremo Tribunal Federal de interpretar/aplicar o texto constitucional. Pode-se dizer, inclusive, que a abertura da Corte Constitucional à participação comunitária seja através das audiências públicas, seja pela intervenção do amicus curiae, ou mesmo pela transmissão ao vivo do plenário, tem erguido suas decisões a um grau de conformação social inquestionável.

Para terminar, embora no decorrer do presente trabalho tenha sido defendido que o destacado papel desempenhado pela Corte Constitucional brasileira nos rumos do país seja absolutamente legítimo, tendo como respaldo o sistema constitucional adotado pela Carta de 88, que trouxe em seu bojo o paradigma neopositivista, embora também neste tópico derradeiro fosse aplaudida a postura casualmente ativista do Supremo Tribunal Federal, não se pode olvidar que, assim como alertara Barroso (2010), exceto em prol da efetivação de direitos fundamentais e da defesa do princípio democrático, numa democracia que tem como fundamento o pluralismo político, o papel principal da vida política do Estado deve ser exercido pelos poderes de representatividade popular, isto é, por aqueles que recebem a chancela do povo para decidir.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Notas

[1] Neoconstitucionalismo e neopositivismo serão termos utilizados de maneira indiscriminada no presente trabalho, pois não se vislumbra uma distinção conceitual que possa acarretar desvio teórico.

[2] KELSEN, 1998, p. 12.

[3] Em sede de julgamento pelo Tribunal de Nuremberg, os generais nazistas fundamentaram suas atrocidades no puro cumprimento da lei.

[4] TAVARES, 2008, p. 333, grifo nosso.

[5] Expressão utilizada por Daniel Sarmento em “O Neoconstitucionalismo no Brasil: Riscos e Possibilidades”, 2009, p.43.

[6] No presente trabalho a menção a Jurisdição Constitucional será sempre para se referir ao Supremo Tribunal Federal, malgrado sua definição inclua o controle de constitucionalidade exercido de maneira difusa por Tribunais e juízes de primeiro grau.

[7] SARMENTO, 2009, p. 34.

[8] Nesse sentido a ilustração de Luís Roberto Barroso (2010, p. 08): “Como consequência, quase todas as questões de relevância política, social ou moral foram discutidas ou já estão postas em sede judicial, especialmente perante o Supremo Tribunal Federal. A enunciação que se segue, meramente exemplificativa, serve como boa ilustração dos temas judicializados: (i) instituição de contribuição dos inativos na Reforma da Previdência (ADI 3105/DF); (ii) criação do Conselho Nacional de Justiça na Reforma do Judiciário (ADI 3367); (iii) pesquisas com células-tronco embrionárias (ADI 3510/DF); (iv) liberdade de expressão e racismo (HC 82424/RS – caso Ellwanger); (v) interrupção da gestação de fetos anencefálicos (ADPF 54/DF); (vi) restrição ao uso de algemas (HC 91952/SP e Súmula Vinculante nº 11); (vii) demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol (Pet 3388/RR); (viii) legitimidade de ações afirmativas e quotas sociais e raciais (ADI 3330); (ix) vedação ao nepotismo (ADC 12/DF e Súmula nº 13); (x) não-recepção da Lei de Imprensa (ADPF 130/DF). A lista poderia prosseguir indefinidamente, com a identificação de casos de grande visibilidade e repercussão, como a extradição do militante italiano Cesare Battisti (Ext 1085/Itália e MS 27875/DF), a questão da importação de pneus usados (ADPF 101/DF) ou da proibição do uso do amianto (ADI 3937/SP). Merece destaque a realização de diversas audiências públicas, perante o STF, para debater a questão da judicialização de prestações de saúde, notadamente o fornecimento de medicamentos e de tratamentos fora das listas e dos protocolos do Sistema Único de Saúde (SUS).”

[9] Ibidem

[10] Segundo Daniel Sarmento (2006, p. 281): “Hoje, a opinião pública resulta cada vez menos do embate de ideias entre cidadãos bem informados, sendo cada vez mais definida pelos veículos de comunicação de massa.O sujeito real da democracia contemporânea não é, infelizmente, o cidadão participativo, mas o consumidor apático, que, no intervalo entre a novela e o filme enlatado, assiste no jornal da TV às notícias sobre o último escândalo político. Neste contexto, a mídia assumiu um enorme poder na fixação das agendas de discussão social, na seleção e apresentação dos pontos de vista que serão ouvidos sobre estes temas, e na própria realização das escolhas por cada indivíduo. A opinião pública, dizem os mais céticos, é a opinião publicada.” (grifo inserido)

[11] BRITTO, 2006, p. 31.

[12] Segundo Luis Roberto Barroso (2010, p. 24): “Além dos problemas de ambiguidade da linguagem, que envolvem a determinação semântica de sentido da norma, existem, também, em uma sociedade pluralista e diversificada, o que se tem denominado de desacordo moral razoável. Pessoas bem intencionadas e esclarecidas, em relação a múltiplas matérias, pensam de maneira radicalmente contrária, sem conciliação possível. Cláusulas constitucionais como direito à vida, dignidade da pessoa humana ou igualdade dão margem a construções hermenêuticas distintas, por vezes contrapostas, de acordo com a pré-compreensão do intérprete. Esse fenômeno se revela em questões que são controvertidas em todo o mundo, inclusive no Brasil, como, por exemplo, interrupção de gestação, pesquisas com células-tronco embrionárias, eutanásia/ortotanásia, uniões homoafetivas, em meio a inúmeras outras. Nessas matérias, como regra geral, o papel do direito e do Estado deve ser o de assegurar que cada pessoa possa viver sua autonomia da vontade e suas crenças. Ainda assim, inúmeras complexidades surgem, motivadas por visões filosóficas e religiosas diversas.”

[13] BINENBOJM, 2010, p. 99.

[14] HÃBERLE, 1997.

[15] A ação, movida pelo então Procurador Geral da República Cláudio Fonteles, versava sobre a inconstitucionalidade do art. 5º da Lei 11.105 (Lei de Biossegurança), tendo por fundamento a violação ao direito à vida e à dignidade da pessoa humana. O relator do caso, o ministro Carlos Ayres Britto, em razão da importância da matéria, julgou adequado ouvir depoimentos de pessoas com experiência e autoridade, garantindo, assim, uma maior participação da sociedade. A ação foi julgada improcedente sob o argumento de que a pesquisa em células-tronco embrionárias obtidas a partir de embriões humanos produzidos através de fertilização in vitro só poderá ser realizada mediante prévia autorização e aprovação por um Órgão Central de Ética e Pesquisa, o qual deverá ser vinculado ao Ministério da Saúde.

[16] BARROSO, 2009, p. 172.

[17] GOMES, 1997, p. 123.

[18] BELLO FILHO, 2003, p. 231.

[19] BARROSO, 2008, p. 03.

[20] STRECK, 2009, p. 53.

[21] Entende-se aqui por “político” tudo aquilo que está fora do campo do Direito.

[22] SARMENTO, 2009, p. 37.

[23] ZAFFARONI, 1995, p. 94.

[24] Nas palavras de Celso Antonio Bandeira de Mello (2009, p. 99), interesse público primário “é o pertinente à sociedade como um todo, e só ele pode ser validamente objetivado, pois este é o interesse que a Lei consagra e entrega a compita do Estado como representante do corpo social”.

[25] Segundo Barroso (2010) a autocontenção judicial é a conduta pela qual o Judiciário procura reduzir sua interferência nas ações dos outros Poderes.

Sobre os autores
Allender Barreto Lima da Silva

Advogado, pós-graduado em Direito Constitucional

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Allender Barreto Lima; BRAGA, Marina Lisboa. A legitimidade democrática da jurisdição constitucional brasileira. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3294, 8 jul. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22156. Acesso em: 14 nov. 2024.

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