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A incidência da multa do artigo 475-J do CPC no cumprimento de sentença

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Agenda 28/11/2012 às 10:29

Prevalece a doutrina que defende a incidência e exigibilidade da multa após o trânsito em julgado da decisão judicial, mediante intimação do devedor para pagamento, através de seu advogado.

Resumo: A presente pesquisa científica do cumprimento de sentença, enquanto fase de Processo sincrético, suas etapas, quando se dá o seu início, com relevância quanto ao prazo para a exigência da multa legal do artigo 475-J do Código de Processo Civil, explanando sobre a natureza jurídica da referida multa, com o estudo quanto a necessidade, ou não, da intimação prévia do devedor e as conseqüências a respeito da matéria, à luz da doutrina e jurisprudência, que divergem sobre o tema, especialmente quanto ao prazo relativo à referida multa e a intimação para cumprimento. A abordagem nesse sentido, considerando as diferentes posições jurisprudenciais e doutrinárias existentes, se faz ímpar, para a verificação da tendência da interpretação processual e possibilitar o surgimento de novas interpretações. Nesse sentido há de se analisar o início da exigência da multa do artigo 475-J do CPC e os principais pontos de divergência doutrinária e jurisprudencial decorrentes, com ênfase à intimação da parte vencida, e utilizando-se para tanto da metodologia qualitativa e analítica, com fonte referencial de reflexão a análise bibliográfica.

Palavras-chave: Cumprimento de sentença. Artigo 475-J CPC. Multa processual.


1 INTRODUÇÃO

Trata o presente trabalho do cumprimento de sentença e a aplicabilidade da multa processual prevista no artigo 475-J do CPC, com análise do momento de incidência da referida multa.

Nos últimos tempos ocorreram diversas alterações e reformas processuais que se deram no sentido de dar mais celeridade e efetividade aos processos, a exemplo do sincretismo processual, concatenando as antigas fases de conhecimento e de execução de sentença, surgindo então a fase de conhecimento e a fase de cumprimento de sentença de forma agregada.

Como decorrência das alterações realizadas o legislador vislumbrou a previsão de multa processual a ser aplicada ao vencido da demanda que não paga no prazo legal, conforme a previsão do artigo 475-J do CPC, criando ônus ao inadimplente e bônus à parte que colabora de plano com a efetividade do processo.

Surgem divergências doutrinárias e jurisprudenciais quanto ao momento em que se torna exigível a multa e se há necessidade de prévia intimação do vencido para início da contagem do prazo, e como deve se dar essa intimação.

A pertinência do tema se verifica a tomar conhecimento das posições doutrinárias e jurisprudenciais e suas conseqüências no direito aplicado – uma vez que a multa, além de uma coerção, reflete de forma direta no valor da obrigação, gerando conseqüências para as partes – possibilitando uma visão geral e permitindo a reflexão sobre o assunto tratado.

Tendo-se em vista a dinâmica própria do Direito, e no caso vertente, a divergência que há sobre a multa, início de sua exigência, se necessária ou não a prévia intimação do vencido na demanda, e como se dá essa intimação, vislumbra-se a probabilidade de surgirem novos entendimentos, inclusive diante do projeto de lei do novo código de processo civil.

Em assim sendo, objetiva o presente trabalho a análise do início da exigência da multa do artigo 475-J do CPC e os principais pontos de divergência doutrinária e jurisprudencial decorrentes, com ênfase à intimação da parte vencida.


2 DESENVOLVIMENTO

2.1 O SINCRETISMO PROCESSUAL E A EFETIVIDADE DO PROCESSO

Primeiramente, cumpre analisar como se deu a origem do presente processo sincrético.

A legislação processual civil brasileira em vigor se trata da Lei n. 5.869/1973, que na sua forma originária dividia em processos autônomos as medidas cautelares, o processo de conhecimento e o processo de execução, além de outras disposições não atinentes ao tema em estudo.

Com o passar dos anos, diante da dinâmica social e econômica, bem como pela necessidade de tornar o processo mais célere e efetivo, tornou-se imperativa a modernização do processo civil brasileiro, tendo nos últimos anos sofrido várias modificações – sempre visando maior celeridade processual, evitando excesso de recursos, e a efetividade do processo.

A durabilidade razoável do processo, erigida na Constituição da República através de Emenda Constitucional n. 45/2004, acrescentou o inciso LXXVIII, e respectivos parágrafos, no artigo 5º, que trata dos direitos e garantias fundamentais, dada a relevância que se tem dado à celeridade e efetividade processual.

Vieram nova reformas processuais, agora também por influência direta do texto constitucional, a exemplo da Lei n. 11.232/2005 que deu fim ao procedimento executivo autônomo, tornando-o uma fase do processo de conhecimento – estava criada a fase de cumprimento de sentença, configurando o sincretismo processual.

Os princípios da economia, celeridade e efetividade, ganharam força, ao mesmo tempo em que davam maior sustentabilidade ao processo civil, numa relação recíproca e concomitante. Doutrinadores, juristas e jurisdicionados vislumbraram importante passo na modernização do processo civil brasileiro:

Confirmou-se, assim, o que antes era apenas uma tendência. A execução passou a ser um prolongamento do processo de conhecimento, o que modificou substancialmente o sistema de execução. De certo modo o sincretismo já ocorria no sistema previsto pelos arts. 461 e 461-A do CPC. (CRUZ, 2007, p.196)

Ainda, a exemplo da evolução das reformas processuais ocorridas, especialmente quanto ao sincretismo processual, trata a doutrina:

Com a reforma da redação do art. 461 do CPC, em 1994, o processo de execução de sentença que impusesse uma obrigação de fazer ou de não-fazer foi extinto; em 2002, com a criação do art. 461-A, o mesmo regramento estendeu-se às obrigações para entrega de coisa. Faltava a sentença pecuniária. A execução dessas sentenças prescindia da instauração de um novo processo; dava-se em uma fase do procedimento posterior à certificação do direito, denominada de fase executiva. Tudo isso já foi examinado nos capítulos anteriores.

A Lei 11.232/2005 pretendeu eliminar o processo autônomo de execução de sentença. Criou-se a fase de cumprimento de sentença (arts. 475-I a art. 475-R), que corresponde à execução da sentença, só que em uma fase de um mesmo procedimento, e não como objeto de um outro processo. (DIDIER JR, 2007, p.417)

Vislumbra-se, assim, que o sincretismo processual se mostra condizente com os anseios dos jurisdicionados, traduzindo na economia e celeridade do processo, se aproximando de um processo mais efetivo.

Nesse sentido diz a doutrina:

O sincretismo processual traduz uma tendência do direito processual, de combinar fórmulas e procedimentos, de modo a possibilitar a obtenção de mais de uma tutela jurisdicional, simpliciter et de plano (de forma simples e de imediato), no bojo de um mesmo processo, com o que, além de evitar a proliferação de processos, simplifica e humaniza a prestação jurisdicional. (ALVIM, 2006, p.40)

Importante frisar que o cumprimento de sentença, que se reserva a sentença pecuniária de quantia certa, em que pese se tratar de uma fase processual em processo sincrético, possui a carga principiológica própria da execução, tendo como fundamental o princípio da efetividade.

A doutrina bem trata de tão importante princípio:

Da cláusula geral do “devido processo legal” podem ser extraídos todos os princípios que regem o direito processual. É dela, por exemplo, que se extrai o princípio da efetividade: os direitos devem ser, além de reconhecidos, efetivados. Processo devido é processo efetivo. O princípio da efetividade garante o direito fundamental à tutela executiva, que consiste “na exigência de um sistema completo de tutela executiva, no qual existam meios executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfação a qualquer direito merecedor de tutela executiva”.

Esse posicionamento é reforçado pela moderna compreensão do chamado “princípio da inafastabilidade”, que, conforme célere lição de KAZUO WATANABE, deve ser entendido não como uma garantia formal, uma garantia de acesso à ordem jurídica justa, consubstanciada em uma prestação jurisdicional célere, adequada e eficaz. “O direito à sentença deve ser visto como direito ao provimento e aos meios executivos capazes de dar efetividade ao direito substancial, o que significa o dieito à efetividade em sentido estrito”. Também se pode retirar o direito fundamental à efetividade desse princípio constitucional, do qual seria o corolário.

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Segundo MARCELO LIMA GUERRA, o direito fundamental à tutela executiva exige um sistema de tutela jurisdicional “capaz de proporcionar pronta e integral satisfação a qualquer direito merecedor de tutela executiva”. Mais concretamente, significa: a) A interpretação das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possível; b) O juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restrição a um meio executivo, sempre que essa restrição não se justificar à luz da proporcionalidade, como forma de proteção a outro direito fundamental; c) O juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessários à prestação integral de tutela executiva. (DIDIER JR, 2011, p.47)

Importa ao presente estudo o cumprimento de sentença de título judicial por quantia certa, que se dá no bojo do processo em que se discute o direito, enquanto fase processual, possuindo o sincretismo como característica que resulta em uma demanda mais célere e econômica, na busca da efetividade processual.

2.2 O CUMPRIMENTO DA SENTENÇA E O ARTIGO 475-J DO CPC

O procedimento do cumprimento de sentença apresenta duas fases distintas e subsequentes, quais sejam, a fase de cumprimento voluntário e a fase de execução forçada.

Na primeira fase, há o deferimento de prazo para que o devedor cumpra voluntariamente a obrigação, se trata de uma etapa, que se não cumprida enseja a segunda fase, em que são realizados os atos com vistas à satisfação forçada.

A doutrina bem define as fases quanto aos atos iniciais da execução:

O procedimento executivo da prestação de pagar quantia calcada em título judicial apresenta, tal como ocorre com o procedimento executivo calcado em título extrajudicial, duas fases bem definidas: (i) a primeira, denominada de fase inicial ou fase de cumprimento voluntário, por meio da qual se defere ao devedor um determinado prazo para que cumpra, espontaneamente, o dever que lhe foi imposto; (ii) a segunda, denominada de fase de execução forçada, em que se praticam atos tendentes à satisfação compulsória do direito de prestação do credor. A fase inicial é, como já se viu, preliminar à segunda fase, no sentido de que esta somente ocorrerá se não houver o adimplemento espontâneo durante a primeira fase. (DIDIER JR, 2011, p.518)

Parece pacífica a doutrina quanto as etapas iniciais dos atos da execução:

Constituído o título, manda  a lei que, antes de se passar à fase de execução, seja dado ao devedor um prazo de quinze dias para que efetue voluntariamente o pagamento. Se o fizer, nem sequer terá início a fase executiva, pois a obrigação foi cumprida.

Se não, o credor estará habilitado a requerer a execução, com expedição de mandado de penhora e avaliação. O montante da condenação será acrescido de multa de dez por cento do débito. (GONÇALVES, 2012, p.648)

No cumprimento de sentença condenatória por quantia certa, o devedor tem a faculdade de cumprir a obrigação, em razão da multa processual prevista no artigo 475-J do Código de Processo Civil. Ao optar pelo cumprimento, chama para si a responsabilidade, pois dará sequência ao procedimento, no sentido de concretizar a tutela e exaurir o comando judicial – ensina Humberto Theodoro Júnior que essa faculdade decorre tanto do dever de cumprir a obrigação quanto do direito de se ver livre da dívida, fazendo referência ao artigo 334 do Código Civil (THEODORO JÚNIOR, 2008, p. 546), artigo este que trata da consignação em pagamento, de forma que o depósito judicial “equivalerá ao pagamento, liberando o devedor de sua obrigação” (BDINE JR, 2008, p. 293).

Não obstante, trata-se de uma faculdade do devedor, uma vez que a responsabilidade pela execução é do credor, face ao princípio da disponibilidade do processo, vez que fica a seu critério a realização da execução. Pode dispor da execução, não executando, ou desistindo, parcial ou totalmente, tanto da demanda proposta quanto de algum ato realizado, a exemplo da penhora. Realiza-se ao interesse do credor (DIDIER JR, 2011, p. 62).

Ainda quanto ao princípio da disponibilidade do processo pelo credor, diz a doutrina:

A execução é feita a benefício do credor, para que possa satisfazer o seu crédito. Ele pode desistir dela a qualquer tempo, sem necessidade de consentimento do devedor. É o que dispõe o art. 569 do CPC: “ O credor tem a faculdade de desistir de toda a execução ou de apenas algumas medidas executivas”. Ela se distingue do processo de conhecimento, em que a desistência dependerá do consentimento do réu, quando ele já tenha oferecido resposta, o que se justifica porque este pode desejar um pronunciamento do juiz, que impeça o autor de voltar a juízo para rediscutir a questão.

Há um caso em que a desistência da execução demanda a anuência do devedor: se estiver embargada, e se os embargos não versarem apenas questões processuais, mas matéria de fundo, caso em que o executado-embargante poderá desejar o pronunciamento do juiz a respeito. (GONÇALVES, 2012, p.565)

Assim, verifica-se que cabe ao credor dar sequência à fase de cumprimento, em aplicabilidade ao princípio da iniciativa da parte. Humberto Theodoro Júnior, ensina que “Caberá ao credor requerer a medida em simples petição formulada com o demonstrativo do débito atualizado (art. 614, II), e, se for o caso, com o comprovante de que já ocorreu a condição ou o termo, se tais elementos foram previstos na sentença” (THEODORO JUNIOR, 2009, p. 48).

Ainda quanto a iniciativa do credor, a dar o impulso inicial nesta fase processual, com o objetivo de efetivar o comando judicial que lhe é favorável, aponta a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. NOS TERMOS DA SÚMULA 282 DO STF, É INADMISSÍVEL O CONHECIMENTO DE RECURSO POR ALEGADA VIOLAÇÃO A ARTIGOS DE LEI, CUJA APRECIAÇÃO NÃO FOI REALIZADA PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. CONFORME PRECEDENTE DESTA TURMA, QUE GUARDA ESTRITA SINTONIA COM O ENTENDIMENTO PACIFICADO NESTE EGR. STJ, "'A FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA NÃO SE EFETIVA DE FORMA AUTOMÁTICA, OU SEJA, LOGO APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO. DE ACORDO COM O ART. 475-J COMBINADO COM OS ARTS. 475-B E 614, II, TODOS DO DO CPC, CABE AO CREDOR O EXERCÍCIO DE ATOS PARA O REGULAR CUMPRIMENTO DA DECISÃO CONDENATÓRIA, ESPECIALMENTE REQUERER AO JUÍZO QUE DÊ CIÊNCIA AO DEVEDOR SOBRE O MONTANTE APURADO, CONSOANTE MEMÓRIA DE CÁLCULO DISCRIMINADA E ATUALIZADA". "OBSERVADO PELO CREDOR O PROCEDIMENTO RELATIVO AO CUMPRIMENTO DO JULGADO NA FORMA DO ART. 475-J DO CPC E CIENTE O ADVOGADO DA PARTE DEVEDORA ACERCA DA FASE EXECUTIVA, O DESCUMPRIMENTO DA CONDENAÇÃO A QUE LHE FORA IMPOSTA IMPLICA NA IMPOSIÇÃO DE MULTA DE 10% SOBRE O MONTANTE DEVIDO". AGRAVO IMPROVIDO. (STJ, 2010, s/p).

Em assim sendo, a iniciativa é condição para a realização dos demais atos da fase executiva, inclusive a permitir que se operem aqueles que se dão de ofício pelo juiz, a exemplo dos artigos 475-J, §1º ao 5º, e 475-L ao 475-R, do Código de Processo Civil.

2.3 A MULTA DO ARTIGO 475-J DO CPC

2.3.1. Natureza Jurídica da Multa Processual

Inicialmente, há de se tecer algumas considerações quanto a natureza jurídica da multa do artigo 475-J, especialmente em consideração a divergência doutrinária a respeito, apontando natureza punitiva (NEVES, 2006, p. 219), coercitiva (WAMBIER, 2006, p. 423) ou híbrida (DIDIER JR, 2011, p. 519).

Para a doutrina que afirma a natureza punitiva da multa em comento, justificam a posição tendo em vista que sua incidência se dá após decorrido o prazo da fase de cumprimento voluntário, penalizando o inadimplente. Já para os que defendem a natureza coercitiva se verifica no âmbito psicológico, diante da consciência de que o comando judicial deve ser cumprido de plano.

O legislador instituiu uma multa legal com o objetivo de forçar o cumprimento voluntário da obrigação pecuniária. Trata-se de medida de coerção indireta prevista em lei, que dispensa manifestação judicial: é hipótese de sanção legal pelo inadimplemento da obrigação. A multa tem, assim, dupla finalidade: servir como contramotivo para o inadimplemento (coerção) e punir o inadimplemento (sanção). (DIDIER JR, 2011, p.519)

Não obstante, ao que tudo indica, a teoria que explica a natureza híbrida – coercitiva e punitiva – da multa, parece mais acertada, correspondendo a cada fase dos atos iniciais do cumprimento de sentença, e sua influência em relação ao devedor.

2.3.2. O Prazo para Pagamento Voluntário e a Multa do Artigo 475-J

A depender da atuação do devedor haverá ou não a incidência da multa legal do artigo 475-J, no percentual de 10%, restando pacífico o entendimento doutrinário e jurisprudencial a respeito:

Multa de 10%. Intimado o devedor, na pessoa de seu advogado, pode cumprir (pagar) ou não cumprir o julgado (não pagar). O descumprimento desse dever de cumprir voluntariamente o julgado acarreta ao devedor faltoso a pena prevista no caput do CPC475-J: acrescente-se ao valor do título 10% (dez por cento), sob a rubrica de multa. O percentual incide sobre o valor total e atual da condenação, isto é, o valor que consta da sentença (ou da decisão de liquidação – CPC 475-A et seq.), acrescido de juros legais, correção monetária e outras verbas que incidirem legalmente ou por conta do que estiver contido no título. (NERY JUNIOR, 2007, p.733)

Surgem as divergências doutrinárias a partir de quando se dá a incidência da multa, para sua exigência, e quanto a necessidade de intimação do devedor:

(...) o legislador não estabelece a partir de quando se conta o acréscimo, assim como não fala em necessidade de intimação do devedor e, por conseqüência, não haveria de cogitar de o ato não previsto (a intimação) dever ser pessoal ou poder realizar-se na  pessoa de seu procurador. Limita-se o dispositivo em definir que, se não houver execução voluntária da obrigação reconhecida em sentença, sendo líquida ou tendo sido liquidada, passa a ser acrescida da multa de 10%. (FRIAS, 2007, p.156)

Quanto as divergências acerca da necessidade da intimação e o prazo para o início da etapa de cumprimento espontâneo, emergiram posições doutrinárias e jurisprudenciais:

Sobre ele, existem numerosas controvérsias. A principal é sobre o termo inicial da contagem, havendo três correntes doutrinárias e jurisprudenciais. São elas:

. o prazo corre automaticamente, desde o momento em que o titulo é constituído, sendo desnecessária a intimação do devedor. Quando não mais couber contra a sentença ou acórdão condenatórios recurso com efeito suspensivo, cumprirá ao devedor procurar o credor e fazer o pagamento, ou depositar o valor em juízo, para ser levantado pelo credor, ainda que os autos não tenham retornado do tribunal;

. o prazo corre a partir do momento em que o devedor é intimado na pessoa do advogado. A intimação, quando tiver havido recurso, pode ser feita em conjunto com aquela que determina o cumprimento do acórdão. Se o réu for revel, ela não será necessária, na forma do art. 322 do CPC;

. o prazo corre a partir do momento em que o devedor é pessoalmente intimado, não bastando a intimação na pessoa do advogado. (GONÇALVES, 2012, p.648)

Assim, parte da doutrina entende ser desnecessária a intimação, que ocorreria de forma automática, a partir do trânsito em julgado, havendo o dever do obrigado frente ao comando judicial (THEODORO JUNIOR, 2009, p. 49), tese que ganhou força inicialmente – nesse caso, bastaria a intimação do advogado da ocorrência do trânsito em julgado da decisão.

No mesmo sentido posicionou-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, ao menos num primeiro momento:

PROCESSUAL CIVIL. ALEGADA AFRONTA AO ART. 535 DO CPC- NÃO-OCORRÊNCIA. LEI 11.232/2005. ARTIGO 475-J, CPC. CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. MULTA. TERMO INICIAL. INTIMAÇÃO DA PARTE VENCIDA.

DESNECESSIDADE. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO-DEMONSTRADA. 1. O Tribunal de origem solveu a controvérsia de maneira sólida e fundamentada, apenas não adotando a tese dos recorrentes, razão pela qual fica afastada a afronta ao art. 535 do CPC. 2. Transitada em julgado a sentença condenatória, não é necessário que a parte vencida, pessoalmente ou por seu advogado, seja intimada para cumpri-la (REsp 954.859/RS, (REsp 954.859/RS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 16.8.2007). 3. Cabe ao vencido cumprir espontaneamente a obrigação, em quinze dias, sob pena de ver sua dívida automaticamente acrescida de 10% (REsp 954.859/RS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, Terceira Turma, DJU 27.8.2007). 4. A simples transcrição de ementas de acórdãos considerados paradigmas não é suficiente para dar cumprimento ao que exigem os arts. 541 do CPC e 255 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça. 5. Agravo regimental não-provido. (STJ, 2008, s/p).

Esse entendimento, diante da influência das decisões do Superior Tribunal de Justiça frente aos Tribunais Estaduais, espraiou-se e ganhou adeptos, surgindo o entendimento de que o prazo para pagamento do montante começaria a partir da eficácia da sentença, de forma que “em sendo proferida a sentença e tendo sido objeto de recurso de apelação recebido no duplo efeito, somente a partir da intimação do julgamento deste recurso é que, em tese, poderia passar a contar o prazo de 15 dias para cumprimento” (AMENDOEIRA JR, 2012, p. 400), posicionamento que gera reflexos quanto a execução provisória, e que será tratada posteriormente.

Frise-se que, a partir do instante em que a condenação se torna eficaz, o réu tem o dever de cumpri-la, depositando o valor devido. Portanto, ao interpor recurso sem efeito suspensivo, o réu deve depositar o valor da condenação, pena de ver incidir a multa de dez por cento sobre o montante devido. Porém, exatamente porque esta condenação é provisória, o credor não pode levantar o valor depositado sem prestar caução suficiente e idônea – a ser arbitrada de plano pelo juiz e prestada nos mesmos autos (art. 475-O, III, do CPC) - , sujeitando-se, ainda, à restituição da quantia e à reparação dos eventuais prejuízos sofridos pelo devedor em caso de reforma da decisão (art. 475-O, I e II, do CPC). (MARINONI; ARENHART, 2008, p.240).

Atualmente o entendimento pacificado pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça é pela necessidade de intimação do devedor, através de seu advogado, independente de onde ocorrer o trânsito em julgado, seja em primeira ou segunda instância:

PROCESSUAL CIVIL. LEI N. 11.232, DE 23.12.2005. CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA. JUÍZO COMPETENTE. ART. 475-P, INCISO II, E PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC. TERMO INICIAL DO PRAZO DE 15 DIAS. INTIMAÇÃO NA PESSOA DO ADVOGADO PELA PUBLICAÇÃO NA IMPRENSA OFICIAL. ART. 475-J DO CPC. MULTA. JUROS COMPENSATÓRIOS. INEXIGIBILIDADE. 1. O cumprimento da sentença não se efetiva de forma automática, ou seja, logo após o trânsito em julgado da decisão. De acordo com o art. 475-J combinado com os arts. 475-B e 614, II, todos do CPC, cabe ao credor o exercício de atos para o regular cumprimento da decisão condenatória, especialmente requerer ao juízo que dê ciência ao devedor sobre o montante apurado, consoante memória de cálculo discriminada e atualizada. 2. Na hipótese em que o trânsito em julgado da sentença condenatória com força de executiva (sentença executiva) ocorrer em sede de instância recursal (STF, STJ, TJ E TRF), após a baixa dos autos à Comarca de origem e a aposição do "cumpra-se" pelo juiz de primeiro grau, o devedor haverá de ser intimado na pessoa do seu advogado, por publicação na imprensa oficial, para efetuar o pagamento no prazo de quinze dias, a partir de quando, caso não o efetue, passará a incidir sobre o montante da condenação, a multa de 10% (dez por cento) prevista no art. 475-J, caput, do Código de Processo Civil. 3. O juízo competente para o cumprimento da sentença em execução por quantia certa será aquele em que se processou a causa no Primeiro Grau de Jurisdição (art. 475-P, II, do CPC), ou em uma das opções que o credor poderá fazer a escolha, na forma do seu parágrafo único – local onde se encontram os bens sujeitos à expropriação ou o atual domicílio do executado. 4. Os juros compensatórios não são exigíveis ante a inexistência do prévio ajuste e a ausência de fixação na sentença. 5. Recurso especial conhecido e parcialmente provido. (STJ, 2010, s/p).

Embora existam divergências doutrinárias e jurisprudenciais sobre o tema, com o julgamento, anteriormente citado, pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, ao que tudo indica, é a posição que se firmará, vez que vem ganhando força junto aos doutrinadores:

Parece que a melhor interpretação é a que exige a intimação do devedor, que pode ser feita pela imprensa oficial, dirigida ao seu advogado, consoante a tendência que se vem firmando em nosso ordenamento (p. ex.: arts. 57, 316, 475-A, §1º, 475-J, §1º, 659, §5º etc.). Isso porque podem surgir dúvidas sobre a data do trânsito em julgado (se o último recurso não foi conhecido, há controvérsia sobre o tema, conforme exposto no v. 3 deste Curso, para onde se remete o leitor ) e sobre o montante da dívida, que muitas vezes, exige, no mínimo, a elaboração prévia de cálculos aritméticos pelo próprio credor (art. 475-B, CPC). (DIDIER JR, 2011, p.520).

No mesmo sentido Nery Junior:

Intimação do devedor. O devedor deve ser intimado para que, no prazo de quinze dias a contar da efetiva intimação, cumpra o julgado e efetue o pagamento da quantia devida. A intimação do devedor deve ser feita na pessoa de seu advogado, que é o modo determinado pela Reforma da L 11232/05 para a comunicação do devedor na liquidação de sentença e na execução para cumprimento da sentença. (NERY JUNIOR, 2007, p.733).

Não obstante, importante salientar pela existência de entendimento a defender ser necessária a intimação pessoal do executado, e não através de seu advogado, vez que o cumprimento da obrigação configura ato pessoal do réu, sob pena de se reputar nula a intimação, e consequentemente não podendo ser cobrada a multa na execução de sentença (MEDINA, 2008, p. 220).

Para José Miguel Garcia Medina, a incidência da multa se dá de forma automática, “independentemente de requerimento do autor ou de decisão judicial” (MEDINA, 2008, p. 218), todavia, defende que a execução, tanto da multa quanto do valor principal, se dê mediante provocação do credor, e a necessidade de intimação pessoal do executado.

Em assim sendo se verifica que a doutrina e a jurisprudência existentes divergem quanto o início do prazo para aferição da exigibilidade da multa processual do artigo 475-J do CPC, inclusive quanto a necessidade e forma de intimação do devedor, todavia, prevalecendo o entendimento pela intimação através do advogado, mediante prévio pedido do credor nesse sentido.

2.3.2.1. Execução Provisória e a Multa do Artigo 475-J

Oportunamente, importante fazer uma análise quanto a execução provisória da sentença e a incidência da multa em estudo, vez que também nesse sentido existem divergências doutrinárias, a partir dos posicionamentos a que são adeptos os estudiosos do direito.

Defendendo a incidência da multa do artigo 475-J do Código de Processo Civil já no cumprimento provisório da sentença, a doutrina explana que “mesmo sendo o acórdão objeto de recurso ordinário ou de recurso extraordinário, não dotados de efeito suspensivo, poderá iniciar-se o cumprimento provisório da sentença, devendo ser incluída aí a multa de 10%, se não houver pagamento” (AMENDOEIRA JR, 2012, p. 400):

Assim, exatamente porque a execução está autorizada, o autor poderá requerer a execução da condenação provisória acrescida do valor da multa, solicitando, nos termos da parte final do art. 475-J do CPC, a penhora e a avaliação de bens do devedor. O art. 475-O, III, do CPC autoriza o exeqüente a alienar a propriedade destes bens, prestando caução suficiente e idônea. (MARINONI; ARENHART, 2008, p.361).

Nesse passo, se reformada a decisão que fora provisoriamente executada, caberá ao exeqüente a restituição integral do valor levantado.

Outro posicionamento, por decorrência lógica, é pela impossibilidade da aplicação da multa no cumprimento provisório da decisão judicial, entendimento que prevalece tanto na doutrina quanto na jurisprudência:

Há quem defenda a aplicação da multa na execução provisória sob o argumento de que ela teria a função de impedir o uso protelatório do recurso, já que sem ela o executado teria um meio fácil e econômico de impedir a ultimação do processo executivo. Observe-se, no entanto, que a multa do art. 475-J não tem caráter repressivo de litigância de má-fé. (THEODORO JÚNIOR, 2008, p.573).

Ainda em referência aos ensinamentos de Theodoro Júnior, em complemento:

Muito se discute sobre o cabimento, ou não, da multa de 10%, prevista no art. 475-J para o cumprimento de sentença relativa a obrigações de quantia certa, no caso de execução provisória. A meu sentir, não tem pertinência a imposição de tal pena a quem ainda não se acha sujeito ao cumprimento definitivo da condenação. Em se tratando de execução manejável a conta e risco do credor, em condições de precariedade, não se pode entrever falta ou mora do devedor por não dar imediato cumprimento à sentença. (THEODORO JÚNIOR, 2008, p.615).

No mesmo sentido é o entendimento de Luiz Rodrigues Wambier, ao expor que não seria razoável a imposição de multa tendo por base uma sentença ainda passível de mudança (WAMBIER, 2008, p. 307).

2.3.3. A Multa Processual e o Projeto de Lei do Novo CPC

Tendo por referência a redação original do Projeto de Lei n. 166 de 2010 – Novo Código de Processo Civil – que tramita no Senado, o atual artigo 475-J encontra correspondência, especialmente, nos artigos 495 e 496, em que até o momento indicam pela necessidade de apresentação de demonstrativo de cálculo pelo credor, para posterior intimação do devedor para pagamento, sob pena de multa – que incidirá retroativamente, caso o devedor não tenha acolhida suas alegações no sentido de afastá-la, e a incidência parcial, nos termos do artigo 496, parágrafos 2º e 3º, respectivamente, do projeto de lei em comento.

O que se observa, é que a tendência é pela incidência da multa tão somente no cumprimento definitivo da decisão, e a necessidade de intimação do devedor, mesmo que através de seu advogado, mediante pedido prévio do credor, que deverá apresentar cálculo discriminado do valor.

Em assim sendo, o que nota, é que a posição doutrinária e jurisprudencial que atualmente está a ser aplicada vai ao encontro das tendências legislativas que estão a dar os contornos na matéria em estudo no âmbito do projeto do novo código processual.

Sobre o autor
Cinthia da Silva Pintado

Assessora jurídica no escritorio de Advocacia Machado, em Cascavel (PR).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PINTADO, Cinthia Silva. A incidência da multa do artigo 475-J do CPC no cumprimento de sentença. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3437, 28 nov. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23118. Acesso em: 27 dez. 2024.

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