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Não incidência de contribuição previdenciária sobre a distribuição de lucros aos sócios

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Agenda 11/04/2013 às 09:16

Remuneração refere-se necessariamente ao pagamento ao sócio pelo trabalho, gerência e tempo disponibilizado junto à sociedade. Ao contrário, a distribuição de lucros consiste em retorno ao sócio do capital investido para iniciação e desenvolvimento do negócio, não havendo que se falar em salário nem em contribuição previdenciária.

1. INTRODUÇÃO:

A constituição de uma sociedade empresária limitada necessita apresentar em seu Contrato Social constitutivo, dentre outros requisitos constantes do art. 997 do Código Civil, o capital social pelo qual iniciará suas atividades, nos termos do inciso III do referido dispositivo.

Dispõe ainda o respectivo inciso que o capital social poderá ser “expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária”.

Desse modo, conclui-se necessariamente que o capital investido pelo sócio, seja ele em moeda ou quaisquer espécies de bens, é fator essencial para o desenvolvimento das atividades da sociedade, de forma que obtendo lucros, nada mais próprio que tais valores retornem aos sócios, como fruto do investimento originalmente realizado.

Não há previsão expressa no Código Civil quanto à destinação dos resultados da sociedade. Nesses termos, o Contrato Social pode determinar a distribuição desses valores, estabelecendo, por exemplo, que o lucro auferido seja reinvestido na própria sociedade, ou ainda, deixar tal decisão sob o crivo da maioria societária. Omisso o Contrato Social a respeito do assunto, mas estabelecida a regência supletiva da LSA (Lei n.° 6.404/76), tem-se necessariamente que metade do lucro mínimo ajustado deve ser distribuído entre os sócios, no fim de cada exercício (art. 202, I, da LSA).

Certo, no entanto, que aos sócios é assegurado o direito de participar nos dividendos da sociedade, ou quando verificado o prejuízo com o pagamento das perdas. Esse direcionamentose verifica claramente da leitura do art. 1.007 do Código Civil:

“Art. 1.007. Salvo estipulação em contrário, o sócio participa dos lucros e das perdas, na proporção das respectivas quotas, mas aquele, cuja contribuição consiste em serviços, somente participa dos lucros na proporção da média do valor das quotas.

Art. 1.008. É nula a estipulação contratual que exclua qualquer sócio de participar dos lucros e das perdas.”

Assim, sem abordar maiores particulares, como por exemplo a distribuição proporcional ou desproporcional às quotas e outras situações atinentes à matéria, tem-se necessariamente que a obtenção de lucros e retorno do capital investido é a intenção precípua da constituição e desenvolvimento de qualquer atividade empresária.

Nesse sentido, importa citar Fábio Ulhôa Coelho[1]:

A participação nos resultados da empresa representa a principal motivação para qualquer pessoa se unir a outras, numa sociedade empresária. Tanto os sócios com perfil de empreendedor como os de investidor buscam, ao contratar a constituição da limitada, obter retorno do capital nela empregado, em níveis que superem (ou, ao menos, igualem) os oferecidos por outras alternativas de investimento existentes no mercado. A repartição dos lucros da sociedade entre os seus membros é o principal fator de atração do interesse dos sócios; e corresponde, no plano jurídico, a direito inerente à titularidade da quota social.

Ato contínuo, e adentrando à matéria analisada no presente artigo, é sabido e consabido que sobre a distribuição de lucros não incide tributação relativa a imposto de renda, tendo em vista que tais receitas da sociedade já foram objeto de tributação, sendo a participação e distribuição dos lucros parte residual de tais valores e inequivocamente o retorno do capital inicialmente investido pelo sócio.

Essa é a interpretação decorrente das previsões legais contidas no art. 10 da Lei n.° 9.249/1995, art. 39, inciso XXIX do RIR/99 (Decreto n.° 3.000/99) e art. 48 caput, e §§ 1° a 8° da IN 093/97 expedida pela Receita Federal do Brasil (RFB).

Entender de modo contrário seria impor aos sócios e à sociedade bi tributação, considerando-se a ocorrência de um único fato gerador, conforme exposto.

Nesse mesmo conceito, tem-se que eventual distribuição de lucros não pode ser confundida como remuneração ao sócio, mas tão somente como retorno de seu investimento inicialmente realizado, ao integralizar o capital social para fins de constituição da sociedade empresária.

Embora seja cristalina conclusão decorrente do entendimento acima, o Fisco, em sua sangria arrecadatória, tem-se se sobreposto a alguns princípios e normas do direito com vistas a exigir do contribuinte tributos de forma indevida, interpretando a legislação tributária e dando-lhe o significado que melhor lhe assiste. Senão vejamos:


2. DO ENTENDIMENTO DO FISCO:

Consoante observado, não obstante a conhecida e onerosa carga tributária imposta ao contribuinte brasileiro, o Fisco também sido demasiado abusivo na interpretação da legislação tributária, destacando-se dentre seus posicionamentos pela autuação de alguns contribuintes no que tange à incidência de contribuição previdenciária sobre a parcela relativa à distribuição de lucros de determinadas sociedades empresárias.

Em determinadas situações, sociedades prestadoras de serviços tem sido fiscalizadas e autuadas pela Fazenda em decorrência da distribuição de lucros aos sócios da empresa, presumindo-se que a parcela relativa à distribuição dos lucros trata-se, na verdade de remuneração, e, portanto, passível de incidência de contribuição previdenciária.

Para tanto, a Previdência Social tem se baseado na previsão legal constante do art. 201, inciso II, § 5º, II, do Regulamento da Previdência Social(Decreto 3.048/99). In verbis:

Art. 201. A contribuição a cargo da empresa, destinada à seguridade social, é de:

II - vinte por cento sobre o total das remunerações ou retribuições pagas ou creditadas no decorrer do mês ao segurado contribuinte individual;

§ 5º  No caso de sociedade civil de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissões legalmente regulamentadas, a contribuição da empresa referente aos segurados a que se referem as alíneas "g" a "i" do inciso V do art. 9º, observado o disposto no art. 225 e legislação específica, será de vinte por cento sobre:

II - os valores totais pagos ou creditados aos sócios, ainda que a título de antecipação de lucro da pessoa jurídica, quando não houver discriminação entre a remuneração decorrente do trabalho e a proveniente do capital social ou tratar-se de adiantamento de resultado ainda não apurado por meio de demonstração de resultado do exercício.(grifo nosso)

Assim, independentemente da sociedade empresária declinar em seu Contrato Social que o sócio administrador irá auferir um salário como pró-labore, em razão do trabalho desenvolvido junto à empresa, recolhendo regularmente a contribuição previdenciária incidente sobre tal valor (inciso I, art. 201 do Decreto 3.048/99), na ocorrência de distribuição de lucros, de forma antecipada, o entendimento do Fisco é que os respectivos valores transmitidos aos sócios sob essa rubrica, representariam na realidade pagamento aos sócios pelos serviços prestados pela sociedade junto aos seus clientes.

E, por tais razões, entende o Fisco que tal valor consiste em remuneração, e, portanto, passível de incidência da contribuição previdenciária referida, com fundamento no art. 28, § 9°, gda Lei n.° 8.212/1991. Verificada tal situação, submete-se o contribuinte à fiscalização, havendo necessariamente a lavratura do Auto de Infração respectivo em face da sociedade.

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No entanto, em que pese o Fisco declinar e impor aos contribuintes seu parcial entendimento, cumpre salientar que tal interpretação é totalmente contrária à legislação pertinente, exigindo-se do contribuinte tributos de modo totalmente indevido, estando tais autuações desprovidas de fundamento legal para tanto.


3. DAS RAZÕES DE NÃO-INCIDÊNCIA DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA:

3.1 Do princípio da legalidade:

Preliminarmente, insta ressaltar que tal tentativa de tributação atenta flagrantemente aos princípios de direito tributário, precisamente por esse posicionamento do Fisco incluir no sistema tributário vigente a presunção como fato gerador do tributo, vez que eventualdistribuição de lucros seria considerada como remuneração, ao arrepio do princípio da legalidade vigente no Direito Tributário, bem como a previsão expressa da ocorrência do fato gerador, nos termos do art. 116 do Código Tributário Nacional.

Ora, é de conhecimento que a reserva legal é princípio inerente do Direito Tributário. No entanto, no que tange ao fato gerador constante do art. 201, § 5°, inciso do II temos que o mesmo atribui obrigação tributária futura, mesmo que o evento a que lhe dá embasamento já tenha ocorrido. Trata-se do instituto conhecido pela doutrina como fato gerador antecipado, consistindo no estabelecimento de obrigação de recolher tributo com base em ocorrência material que possa vir a se subsumir à hipótese de incidência futura.

No caso específico, conforme pretende a Fazenda Pública, o fato gerador constante do dispositivo de lei acima se refere a fato gerador antecipado, o qual visa exigir do contribuinte tributos com base em evento que futuramente se perpetuará (inexistência de lucro acumulado a distribuir). Ou seja, embora o fato gerador já tenha ocorrido (distribuição do lucro) a hipótese de incidência (inexistência do lucro ao fim do exercício) ainda se encontra pendente, vindo a ocorrer somente em uma data futura.

No entanto, por se tratar de estabelecimento de obrigação tributária, definindo fato gerador de exação, tem-se necessariamente que tal vinculação deve encontrar fundamento legal, atendendo-se ao princípio da reserva legal, devendo ser essa obrigatoriedade ser disciplinada por Lei Complementar, em seu sentido formal, nos termos do art. 150, I da Constituição Federal e art. 97, III do Código Tributário Nacional.

Ademais, a própria definição do Código Tributário Nacional, em seu art. 114, atribui que “o fato gerador da obrigação tributária principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência”. Nesse sentido é explícita a lição de Hugo de Brito Machado[2]:

“Definida em lei, vale dizer que a definição do fato gerador da obrigação tributária principal, a descrição da situação cuja ocorrência faz nascer essa obrigação, é matéria compreendida na reserva legal. Só a lei é o instrumento próprio para descrever, para definir, a situação cuja ocorrência gera a obrigação tributária principal.”

Contudo, no que se refere ao art. 201, § 5°, inciso II, suporte legal do fato gerador da contribuição previdenciária pretendida, tem-se que tal obrigação fora prevista por meio de Decreto (Decreto nº 4.729/2.003), não sendo encontrado, portanto, qualquer fundamento legal para a imposição de obrigação tributária ao contribuinte.

Ora, conforme depreende-se da redação constante do art. 99 do CTN, verifica-se que os Decretos não são instrumentos normativos, mas sim reguladores de disposições gerais. Nesse sentido:

Art. 99. O conteúdo e o alcance dos decretos restringem-se aos das leis em função das quais sejam expedidos, determinados com observância das regras de interpretação estabelecidas nesta Lei.”

Outrossim, o próprio dispositivo constitucional que dispõe acerca da Seguridade Social, isto é, o art. 195 da Constituição Federal estabelece em seu § 4° que “a lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social”, demonstrando mais uma vez que a imposição e exigibilidade do recolhimento de quaisquer tributos depende necessariamente de legislação específica, em seu sentido formal.

Inadmissível, portanto, que o Fisco, quando da tentativa de configurar o lucro distribuído aos sócios como natureza salarial, intente, por meio de norma desprovida dos requisitos formais para sua edição e por dizer de reserva legal, presumir que a distribuição de tais valores ocorreu de modo indevido, sendo suscetível de incidência da contribuição tributária respectiva.

Nessa direção manifesta-se Roque AntonioCarrazza[3]:

“Pensamos que quando a Constituição declara ser vedado às pessoas políticas ‘exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça’, ela implicitamente proíbe a utilização de artifícios exegéticos, meios de prova, presunções, ficções, indícios etc., que, à falta deste ato normativo, levem a um destes resultados.

É certo que o direito tributário admite ficções, presunções e indícios. É igualmente certo, todavia, que não pode ignorar os princípios constitucionais, que formam o que Louis Trotabas chamava de Estatuto do Contribuinte, especialmente o da tipicidade fechada.”

Nesses termos, conclui-se, de forma preliminar, que a pretensão da Fazenda Pública no que tange à cobrança da contribuição previdenciária respectiva não pode prosperar, vez que não encontra fundamento legal necessário à previsão da ocorrência concreta do fato gerador da obrigação tributária.

Assim, não havendo previsão expressa em lei, em seu sentido formal, desatende-se o princípio da reserva legal, sendo indevida qualquer obrigação tributária sob tal fundamento.

3.2 Da distinção havida entre distribuição de lucros e remuneração:

Prosseguindo-se, observa-se que o entendimento proferido pela Fazenda tende a confundir os valores transmitidos aos sócios como distribuição de lucros com aqueles os quais lhes seriam devidos a título de remuneração (pró-labore). E, em razão desse posicionamento, impõe-se ao contribuinte a exigibilidade de recolher a contribuição previdenciária sobre o total repassado ao sócio, mesmo que sob a rubrica de lucros distribuídos.

No entanto, há nítida distinção entre os institutos, os quais decorrem de situações díspares, isto é, a distribuição de lucros nada mais é que o retorno do capital social inicialmente integralizado pelos sócios quando da constituição da sociedade, já o pró-labore, consiste na remuneração pelos serviços prestados por esse sócio junto à empresa, por seu tempo disponibilizado para a gerência da sociedade.

Nesse caminho, cumpre colacionar doutrina de Fábio Ulhôa Coelho[4]:

“No plano conceitual, os lucros remuneram o capital investido na sociedade. Todos os sócios, empreendedores ou investidores, têm direito ao seu recebimento, nos limites da política de distribuição contratada entre eles. Já o pro labore, ainda no plano dos conceitos, remunera o trabalho de direção da empresa. Seu pagamento, assim, deve beneficiar apenas os empreendedores, que dedicaram tempo à gestão dos negócios sociais.”

E prossegue o eminente Autor:

“No plano jurídico, a distinção assume contornos exclusivamente formais, e se afasta da pureza conceitual. Quer dizer, os lucros, quando distribuídos, são devidos a todos os sócios; o pro labore, ao sócio ou sócios que, pelo contrato social, tiverem direito ao seu recebimento. Em decorrência da rigidez formal da regra, o sócio investidor, que não trabalha na gestão da empresa, mas que é nomeado, no contrato social, como titular de direito a pro labore, deve receber o pagamento. Em contrapartida, o empreendedor que exerce a administração, mas não é lembrado, no contrato social, como titular do direito ao pro labore, não o pode receber.”

Assim, da leitura da citação acima, depreende-se uma nítida distinção entre os institutos, concluindo-se que de forma alguma podem ser confundidas suas ocorrências.

Outrossim, mais uma vez demonstrando a incompatibilidade entre distribuição de lucros e remuneração, aponta-se que a referida legislação pretende alterar o conceito de renda já definido inclusive pela própria legislação do imposto de renda, violando assim diretamente a vedação constante do art. 110 do Código Tributário Nacional que dispõe acerca da proibição de alteração pela legislação tributária de conceitos e institutos jurídicos de direito privado.

Nesses termos, não obstante a flagrante inconstitucionalidade formal do dispositivo acima apontado como fundamento à exigência da contribuição previdenciária, tem-senecessariamente que a distribuição de lucros representa tão somente o retorno do capital social investido pelos sócios quando da constituição da sociedade, segundo se expôs. Não se refere a salário/remuneração derivado da empresa, visto que essa ocorrência somente se verifica ante ao pagamento de pró-labore ao sócio administrador ou administrador não-sócio, frise-se, quando estes necessariamente exercerem tais atividades em favor da sociedade.

Ora, o próprio art. 201, § 1° do Regulamento da Previdência Social (Decreto n.° 3.048/1999) é claro ao observar que a parcela relativa ao lucro distribuído ao empresário não é considerada remuneração, e, portanto, está isenta de qualquer incidência da contribuição previdenciária respectiva. Nesse sentido, colaciona-se o referido dispositivo:

“Art. 201. A contribuição a cargo da empresa, destinada à seguridade social, é de: [...]

§ 1º São consideradas remuneração as importâncias auferidas em uma ou mais empresas, assim entendida a totalidade dos rendimentos pagos, devidos ou creditados a qualquer título, durante o mês, destinados a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive os ganhos habituais sob a forma de utilidades, ressalvado o disposto no § 9º do art. 214 e excetuado o lucro distribuído ao segurado empresário, observados os termos do inciso II do § 5º.” (grifo nosso)

Outrossim, a previsão constante do art. 28, § 9°, j da Lei n.° 8.212/1991 é clara ao observar que a parcela relativa à participação nos lucros/resultados da sociedade empresária não representa salário contribuição, e, portanto, não está sujeita à incidência de contribuição previdenciária respectiva:

“Art. 28. Entende-se por salário-de-contribuição:[...]

§ 9º Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente: [...]

j) a participação nos lucros ou resultados da empresa, quando paga ou creditada de acordo com lei específica;”

Frise-se que tal dispositivo refere-se à eventual participação nos resultados por empregados contratados pela sociedade empresária, nos moldes celetistas (art. 3° da Consolidação das Leis do Trabalho), mas no mesmo sentido dispõe acerca das parcelas que podem ou não serem consideradas como parte do salário-de-contribuição.

Da análise das legislações pertinentes não se verifica qualquer obrigatoriedade de pagamento de pró-labore ao sócio, nem estabelece valor mínimo a ser pago, sendo eventualmente devida remuneração pelo trabalho realizado junto à sociedade, situação a qual, em determinadas sociedades sequer ocorre ordinariamente.

Assim, resta evidente que sobre a parcela decorrente de distribuição de lucros não há incidência de contribuição previdenciária, vez que necessariamente não pode ser entendida como remuneração, sendo, assim, descabidas quaisquer exigências do Fisco perante os contribuintes nesse sentido. Nesse caminho tem decidido nossos Tribunais:

TRIBUTÁRIO. LUCRO PRESUMIDO. ESCRITA CONTÁBIL. LIVRO CAIXA. DISTRIBUIÇÃO DE LUCROS. PRÓ-LABORE. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. 1. O contribuinte que sofre tributação pelo lucro presumido, não está obrigado à manutenção de escrita contábil, mas tão-somente de Livro Caixa. 2. Aos sujeitos privados é dado fazer tudo que a lei não proíbe, pelo que não é possível que se exija do contribuinte que faça algo de que a lei expressamente o dispensa - escrituração contábil -, sujeitando-o, à autuação e tributação. 3. Valores recebidos a título de distribuição de lucros não configuram pagamento de natureza salarial, sendo ilegítima a incidência da contribuição social sobre esses valores. 4. Para a verificação da natureza dos valores lançados, basta que o contribuinte mantenha Livro Caixa discriminando contabilmente os lançamentos decorrentes do trabalho (pró-labore), sobre os quais incide a contribuição previdenciária, e os lançamentos referentes à distribuição dos lucros. (TRF4, APELREEX 2005.71.15.002319-6, Primeira Turma, Relator Joel Ilan Paciornik, D.E. 20/04/2010) (grifo nosso)

Outrossim, a própria Receita Federal, na Solução de Consulta n.° 046/2010 expedida pela Superintendência Regional da Receita Federal - SRRF / 6a. Região Fiscal, proferiu esse entendimento:

DISTRIBUIÇÃO DE LUCROS AOS SÓCIOS.NÃO INCIDÊNCIA. O sócio cotista que receba pro labore é segurado obrigatório do RGPS, na qualidade de contribuinte individual, havendo incidência de contribuição previdenciária sobre o pro labore por ele recebido. Não incide a contribuição previdenciária sobre os lucros distribuídos aos sócios quando houver discriminação entre a remuneração decorrente do trabalho (pro labore) e a proveniente do capital social (lucro) e tratar-se de resultado já apurado por meio de demonstração do resultado do exercício.- DRE.Estão abrangidos pela não incidência os lucros distribuídos aos sócios de forma desproporcional à sua participação no capital social, desde que tal distribuição esteja devidamente estipulada pelas partes no contrato social, em conformidade com a legislação societária. DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei Nº 8.212/1991, art. 12, inc. V, alínea "f"; Decreto Nº 3.048/1999 - Regulamento da Previdência Social - RPS, art. 201, caput e §§ 1º e 5º, incs. I e II; Lei Nº 10.406/2002, arts. 997, incs. IV e VII, 1.007, 1.008, 1.053 e 1.054. ROBERTO DOMINGUES DE MORAES - Chefe Substituto (Data da Decisão: 24.05.2010 14.06.2010) (grifo nosso)

Importa, no entanto, salientar que a previsão legal empregada pelo Fisco como sustentáculo à incidência da contribuição previdenciária (art. 201, inciso II, § 5º, II,Decreto 3.048/99), é clara ao afirmar acerca da discriminação contábil dos valores relativos ao pró-labore e as importâncias destinadas pela sociedade como distribuição de lucros.

Outrossim, em ocorrendo a distribuição antecipada de resultados, o balanço da empresa e documentos contábeis que comprovem a apuração de lucros devem apontar nesse sentido, sob pena de se permitir a “presunção” por parte do Fisco que a distribuição realizada aos sócios consistiu necessariamente em remuneração.

Ademais, importante também ressaltar que as cláusulas constantes do Contrato Social da empresa também são fonte de análise para o Fisco proceder à fiscalização e autuação respectiva. Nesse sentido, a expressa previsão da possibilidade de distribuição antecipada de lucros, bem como o pagamento de pró-labore aos sócios-administradores tende a evitar que as condutas efetivamente praticadas pela sociedade sejam incompatíveis com as previsões de seu Contrato Social, impedindo sejam os atos considerados como dissimulação, nos termos do art. 116, Parágrafo Único e art. 149, VII, ambos do Código Tributário Nacional.

Nesses termos, não obstante os fundamentos acima atestem pela não-incidência de contribuição previdenciária sobre a parcela relativa a distribuição de lucros aos sócios, insta salientar que a organização dos documentos contábeis da empresa, com a discriminação correta dos valores, bem como os cuidados com a elaboração das cláusulas do Contrato Social prevendo a possibilidade de distribuição antecipada de lucros e pagamento de pró-labore são imprescindíveis para evitar qualquer margem de entendimento contrário pelo Fisco, eximindo a empresa de eventual autuação fiscal.

Há situações, contudo, no que tange às sociedades empresárias optantes pelo regime de tributação do SIMPLES Nacional (Lucro Presumido) que a legislação desobriga o contribuinte de manter escrita contábil respectiva, procedendo-se tão somente à emissão do Livro-Caixa.

Em casos como esse, verificando-se por meio desses lançamentos contábeis que parcela referiu-se à distribuição de lucros e não pagamento de remuneração, também não há que se falar em incidência da contribuição previdenciária respectiva. Nesse sentido tem entendido o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4):

SIMPLES. LUCRO PRESUMIDO. ESCRITA CONTABIL. LIVRO CAIXA DISTRIBUIÇÃO DE LUCROS. PRO-LABORE. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIARIA. 1. O contribuinte optante pelo SIMPLES, sofrendo tributação pelo lucro presumido, não está obrigado à manutenção de escrita contábil, mas tão-somente de Livro Caixa. 2. Aos sujeitos privados é dado fazer tudo que a lei não proíbe, pelo que não é possível que se exija do contribuinte que faça algo de que a lei expressamente o dispensa - escrituração contábil -, sujeitando-o, à autuação e tributação. 3. Valores recebidos a título de distribuição de lucros não configuram pagamento de natureza salarial, sendo ilegítima a incidência da contribuição social sobre esses valores. 4. Para a verificação da natureza dos valores lançados, basta que o contribuinte mantenha Livro Caixa discriminando contabilmente os lançamentos decorrentes do trabalho (pró-labore), sobre os quais incide a contribuição previdenciária, e os lançamentos referentes à distribuição dos lucros. 5. A lei é indiferente que a distribuição de lucros tenha se procedido, em algumas competências, em meses subsequentes. Tal circunstância não se configura ilegal, nem enseja conclusão inequívoca de evasão fiscal. Referência Legislativa:LEG-FED DEC-612 ANO-1992 ART-47 PAR-8 LET-C LEG-FED DEC-2173 ANO-1997 ART-47 PAR-7 LET-A LET-B Decisão: A TURMA, POR UNANIMIDADE, DEU PROVIMENTO AO APELO TRF4 - AC - APELAÇAO CIVEL - 200271070054278 - 15/06/2004 - Tribunal Regional Federal da 4a. Região - TRF-4ª - SEGUNDA TURMA(Data da Decisão: 15/06/2004 - Data de Publicação: 21/07/2004) Espécie: AC - APELAÇAO CIVEL – 625848 - Relator(a): JUIZ DIRCEU DE ALMEIDA SOARES (grifo nosso)

Desse modo, ante aos fundamentos expostos, conclui-se pela impossibilidade da incidência de contribuição previdenciária sobre a parcela relativa aos lucros distribuídos aos sócios, pois em hipótese alguma podem tais valores serem tidos como remuneração, diferentemente dos valores considerados como pró-labore, devidamente apontados nos documentos contábeis respectivos.

Sobre o autor
Diogo Fantinatti de Campos

Advogado na cidade de Joinville/SC. Graduado em Direito pela Faculdade Estadual de Direito do Norte Pioneiro - Fundinop - UENP. Pós-graduando em Direito Civil e Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAMPOS, Diogo Fantinatti. Não incidência de contribuição previdenciária sobre a distribuição de lucros aos sócios. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3571, 11 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24166. Acesso em: 2 nov. 2024.

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