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Protesto de títulos e o momento da lavratura do protesto

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Agenda 08/09/2013 às 11:11

3.            PROTESTO DE TÍTULOS

O Protesto é o ato pelo qual se comprova, oficialmente, que uma obrigação foi descumprida ou não aceita. O art. 1º da Lei nº 9492/97 conceitua o protesto como sendo o “ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida”.

Vicente de Abreu Amadei melhor define a finalidade do protesto ao referir que este tem o condão de provar uma “situação cambiária insatisfeita”. (AMADEI, Vicente Abreu. DIP, Ricardo (coordenador) et al. Introdução ao Direito Notarial e Registral. Porto Alegre: Fabris Editor IRIB, 2004, pag. 75).

O serviço de protesto de títulos é prestado pelo Tabelião de Protesto. A Lei nº 8935/94, em seu art. 5º, assim nomeia este profissional. Enquadra a atividade de protesto dentro daquelas típicas dos notários. O ato do protesto é o que sedimenta um procedimento, voltado à obtenção de um resultado: provar a insatisfação de uma situação cambiária.

O ato do protesto é, portanto, notarial, no sentido de que lança em notas o acontecido, o presenciado, e certifica que aquilo ocorreu. Não há um juízo de qualificação meramente documental. O Tabelião de Protestos verifica o título apresentado, se contém algum vício. Em não havendo algo que impeça o procedimento do protesto, o Tabelião diligenciará a intimação do devedor (não abordaremos aqui a questão do aceite, nas Letras de Câmbio, que hoje quase estão fadadas ao completo desuso). Aguarda-se a conduta do intimado para, após, caso o mesmo não se prontifique a cumprir a obrigação, “tirar-se” o protesto.

Essa série de situações que ocorrem durante o procedimento confirma a natureza notarial do protesto. As atividades mencionadas nos incisos I e III do art. 6º da Lei nº 8935/94 são exercidas pelo Tabelião de Protesto. Formalizam juridicamente a vontade das partes, no sentido de que testificam a insatisfação da situação cambiária ou em forma similar às cambiárias.  Autenticam fatos, de forma a certificar que o devedor deixou de agir.

Entretanto, isso não afasta o enquadramento do Protesto como um ato de registro. É que o Tabelião de Protesto lança o teor do protesto em seu Livro, procedendo a verdadeiro assentamento registrário.

Vicente de Abreu Amadei discorre sobre isso:

“Por fim, sob o ângulo do direito notarial e registrário apresenta-se intrincada questão, ou seja, saber se o ato oficial extrajudicial do protesto é notarial, de registro ou misto:

a)           segundo a tradição do instituto é ato notarial (daí até a denominação “Tabelião de Protesto” – não “Oficial Registrador”), porque o Tabelião é terceiro (testemunha qualificada) em condições de testificar (comprovar), com o sinal da fé pública, o protesto que o portador do título (o primeiro) faz em relação ao devedor (o segundo); assim, o Tabelião viabiliza, testifica e instrumenta publicamente o protesto e, neste sentido, pela tradição do instituto, é ato notarial;

b)           todavia, a Lei 9.492/97 também o qualifica como ato de registro (daí a denominada de Livro de Registro de Protesto), porque cabe ao Tabelião registrar (inscrever) o fato do protesto para proclamar publicamente a nova situação jurídica do título: título protestado;

c)           assim, como cabe ao Tabelião de Protesto essa dupla função – dar forma escrita e pública ao protesto, instrumentando-o, bem como inscrevê-lo para proclamar publicamente a nova situação jurídica do título -, a natureza do protesto, em meu ver, é mista: notarial e registral”. (AMADEI, Vicente Abreu. DIP, Ricardo (coordenador) et al. Introdução ao Direito Notarial e Registral. Porto Alegre: Fabris Editor IRIB, 2004, pag. 89).

E o protesto pode ser visto com a função única de testificar a inércia do devedor. Modernamente, o protesto é um meio de coerção. O credor provoca o Tabelião de Protesto com o intuito de coagir, licitamente, o devedor a cumprir a obrigação. A finalidade do serviço de protesto de títulos é, também, o de satisfazer o crédito. Se o devedor não honrar a obrigação no tríduo legal, terá contra si lavrado termo de Protesto, o qual poderá ser informado a entidades de proteção ao crédito, restringindo a liberdade contratual do devedor.

Sérgio Luiz José Bueno afirma:

“Assim, a atividade dos Tabeliães de Protesto vai muito além da simples testificação da falta de pagamento, aceite ou devolução do título ou documento de dívida. Nos dias de hoje, os citados Profissionais do Direito, por meio de procedimento legal e oficial, testificam também o cumprimento de obrigações e é preciso dizer, mesmo sem rigor estatístico, que cerca de metade dos apontamentos resulta em pagamentos, propiciando aos credores a satisfação de seus créditos. Se não tivesse o credor a faculdade de valer-se do Tabelionato de Protesto, fatalmente o litígio aportaria em um de nossos tribunais, já de há muito assoberbados, e o credor legítimo aguardaria por meses ou anos pelo pagamento que no Tabelionato poderia ocorrer em poucos dias.

É essencial que não tenhamos uma visão distorcida do protesto como instituto jurídico, como tem sido lançado equivocadamente mesmo em algumas decisões pretorianas. O procedimento que pode resultar no protesto não é apenas um meio de coerção para obtenção do pagamento pelo devedor. É muito mais que isso, mesmo nos casos de protesto facultativo. É, sim, uma forma rápida e segura de composição e prevenção de litígios, sem passar por manobrar meramente protelatórias que insegurança e revolta trazem aos bons pagadores. Não é um castigo ao mau pagador, mas um caminho jurídico legítimo e eficaz para o credor, com o desafogo do Poder Judiciário”. (BUENO, Sérgio Luiz José. O protesto de títulos e outros documentos de dívida : aspectos práticos. – Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris Ed., 2011, pág. 23)

A finidade do protesto é, portanto, dúplice: constituir prova oficial da inércia de alguém, e de coagir o devedor a pagar, sob pena de sofrer restrições diversas.

3.1.       RESPONSABILIDADE CIVIL

Quanto à responsabilidade civil dos Tabeliães de Protesto, remeto as considerações feitas quando da análise do item 2.3 deste trabalho monográfico. Em síntese, entendo inaplicável o art. 38 da Lei nº 9.492/97 (que impõe a responsabilidade subjetiva), mesmo que somente restrita aos Tabeliães de Protesto. A Lei nº 8935/94, de caráter geral, regulou a matéria no art. 22, impondo a todos os Notários e Registradores a responsabilização objetiva. Não poderia o legislador regular a matéria de forma diversa, justamente porque o fundamento da Lei nº 8935/94 é o parágrafo 1º do art. 236 da Constituição Federal. Somente uma Lei pode ter caráter geral para regular a atividade notarial e registral, disciplinando a responsabilidade civil e criminal dos mesmos.

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O entendimento acima confronta com parte da doutrina. Sérgio Luiz José Bueno é um dos que defendem a aplicação da teoria da responsabilidade subjetiva aos Tabeliães de Protesto. Comentando o art. 38, Sérgio Bueno expõe:

“O artigo em comento estabelece a responsabilidade civil subjetiva ao Tabelião de Protesto, ou seja, sua responsabilização depende da demonstração de que agiu com dolo ou culpa. Descabida se mostra a imputação de responsabilidade objeti/va, tal como se dá com o art. 22 da Lei nº 8.935/94.

A propósito, tendo em vista que a Lei 9.492/97 é posterior àquela a que nos referimos, tem-se que vige para os Tabeliães de Protesto a responsabilidade subjetiva estabelecida na lei mais nova.

Note-se que o Tabelião de Protesto responde pelos atos de seus prepostos, desde que se demostre que em relação a eles agiu com imprudência, imperícia ou negligência. É o que se dá, no caso de culpa in eligendo e in vigilando”. (BUENO, Sérgio Luiz José. O protesto de títulos e outros documentos de dívida : aspectos práticos. – Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris Ed., 2011, pág. 187).

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul já reconheceu a responsabilidade civil objetiva dos Tabeliães, aplicando o art. 22 da Lei nº 8935/94:

APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL DO TABELIÃO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL. PREJUÍZOS DECORRENTES DA INDEVIDA AVERBAÇÃO PELO REGISTRO IMOBILIÁRIO. QUESTÃO ANALISADA EM PROCEDIMENTO DE DÚVIDA. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS ADEQUADAMENTE FIXADOS. SENTENÇA MANTIDA.

O tabelião responde objetivamente pelos atos praticados no exercício de sua serventia. Inteligência do artigo 22 da Lei 8.935/94.

Para que seja reconhecida a responsabilidade pela falha na prestação do serviço, é indispensável a prova do dano e, ainda, do nexo causal.

Os prejuízos sofridos pelo autor decorrem de ato praticado pelo Registro Imobiliário, quando da averbação indevida da escritura pública, circunstância que também foi apurada em procedimento de dúvida. Indenização indevida.

Honorários sucumbenciais fixados em conformidade com os ditames contidos no artigo 20, §§ 3º e 4, do CPC. Sentença mantida...228.935

(70044705960 RS , Relator: Romeu Marques Ribeiro Filho, Data de Julgamento: 29/02/2012, Quinta Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 07/03/2012)

3.2.       PRINCÍPIOS

O serviço de protesto de títulos está sujeito a regras, normas e princípios. Estes últimos norteiam a edição das regras, a criação de normas e a interpretação de ambos.

Vicente de Abreu Amadei divide os princípios aplicáveis à atividade notarial de protesto em 3 (três) grupos: os institucionais, os finalísticos, e os específicos do protesto de títulos. Tratou de dividir ainda os princípios específicos em dois subgrupos: aqueles de ordem finalística, que regulam o protesto como ato jurídico, e aqueles de ordem operacional, que vislumbram o protesto como procedimento notarial-registral.

Quanto aos princípios institucionais, entende-se que se aplicam, em geral, aos serviços de notas e de registro, os princípios que regem o regime jurídico administrativo. São eles os elencados no art. 37 da Constituição, especialmente a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência. Ainda, o da continuidade do serviço público e o da fiscalização pelo Poder Judiciário (art. 236 da Constituição).

No segundo grupo, constam os princípios finalísticos que, evidentemente, dizem respeito aos fins do protesto. São dois os princípios: o da segurança jurídica formal e o da publicidade.

O princípio da segurança jurídica é inerente a todas as atividades de notas e de registros, e constitui pressuposto de existência desses serviços. As serventias extrajudiciais são os braços do Estado que tem em sua matriz fundamental a busca da segurança jurídica. Deste princípio decorre o atributo que confere aos serviços notariais e registrais a característica de certeza: a fé pública. São os chamados dignos de fé, a que fez alusão Demócrito de Abdera.

Quanto ao princípio da segurança jurídica formal, Vicente de Abreu Amadei o divide em dois modos: estaticamente e dinamicamente. Assim, expõe o doutrinador:

“Esse princípio maior das Notas e dos Registros, que é o de segurança jurídica formal, particulariza-se no serviço de protesto de títulos de dois modos:

a)           estaticamente, conferindo, concreta e formalmente, certeza jurídica (por presunção relativa) às situações cambiárias não satisfeitas de cada título protestado;

b)           dinamicamente, na medida em que projeta confiança na vida comercial (especialmente na proteção ao crédito), quer infundindo esperança de que os títulos inadimplidos venham a ser satisfeitos com rapidez, quer atuando como veículo de informação de protestos tirados, em favor dos adquirentes de boa-fé, para os negócios jurídicos futuros.

Publicidade é, nas Notas e Registros, o meio (instrumento) pelo qual se atinge a segurança jurídica estática e dinâmica e, por isso, enquanto esta (segurança jurídica) é a razão última deles, a publicidade é a razão próxima: Notas e Registros existem para a publicidade (e daí para a segurança jurídica), e, por isso é que o ato notarial e o ato de Registro se qualificam como “públicos” (não como “seguros”)”. (AMADEI, Vicente Abreu. DIP, Ricardo (coordenador) et al. Introdução ao Direito Notarial e Registral. Porto Alegre: Fabris Editor IRIB, 2004, pag. 100-101).

A publicidade notarial (dos Tabeliães de Protesto) difere da publicidade estudada em Direito Administrativo. Enquanto nesta há a imposição ao administrador público de agir com transparência, lisura, ética, de garantir acesso às informações de interesse coletivo. A publicidade notarial, no entanto, visa o interesse privado, particular. A publicidade notarial confere notoriedade ao ato jurídico, conferindo eficácia, produzindo efeitos na esfera jurídica das partes. A fé pública é marca da publicidade notarial, que garante a autenticidade e a presunção de veracidade ao ato.

Os princípios específicos do protesto são o da oficialidade, da insubstitutividade, da unitariedade, da rogação, da celeridade, e da formalidade simplificada. Os três primeiros dizem respeito à ordem finalística do protesto, enquanto os três últimos tratam do protesto como procedimento.

A oficialidade traduz a noção de que o protesto é um ato oficial, realizado por uma pessoa dotada de atributos peculiares, qual seja, de conferir autenticidade e presunção de veracidade a um ato ou fato.

A insubstitutividade do protesto denota a necessidade do protesto como meio indispensável de prova. Não há outra forma supressão do protesto. O protesto de título não pode ser substituto por qualquer testemunho, documento ou ato.

Pelo princípio da unitariedade entende-se que o protesto é ato único. O que está sendo protestado é o título, a falta de pagamento ou a falta de aceite, e não a pessoa que consta no título.

O princípio da rogação, também conhecido por instância, reza que o Tabelião de Protesto somente pode iniciar o procedimento do protesto mediante requerimento formal do interessado, pessoalmente ou por procurador.

Os princípios da celeridade e da formalidade simplificada implicam na ideia de que o procedimento do protesto deve ser norteado pela rapidez. As relações empresariais e negociais exigem que a satisfação da obrigação ocorra de maneira dinâmica. O protesto é o procedimento que visa garantir efetividade ao direito de crédito.

A demora na tirada do protesto pode acarretar prejuízos desnecessários ao credor. Os prazos do protesto traduzem a inserção desses princípios: 24 (vinte e quatro) horas para protocolização dos títulos apresentados e 3 (três) dias úteis para a lavratura do protesto.

Ainda, é possível levantar, no contexto do princípio da formalidade simplificada, o exemplo da intimação do devedor para pagar no tríduo legal. Conforme dicção do art. 14 da Lei nº 9.492/97, a intimação do protesto não precisa ser feita pessoalmente ao devedor, sendo considerada válida se entregue no endereço indicado pelo credor, assumindo este a responsabilidade pela veracidade da informação.

3.3.       TERRITORIALIDADE

O Tabelionato de Protesto está sujeito ao princípio da territorialidade. A Lei nº 9492/97, no art. 6º, apenas se refere ao local do protesto quando trata dos cheques, que deverá ser levado a protesto no Tabelionato da local da praça de pagamento ou do domicílio do devedor.

As regras de competência dos serviços de protesto levam em consideração as leis esparsas, que tratam dos títulos de crédito em espécie. Geralmente, a praça de pagamento indicada no título determina o serviço competente para a tirada do protesto.

Importante salientar que, em regra, a territorialidade do protesto é definida pela unidade da comarca. As normas estaduais é que definem com clareza a divisão dos serviços de protesto, podendo haver mais de um Tabelionato na mesma localidade. Nesta hipótese, faz-se necessária a instalação de serviço de distribuição de títulos, conforme diretriz do art. 7º da Lei de Protesto.

3.4.       TÍTULOS PROTESTÁVEIS

A noção clássica do protesto de títulos se funda na ideia de títulos de créditos. A origem do instituto do protesto está diretamente ligada ao conceito desses títulos, em especial ao da Letra de Câmbio, que caracteriza-se por seu o título cambiário mais tradicional.

A Lei nº 9492/97 inovou ao introduzir a possibilidade de protesto de outros documentos de dívida. O conceito de documentos de dívida é amplo, e muito tem se discutido sobre isso.

O art. 1º da mencionada Lei possui a seguinte redação:

“Art. 1º Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida”.

 

A Lei de Protesto regulou o protesto, e o estendeu a duas possibilidades: títulos e documentos de dívida. Títulos de dívida são os conhecidos títulos de crédito clássicos, letra de cambio, cheque, duplicata, nota promissória, cédulas, etc.

Há ainda os documentos de dívida. A interpretação dada no Estado de São Paulo é a sedimentada no Parecer nº 076/05-E, da Corregedoria Geral da Justiça, lançada pelo MM. Juiz José Antônio de Paulo Santos Neto, no bojo do Processo CG 864/2004:

“PROTESTO DE TÍTULOS E OUTROS DOCUMENTOS DE DÍVIDA – Alcance desta terminologia – Inteligência da Lei nº 9.492/97 à luz do hodierno ordenamento jurídico – Possibilidade de protesto dos títulos executivos judiciais e extrajudiciais – Atributos de liquidez, certeza e exigibilidade – Caráter normativo – Inclusão do contrato de locação de veículo desde que ajustado ao inciso II do art. 585 do Código de Processo Civil”.

Nesse sentido, todos os documentos que gozem dos atributos de liquidez, certeza e exigibilidade podem ser admitidos a protesto, especialmente os títulos executivos judiciais e extrajudiciais, dispostos nos artigos 475-N e 585 do Código de Processo Civil.

Sílvio de Salvo Venosa comenta a mudança de visão e de interpretação dos serviços de protestos:

“A Lei nº 9.492/97, ao ampliar as possibilidades de protesto a outras modalidades de obrigações, insere-se nesse desiderato, qual seja, instrumentalizar o credor mais uma ferramenta para que seu crédito seja adimplido. A posição da lei não é nova, pois o Código Civil de 2002 enfatiza a função social do contrato (art. 421) e os princípios de probidade e boa-fé (art. 422). Aliás, o princípio da boa-fé objetiva é norteador de todo direito obrigacional no diploma civil, e a jurisprudência já o aplica amplamente. A nova lei de protestos insere-se nesse ordenamento. A matéria não é nova na legislação, pois os processualistas já se adiantaram e, na última década do século XX, introduziram importantes modificações no CPC, em prol do sentido social no cumprimento das obrigações, dando nova feição à execução específica e autorizando a tutela antecipada.

(...)

Destarte, não há surpresas nem necessidade de maiores investigações para buscar a ratio essendi da inovação da lei que permite o protesto extrajudicial de outros documentos de dívida, fora do âmbito dos títulos cambiários. A tendência é de ser ampliado o universo de documentos representativos de créditos, sujeitos a protesto”. (VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil; direito empresarial / Sílvio de Salvo Venosa, Cláudia Rodrigues. 2 ed. – São Paulo: Atlas, 2010, pág. 263-264).

Recentemente, houve inclusão do parágrafo único no citado art. 1º da Lei nº 9492/97. Por meio dessa adição, “as certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas” são documentos sujeitos ao protesto. A Lei nº 12767/2012, que determinou a inclusão do paragrafo único, veio em boa hora, em virtude das constantes discussões doutrinárias e também jurisprudenciais sobre o tema.

A protestabilidade das certidões de dívida ativa é objeto de inúmeros questionamentos. Um deles emana do MM. Desembargador Milton Nobre:

“Anoto que, não obstante os bons propósitos que podem mover os defensores da validade do protesto das CDAs, como meio de receber o montante elevadíssimo de dívida ativa não paga de fato existente no Brasil, e mesmo o protesto de sentenças transitadas em julgado que versem sobre o pagamento, em especial de dívidas líquidas de natureza alimentar ou trabalhista, no meu modo de ver, essas práticas, ainda que possam vir a ser consagradas em lei, o que não duvido possa acontecer com a atual relativização dos conceitos jurídicos e o predomínio de um conhecimento norteado pelo pragmatismo, ao mesmo tempo tão imediatista quanto pouco responsável, serão sempre destituídas de fundamento ético que as legitime juridicamente, uma vez que desfavorecem o equilíbrio entre as partes com riscos de prejuízo para os notoriamente mais fracos, ou sejam, no caso das CDAs, os contribuintes e, no daquelas sentenças, o alimentante ou o trabalhador, pois na hipótese destas, como antes sublinhado, sendo o apontamento feito sob responsabilidade destes, poderão vir a pagar as despesas cartoriais e até a responder por dano”. (NOBRE, Milton Augusto de Brito. Protesto das CDAs: mutação ou deformação no protesto de títulos. In Revista do Ministério Público do Estado do Pará. Belém: Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional, ano 5, vol.1, 2010, p. 145).

Os que defendem a impossibilidade do protesto da Certidão de Dívida Ativa argumentam que tais documentos possuem natureza oficial, com presunção de veracidade. O protesto, portanto, não conferirá publicidade, ou certeza quanto a inércia do devedor, posto que a CDA é emitida em razão da comprada inadimplência do devedor. O protesto seria desvirtuado, passando apenas ao condão de compelir o devedor a pagar, sob pena de restrição à liberdade contratual, com a possível incluir do nome do devedor nos bancos de restrição ao crédito.

Apesar dos argumentos desfavoráveis, é plenamente possível o protesto das Certidões de Dívida Ativa, especialmente considerada a existência de permissivo legal. Além disso, o protesto das CDAs deve ser visto também sob o princípio da segurança jurídica dinâmica, a qual visa garantir confiança ao meio negocial, de que as dívidas serão adimplidas, que as obrigações serão honradas no prazo adequado.

O protesto é o meio idôneo e oficial para tal intento. Outro atributo importante nessa problemática é a condição de imparcialidade do Tabelião de Protesto. A Certidão de Dívida Ativa é emitida após um procedimento feito pelo próprio credor da dívida, em termos gerais. A execução da dívida possui instrumento processual próprio, mas não tão célere quanto o praticado nos Tabelionatos de Protesto. O procedimento do protesto garante uma tentativa a mais para satisfazer a obrigação inadimplida. Aí está inserido o interesse não só do ente credor, mas da sociedade, que almeja seja o crédito satisfeito. O Tabelião de Protesto é agente imparcial, que não participou do procedimento administrativo voltado a instrumentalizar a CDA, e por conta disso legitimará a cobrança da dívida.

O procedimento do protesto se traduz em um meio célere e simplificado para coagir o devedor a satisfazer a obrigação, quitando a dívida, e evitando assim a inauguração de um processo contencioso.

Sobre o autor
José Eduardo de Moraes

Tabelião e Registrador do 1º Ofício de Porto Franco - Maranhão.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MORAES, José Eduardo. Protesto de títulos e o momento da lavratura do protesto. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3721, 8 set. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25247. Acesso em: 5 nov. 2024.

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