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A transportadora não pode reter produto pelo não pagamento da verba de estadia

A retenção dos produtos transportados, sob a justificativa do não recebimento da verba de estadia, é ilegal, constituindo exercício arbitrário das próprias razões.

 O tema em questão tem sido corrente, no dia a dia, no âmbito do transporte, sobretudo no transporte rodoviário. Isso porque, nos incumbimos de explorar a questão com relação à “verba de estadia”.

 A “verba de estadia” foi regulada pelo § 5º, do artigo 11 da Lei nº 11.422/2007, que assim dispõe:

“§ 5º Atendidas as exigências deste artigo, o prazo máximo para carga e descarga do veículo de Transporte Rodoviário de Cargas será de 5 (cinco) horas, contadas da chegada do veículo ao endereço de destino; após este período será devido ao TAC ou à ETC o valor de R$ 1,00 (um real) por tonelada/hora ou fração”.

 Tal disposição somente se aplica em caso da ausência de previsão contratual entre as partes, quanto ao prazo limite de carga e descarga e valor da verba de estadia.

 A não observância do prazo legal ou contratual estipulado para carga e descarga das mercadorias, seja pela falta de omissão ou de meios empregados para cumprimento do contrato de prestação de serviços, dá azo à condenação por responsabilidade civil e respectiva condenação ao pagamento da “verba de estadia”.

 Por óbvio, o escopo da lei não é a de enriquecer as empresas transportadoras, mas sim evitar que o transportador que utiliza um caminhão tipo "truck" ou que possua apenas um "cavalo" e uma carreta, sofra prejuízo decorrente da espera de mais de cinco horas para descarregar seu veículo no destino, ficando impossibilitado de realizar outros fretes e de, consequentemente, obter lucro.

 Essa orientação vem ao encontro da lição de CARLOS MAXIMILIANO segundo a qual: "Precisa o exegeta possuir um intelecto respeitoso da lei, porém ao mesmo tempo inclinado a quebrar-lhe a rigidez lógica; apto a apreender os interesses individuais, porém conciliando-os com o interesse social, que é superior; capaz de reunir em uma síntese considerações variadíssimas e manter-se no difícil meio termo - nem rastejar pelo solo, nem voar em vertiginosa altura”.

 Todavia, não se pode impor prejuízo ao terceiro de boa-fé.

 Insta ressaltar que o contrato de prestação de serviços não tem força sobre o transportador que dele não pactuou. Isso se dá porque os contratos celebrados fazem lei entre as partes, não podendo, todavia, restringir direitos de terceiros.

 Vale dizer que o contrato só obriga aqueles que tomaram parte em sua formação, não prejudicando nem aproveitando a terceiros, tendo em vista que ninguém pode se tornar devedor ou credor sem sua plena aquiescência.

 Por isso mesmo é que a retenção dos produtos transportados, sob a justificativa do não recebimento da verba de estadia, é ilegal, constituindo exercício arbitrário das próprias razões.

 Recente decisão a respeito do tema em mote se deu na Comarca de Rio Brilhante/MS que julgou procedente a ação interposta contra uma empresa de transportes que reteve os produtos destinados para entrega, em razão do não pagamento da “verba de estadia”.

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Conforme trecho da decisão do D. Juízo monocrático:

“Portanto, mesmo sendo legítimo o direito ao recebimento da verba devida pelo tempo excedido no desembarque da mercadoria, não podem os requeridos procederem de modo a obstar entrega do produto, uma vez que inexiste qualquer autorização legal para tanto”.

 Aliás, em reforço à tese aqui exposta (em matéria aduaneira e tributária), existem duas súmulas a referendar a abusividade/ilegalidade da conduta descrita, quais sejam: Súmulas 70, 323 e 547 do STF.

 Portanto, a nosso ver, é indevida retenção das mercadorias armazenadas, via desembarque, além do tempo necessário para assegurar o pagamento da verba correspondente (contrapartida do serviço); transmudando a situação existente, tornando ilegal e abusiva a conduta da empresa de transporte, uma vez que após a formalização do crédito, com a respectiva documentação suporte (destinada a sua cobrança), a mercadoria deve ser liberada.

 Aliás, será considerado ilegal, por parte do Judiciário, o ato de apreender ou reter mercadorias como condição de pagamento de valores. Isto porque não se pode privar a empresa de seus bens sem o devido processo legal, conforme dispõe o artigo 5º, inciso LIV, da Constituição Federal, e consoante com a Súmula nº 323 do STF, aqui aplicado analogicamente.

 Desse modo, no caso de ser ultrapassado o prazo máximo legal ou contratado para carga e descarga do veículo de Transporte Rodoviário de Cargas (e havendo negativa do Contratante do pagamento da verba de estadia), deve o transportador viabilizar a entrega da carga, efetuando, posteriormente a cobrança judicial da verba de estadia.

Sobre os autores
Rodrigo Vallejo Marsaioli

advogado, sócio do escritório "MARSAIOLI ADVOGADOS ASSOCIADOS", administrador de empresas pela Faculdade de Administração de Empresas de Santos - FAES,pós-graduado em Direito pela UNISANTOS e membro do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-Seção São Paulo.

Roberta Sinigoi Seabra de Azevedo Frank

Advogada. Formada em Direito pela Universidade Católica de Santos – UNISANTOS. Pós Graduada em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária. É associada do escritório MARSAIOLI & MARSAIOLI ADVOGADOS ASSOCIADOS.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARSAIOLI, Rodrigo Vallejo; FRANK, Roberta Sinigoi Seabra Azevedo. A transportadora não pode reter produto pelo não pagamento da verba de estadia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3732, 19 set. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25338. Acesso em: 22 nov. 2024.

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