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A submissão ao tratamento involuntário na visão das Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais e o embaraço jurisprudencial causado pelo antagonismo judicial

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Agenda 30/04/2014 às 11:30

Trata-se de estudo acerca das divergências existentes entre as Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça de Minas Gerais na apreciação do tema tratamento médico involuntário.

Resumo: Trata-se de estudo acerca das divergências existentes entre as Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Diverge em demasia a corte mineira sobre a submissão à terapia médica involuntária, requerida pelo Ministério Público, Defensoria Pública ou por algum familiar. Mantém-se inerte o Tribunal de Apelação ao não se utilizar da medida de uniformização de jurisprudência, ação que impediria a diversidade de posicionamentos. A análise tem por fundamento os arestos, em seu inteiro teor, do primeiro dia do ano de 2.013 até 31 de julho passado. 

Palavras-chave: Terapia médica. Submissão involuntária. Incapacidade.  Liberdade

Sumário. 1 Introdução. 2 Primeira Câmara Cível. 3 Segunda Câmara Cível. 4 Terceira Câmara Cível. 5 Quarta Câmara Cível. 6 Quinta Câmara Cível. 7 Sexta Câmara Cível. 8 Sétima Câmara Cível. 9 Oitava Câmara Cível. 10 Demais Câmaras Cíveis. 11 Conclusão. Referências 


1 INTRODUÇÃO 

No período colonial brasileiro era costume recorrer das decisões judiciais ao Governador ou ao Rei de Portugal, este, assoberbado, nomeava cidadãos para apreciar os recursos em seu nome e assim retirar os estorvos, embaraços que impediam o julgamento da demanda, nascia assim a nobre função dos Desembargadores. 

Hodiernamente, os magistrados dos tribunais estaduais alteraram a imperial função, são revisores das decisões ditas de primeiro grau e seletivamente, quando no uso da competência originária, juízes que primeiro apreciam a demanda. 

O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais é composto por 9 (nove) Grupos de Câmaras Cíveis, cada grupo é composto de 2 (duas) Câmaras e em cada uma destas oficiam 5 (cinco) desembargadores, segundo o Regimento Interno da corte mineira. 

Dada à grandiosidade civilista do Tribunal, 90 (noventa) membros, é natural a divergência de posicionamentos entre os julgadores, Câmaras e Grupos, alguns mais conservadores, outros vanguardistas. 

Com o fim de solucionar pontuais discrepâncias, o Regimento Interno do judiciário mineiro nos socorre: 

“Art.18 - São atribuições jurisdicionais da Corte Superior: 

XI - julgar incidente de uniformização de jurisprudência quando divergentes os Grupos de Câmaras Cíveis ou as Câmaras Isoladas.” 

Inobstante, o mesmo diploma (Capítulo III do RITJMG) aduz que a decisão no incidente de uniformização resultará em enunciado de súmula a ser publicado pelo Tribunal de Justiça. 

Ademais, existem ainda as 1º e 2º Câmaras de Uniformização de Jurisprudência Cível cuja finalidade é unificar o entendimento da Corte, ambas criadas pela Portaria Conjunta 275/12 do TJMG. 

Contudo, apesar da existência de instrumentos para sanar a multiplicidade de entendimentos, é perceptível a variedade de decisões quando o tema é a internação involuntária de usuários de substâncias entorpecentes capazes ou não. 

O objetivo deste escrito é esmiuçar as decisões da Segunda Instância mineira, bem como seus fundamentos e vertentes a partir do ano de 2.013 até o meado do corrente ano.


2 PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL 

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - INTERDIÇÃO COMPULSÓRIA - EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO - PRÉVIA INTERDIÇÃO DA PACIENTE - DESNECESSIDADE - DIREITO À SAÚDE E À INTEGRIDADE FÍSICA E MENTAL DO DEPENDENTE QUÍMICO - LEI Nº10.216/01 - CASSAÇÃO DA SENTENÇA. A internação do toxicômaco caracteriza-se como medida de proteção à saúde e à integridade física e mental deste, tendo por fundamento o próprio princípio da dignidade da pessoa humana; e, ao mesmo tempo, garante a segurança da família e de toda a coletividade. Ademais, não há na legislação de regência qualquer dispositivo que condicione a internação compulsória à prévia interdição do dependente químico, sendo suficiente a realização de perícia médica que comprove a dependência, a necessidade do tratamento e os motivos da internação (Lei nº10.216/01). (MINAS GERAIS, TJMG, 1º C. Cív. Apelação Cível nº 1.0324.12.014859-2/001, Rel.: Geraldo Augusto. Jul 25.06.2013. v.u.) 

A ementa acima, síntese da decisão, unifica o pensamento da 1º Câmara, qual seja: É admissível a submissão ao tratamento involuntário do dependente químico com fundamento na Lei nº 10.216/01 (Direito das pessoas portadoras de transtornos mentais). Justifica-se a decisão em razão da inexistência de vedação legal à terapia compulsória. 

O Relator, Desembargador Geraldo Augusto, em outra demanda cujo objeto era a antecipação de tutela consistente na “internação compulsória” indeferida no juízo a quo, proferiu voto que abrangeu aqueles que padecem do alcoolismo. 

Na espécie, “a parte agravada ajuizou ação requerendo a realização de internação compulsória para tratamento de saúde mental de A.J.M. em hospital ou clínica credenciados, na rede pública ou particular, uma vez que padece de tuberculose pulmonar e alcoolismo crônico.” (MINAS GERAIS, TJMG, 1º C. Cív. Agravo de Instrumento nº 1.0024.12.316453-5/001) 

Como se observa, o alcoolismo também foi encampado pela possibilidade de internação compulsória nas decisões da 1º Câmara Cível do TJMG. 

Contudo, antes de esmiuçar os demais julgados, é preciso frisar que existem variantes decisórias que merecem reparo segundo o objeto do pedido dos requerentes, senão vejamos: 

1 - O requerimento de internação compulsória tem por finalidade obrigar o estado a fornecer o tratamento, ou seja, o objetivo almejado é o fornecimento de terapia médica. 

2 - O requerimento de internação compulsória tem por objeto a autorização judicial para a família promover o tratamento e escolher a instituição, ou seja, o objetivo é a supressão da vontade do indivíduo. 

O julgado abaixo, também da 1º Câmara, exemplifica o desejo de obter tratamento médico não oferecido pelo estado: 

EMENTA: ADMINSITRATIVO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA. PROVIDÊNCIA REQUERIDA PELO CURADOR. CURATELADA PORTADORA DE HIPERTIREOIDISMO DESCONTROLADO E USUÁRIA DE DROGAS. AUSÊNCIA DE DISCERNIMENTO PESSOAL QUANTO AO MAL QUE A ACOMETE. TUTELA DE URGÊNCIA CONCEDIDA. - Se a prova documental evidencia que a curatelada não possui compreensão do mal que a acomete e que por isso está completamente impossibilitada de realizar o tratamento ambulatorial, encontram-se presentes os requisitos necessários à determinação de sua internação compulsória como medida de urgência no âmbito de processo de conhecimento. (MINAS GERAIS, TJMG, 1º C. Cív. Agravo de Instrumento nº 1.0024.12.239794-6/001, Rel.: Alberto Vilas Boas. Jul 19.03.2012. v.u.) 

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 3 SEGUNDA CÂMARA CÍVEL 

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - INTERNAÇÃO COMPÚLSÓRIA DE DROGADITO - INTERDIÇÃO PRÉVIA - DESNECESSIDADE - NATUREZA AUTÔNOMA DO PROCEDIMENTO - SENTENÇA CASSADA. A internação compulsória do drogadito prescinde de sua prévia interdição, eis que os dispositivos legais de regência delineiam a natureza autônoma do procedimento, cuja finalidade é resguardar a segurança e a integridade física do usuário de drogas, bem como dos integrantes do núcleo familiar respectivo. (MINAS GERAIS, TJMG, 2º C. Cív. Apelação Cível nº 1.0153.12.002960-5/001, Rel.: Afrânio Vilela. Jul 04.06.13. v.u.) 

O Relator do acórdão, Des. Afrânio Vilela, desenvolve tese cuja propositura da ação de interdição não é precedente obrigatório para aqueles que desejam submeter pessoa a tratamento médico involuntário, dando a entender que é possível compelir alguém a se tratar embora inexista decisão declaratória de sua incapacidade. Em síntese, está em sintonia com o entendimento da 1º Câmara Cível. 

Contudo, no que se refere ao fornecimento de tratamento pelo estado, o Des. Afrânio Vilela enumera condicionante: 

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA - USUÁRIO DE DROGAS - CONDENAÇÃO DO MUNICÍPIO DE SANTA LUZIA AO PAGAMENTO DO TRATAMENTO - AUSÊNCIA DE PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA -IMPOSSIBILIDADE - DECISÃO REFORMADA. Ao contrário dos medicamentos que possuem repasse específico, o tratamento de dependentes químicos não está incluído no rol dos serviços gratuitos de todos os Municípios, o que, em tese, inviabiliza compelir o Município de Santa Luzia a arcar com a internação particular, caso não possua clínicas públicas, até porque o custeio pode não estar previsto no orçamento municipal. (MINAS GERAIS, TJMG, 2º C. Cív. Agravo de Instrumento nº 1.0245.12.003295-9/001, Rel.: Afrânio Vilela. Jul 23.03.13. v.u.) 

De acordo com extrato do voto, a limitação orçamentária é impedimento à oferta de tratamento, senão vejamos: 

Não há como olvidar o princípio da dignidade da pessoa humana neste caso, mormente se considerado o estado agressivo do jovem toxicômano. Contudo, diferente dos medicamentos que possuem repasse específico, o tratamento de dependentes químicos não está incluído no rol dos serviços gratuitos de todos os Municípios, o que, em tese, inviabiliza compelir o Município de Santa Luzia a arcar com a internação particular, caso não possua clínicas públicas, até porque o custeio pode não estar previsto no orçamento municipal. (MINAS GERAIS, TJMG, 2º C. Cív. Agravo de Instrumento nº 1.0245.12.003295-9/001, Rel.: Afrânio Vilela. Jul 23.03.13. v.u.) 

A mencionada condicionante deixa de existir quando a internação tem por objetivo o tratamento de menor dependente químico, segundo Afrânio Vilela, embora esta condição sequer tenha sido mencionada no voto, senão vejamos: 

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - MENOR USUÁRIO DE DROGAS - INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA - TRATAMENTO EM CLÍNICA ESPECIALIZADA - DIREITO À SAÚDE - ART. 196 DA CR/88 - CUSTEIO PELO MUNICÍPIO - POSSIBILIDADE - DECISÃO MANTIDA. A saúde compete solidariamente à União, Estados e Municípios, podendo o cidadão acionar qualquer desses entes federativos, conjunta, ou isoladamente, para fins de obtenção de medicamentos que não integram a tabela do Sistema Único de Saúde. Deve ser mantida a decisão proferida nos autos da ação civil pública que impõe ao Município a obrigação de arcar com os custos de internação de usuário de drogas em clínica especializada particular. (MINAS GERAIS, TJMG, 2º C. Cív. Agravo de Instrumento nº 1.0035.12.008308-0/001, Rel.: Afrânio Vilela. Jul 26.02.13. v.u.) 

De acordo com extrato do voto, a limitação orçamentária não é impedimento à oferta de tratamento: 

Assim, na colidência entre o direito à preservação da vida e o interesse financeiro estatal, não há dúvida quanto à prevalência do primeiro. Consoante manifestado na decisão liminar de f.81/84-TJ, mantenho o posicionamento segundo o qual não foi possível concluir pela desnecessidade da internação do menor K.M.C.B., com 16 anos e que, segundo consta, é usuário de drogas há alguns anos e foi abandonado por seus genitores, atualmente, vivendo nas ruas. (...) Com efeito, o consumo de drogas é um problema de saúde pública, cabendo ao Estado não só a repressão ao tráfico, mas também investir na recuperação dos dependentes químicos. (MINAS GERAIS, TJMG, 2º C. Cív. Agravo de Instrumento nº 1.0035.12.008308-0/001, Rel.: Afrânio Vilela. Jul 26.02.13. v.u.) 

Registre-se, o lapso temporal entre as duas decisões foram de exatos 30 (trinta) dias, esta em 26 de fevereiro e aquela 26 de março, ambas proferidas em 2.013, e não houve menção à alteração de posicionamento do Desembargador Afrânio Vilela. 


4 TERCEIRA CÂMARA CÍVEL 

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA. SAÚDE. PRÉVIO PROCEDIMENTO DE INTERDIÇÃO. DESNECESSIDADE. EMENDA DA PETIÇÃO INICIAL. ALTERAÇÃO DO POLO ATIVO. POSSIBILIDADE. INSTRUMENTALIDADE. - A saúde é direito de todos e dever do Estado, tratando-se de um direito fundamental, nos termos preconizados pelos artigos 6º e 196 da CR/88.- A ação de internação compulsória dispensa o prévio procedimento de interdição, exigindo-se para tanto laudo médico atestando a sua incapacidade para os atos da vida civil, nos termos do art. 4º, II, do Código Civil. - Excepcionalmente e tendo em vista o princípio da instrumentalidade, admite-se a emenda da petição inicial com o fito de alterar o polo ativo. Precedente do STJ (REsp 803.684/PE). (MINAS GERAIS, TJMG, 3º C. Cív. Agravo de Instrumento nº 1.0324.12.010129-4/001, Rel.: Jair Varão. Jul. 21.02.13. m.v.) 

Observa-se que a 3º Câmara não destoa da 1ª e 2º ao prescindir da anterior declaração de incapacidade. 

Inobstante, fundamenta a possibilidade de supressão da vontade e conseqüente submissão ao tratamento involuntário na Lei 10.216/2001, segundo o voto condutor: 

A propósito, os arts. 6º e 9º da Lei n.º 10.216/2001, a qual regulamenta a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais, estatui a possibilidade de a internação psiquiátrica (compulsória) ser determinada pelo juiz, exigindo-se, para tanto, a realização de laudo médico circunstanciado que caracterize os motivos da internação. Daí depreende-se inexistir no ordenamento jurídico pátrio a exigência de prévia interdição como condição para a internação compulsória, sendo suficiente a constatação em perícia médica de dependência química com a respectiva indicação de tratamento. 

Todavia, o Revisor, Des. Kildare Carvalho, em voto divergente, apontou preocupações postas de lado pelos demais membros da Câmara: A supressão da vontade do indivíduo, ou seja, a anulação da liberdade individual: 

Pois bem, não obstante não tenha ainda me manifestado sobre o mérito de demandas semelhantes à presente, tenho por irretocável a sentença primeva, porquanto comungo do entendimento de que se apresenta deveras drástica a medida que atenta contra a liberdade individual do ser humano, sobretudo se a incapacidade deste não foi ainda declarada pelo Poder Judiciário. Não bastasse isso, da leitura dos documentos que instruem o processado, não vejo como enquadrar a hipótese versada no caso aos ditames da Lei n. 10.216/01, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. Vale dizer, não se tendo notícia acerca da declaração de incapacidade do réu, não vejo como se poder atribuir-lhe a condição de "portador de transtorno mental", de modo que a ele se apliquem os ditames da mencionada lei. Além do mais, não se pode passar despercebido o fato de ser controversa a discussão acerca da sujeição dos dependentes químicos de drogas à internação compulsória, ainda mais se considerarmos a possibilidade de o Poder Público fornecer-lhe o devido, necessário e adequado tratamento. 

Revela-se preocupante a aplicação de norma cuja finalidade precípua é a saúde mental (Lei nº 10.216/01) em indivíduos que são dependentes químicos, não raro pessoas sãs, embora usuários de drogas. 

Em outra oportunidade, 20 (vinte) dias após o julgamento acima mencionado, em 7 de março de 2.013, o Relator Jair Varão e o Revisor Kildare Carvalho proferiram voto no mesmo sentido no Agravo de Instrumento n° 1.0324.12.004821-4/001. 

Em síntese, a apontada demanda versa sobre “agravo de instrumento interposto contra a r. decisão de f. 56, TJ, proferida pelo MM. Juiz da 2ª Vara Cível da Comarca de Itajubá, que, nos autos da ação de interdição cumulada com pedido de medida protetiva de internação movida por E. M. de O. S. em face de U. de O. S. e do Município de Piranguçú, concedeu tutela antecipada para determinar que o Município réu tome as providências necessárias ao tratamento do interditando em clínica especializada”. 

Na ocasião, o Relator negou provimento ao recurso do Município, mantendo a sentença que determinou o fornecimento do tratamento; o Revisor, por sua vez, acompanhou o Relator e ressaltou a imprescindibilidade da propositura da ação de interdição: 

“Vale dizer, havendo sido decretada a interdição temporária do réu, configurando-se, em princípio, sua incapacidade, possível lhe atribuir, repita-se, neste juízo prévio, a condição de "portador de transtorno mental", de modo que a ele se apliquem os ditames da mencionada lei.” 

O Des. Kildare Carvalho, apesar de externar a posição pela necessidade de ingresso da ação de interdição para se promover a internação compulsória, em voto condutor – proferido em abril de 2.013 - nos autos do recurso de Agravo de Instrumento nº 1.0515.11.002747-8/001, preteriu este argumento - anteriormente utilizado - e defendeu a tese que o demandante não reunira os requisitos para a concessão da tutela antecipada em demanda cujo objeto era a internação compulsória sem ingresso concomitante ou prévio da ação de interdição. 

Tal decisão leva a crer que acaso o interessado reunisse as condições, seu pleito obteria sucesso apesar a inexistência de demanda visando à interdição. 

A Desa. Albergaria Costa, membro da 3º Câmara Cível, não dissentiu de alguns de seus pares quando associou a lei da saúde mental à internação compulsória: 

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. INTERNAÇÃO DE DEPENDENTE QUÍMICO. USUÁRIO DE DROGAS. LEI 10.216/2001. LAUDO MÉDICO. URGÊNCIA COMPROVADA. TUTELA ANTECIPADA. REQUESITOS PRESENTES. Segundo os requisitos traçados pela Lei nº 10.216/2001, a internação psiquiátrica de dependente químico somente será realizada mediante laudo médico que caracterize os seus motivos e desde que os recursos extra-hospitalares tenham se mostrado insuficientes. Presentes os requisitos necessários para a concessão da tutela antecipada, mantem-se a decisão que determinou a internação compulsória de dependente químico em clínica especializada. Recurso conhecido e não provido. (MINAS GERAIS, TJMG, 3º C. Cív. Agravo de Instrumento nº 1.0470.12.005437-9/001, Rel.: Albergaria Costa. Jul. 25.04.13. v.u.) 

Albergaria Costa, no voto proferido no recurso de Agravo de Instrumento nº 1.0153.13.001659-2/001 manteve a mesma linha adotada no aresto supra: 

A internação compulsória em estabelecimento psiquiátrico é medida altamente interventiva que afeta demasiadamente a liberdade do paciente, e por isso deve ser admitida somente em casos excepcionais, mediante o cumprimento dos requisitos legais e desde que haja prova da efetiva necessidade da medida. [...] Neste sentido, a Lei nº 10.216/2001, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais "de qualquer natureza" (art. 2º), prescreve que "a internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico circunstanciado que caracterize os seus motivos" (art. 6º) e que "a internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes" (art.4º). 

O Des. Elias Camilo, diversamente dos predecessores, manteve decisão a quo sob o fundamento da obrigação estatal de fornecer tratamento médico, entretanto manteve a ordem de submissão do cidadão à internação involuntária e sequer ponderou acerca do direito de escolha sobre da conveniência da terapia: 

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO ORDINÁRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - ENCAMINHAMENTO IMEDIATO DE PACIENTE À AVALIAÇÃO PSIQUIÁTRICA - EVENTUAL INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA EM CLÍNICA ESPECIALIZADA - TRATAMENTO DE DESINTOXIAÇÃO E RECUPERAÇÃO DE TOXICÔMANOS - REDE PÚBLICA OU PARTICULAR - CUSTEIO PELO ENTE PÚBLICO LOCAL - LIMINAR DEFERIDA - REQUISITOS DEMONSTRADOS - COMINAÇÃO DE MULTA EM CASO DE DESCUMPRIMENTO - REDUÇÃO - INVIABILIDADE - BLOQUEIO DE VALOR NECESSÁRIO - POSSIBILIDADE - DECISÃO MANTIDA. 1. A presença de prova inicial que revela a relevância dos fundamentos despendidos na Ação Ordinária de Obrigação de Fazer ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, aliada ao fundado receio de dano grave ou de difícil reparação à saúde, torna imperiosa a manutenção da liminar deferida no juízo de origem, em desfavor do Município de Jequeri, com o objetivo de determinar a imediata avaliação psiquiátrica para apuração de eventual necessidade de tratamento para abstinência, bem como eventual internação compulsória em hospital da rede pública ou em clínica particular especializada em tratamento para dependentes químicos. 2. É legítima a imposição de multa diária ao Poder Público para o caso de descumprimento de obrigação de fazer de alta complexidade a paciente hipossuficiente, tendo em vista a manifesta relevância dos direitos fundamentais que envolve, ressalvando que as multas devem guardar relação direta de proporcionalidade e razoabilidade com o pretenso valor da condenação, bem como a natureza da obrigação a ser cumprida. (MINAS GERAIS, TJMG, 3º C. Cív. Agravo de Instrumento nº 1.0355.12.002107-4/001, Rel.: Elias Camilo. Jul. 04.07.13. v.u.) 

Extrato da decisão sintetiza do pensamento do Desembargador: 

Sobreleva consignar, a título de registro, que a presença de prova inicial que revela a relevância dos fundamentos despendidos na Ação Ordinária de Obrigação de Fazer ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, aliada ao fundado receio de dano grave ou de difícil reparação à saúde, torna imperiosa a manutenção da liminar deferida no juízo de origem, em desfavor do Município de Jequeri, com o objetivo de determinar a imediata avaliação psiquiátrica para apuração de eventual necessidade de tratamento para abstinência, bem como eventual internação compulsória em hospital da rede pública ou em clínica particular especializada em tratamento para dependentes químicos.  

Sobre o autor
Daniel Vieira Bueno

Analista do Ministério Público de Minas Gerais, ex-Oficial do Ministério Público de Minas Gerais, ex-advogado, ex-Oficial de Apoio Judicial do TJMG

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BUENO, Daniel Vieira. A submissão ao tratamento involuntário na visão das Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais e o embaraço jurisprudencial causado pelo antagonismo judicial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3955, 30 abr. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27906. Acesso em: 22 nov. 2024.

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