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A aplicação da imunidade religiosa, prevista no art. 150, VI, “b”, da CF, à Maçonaria

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Agenda 17/05/2014 às 12:22

A loja maçônica, por revelar diversos elementos de religiosidade, deve ser vista como um templo, pois em seus cultos há a elevação espiritual, a profissão de fé e a prática de virtudes, razão pela qual deve ser abarcada pela imunidade religiosa.

O artigo 150, inciso VI, alínea “b”, da Constituição Federal, traz o instituto da imunidade tributária religiosa. A referida norma traz em seu bojo a vedação de que sejam instituídos impostos sobre os “templos de qualquer culto”.

Muito se discute, atualmente, qual o conceito de “templos de qualquer culto” para fins de incidência da norma. A questão está em saber o alcance dos conceitos de “templo” e “culto”, para que se possa definir quais as entidades que seriam imunes.

Nesse contexto, surge a discussão sobre a natureza jurídica da Maçonaria, para fins de aplicação da imunidade religiosa. Ou seja, se tem ela caráter religioso ou não, para fins de incidência tributária.

Vale registrar que tal discussão chegou à apreciação do STF, no Recurso Extraordinário nº 562.351/RS, da relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski. Na ocasião do julgamento, em 04/09/2012, a Primeira Turma do STF, por maioria de votos, entendeu que a Maçonaria não estaria abrangida pela imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “b”, da CF.

Assim, tendo em vista ter sido este o único precedente do STF sobre o tema, e considerando que o julgamento foi por uma das Turmas, ou seja, pelo voto de apenas cinco ministros, e, mesmo assim, a conclusão não foi à unanimidade, é de se concluir que o debate sobre a imunidade religiosa da Maçonaria está em aberto.

Cumpre, nesse ponto, estabelecer as diretrizes da imunidade religiosa, cerne do presente trabalho e prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “b””, da CF. Eis os exatos termos da referida norma:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

VI - instituir impostos sobre:

b) templos de qualquer culto;

Nesse sentido, nota-se que a CF, ao estabelecer tal preceito, houve por bem imunizar amplamente os templos de qualquer culto, haja vista ser o Brasil um país laico, onde não há uma religião oficial ou de Estado, apesar de termos historicamente uma ampla maioria cristã.

No que tange ao vetor axiológico, afirma Eduardo Sabbag:

Por derradeiro, frise-se que o elemento teleológico que justifica a norma em comento atrela-se à liberdade religiosa (art. 5º, VI ao VIII, CF) e à neutralidade ou não identificação do Estado com qualquer religião (art. 19, I, CF)[1].

Na mesma linha é a lição de Ricardo Alexandre, segundo o qual a imunidade religiosa veda ao Estado utilizar-se do poder de tributar como forma de embaraçar o normal funcionamento de qualquer entidade religiosa, haja vista ser a liberdade de crença um direito fundamental[2].

Nesse ponto vale transcrever os exatos termos dos artigos 5º, incisos VI a VIII, e 19, inciso I, todos do Diploma Maior:

Art. 5º. VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; 

VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;

VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;

Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;

Desta feita, a liberdade de crença ou liberdade religiosa significa não só a possibilidade do cidadão de professar sua fé no culto e templo que bem lhe aprouver, mas também engloba o direito de não possuir nenhuma religião, conforme sua livre escolha[3].

É de se notar, portanto, que o elemento teleológico da imunidade religiosa consiste, em última análise, na preservação da liberdade religiosa ou liberdade de crença. Assim, deve manter, o Estado Brasileiro, a devida equidistância de toda e qualquer religião, respeitando seus cultos e crenças sem qualquer discriminação ou favorecimento, a teor dos artigos 5º, inciso VI, e 19, inciso I, ambos da Constituição Federal.

Entendido o vetor axiológico da imunidade religiosa, cumpre agora analisar a expressão “templos de qualquer culto”, definindo-se seus conceitos.

Para Leandro Paulsen, a expressão “templos de qualquer culto” deve ser interpretada de maneira ampla, abarcando toda e qualquer forma de expressão da religiosidade, ainda que não diga respeito às religiões que tradicionalmente predominam em nossa sociedade. O único limite seria o respeito à dignidade da pessoa humana, razão pela qual não se deve admitir religiões que descambam para o absurdo, com inspirações para dominação, exclusão social ou sacrifício dos fiéis[4].

Já na lição de Sabbag, a expressão “culto” tem o seguinte significado:

Em breve incursão conceitual, seria possível afirmar que culto é a manifestação religiosa cuja liturgia adstringe-se a valores consonantes com o arcabouço valorativo que se estipula, programática e teleologicamente, no texto constitucional[5].

Ainda segundo o autor, o culto é o prestígio à fé e aos valores transcendentais que a circundam, desde que não coloquem em risco a dignidade da pessoa humana e a igualdade entre as pessoas[6].

No que tange à expressão templo, entende Eduardo Sabbag ter ele um conceito de amplitude semântica. Para o autor, existem três teorias que tentam definir templo, quais sejam: a clássico-restritiva; a clássico-liberal; e a moderna[7].

A teoria clássico-restritiva define templo como sendo o local destinado à celebração do culto. Seria imune, portanto, apenas o imóvel onde é celebrado o culto. Defendem essa teoria Pontes de Miranda e Sacha Calmon Navarro Coêlho[8].

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Já a teoria clássico-liberal conceitua o templo como sendo tudo aquilo que, mesmo indiretamente, viabiliza o culto. Seriam imunes, assim, não apenas o imóvel onde se celebra o culto, mas também seus anexos. São defensores dessa teoria Aliomar Baleeiro, Roque Antonio Carraza e Hugo de Brito Machado[9].

Desta feita, segundo Aliomar Baleeiro, não se pode considerar templo apenas a igreja, mesquita, sinagoga ou edifício principal, onde é celebrada a cerimônia pública, mas também as dependências contíguas, como o convento ou a residência do pároco, desde que não empregados com finalidade econômica[10].

Para a teoria moderna, o templo deve ser visto como entidade, instituição, organização ou associação, mantenedora daquele templo religioso, independentemente das coisas e pessoas. Dessa forma, o conceito de templo aproxima-se muito mais da concepção de organização religiosa[11]. Defendem essa teoria José Eduardo Soares de Melo, Marco Aurélio Greco, Celso Ribeiro Bastos e Eduardo Sabbag.

 No presente trabalho, adotamos a teoria moderna, por se mostrar a mais adequada à nossa realidade, vez que trata o templo religioso como entidade, de maneira ampliativa, como devem ser vistas as imunidades, de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, revelada, por exemplo, no julgamento do RE 102.141.

Sustentando a interpretação ampliativa das imunidades tributárias, vale ressaltar trecho do voto do Ministro Marco Aurélio, do STF, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 562.351/RS:

O Supremo, embora com pontuais oscilações, tem encampado o entendimento de se conferir às imunidades interpretação ampla. Essa corrente se expressa, por exemplo, no reconhecimento da imunidade aos álbuns de figurinhas, o que ocorreu no julgamento do Recurso Extraordinário nº 221.239, da relatoria da Ministra Ellen Gracie. Vale citar, ainda, o Recurso Extraordinário nº 174.476-6/SP – relatado pelo saudoso Ministro Maurício Corrêa, cujo acórdão fui designado para redigir, no qual o Supremo estendeu a imunidade do artigo 150, inciso VI, alínea “d”, da Carta aos filmes e papéis fotográficos – e também o Recurso Extraordinário nº 325.822/SP, relator Ministro Gilmar Mendes, apreciado em 18 de dezembro de 2002, quando o Tribunal assentou que a imunidade relativa às instituições de assistência social estende-se aos imóveis alugados para terceiros, desde que a receita seja revertida à finalidade institucional.[12]

Defendem, ainda, essa interpretação ampliativa das imunidades os doutrinadores Regina Helena Costa, Luciano Amaro, Hugo de Brito Machado, Celso Ribeiro Bastos, Ives Gandra da Silva Martins, José Eduardo Soares de Melo, dentre outros.[13]

Vale ressaltar, nesse ponto, que a imunidade religiosa, da mesma forma que a imunidade das entidades de assistência social, é uma imunidade relativa, pois, nos termos do artigo 150, § 4º, da Constituição Federal, haverá a desoneração das entidades religiosas apenas quanto aos impostos incidentes sobre o patrimônio, renda e serviços relacionados à finalidade essencial da instituição.

Essa norma do § 4º que restringe a imunidade religiosa corrobora ainda mais a posição adotada neste trabalho, de que a melhor teoria acerca do conceito de templo advém da teoria moderna, em sua interpretação ampliativa.

Estabelecidas as bases teóricas quanto à imunidade religiosa e suas premissas, cumpre agora adentrar no tema central, qual seja, a possibilidade de se aplicar a imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “b”, da CF, à maçonaria.

O tema da aplicação da imunidade religiosa à maçonaria ou às lojas maçônicas é de escasso material de pesquisa, tanto na doutrina quanto na jurisprudência. Recentemente, em 4 de setembro de 2012, o STF, por meio da sua Primeira Turma, julgou o RE nº 562.351/RS, da relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski, que versava o tema.

Na ocasião, a Turma, por maioria de votos, vencido o Ministro Marco Aurélio, entendeu que as lojas maçônicas não têm direito à imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “b”, da Constituição Federal, ao argumento de que na maçonaria não se professa qualquer religião.

Eis a ementa do referido julgado:

CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. ART. 150, VI, C, DA CARTA FEDERAL. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 279 DO STF. ART. 150, VI, B, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ABRANGÊNCIA DO TERMO “TEMPLOS DE QUALQUER CULTO”. MAÇONARIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO EM PARTE E, NO QUE CONHECIDO, DESPROVIDO.

I – O reconhecimento da imunidade tributária prevista no art. 150, VI, c, da Constituição Federal exige o cumprimento dos requisitos estabelecidos em lei.

II – Assim, para se chegar-se à conclusão se o recorrente atende aos requisitos da lei para fazer jus à imunidade prevista neste dispositivo, necessário seria o reexame do conjunto fático-probatório constante dos autos. Incide, na espécie, o teor da Súmula 279 do STF. Precedentes.

III – A imunidade tributária conferida pelo art. 150, VI, b, é restrita aos templos de qualquer culto religioso, não se aplicando à maçonaria, em cujas lojas não se professa qualquer religião.

IV - Recurso extraordinário parcialmente conhecido, e desprovido na parte conhecida.

Vale ressaltar que o fato do processo ter sido julgado pelo Supremo Tribunal Federal, por si só, não revela qualquer pacificação do tema, seja porque o resultado não foi unânime, seja porque o entendimento foi tomado por uma das Turmas daquela Corte, e não pelo Plenário.

Desta feita, cabe aqui discutir o posicionamento adotado pelo STF, tendo-se em vista a teoria moderna do Templo, que o entende como Entidade, trazendo uma interpretação ampliativa da imunidade religiosa, razão pela qual a aplicação da imunidade à maçonaria se revela um tema de extrema relevância.

Conforme visto anteriormente, a expressão “templos de qualquer culto” deve ser interpretada de maneira ampla, abarcando toda e qualquer religião, desde que não se ofenda a dignidade da pessoa humana. Nesse sentido é o entendimento de Eduardo Sabbag, que leciona:

Não se pode perder de vista que o conceito de religião é aberto, inexistindo um regramento legal ou constitucional. Vale dizer que a conceituação de religião, longe de ser “substancial” – em que se perscruta aleatoriamente o elemento conteudístico –, deverá ser funcional, abrindo-se para quaisquer agrupamentos litúrgicos em que os participantes se coobriguem moralmente a agir sob certos princípios. Nesse sentido, o intérprete deve buscar o sentido mais abrangente, sob pena de colocar em risco as crenças de grupos minoritários.[14]

Como dito anteriormente, o Brasil é um país laico, nos termos dos artigos 5º, incisos VI ao VIII, e 19, inciso I, todos da Constituição Federal, ou seja, não possui uma religião oficial do Estado.

Desta forma, se o constituinte originário optou por imunizar os templos de qualquer culto, de forma ampla e sem privilégios ou perseguições, não cabe à legislação ordinária ou ao operador do direito restringir o conceito de religião, de templo ou de culto apenas àqueles que tradicionalmente prevalecem no seio da sociedade ao longo dos anos.

Essa é a posição do Ministro Marco Aurélio, do STF:

Evidentemente, pressuponho um conceito mais largo de religião, até mesmo em deferência ao disposto no artigo 1º, inciso V, da Carta Federal, que consagra o pluralismo como um valor basilar da República Federal do Brasil. Ao contrário dos teólogos e cientistas sociais, preocupados apenas com a ciência que praticam, o pluralismo impede que o Poder Judiciário adote uma definição ortodoxa de religião. Exige-lhe leitura compreensiva das práticas sociais a fim de classificá-las como religiosas ou não, haja vista que tanto o direito como a religião são subprodutos da cultura. Assim, a meu ver, certas práticas que poderiam ser consideradas “seitas”, e não “religiões”, não escapam à imunização ao poderio tributário do Estado.[15]

Ao intérprete não é dado analisar o mérito da religião, não podendo julgá-la ou avaliá-la. Não cabe ao operador do direito emitir qualquer juízo de valor acerca de qualquer religião, para fins de subsunção ou não à imunidade religiosa, sob pena de se embaraçar o funcionamento do culto religioso ou igreja, violando frontalmente a regra do artigo 19, inciso I, do Diploma Maior.

 Mesmo que não se concorde com a fé ali professada, mesmo que o Poder Judiciário considere absurda a religião daquela entidade, mesmo assim não se pode negar-lhe a aplicação da imunidade religiosa, sob pena de se negar vigência à norma da alínea “b”, do inciso VI, do artigo 150 da Constituição Federal.

Por esse motivo, entendemos que não se pode desconsiderar o caráter religioso da maçonaria, instituição que está presente há séculos, em todo o mundo, e onde são realizados ritos sacramentais inegavelmente de cunho religioso. Nesse sentido é a lição de Eduardo Sabbag:

A nosso sentir, a maçonaria deve ser considerada uma verdadeira religião, à semelhança de tantas outras que harmonicamente coexistem em nosso Estado laico. Seu rito está inserido em sistema sacramental e, como tal, apresenta-se pelo aspecto externo (a liturgia cerimonial, a doutrina e os símbolos) e pelo aspecto interno (a liturgia espiritual ou mental, acessível com exclusividade ao maçom que tenha evoluído na utilização da imaginação espiritual).[16]

Corroborando tal entendimento, há de ser levado em conta o artigo 8º, parágrafo único, da Lei Complementar nº 277/2000, com as alterações conferidas pela Lei Complementar nº 363/2001, ambas do Distrito Federal.

Na referida norma consta expressamente a isenção do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU para os imóveis ocupados por templos maçônicos e religiosos de qualquer culto. Esse é o exato teor do dispositivo:

Art. 8º. Fica concedida a remissão dos débitos do Imposto sobre a Propriedade Predial Territorial Urbana -IPTU, inscritos e não inscritos em dívida ativa, ajuizados e por ajuizar, bem como das multas decorrentes da cobrança de preço público nos casos de ocupação temporária de área pública para canteiros de obra, dos templos de qualquer culto, da Confederação Brasileira de Trabalhadores Circulistas, incidentes sobre o seu imóvel, localizados no Distrito Federal.

Parágrafo único. Ficam isentos do pagamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU os imóveis construídos e ocupados por templos maçônicos e religiosos, de qualquer culto, ficando remidos os respectivos débitos inscritos e não inscritos na dívida ativa, ajuizados e por ajuizar. (Parágrafo Único acrescentado pela Lei Complementar nº 363, de 19/01/2001).

A utilização da expressão “templo maçônico” pelo legislador distrital se mostra em total correspondência com a Constituição Federal e corrobora o que defendido no presente estudo, pois, inegavelmente, a maçonaria representa um templo religioso, haja vista possuir todos os elementos de uma religião.

Na mesma linha é o entendimento de Roque Antonio Carraza, que assim disserta sobre o tema:

Sabemos que, durante o Império, tínhamos uma religião oficial: a religião católica apostólica romana. As outras religiões eram toleradas, mas apenas a católica recebia especial proteção do Estado.

(...)

Muito bem, com a proclamação da República, que se inspirava no positivismo de Augusto Comte, foi imediatamente decretada a separação entre a Igreja e o Estado. O Estado tornou-se laico. Deixou de dispensar maior proteção a uma religião em particular (ainda que majoritária), para tolerar todas elas.

Evidentemente, o Estado tolera todas as religiões que não ofendem a moral, nem os bons costumes, nem, tampouco, fazem perigar a segurança nacional. Há, no entanto, uma presunção no sentido de que a religião é legítima, presunção, esta, que só cederá passo diante de prova em contrário, a ser produzida pelo Poder Público.

Graças a esta inteligência, tem-se aceito que também são templos a loja maçônica, o templo positivista e o centro espírita.[17]

Vale destacar, no mais, o entendimento do Ministro Marco Aurélio, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 562.351/RS:

Numa perspectiva menos rígida do conceito de religião, certamente se consegue classificar a maçonaria como uma corrente religiosa, que contempla física e metafísica. São práticas ritualísticas que somente podem ser adequadamente compreendidas no interior de um conceito mais abrangente de religiosidade. Há uma profissão de fé em valores e princípios comuns, inclusive em uma entidade de caráter sobrenatural capaz de explicar fenômenos naturais – basta ter em conta a constante referência ao “Grande arquiteto do Universo”, que se aproxima da figura de um deus. Está presente, portanto, a tríplice marca da religião: elevação espiritual, profissão de fé e prática de virtudes.[18]

Ainda nas palavras do Ministro Marco Aurélio:

Ao contrário dos teólogos e cientistas sociais, preocupados apenas com a ciência que praticam, o pluralismo impede que o Poder Judiciário adote uma definição ortodoxa de religião. Exige-lhe leitura compreensiva das práticas sociais a fim de classificá-las como religiosas ou não, haja vista que tanto o direito como a religião são subprodutos da cultura. Assim, a meu ver, certas práticas que poderiam ser consideradas “seitas”, e não “religiões”, não escapam à imunização ao poderio tributário do Estado.[19]

Seguindo o mesmo raciocínio é a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, quando do julgamento de três processos, quais sejam: a) APC-5176599; b) 20000150021228-APC; e c) 20030150093525-APC.

Apreciando esses casos, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios enfrentou o tema da imunidade da maçonaria e concluiu, em síntese, ser ela uma sociedade de cunho religioso, guardando, assim, a conotação de templo, nos termos do que previsto no texto constitucional.

Com efeito, salutar é o entendimento da Desembargadora Sandra de Santis, do TJDFT, valendo ressaltar trecho de seu voto proferido no julgamento da Apelação Cível nº 2000.01.5.002122-8, quando confirmou a sentença de primeiro grau que concedera a imunidade à maçonaria:

Culto é o conjunto de práticas destinadas ao aperfeiçoamento dos sentimentos humanos. E, considerando que é denominado templo o local onde se reúnem os maçons periodicamente a fim de praticar as cerimônias ritualísticas para melhorar o caráter, a vida espiritual, meditar sobre a missão do homem na vida, recordando-lhe os valores eternos cujo cultivo lhes permite acercar-se da verdade, não se pode chegar a conclusão diversa daquela exarada pelo MM. Juiz na sentença recorrida.[20]

Por fim, é imperioso trazer, mais uma vez, o entendimento do Ministro Marco Aurélio, que defende não se poder negar a existência de cultos na prática maçônica, a ensejar a imunidade:

Ora, há inequívocos elementos de religiosidade na prática maçônica. No mais, atentem para a norma constitucional: ela protege o culto. E este consiste em rituais de elevação espiritual, propósitos intrincados nas práticas maçônicas, que, se não podem ser classificadas como genuína religião, segundo a perspectiva das religiões tradicionais – e o tema é controverso –, estão dentro do escopo protetivo da Constituição de 1988.[21]

A conclusão a que se chega, portanto, é no sentido de que a maçonaria faz jus à imunidade religiosa prevista constitucionalmente, uma vez que não se pode negar o caráter religioso ou a presença de um templo e da realização de cultos, o que a adequa perfeitamente ao artigo 150, inciso VI, alínea “b”, da Constituição Federal.

A loja maçônica, por revelar diversos elementos de religiosidade, deve ser vista como um templo, pois em seus cultos há a elevação espiritual, a profissão de fé e a prática de virtudes, razão pela qual deve ser abarcada pela imunidade religiosa.

Sobre o autor
Rafael Sasse Lobato

Advogado do Escritório Gabriela Rollemberg Advocacia. Graduado em Direito pelo Centro Universitário de Brasília – UniCEUB. Pós-Graduado em Direito Tributário pelo Instituto Luiz Flávio Gomes. Membro da Associação Brasiliense de Direito Processual Civil (ABPC).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOBATO, Rafael Sasse. A aplicação da imunidade religiosa, prevista no art. 150, VI, “b”, da CF, à Maçonaria. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3972, 17 mai. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27964. Acesso em: 22 nov. 2024.

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