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O direito à privacidade frente aos avanços tecnológicos na sociedade da informação

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CONCLUSÃO

Como visto anteriormente, temos que na Sociedade da Informação o uso da tecnologia é uma realidade que veio para ficar e se aprofundar ainda mais, reduzindo gradativamente os conceitos de privacidade e âmbito privado. A erosão da tais garantias é real, com reflexos tanto positivos quanto negativos e se faz necessário a sociedade entender e regrar esta nova capacidade técnica, para evitar abusos e situações de privilégio dos detentores dos meios de telecomunicação, e principalmente, dos governos.

No livro Vigiar e Punir, publicado em 1975, o pensador e filósofo francês Michel Foucault descreve como se exerce o poder disciplinar e quais os reflexos desse mecanismo para o indivíduo e para a coletividade – tema da maior relevância para a compreensão dos fundamentos filosóficos do exercício da vigilância na sociedade da informação. Segundo o autor, a história da humanidade expõe o exercício do poder disciplinar que se materializa na manipulação e no uso de informações em benefício de certas elites, capazes de processá-las e armazená-las, fazendo desses repositórios fontes seguras de fiscalização, de repressão e de controle dos indivíduos. Nas palavras de Foucault[23]:

Daí o efeito mais importante do Panóptico: induzir no detento um estado consciente e permanente de visibilidade que assegura o funcionamento automático do poder. Fazer com que a vigilância seja permanente em seus efeitos, mesmo se é descontínua em sua ação; que a perfeição do poder tenda a tornar inútil a atualidade de seu exercício; (...) O Panóptico é uma máquina maravilhosa que, a partir dos desejos mais diversos, fabrica efeitos homogêneos de poder. Uma sujeição real nasce mecanicamente de uma relação fictícia. De modo que não é necessário recorrer à força para obrigar o condenado ao bom comportamento, o louco à calma, o operário ao trabalho, o escolar à aplicação.

Do século XVIII para até os dias atuais houve evidente e enorme evolução tecnológica, mas o espírito do controle é o mesmo, com a vantagem adicionar de não ser necessário nenhuma construção especial. É possível monitorar e controlar apenas com tecnologia.

Além do conluio entre empresas privadas e Estado para se atingir o objetivo de vigiar e controlar a sociedade da informação, Estados percebem ser necessário a criação de convênios entre agências de inteligência de diversas nações. Manuel Castells assim descreve a influencia no comportamento individual pela vigilância em meio eletrônico[24]:

Não é o Big Brother, mas uma multidão de irmãzinhas, agências de vigilância e processamento de informações que registram nosso comportamento para sempre, enquanto bancos de dados nos rodeiam ao longo da nossa vida – a começar, dentro em breve, com nosso DNA e características pessoais (nossa retina, nosso datilograma, na forma de marcas digitalizadas). Nas condições vigentes nos Estados autoritários, essa vigilância pode afetar diretamente nossas vidas (essa é de fato a situação da maioria esmagadora da humanidade). Mas mesmo em sociedades democráticas, em que os direitos civis são respeitados, a transparência de nossas vidas moldará decisivamente as nossas atitudes. Ninguém jamais foi capaz de viver numa sociedade transparente. Se esse sistema de vigilância e controle da Internet se desenvolver plenamente, não poderemos fazer o que nos agrada. Talvez não tenhamos nenhuma liberdade, e nenhum lugar onde nos esconder.

Vale lembrar também que o Artigo 12 do projeto de lei,[25] incluído após as revelações de espionagem pelo governo dos EUA, não se destina ao propósito de garantir maior privacidade aos internautas brasileiros, pelo contrário amplia a possibilidade de espionagem, além de representar um custo econômico elevado para o setor que pode prejudicar colateralmente o surgimento de novas empresas nacionais.

Dessa forma a questão da privacidade frente aos avanços tecnológicos deve ser questão de debate e constante vigilância pela sociedade civil, sendo saudável a inclusão de extensa proteção no marco civil, porém sem jamais nos esquecermos de que devemos proteger nossa privacidade não apenas de empresas e entidades estrangeiras, mas principalmente do governo.


BIBLIOGRAFIA

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Notas

[1] BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil. vol. 2, São Paulo: Saraiva, 1989, p. 63.

[2]Lei Carolina Dieckmann é como ficou conhecida a Lei Brasileira 12.737/2012, sancionada em 3 de dezembro de [2012] pela Presidente Dilma Rousseff, que promoveu alterações no Código Penal Brasileiro (Decreto-Lei 2.848 de 7 de dezembro de [1940]), tipificando os chamados delitos ou crimes informáticos. A legislação é oriunda do Projeto de Lei 2793/2011, apresentado em 29 de novembro de [2011], pelo Deputado Paulo Teixeira (PT-SP), que tramitou em regime de urgência e em tempo "record" no Congresso Nacional, em comparação com outros projetos sobre delitos informáticos que as casas de leis apreciavam (como, por exemplo, o PL 84/1999, a "Lei Azeredo", também transformado em lei ordinária 12.735/2012 em 3 de dezembro de [2012]). Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Lei_Carolina_Dieckmann> Acesso em 27 de fevereiro de 2014.

[3] EXTRA. Famosos: retratos da vida. Disponível em:< http://extra.globo.com/famosos/carolina-dieckmann-diz-que-voltou-mandar-fotos-dela-nua-apos-mudanca-do-marido-da-nele-mais-vontade-de-voltar-para-casa-11226455.html> Acesso em 27 de fevereiro de 2014.

[4] BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. 5ª Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001, pp. 64-65.

[5] PAESANI, Liliana Minardi- Coordenadora. O Direito na sociedade da informação. São Paulo: Atlas, 2007, p. 05.

[6] JENNINGS, Charles; FENA, Lori. Privacidade.com: como preservar sua intimidade na era da internet. Tradução: Bazán Tecnologia e Linguística. São Paulo: Futura, 2000, p. 133.

[7] RODOTÀ, Stefano. A Vida na Sociedade da Vigilância - A Privacidade Hoje, Organização, seleção e apresentação de Maria Celina Bodin de Moraes. Tradução: Danilo Doneda e Luciana Cabral Doneda. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 44.

[8] RODOTÀ, Stefano. A Vida na Sociedade da Vigilância - A Privacidade Hoje, Organização, seleção e apresentação de Maria Celina Bodin de Moraes. Tradução: Danilo Doneda e Luciana Cabral Doneda. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p.49.

[9] RODOTÀ, Stefano. A Vida na Sociedade da Vigilância - A Privacidade Hoje, Organização, seleção e apresentação de Maria Celina Bodin de Moraes. Tradução: Danilo Doneda e Luciana Cabral Doneda. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p.59.

[10]Edward Joseph Snowden (Elizabeth City, 21 de junho de [1983]) é um ex-analista de inteligência norte-americano que tornou públicos detalhes de vários programas altamente confidenciais de vigilância eletrônica dos governos de Estados Unidos e Reino Unido. Snowden era um colaborador terceirizado da Agência de Segurança Nacional (NSA) e foi também funcionário da Central Intelligence Agency (CIA).A revelação deu-se através dos jornais The Guardian e The Washington Post, dando detalhes da vigilância de comunicações e tráfego de informações executada pelo programa de vigilância PRISM dos Estados Unidos. Em reação às revelações, o Governo dos Estados Unidos acusou-o de roubo de propriedade do governo, comunicação não autorizada de informações de defesa nacional e comunicação intencional de informações classificadas como de inteligência para pessoa não autorizada. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Edward_Snowden> Acesso em 05 de março de 2014.

[11] RODOTÀ, Stefano. A Vida na Sociedade da Vigilância - A Privacidade Hoje, Organização, seleção e apresentação de Maria Celina Bodin de Moraes. Tradução: Danilo Doneda e Luciana Cabral Doneda. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 51

[12] Ibidem p. 81.

[13] SCHMIDT, Eric; COHEN, Jared. A nova era digital: como será o futuro das pessoas, das nações e dos negócios. Tradução Ana Beatriz Rodrigues, Rogério Durst. 1. Ed. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2013, p. 64.

[14]Portal CulturaDigital FGV, http://culturadigital.br/marcocivil/sobre/, acessado em 10 de março de 2014.

[15] Portal G1 Brasil, Barreto defende criação de 'Constituição' da Internet, disponível em http://g1.globo.com/brasil/noticia/2010/05/barreto-defende-criacao-de-constituicao-da-internet.html, acessado 10 março de 2014.

[16] Agencia Brasil, Após denúncias de espionagem, governo pedirá agilidade na votação do Marco Civil da Internet, disponível em http://memoria.ebc.com.br/agenciabrasil/noticia/2013-07-08/apos-denuncias-de-espionagem-governo-pedira-agilidade-na-votacao-do-marco-civil-da-internet, acessado 10 de março de 2014.

[17] Agência Câmara dos Deputados, Marco civil da internet ganha urgência constitucional na tramitação, disponível em http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/COMUNICACAO/451694-MARCO-CIVIL-DA-INTERNET-GANHA-URGENCIA-CONSTITUCIONAL-NA-TRAMITACAO.html, acessado 10 de março de 2014.

[18] Blog do Sakamoto, Marco Civil: Estão querendo criar “gente diferenciada” na internet, disponível em http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2013/11/12/marco-civil-estao-querendo-criar-gente-diferenciada-na-internet/, acessado 10 de março de 2014.

[19] O globo, Entidades denunciam violação de privacidade em novo texto do Marco Civil da Internet, disponível em http://oglobo.globo.com/tecnologia/entidades-denunciam-violacao-de-privacidade-em-novo-texto-do-marco-civil-da-internet-11562098, acessado 10 de março de 2014.

[20] Câmara dos Deputados, Projeto de Lei 2126/2011 Inteiro Teor, disponível em http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=517255, acessado em 10 de março de 2014.

[21] RODOTÀ, Stefano. A Vida na Sociedade da Vigilância - A Privacidade Hoje, Organização, seleção e apresentação de Maria Celina Bodin de Moraes. Tradução: Danilo Doneda e Luciana Cabral Doneda. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p.341-347.

[22] Câmara dos Deputados, Projeto de Lei 2126/2011 Inteiro Teor, disponível em http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=517255, acessado em 10 de março de 2014.

[23] FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis: Vozes, 1987. p. 225-226

[24] CASTELLS, Manuel. A galáxia da internet: reflexões sobre a internet, os negócios e a sociedade. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges, Revisão de Paula Vaz. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2003,p. 149.

[25] Art. 12. O Poder Executivo, por meio de Decreto, poderá obrigar os provedores de conexão e de aplicações de Internet previstos no art. 11 que exerçam suas atividades de forma organizada, profissional e com finalidades econômicas a instalarem ou utilizarem estruturas para armazenamento, gerenciamento e disseminação de dados em território nacional, considerando o porte dos provedores, seu faturamento no Brasil e a amplitude da oferta do serviço ao público brasileiro.

Sobre os autores
Cláudio Ralves

Graduado em Direito pela Universidade Paulista- UNIP Campus Alphaville, Advogado e Mestrando em Direito da Sociedade da Informação pelas Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RALVES, Cláudio; VIEIRA, Alexandre Pires. O direito à privacidade frente aos avanços tecnológicos na sociedade da informação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3979, 24 mai. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27972. Acesso em: 23 dez. 2024.

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