RESUMO: O direito a privacidade é um princípio constitucional e está intrinsecamente ligado com o direito da personalidade da pessoa humana, e a violação deste princípio implica na interferência direta das relações pessoais e de intimidade, desvirtuando a própria maneira de pensar e agir, causando inibição à criatividade e obstrução a comunicação com a sociedade. Devido ao avanço tecnológico, as pessoas tendem a se habituar com as facilidades das compras online e das redes sociais, fornecendo assim informações pessoais através de redes que interligam os banco de dados, relativizando o direito a privacidade e outros inerentes a ele.
Palavras chave: privacidade, tecnologia, sociedade da informação.
INTRODUÇÃO
Na sociedade da informação a privacidade é um dos temas mais ecoados e sua relativização é acentuada com o avanço tecnológico.
Desta forma, faz-se mister entender o que é a privacidade e a que outros princípios correlatos está contextualizado na sociedade da informação.
Neste diapasão, é discutido a importância de se ter um controle dos bancos de dados públicos e privados, seguindo princípios capazes de balizar a coleta de dados e sua finalidade como o princípio da correção na coleta e no tratamento das informações, o princípio da exatidão dos dados coletados, o princípio da finalidade da coleta dos dados, o princípio da publicidade dos bancos de dados, o princípio do acesso individual e o princípio da segurança.
É salutar que o usuário tenha consciência que os dados inseridos na rede de computadores, devido a capacidade de armazenamento em nuvens, torna-se quase permanentes, e a privacidade não estará garantida.
Em termos legislativos será discutida a privacidade sob o prisma do Marco Civil para Internet, contextualizando a realidade em que vivemos.
1 NOÇÕES DE PRIVACIDADE
1.1 Privacidade e liberdade de expressão
A privacidade é coirmã da liberdade de expressão, e mais que isto, não poderia existir sem ela. Podemos pensar nos regimes ditatoriais, que não garantem ao indivíduo a livre manifestação, a liberdade de seus pensamentos. Logo, será afastado de sua privacidade, e por receio de ser rechaçado, não poderá mostrar quem realmente é, desvirtuando sua personalidade ao sabor dos ventos da repressão e censura.
Celso Bastos[1] conceitua privacidade como a “faculdade que tem cada indivíduo de obstar a intromissão de estranhos em sua vida privada e familiar, assim como de impedir-lhes o acesso a informações sobre a privacidade de cada um, e também impedir que sejam divulgadas informações sobre esta área da manifestação existencial do ser humano”.
A liberdade de expressão é a autonomia de poder decidir de que forma se comunicar com a sociedade, podendo expressar a opinião sobre qualquer tipo de assunto, sensível ou não, ponderando, porém, o limite da privacidade de outrem. Neste ponto, a liberdade de expressão e a privacidade andam juntas, não podendo uma ultrapassar os limites da outra.
1.2 Intimidade e vida privada
A privacidade diferencia-se da intimidade no que concerne a aproximação com o público, onde este direito muitas vezes é relativizado. Já a intimidade é intrinsecamente engajada na pessoa, pertencente a vida privada e sem possibilidades de tornar-se público sem sua violação propriamente dita, permeando o centro da privacidade, onde esta abrange aquela.
A intimidade é um direito de exercício que o indivíduo tem para voltar-se a si mesmo sem receio de demonstrar seus reais sentimentos e vontades. Quando as fotos nuas da atriz Carolina Dieckmann foram divulgadas na internet sem o seu consentimento, toda sociedade se mobilizou sendo, inclusive, o fato objeto de alteração de Lei[2].
A intimidade é algo intrínseco e individual, e também se relaciona com o comportamento que os indivíduos tem, podendo desta forma mensurar o que deve ser preservado ou não. Assim, a mesma atriz recentemente relatou[3] que voltou a enviar fotos nuas por e-mail a seu marido e já não se importa mais se estas fotos forem divulgadas, pois ela já foi vista nua por todos e não têm mais graça.
De fato, a intimidade permeia fatos subjetivos na vida de cada indivíduo, que a considera como um o direito de se manifestar de acordo com a cultura local, levando-se em conta os fatos pessoais como a introversão e a timidez.
1.3 Privacidade e direitos da personalidade
Carlos Alberto Bittar[4] considera que são da personalidade os direitos reconhecidos à pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade, previstos no ordenamento jurídico para a defesa de valores inatos ao homem como a vida, a rigidez física, a intimidade, a honra, a intelectualidade e outros.
Assim, ele divide os direitos da personalidade em direitos físicos, direitos psíquicos e direitos morais. Entre os físicos protege-se o direito à vida, à integridade física, ao corpo e suas partes, à imagem e à voz. Entre os psíquicos abriga-se o direito à liberdade de pensamento, de culto, de expressão e de outras manifestações; inclusive o direito à intimidade; o direito a integridade psíquica e o direito ao segredo. No grupo dos direitos morais situam-se os direitos à identidade, à honra, à reputação e o direito às criações intelectuais.
Por serem inatos, os direitos da personalidade devem ser reconhecidos e sancionados pelo Estado em um ou outro plano de direito positivado. Dessa forma, encontramos no Código Civil Brasileiro nos arts. 11 a 21 alguns direitos da personalidade, porém outros direitos relacionados com o principio da dignidade pessoa humana em suas projeções física, moral e psíquica com fundamento no direito geral da personalidade deve ser reconhecido e observado pelos aplicadores do direito.
2 PRIVACIDADE NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
2.1 Natureza jurídica da sociedade da informação
A sociedade da Informação constitui um campo que precisa ser explorado com afinco, com intervenções e reflexões com intuito de fixar importantes conceitos no ramo do direito.
Adalberto Simão Filho[5] entende que a Sociedade da Informação
estrutura-se na premissa estabelecida pelo art. 5º da Constituição Federal no sentido de que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade de direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade e se completa no inciso XIV do art. 5º da Constituição Federal, que assegura a todos o acesso à informação.
A partir dos princípios constitucionais elencados podemos desenvolver o conceito da sociedade da informação, onde seu clímax está no desenvolvimento tecnológico, que viabilizou o acesso à informação através de redes interligadas, onde prepondera a busca da igualdade e a extensão de todos os ramos do direito para a sociedade digital, porém com sujeitos de direitos reais.
Nesse contexto, trabalhamos o direito na sociedade da informação sob todos os primas, e a privacidade sem dúvida nenhuma tem se relativizado com a chegada da tecnologia digital, e para alguns, a privacidade tende a ser eliminada por completo.
Para isso basta observar a interferência da tecnologia em nosso cotidiano, câmeras de segurança espalhadas, localizadores nos celulares e tablet´s, monitoramentos eletrônicos, acesso instantâneo a perfis em redes sociais, ou seja, a tecnologia proporciona benefícios, porém restringe a cada vez mais a forma de comportamento das pessoas.
2.2 Privacidade e internet
Outrora a preocupação com a proteção das informações pessoais estava voltada para a realidade tecnológica da época e as normas de direito público e privado pouco discorria sobre o assunto.
No dias atuais, a acentuada inovação tecnológica e o efeito rede mudaram a perspectiva de privacidade, sob o enfoque dos grandes bancos de dados compartilhados via internet e o grande volume de informações processadas mecanicamente e de forma instantânea, fez com que os setores da sociedade enxergassem o direito da privacidade com um novo olhar.
Para melhor contextualizar[6],
o termo ‘efeito rede’ refere-se, basicamente, à maneira como sistemas maciçamente conectados tendem a criar padrões que, uma vez estabelecidos, torna-se extremamente difíceis de eliminar. Esses padrões passam a ter muito valor. Em uma rede, quanto mais pessoas usarem um determinado produto ou sistema, mais valor ele passará a ter, principalmente por causa da capacidade aumentada de um usuário individual para se conectar e compartilhar recursos com outros que utilizam o mesmo sistema.
As construções legislativas de proteção de dados que tinham como premissa os grandes computadores que há trinta anos operavam, ficaram demasiadamente desatualizadas, como observa Rodota[7]: “Seguindo o desenvolvimento da tecnologia, a noção que se tinha de arquivo de banco de dados torna-se insuficiente ou superada. Surge como valor fundamental a noção de rede, será preciso levar em conta as tecnologias interativas, com as perspectivas abertas pela telemática.”.
A definição de privacidade elaborada no novo contexto de tecnologia também está imbuída na complexidade da construção da definição da proteção de dados, que vai além da tutela da intimidade individual, pois se relaciona a nova problemática referente à legalidade da ação pública.
Ao aumentar a possibilidade de tutela efetiva da esfera privada dos cidadãos, tendo em vista que justamente esses últimos a serem os titulares de uma maior quota de poder de controle sobre os aparatos públicos, os sistemas de governo privilegiam a transparência na efetivação da criação das legislações.
Por outro lado, toda a gama de informações fornecidas pelas pessoas que precisam de determinados serviços, que crescem a cada dia em quantidade e qualidade, acabam por ter usos secundários e lucrativos para os gestores dos sistemas de bancos de dados interativos.
2.3 A circulação das informações entre regras e mercado
A coleta e tratamento da informação têm a ver com o papel do cidadão na sociedade informatizada, de como esta informação é colocada em circulação, sendo, inclusive, papel preponderante na distribuição do poder.
A ONU, detectando a questão dos efeitos sociais e políticos dos tratamentos automatizados das informações discutiu o assunto há algumas décadas. No parágrafo 1, “c”, da Resolução 2.450 (XXIII), de 19 de dezembro de 1968, a Assembleia Geral sublinhava “os usos da eletrônica que possam incidir sobre os direitos do cidadão e os limites que deveriam ser previstos para tais usos em uma sociedade democrática”.
Segundo Rodota[8], “o direito de acesso foi tomado como uma contrapartida oferecida ao individuo pelas informações pessoais ‘cedidas’ às organizações públicas, ou privadas, obedecendo ao critério, tipicamente proprietário, da troca”.
A defesa da privacidade deve superar a lógica proprietária dos bancos de dados, integrandos assim os controles individuais e coletivos para que os interesses sejam equilibrados com regramentos que garantam um funcionamento, uma razão de ser, com o fim de que cada dado coletado tenha uma função ao ser armazenado.
2.4 Princípios e instrumentos na proteção de dados
Na tutela dos dados informáticos, Rodotà aponta que deve se assegurar alguns princípios e instrumentos necessários para se ter efetividade. Dois documentos internacionais apontados pelo autor são deduzidos em alguns princípios que a frente serão elencados. O primeiro documento trata-se da Convenção do Conselho da Europa de 28 de janeiro de 1981, para a proteção das pessoas em relação à coleta automática dos dados de caráter pessoas, e o segundo da Recomendação da OCDE de 23 de setembro de 1980, que contém as diretrizes relativas à proteção da vida privada e à circulação transnacional dos dados de caráter pessoal. Extraem-se dessa forma os seguintes princípios[9]:
1- princípio da correção na coleta e no tratamento das informações;
2- princípio da exatidão dos dados coletados, acompanhado pela obrigação de sua atualização;
3- princípio da finalidade da coleta dos dados, que deve poder ser conhecida antes que ocorra a coleta, e que se especifica na relação entre os dados colhidos e a finalidade perseguida (princípio da pertinência), na relação entre a finalidade da coleta e a utilização dos dados (princípio da utilização não abusiva); na eliminação, ou na transformação em dados anônimos das informações que não são mais necessárias (princípio do direito ao esquecimento);
4- princípio da publicidade dos bancos de dados que tratam as informações pessoais, sobre os quais deve existir um registro público;
5- princípio do acesso individual, com a finalidade de conhecer quais as informações coletadas sobre si próprio, obter a sua cópia, obter a correção daquelas erradas, a integração daquelas incompletas, a eliminação daquelas coletadas ilegitimamente;
6- princípio da segurança física e lógica da coletânea dos dados.
Esses princípios apontados pelo autor nunca estiveram mais atualizados, pois a sociedade da informação carece de normatizações e a todo o momento observamos atos governamentais e privados que são alheios aos princípios extraídos e que causa grande constrangimento entre Estados, como é o caso Snowden[10].
Dentre outras coisas, Snowden revelou que dados coletados por empresas privadas eram repassados ao governo sem o consentimento dos americanos, violando a privacidade de uma nação inteira, sob a justificativa de combate ao terrorismo.
Este fato se coaduna com as afirmações de Rodotà[11]:
Há quem ressalte que regulamentações restritivas da coleta e da circulação de informações são possíveis em tempos razoavelmente tranquilos, ou mesmo realmente felizes. Quando, ao contrário, cresce a instabilidade social, aumenta também a necessidade de informações e da ligação entre os vários bancos de dados para enfrentar situações de emergência em matérias de ordem pública, no mercado de trabalho, e assim por diante.
Já no caso específico do governo norte americano, Rodotà[12] também já alertava sobre a utilizações de informações que extrapolam as finalidades da coleta: “Uma disciplina mais pontual e rigorosa neste setor é necessária, até por causa do advento de um fenômeno que, nos Estados Unidos, já atingiu proporções preocupantes: a aquisição, pela administração pública, de grandes quantidades de informações coletadas por privados.”.
Dessa forma podemos perceber que os princípios elencados não são absolutos, são relativizados ou até ignorados quando existe instabilidade social e estado de alerta por causa de possíveis conflitos armados.
Por outro lado, as pessoas também devem ter um controle do que inserem nos bancos de dados, tendo em vista que o que é lançado no espaço virtual fica armazenado, como descreve Schmidt[13]:
A armazenagem quase permanente de dados terá um grande impacto sobre o modo como os cidadãos operam no espaço virtual. Haverá um registro de todas as atividades e associações online, e tudo o que for agregado à internet se tornará parte de um repositório de informação permanente. A possibilidade de que algum conteúdo pessoal seja publicado e se torne conhecido um dia- por engano ou por interferência criminosa- sempre vai existir. As pessoas precisarão se responsabilizar por suas associações virtuais, passadas e presentes, e os riscos serão elevados para quase todos, já que os relacionamentos online tendem a ser mais abrangentes e difusos do que os físicos. O bom ou o mau comportamento daqueles que conhecemos irá nos afetar positiva ou negativamente. (E parâmetros de privacidade mais severos nas redes sociais não serão suficientes).
A análise crítica da realidade é assustadora, pois à medida que convivemos com a tecnologia nos acostumamos com suas facilidades e perdemos a noção da nocividade dos dados que inserimos, pois a partir do momento em que nos conectamos encerra-se aí a nossa privacidade.
3 A PRIVACIDADE NO MARCO CIVIL
O Marco Civil da Internet é uma iniciativa legislativa, surgida no final de 2009, para regular o uso da Internet no Brasil, por meio da previsão de princípios, garantias, direitos e deveres de quem usa a rede, e da determinação de diretrizes para a atuação do Estado. Neste contexto, a Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça (SAL/MJ), em parceria com a Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getúlio Vargas (DIREITO RIO), lançou o projeto para a construção colaborativa de um Marco Civil da Internet no Brasil[14].
O próprio processo de construção do marco demonstra inovação, onde o tema foi amplamente debatido pela sociedade utilizando a própria Internet como ferramenta para a participação ativa dos inúmeros atores envolvidos no tema. O resultado desta interação, o anteprojeto do marco civil foi então enviado à câmara dos deputados, recebido sob o número 2.126/2011. Na ocasião Marco Civil foi descrito pelo então Ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, como "A Constituição da Internet"[15].
Em julho de 2013, com a publicação de notícias de que as comunicações no Brasil eram alvo de espionagem eletrônica pelos EUA, o governo federal declarou que a aprovação do Marco Civil da Internet era uma prioridade[16], colocando em evidência a questão da privacidade na Internet. No dia 11 de setembro de 2013 foi publicado no Diário Oficial da União a mensagem de urgência assinada pela presidente Dilma Rousseff[17], tendo então a Câmara prazo de 45 dias para que o Marco Civil fosse apreciado pelos deputados, o que não ocorreu, principalmente por pressão das empresas de telecomunicação interessadas na exclusão do princípio de neutralidade de rede[18].
Como pano de fundo a espionagem americana, o texto final do Marco Civil da Internet, foi apresentado em 05 de novembro de 2013 pelo relator da proposta, deputado Alessando Molon, condicionado a Internet, por meio de decreto do governo, a obrigação de os provedores de internet que exercem atividades no país guardarem as informações em datacenters no Brasil.
Infelizmente, um projeto que havia sido extensivamente debatido pela sociedade foi alterado, onde interesses governamentais foram incluídos, não para proteger a população da espionagem, mas aparentemente, garantir que tal espionagem possa ser feita pelo governo Brasileiro.
Tais modificações não foram bem vistas por organizações mídia, de defesa da liberdade na web e dos direitos do consumidor como Associação das Rádios Públicas do Brasil (Arpub), Associação Software Livre.org, Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Proteste, e outras, que enviaram ao Ministério da Justiça carta pedindo mudanças no texto do Marco Civil da Internet[19].
A carta manifesta grave preocupação com a atual versão do projeto de lei: “Entendemos que com a nova proposta pilares fundamentais deste projeto de lei foram abalados, (...) como o direito ao sigilo do fluxo e conteúdo das comunicações privadas, o direito à privacidade e à liberdade de expressão”. Segundo as entidades, o projeto estabelece uma “espécie de grampo compulsório” de toda navegação realizada em grandes sites, invertendo o princípio constitucional da presunção de inocência, fato que acabará por incentivar os provedores a utilizar os dados comercialmente.
Ao contrário da versão anterior, que tratava apenas dos “registros de conexa?o e de acesso a aplicac?o?es de Internet”, o novo texto[20] do artigo 10 faz refere?ncia tambe?m ao “conteu?do de comunicac?o?es privadas”, ampliando o escopo do projeto de lei inicial, incluindo tema em que não houve discussão prévia pela sociedade. Mas, ainda mais grave, o novo texto tambe?m amplia as obrigac?o?es de guarda de registros. Ao contra?rio da versa?o anterior que previa obrigatoriedade de guarda apenas dos registros de conexa?o, a versa?o atual tambe?m torna obrigato?ria a guarda de registros de acesso a aplicac?o?es de Internet.
Cabe ressaltar que na Unia?o Europeia, onde os padrões de proteção a? privacidade são mais altos, a Diretiva[21] que trata de retenção obrigatória de registros diz respeito apenas aos registros de conexão, e não aos registros de aplicações.
Críticas à parte, o projeto de lei[22] do Marco Civil da Internet traz como pedra fundamental o principio da Privacidade, neste sentido, vale destacar os principais pontos:
Art. 3º A disciplina do uso da Internet no Brasil tem os seguintes princípios:
I – garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, nos termos da Constituição;
II – proteção da privacidade;
III – proteção aos dados pessoais, na forma da lei; (...)
Art. 7º O acesso à Internet é essencial ao exercício da cidadania e ao usuário são assegurados os seguintes direitos:
I – à inviolabilidade da intimidade e da vida privada, assegurado o direito à sua proteção e à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
II – à inviolabilidade e ao sigilo do fluxo de suas comunicações pela
Internet, salvo por ordem judicial, na forma da lei;
III – à inviolabilidade e ao sigilo de suas comunicações privadas armazenadas, salvo por ordem judicial; (...)
VII – ao não fornecimento a terceiros de seus dados pessoais, inclusive registros de conexão, e de acesso a aplicações de Internet, salvo mediante consentimento livre, expresso e informado ou nas hipóteses previstas em lei;
VIII – a informações claras e completas sobre a coleta, uso, armazenamento, tratamento e proteção de seus dados pessoais, que somente poderão ser utilizados para finalidades que:
a) justificaram sua coleta;
b) não sejam vedadas pela legislação ; e
c) estejam especificadas nos contratos de prestação de serviços.
IX – ao consentimento expresso sobre a coleta, uso, armazenamento e tratamento de dados pessoais, que deverá ocorrer de forma destacada das demais cláusulas contratuais;
X – à exclusão definitiva dos dados pessoais que tiver fornecido a determinada aplicação de Internet, a seu requerimento, ao término da relação entre as partes; e
Art. 8º A garantia do direito à privacidade e à liberdade de expressão nas comunicações é condição para o pleno exercício do direito de acesso à Internet.
Art. 10. A guarda e a disponibilização dos registros de conexão e de acesso a aplicações de Internet de que trata esta Lei, bem como de dados pessoais e do conteúdo de comunicações privadas, devem atender à preservação da intimidade, vida privada, honra e imagem das partes direta ou indiretamente envolvidas. (Grifos Nossos).
Analisando o texto do projeto de lei e comparando-o com as Diretrizes para a Proteção da Privacidade e dos Fluxos Transfronteiriços de Dados Pessoais da OECD temos que os princípios base das Diretrizes estão fortemente presentes no Marco Civil da Internet brasileira a começar pelos comuns aos países membros da OECD: democracia pluralista, respeito aos direitos humanas e economias de mercado aberto, já que o artigo segundo do projeto apresenta a seguinte redação:
Art. 2º A disciplina do uso da Internet no Brasil tem como fundamento o respeito à liberdade de expressão, bem como (...)
II – os direitos humanos, o desenvolvimento da personalidade e o exercício da cidadania em meios digitais; (...)
V – a livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor; (Grifos Nossos).
Neste sentido, o projeto de lei do marco civil está em linha com os princípios em questão, sendo que o Princípio de limitação da coleta está espelhado nos incisos VII e VIII do art. 7º ao exigir consentimento livre, expresso e informado sobre a coleta, tratamento e proteção dos dados pessoais do usuário. O princípio da qualidade dos dados está compreendido também no artigo 7º que no inciso X prevê a exclusão dos dados pessoais ao termino do relação das partes.
O princípio da finalidade da coleta dos dados e o princípio da limitação de utilização têm lastro no artigo 7º, inciso VIII, que regra que o uso dos dados pessoais somente poderá se dar para finalidades que estejam especificadas nos contratos de prestação de serviços e nos incisos II e III de determinam a inviolabilidade dos dados na forma da lei, salvo por ordem judicial.
O Princípio de participação do indivíduo ou do acesso individua não está expressamente previsto no projeto de lei, mas pode ser inferido do conjunto da norma. De toda forma o remédio constitucional do Habeas Data atende esta necessidade.
E finalmente, o Princípio de responsabilização está presente no artigo 13 que prevê as sanções de advertência, multa, suspensão e proibição do exercício das atividades para aqueles que infringirem as normas do marco civil, responsabilização inclusive prevista para entidades estrangeiras como regra o parágrafo único do artigo em comento: “Parágrafo único. Tratando-se de empresa estrangeira, responde solidariamente pelo pagamento da multa de que trata o caput sua filial, sucursal, escritório ou estabelecimento situado no País”.