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Direito fundamental ao meio ambiente:

a efetividade da tutela constitucional ambiental

Agenda 04/06/2014 às 15:29

Através da Constituição Federal, o Brasil garantiu um lugar legítimo ao direito ambiental dentro da Ordem Social. Trata-se de parte integrante e necessária para o bem-estar da sociedade e para a busca de desenvolvimento socioeconômico pautado na sustentabilidade.

RESUMO: A constante e crescente preocupação com a proteção ambiental levou ao reconhecimento mundial do meio ambiente ecologicamente equilibrado como Direito Fundamental do homem, enquadrando-o na terceira geração da evolução de direitos. O Brasil, seguindo essa necessidade mundial, trouxe de forma inovadora o tratamento da questão ambiental na Constituição Federal de 1988. O principal artigo dedicado ao meio ambiente, artigo 225, fez surgir uma nova figura jurídica: o bem ambiental. O legislador constituinte impôs ainda, como dever de todos, do Poder Público e de cada indivíduo, a função de preservar o meio ambiente. No artigo 225, §1.º, I a VII, foram traçadas as formas de assegurar essa proteção. São normas que, apesar de necessitarem de regulamentação infraconstitucional, determinam as linhas mestras, o alicerce para uma efetiva proteção, pois abrangem desde as mínimas espécies até os maiores ecossistemas.

Palavras-chaves: meio ambiente, direito fundamental, tutela constitucional.  

SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO; 2 DIREITOS FUNDAMENTAIS E O MEIO AMBIENTE; 2.1 Conceito de direito fundamental; 2.2 Direitos fundamentais de terceira geração; 3 Meio ambiente na Constituição Federal de 1988; 3.1 Configuração do bem ambiental; 4 A EFETIVIDADE DA TUTELA CONSTITUCIONAL AMBIENTAL DO ART 225 §1º; 4.1 Preservação e restauração dos processos ecológicos essenciais e a promoção do manejo ecológico das espécies e ecossistemas; 4.2 Preservação do patrimônio genético e fiscalização da pesquisa e manipulação de material genético; 4.3 Realização de Estudo Prévio de Impacto Ambiental e a gestão de riscos; 4.4 Educação ambiental; 4.5 Proteção à fauna e à flora; 5 CONCLUSÃO; REFERÊNCIAS.


1 INTRODUÇÃO

Ao longo da história nunca se preocupou tanto com o meio ambiente. Observa-se que o desenvolvimento econômico, tecnológico e genético trouxe consigo um desgaste e uma poluição que devem ser estudados e combatidos.

A proteção ambiental deve abranger a preservação da natureza em todos os seus elementos essenciais à vida humana e à manutenção do equilíbrio ecológico.

Este artigo tem por escopo mostrar que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito fundamental do homem e, portanto deve ser garantido não apenas pelo Estado, mas também pela participação de todos os cidadãos.

A Constituição Federal de 1988, inovando em relação às anteriores, tutelou de forma bem abrangente o meio ambiente e por isso vai ser o alvo do presente estudo.

Assim, todo indivíduo deve prezar pelo ambiente saudável, tanto na esfera individual como na social. O Estado, para isso, assegura meios de atuação para preservação do ambiente, de forma preventiva e também repressiva.

Discute-se muito acerca da efetividade dessas medidas, pois a prioridade da política de defesa do meio ambiente deveria voltar-se sempre para o momento anterior ao da consumação do dano, pois normalmente a reparação deste dano ecológico é incerta e extremamente onerosa.

Para a melhor compreensão da temática do artigo, no primeiro capítulo, abordar-se-á o meio ambiente como direito fundamental, classificando-o de acordo com a divisão de gerações dos direitos, proposta por Norberto Bobbio.

 No segundo capítulo, será analisado o caput do art. 225 da Constituição Federal de1988, que merece grande destaque pela inteligência de sua redação.

Por fim, no último capítulo, serão estudados os meios constitucionais de atuação do Estado previstos no art. 225 §1° da CF/88, que visam garantir o meio ambiente ecologicamente equilibrado entendendo qual o alcance desses dispositivos, ressaltando os pontos com que a Carta Magna mais se preocupou.

O artigo, portanto, tem a pretensão de compreender o meio ambiente como Direito Fundamental e ainda estudar as medidas e políticas constitucionais do Poder Público para assegurar o equilíbrio entre o desenvolvimento humano e a preservação do ambiente como pressuposto da garantia da própria existência e subsistência da vida.


2 DIREITOS FUNDAMENTAIS E O MEIO AMBIENTE

2.1 Conceito de direito fundamental

Apesar das inúmeras formas empregadas pelos legisladores e doutrinadores para se referir aos direitos fundamentais, tais como direitos do homem, direitos fundamentais da pessoa humana e direitos subjetivos públicos, o presente artigo elegeu a utilização da primeira expressão como base para o estudo.

Luiz Alberto David Araújo desmembra os termos, buscando sua melhor compreensão:

O vocábulo direito serve para indicar tanto a situação em que se pretende a defesa do cidadão perante o Estado como os interesses jurídicos de caráter social, político ou difuso protegidos pela Constituição. De outro lado, o termo fundamental destaca a imprescindibilidade desses direitos à condição humana.( 1999. p.70)

Na mesma linha de pensamento, o ilustre Promotor de Justiça, Vladimir Brega Filho, afirma que “os direitos fundamentais são os interesses jurídicos previstos na Constituição que o Estado deve respeitar e proporcionar às pessoas a fim de que elas tenham uma vida digna”( 2002. p.67).

Os direitos fundamentais, portanto, estão intimamente ligados à dignidade da pessoa humana, uma vez que surgiram para que esta fosse protegida.

 Eles são aceitos por todas as culturas e povos da Terra, como restou confirmado no preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos do Homem promulgada pela Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948:

(...)Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta, sua fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor da pessoa humana e na igualdade de direitos dos homens e das mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla (...) (OLIVEIRA, 2006, p. 1022).  

Dessa forma, reconhece-se que os direitos fundamentais são a “espinha dorsal” de todo ordenamento jurídico, pois refletem os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade e, uma vez assegurados, garantem ao homem uma vida plena e digna.

2.1 Direitos fundamentais de terceira geração

A conjuntura da Segunda Guerra Mundial foi marcada por profundas alterações da comunidade internacional. O crescente desenvolvimento científico e tecnológico e a sociedade de massa reclamam por outros direitos fundamentais que transcendam o individual e o social.

A partir deste momento, o ser humano não é mais visto apenas como um indivíduo isolado, mas ele agora é inserido em uma coletividade global.

Com maestria, aduz Araújo:

Depois de preocupações em torno da liberdade e das necessidades humanas, surge uma nova convergência de direitos, volvida à essência do ser humano, sua razão de existir, ao destino da humanidade, pensando o ser humano enquanto gênero e não adstrito ao indivíduo ou mesmo a uma coletividade determinada (1999, p.78).

Isso faz com que surjam os direitos transindividuais, metaindividuais alicerçados no ideal de solidariedade e de fraternidade. Os principais são: o direito à paz, ao desenvolvimento, à comunicação, à proteção do consumidor e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Todos têm interesse, seja de forma direta ou indireta, na garantia destes direitos. Eles “distinguem-se dos demais em razão de sua titularidade coletiva, ou seja, esses direitos não pertencem a uma pessoa determinada e sim a toda a coletividade” (BREGA, 2002, p.23).

São, portanto, direitos de toda a humanidade, exigindo esforço e cooperação mundiais para sua efetivação.


3 Meio ambiente na Constituição Federal de 1988

No Brasil, a Constituição Federal de 1988 foi a primeira a tratar, especificamente, a questão ambiental, destinando-lhe um capítulo próprio, correspondente ao artigo 225, além de outras menções esparsas ao longo do corpo do texto constitucional. Por isso, é chamada de “Constituição Verde” pelo cunho ambientalista que apresenta, sendo considerada uma das mais avançadas sobre o tema em todo o mundo.

O principal capítulo destinado ao meio ambiente está inserido na Ordem Social com muito acerto, pois, o bem-estar da sociedade é a grande meta de toda política do Poder Público. Também, importante referência ao meio ambiente se faz na Ordem Econômica em que se prevê a “defesa do meio ambiente” como um dos princípios gerais da atividade econômica (art. 170, VI da CF).

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Dessa forma, não se pode esquecer, segundo a lição de Édis Milaré, que:

O crescimento econômico ou o desenvolvimento socioeconômico deve portar-se como um instrumento, um meio eficaz para subsidiar o objetivo social maior. Neste caso, as atividades econômicas não poderão, de forma alguma, gerar problemas que afetem a qualidade ambiental e impeçam o pleno atingimento dos escopos sociais.( 2007. p.149).               

Assim, para melhor compreensão da fundamentação da tutela constitucional sobre o meio ambiente, passa-se a análise da base normativa do Direito Ambiental, qual seja o artigo 225 da CF.

 Para José Afonso da Silva, o dispositivo se divide em três conjuntos de normas: a “norma-matriz” correspondente ao caput; o §1º, em que aparecem os instrumentos de garantia e efetividade do direito enunciado no caput e, por último, um conjunto de determinações particulares, em relação a objetos e setores referidos nos §§ 2º a 6º, que por tratarem de áreas e situações de elevado conteúdo ecológico, merecem desde logo proteção constitucional (2004, p.52).

Como a “norma-matriz”, que é aquela que contem os princípios que norteiam a questão ambiental, é de extrema relevância, far-se-á aqui, um exame do caput, destacando seus pontos principais e deixando para o próximo capítulo, o § 1º do referido artigo, com seus meios de atuação para garantia do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

3.1 Configuração do bem ambiental

Faz-se necessária, pois, a transcrição do caput do artigo 225 da Constituição da República:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (OLIVEIRA, 2006, p.694).    

Cumpre desde logo, estabelecer o que se entende por meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Para Silva, “o objeto da tutela jurídica não é tanto o meio ambiente considerado nos seus elementos constitutivos. O que o Direito visa a proteger é a qualidade do meio ambiente em função da qualidade de vida”(2004, p.81).

Nesse sentido, Duarte preconiza:

Disso decorre que, ao considerar o meio ambiente como direito, com a qualidade de ser ecologicamente equilibrado, quis o constituinte tutelar não qualquer ambiente, mas aquele que resultasse de um equilíbrio entre as (dinâmicas) relações travadas entre o homem e a natureza e que, portanto, impusesse a proteção e defesa para as presentes e futuras gerações (2006, p.92).               

Pode-se notar pela redação do artigo, o caráter intergeracional da defesa do meio ambiente, uma vez que o direito abriga tanto as presentes como as futuras gerações, respaldado nos valores éticos e na solidariedade para a subsistência da vida humana.

O meio ambiente sadio, erigido à categoria de direito fundamental de terceira geração, possui natureza transindividual, difusa e, dada sua importância, poderá e deverá ser defendido das mais diversas formas. Como exemplo dos principais meios de operacionalização dessa defesa são as vias judiciais da ação popular (art. 5º, LXXIII da CF) e da ação civil pública (Lei nº 7347/85).

Surgem, assim, novas relações multilaterais que envolvem os indivíduos e o Estado em prol do meio ambiente. Na correta opinião de Duarte:

Em face da alta relevância do bem jurídico tutelado, a Constituição estabeleceu toda uma política ambiental, impondo a responsabilidade de todos sobre o mesmo (e não só do Estado), e obrigando o Poder Público e a comunidade a preservarem-no para as presentes e futuras gerações; reconhecendo, assim, uma indissociabilidade do vínculo Estado-sociedade civil no dever jurídico de defesa e proteção do meio ambiente (2006, p.94).

A atual Constituição Federal apresenta o meio ambiente como “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”, faz-se, pois necessário entender a natureza jurídica desse bem, posto que ela inova ao criar uma terceira categoria de bens, o bem ambiental, que não é bem público e muito menos privado.

Bem jurídico, pois é tudo aquilo que constitui ou pode constituir um objeto a ser tutelado pelo direito. Já de início, descarta-se a hipótese do meio ambiente ser um bem particular, pois, pertenceria a pessoa natural ou a pessoa jurídica de direito privado, estando intimamente ligado ao direito de propriedade, do qual, na realidade, se afasta muito, tendo em vista que o meio ambiente possui três características fundamentais: a inapropriabilidade, a indisponibilidade e a indivisibilidade.

O meio ambiente é público, na verdade, na medida em que possui caráter transindividual, ou seja, todos podem dele usufruir e não por ser propriedade da União, dos Estados ou dos Municípios, como aqueles do Código Civil.

Reforçando essa idéia, “o meio ambiente sadio é considerado como bem público porque serve a todos os cidadãos e de forma indistinta a toda coletividade, e não porque pertença ao domínio de um determinado ente público"(DUARTE, 2006, p.98). 

Assim, desde logo, observa-se que o “bem de uso comum do povo” proclamado pela Constituição não se confunde com o do bem público da esfera civil.

Destarte, o Texto Constitucional configura uma nova realidade jurídica ao bem ambiental, a de bem difuso, que foi definido posteriormente, pelo Código de Defesa do Consumidor, (Lei n.° 8.087/90) em seu art. 81, parágrafo único, I, com sendo aqueles transindividuais, de natureza indivisível e de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato.

Note-se, também, que o bem ambiental de natureza jurídica própria possui uma finalidade pública que o distingui dos demais bens jurídicos. Ele deve assegurar a sadia qualidade de vida, garantindo dessa forma a vida com dignidade, um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito (art. 1°, III da CF/88).

Acompanhando esse pensamento, Sirvinskas aduz que:

Meio ambiente e qualidade de vida fundem-se no direito à vida, transformando-se num direito fundamental. Por isso que a maioria das Constituições passou a protegê-la mais intensamente como a garantia da coletividade.(2006, p.46).

Entretanto, essa dignidade e o ideal respeito à vida só poderão ser efetivados com a busca da preservação real, total e eficaz do meio ambiente.

Depreende-se de tudo o que foi disposto que o reconhecimento do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental pela Constituição Federal de 1988 é um importante marco em busca da construção de uma sociedade democrática, solidária e participativa. E os meios para assegurar a proteção desse direito/dever devem buscar a preservação da qualidade e dignidade da vida humana e do equilíbrio ecológico, para as presentes e futuras gerações.


4 A EFETIVIDADE DA TUTELA CONSTITUCIONAL AMBIENTAL DO ART 225 §1º

Após entender o meio ambiente como sendo um direito fundamental de terceira geração tutelado pela Lei Maior de forma inovadora e definir a importância de sua proteção, cabe agora saber se a norma constitucional do art. 225 §1.º, por si só, já garante a efetiva preservação do bem ambiental ou se ela apenas fornece as linhas mestras para que haja a proteção integral a ser regulamentada por outras leis e resoluções.

Para Milaré:

Não basta, entretanto, apenas legislar. É fundamental que todas as pessoas e autoridades responsáveis se lancem ao trabalho de tirar essas regras do limbo da teoria para a existência efetiva da vida real; na verdade, o maior dos problemas ambientais brasileiros é o desrespeito generalizado, impunido e impunível, à legislação vigente. É preciso, numa palavra, ultrapassar a ineficaz retórica ecológica – tão inócua quanto aborrecida – e chegar às ações concretas em favor do ambiente e da vida. Do contrário, em breve, nova modalidade de poluição – a “poluição regulamentar” – ocupará o centro de nossas preocupações.(2007, p. 148) 

A Constituição de 1988 prevê em seu artigo destinado ao meio ambiente quais as formas de assegurar a efetividade do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.           

A intensidade dos direitos advindos do art. 225 é forte. As situações jurídicas protegidas são tuteladas não só pelo caminho da abstenção (prestação negativa, v.g.não poluir) mas, sobretudo, pela viabilidade da obtenção de prestações positivas junto ao Estado. A estruturação do sistema constitucional em matéria ambiental torna provedor o Estado, em face da impositividade dos preceitos verificados.( ALONSO JR.,  2006. p.105-106)           

Ela, portanto, de modo bem abrangente procura resguardar de todas as formas e em todos os aspectos o bem ambiental. Apesar de impor ao Poder Público a garantia dessa proteção, é evidente que, em muitos casos, deve também a sociedade e cada indivíduo contribuir nessa árdua, porém necessária, tarefa de preservação da natureza. Dessa forma, concretizar-se-á a democracia participativa tão almejada.

Passa-se, pois a análise de alguns dos incisos do §1º do art. 225 da Constituição Federal de 1988, para contemplar o alcance e a eficácia dos dispositivos.

4.1 Preservação e restauração dos processos ecológicos essenciais e a promoção do manejo ecológico das espécies e ecossistemas

Esta é a primeira medida prevista pela Constituição em seu inciso I do art. 225 § 1°.

Logo de início percebe-se a interdisciplinaridade existente entre as ciências jurídicas e as ciências da natureza. Como o legislador constituinte utilizou-se de termos específicos da Ecologia, faz-se necessário buscar o significado destas expressões em outras matérias, principalmente biológicas, para entendê-las dentro da visão do direito.

A Constituição ao se referir a processos ecológicos essenciais quis garantir a proteção dos processos vitais da natureza que proporcionam uma vida equilibrada não apenas para o homem, mas para todos os seres viventes posto que a sobrevivência do indivíduo está relacionada a tudo que o circunda.

Para Silva, são exemplos desses processos vitais:

A manutenção das cadeias alimentares, os ciclos das águas, do carbono, do oxigênio, do hidrogênio, do nitrogênio, dos minerais, a produção humana de alimentos, de energia e de materiais orgânicos, inorgânicos e sintéticos com que se fazem vestuários, abrigos e ferramentas (2004, p.90).

Apesar de serem mais biológicos que jurídicos, os exemplos dados influem diretamente no cotidiano humano, pois o equilíbrio da natureza proporciona uma melhor qualidade de vida ao homem.

Nessa perspectiva, conclui-se que a norma constitucional busca preservar e restaurar tudo aquilo que proporcione aos seres vivos sua existência saudável, seja através de programas de saneamento básico, seja pela conscientização sobre a utilização dos recursos ambientais, seja fiscalizando a produção de alimentos ou de resíduos. 

A segunda parte do inciso I do art. 225 da CF/88, trata do manejo ecológico das espécies e ecossistemas e deve ser entendido dentro da esfera da gestão ambiental planejada que implica na utilização do meio ambiente de forma sustentável.

Portanto, demonstra-se aqui que o direito fundamental ao meio ambiente coadunado ao ideal do desenvolvimento sustentável almejado pelos Estados e pela sociedade tem um grande aliado através desta norma jurídica, pois ela prevê a preservação, restauração e o manejo da natureza, constituindo-se em um importante meio para efetivar tais escopos. 

4.2 Preservação do patrimônio genético e fiscalização da pesquisa e manipulação de material genético

Este dispositivo é considerado por muitos doutrinadores e juristas como um dos mais avançados e atualizados dentre todos os que integram o capítulo sobre o meio ambiente.

Cumpre desde logo estabelecer a definição de patrimônio genético para entender qual a importância de sua preservação.

Patrimônio genético é a informação dos genes contidos em toda e qualquer espécie, seja ela vegetal, animal, microbiana ou fúngica. Gene, por conseguinte, são os caracteres hereditários (aqueles que são transmitidos de uma geração à outra), sendo instruções codificadas para a construção de proteínas, base de formação de todos os seres vivos. É o fator caracterizante e diferenciador da enorme variedade de espécies.

Assim, para uma proteção efetiva do material genético é necessário um planejamento científico-biológico acompanhado de medidas governamentais, observando e respeitando as espécies raras e as que sofrem risco de extinção bem como dando a devida importância a cada ser vivo.

A norma constitucional garante e almeja a proteção do patrimônio genético, mas tendo em vista as novas realidades que se insurgem, ela necessita, assim como nos outros incisos, de uma regulamentação específica para que tenha maior eficácia.

Neste contexto, como principal exemplo, foi editada, no plano infraconstitucional, a Lei 11.105 de 24 de março de 2005 (Lei de Biossegurança) que traz em seu preâmbulo o que a lei trata:

Regulamenta os incisos II, IV e V do §1.º do art.225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados (...).(PINTO, 2008, p.1631)

Além disso, a mencionada lei tem como diretrizes básicas a proteção à vida, à saúde humana, animal e vegetal, bem como a observância do principio da precaução (art.1.º).

Recentemente, também envolvendo esta Lei, houve um polêmico julgamento em torno das pesquisas com células embrionárias do qual participaram juristas, religiosos, cientistas, comitês de ética, grupos de representação de portadores de necessidades especiais, entre muitos outros manifestantes.

No dia 29 de maio de 2008, em uma decisão histórica, o Supremo Tribunal Federal julgou a ADIn n.º 3510 proposta pelo ex-procurador-geral da República Cláudio Fonteles que questionava a constitucionalidade do art. 5° desta Lei.

O STF, ao final, liberou o uso das células obtidas de embriões humanos desde que respeitados os requisitos impostos pela lei.

O julgado traz muitos benefícios não só para a ciência, para a medicina, para o País, como também para o próprio Direito. Mostra que é preciso a evolução constante, tanto do pensamento como das próprias leis, para que se chegue ao ideal de respeito à dignidade da pessoa humana e à vida saudável.

4.3 Realização de Estudo Prévio de Impacto Ambiental e a gestão de riscos

O Estudo Prévio do Impacto Ambiental é um dos mais importantes pressupostos para a efetividade da proteção do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

 “Trata-se de um meio de atuação preventiva, que visa a evitar as conseqüências danosas, sobre o meio ambiente, de um projeto de obras, de urbanização ou de qualquer atividade” (SILVA, 2004, p.284).

Ele está, portanto intimamente ligado ao princípio da precaução. Sua essência é preventiva na medida em que é exigido para a instalação de qualquer obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação ambiental.             

Neste contexto, deve-se destacar que:

O objetivo central do Estudo de Impacto Ambiental é simples: evitar que um projeto (obra ou atividade), justificável sob o prisma econômico ou em relação aos interesses imediatos de seu proponente, revele-se posteriormente nefasto ou catastrófico para o meio ambiente (MILARÉ, 2007, p.161).

A própria Constituição da República já prevê no inciso IV, que o estudo será exigido na forma da lei e por isso necessita de outras normas ou direcionamentos para sua efetividade, mostrando que ela, por si só, não é capaz de definir todo o procedimento bem como em quais casos será exigido.      

Nessa perspectiva, apesar de pouco eficaz na normatização, a previsão constitucional do Estudo de Impacto Ambiental faz com que esse instrumento tenha grande valor social, pois garante que outras esferas como a econômica e a tecnológica não se sobreponham de forma desenfreada à preservação do meio ambiente.   

Quanto a gestão dos riscos, também é uma das incumbências do Poder Público o controle da produção, da comercialização e do emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco à vida, à qualidade de vida e ao meio ambiente.

Este inciso liga-se ao anterior na medida em que uma das formas de se verificar se há risco nestas atividades é através do Estudo Prévio do Impacto Ambiental. “A gestão de risco está, portanto, necessariamente associada à avaliação das atividades potencialmente causadoras de significativa degradação ambiental” (FERREIRA, 2006, p.249).

A Constituição não distinguiu se os riscos devem ser concretos ou abstratos e com isso impôs que, em ambos os casos, devem ser adotadas medidas preventivas para se afastar e evitar qualquer dano.

Nesse sentido,

Toda e qualquer atividade que possa vir a comprometer a integridade do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado deve ser devidamente avaliada pelo Poder Público, com o propósito de afastar ou minorar os riscos que delas possam decorrer (FERREIRA, 2006, p. 248).   

Os riscos podem ser os mais variados possíveis e eles decorrem das constantes transformações da sociedade, com o avanço da tecnologia, da globalização, com o desenvolvimento econômico e cultural.

4.4 Educação ambiental

Este preceito constitucional, previsto no inciso VI, vem expor a relevância da formação de uma consciência ecológica por parte de todos os cidadãos.

A melhor forma para obtê-la é através da educação ambiental, tanto nas escolas como também fora delas, na comunidade em geral. O processo de alfabetização ecológica deve englobar desde o ensino fundamental até o superior, além, é claro, de campanhas e práticas educativas voltadas a sensibilização da sociedade sobre a importância de se preservar o meio ambiente com simples mudanças de comportamento em seu cotidiano.

Sendo assim, dar-se-á um passo fundamental para a democracia participativa em que todos tenham sua cota de responsabilidade pelo bem ambiental. Deve-se mostrar que pequenas atitudes, tais como, economizar água e energia, selecionar o lixo reciclável, são ações que podem, dentro de um todo, fazer uma grande diferença.

4.5 Proteção à fauna e à flora

Finalmente o último inciso incumbe ao Poder Público a proteção da fauna e da flora, sendo vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco suas funções ecológicas, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade.    

Para maior efetividade dessa proteção da fauna e da flora, a norma constitucional vedou as práticas de atividades que coloquem em risco a função ecológica desses conjuntos bem como as que possam causar a extinção de espécies. Tendo em vista o avanço econômico e tecnológico estas atividades são inúmeras e deverão ser melhor elencadas e proibidas pela legislação esparsa.

Assim, algumas leis já começam a tratar da questão como, por exemplo, a Lei de Crimes Ambientais (Lei n.º 9.605 de 12 de fevereiro de 1998), que dedica nove artigos aos crimes contra a fauna. Há também a Lei n.º 10.519 de 17 de julho de 2001 que dispõe sobre a promoção e a fiscalização da defesa sanitária animal quando da realização de rodeio.

Quanto à flora, mesmo antes do advento da Constituição Federal em 1988, já havia o Código Florestal (Lei n.º 4.771 de 15 de setembro de 1965) que cuidava da proteção das florestas, parte integrante da flora, e que foi inteiramente recepcionada pela vigente Constituição.


5 CONCLUSÃO

O presente artigo procurou mostrar a importância da proteção de meio ambiente através do enfoque dado pelo art. 225 da Constituição Federal de 1988.

Pode-se notar que a questão ambiental, tão preocupante na atualidade, tem no próprio homem o seu violador e o seu protetor, pois é ele quem degrada e ao mesmo tempo a quem cabe preservar o meio ambiente.

Assim, percebe-se que o crescimento econômico e populacional e o desenvolvimento tecnológico, antes feito de forma desordenada, requerem agora a conscientização de que devem ser realizados de maneira sustentável, respeitando todos os elementos que compõe o meio ambiente natural, cultural, artificial e laboral.

Nessa conjuntura, o meio ambiente foi erigido à categoria de Direito Fundamental, pelo seu caráter difuso, sendo uma realidade que transcende as necessidades individuais, mostrando ser um direito universal e sua conservação um direito-dever de toda a raça humana.

Destarte, o Brasil através da Constituição Federal garantiu um lugar legítimo ao direito ambiental dentro da Ordem Social sendo parte integrante e necessária para o bem-estar da sociedade buscando um desenvolvimento socioeconômico pautado na sustentabilidade. Com isso, o caput do artigo 225 da Carta Maior fez surgir uma nova figura, o bem ambiental.

O legislador constituinte enumerou ainda no §1.º do artigo 225 da CF/88 quais as formas incumbidas ao Poder Público para assegurar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Cabe aqui a ressalva de que esses dispositivos apesar de serem a “espinha dorsal” para a tutela do meio ambiente, devem ser melhor regulamentados pela legislação ordinária, tanto pela complexidade da matéria como pela sua extensão e importância.    

Cabe, portanto ao Poder Público viabilizar o cumprimento desta norma, que se mostra essencial e atual editando as leis complementares necessárias, criando e designando órgãos para a operacionalização de tal direito bem como a fiscalização concreta e eficaz.


REFERÊNCIAS

ARAUJO, Luiz Alberto David. Curso de direito constitucional, Vidal Serrano Nunes Júnior. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1999.

BREGA FILHO, Vladimir. Direitos Fundamentais na Constituição de 1988: conceito jurídico das expressões. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2002.

DUARTE, Marise Costa de Souza. Meio ambiente sadio: direito fundamental em crise. 2. tir. Curitiba: Juruá, 2006.

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos Humanos Fundamentais. 8 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006.

MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 5. ed. ref. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.

OLIVEIRA, José Carlos de (organizador). Oito em um acadêmico: Código Civil, Código de Processo Civil, Código Penal, Código de Processo Penal, Código Comercial, Código Tributário, Consolidação das Leis Trabalhistas, Código de Defesa do Consumidor, Constituição Federal, índices alfabéticos remissivos e legislação complementar. São Paulo: Lemos e Cruz, 2006.

PINTO, Antonio Luiz de Toledo; WINDT, Márcia Cristina Vaz dos Santos; CÉSPEDES, Lívia (colaboradores). Vade Mecum - obra coletiva da autoria da Editora Saraiva. São Paulo: Saraiva, 2008.

SILVA, Américo Luís Martins da. Direito do meio ambiente e dos recursos naturais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004.

SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004.

SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 4 ed.rev.atual.e ampl. São Paulo: Saraiva, 2006.   

Sobre a autora
Débora Cristina Mericoffer Rizatto

Graduação em Direito na Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP) - Jacarezinho PR; Pós Graduação em Direito do Estado na Universidade Estadual de Londrina (UEL); Advogada inscrita na OAB/SP 290548 e Professora de Processo Penal da Faculdade de Ciências Sociais e Aplicadas de Primavera do Leste - MT.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIZATTO, Débora Cristina Mericoffer. Direito fundamental ao meio ambiente:: a efetividade da tutela constitucional ambiental. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3990, 4 jun. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29145. Acesso em: 15 nov. 2024.

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