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A parceria público-privada em estabelecimentos penitenciários no Brasil.

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Agenda 27/09/2014 às 20:58

3. SISTEMA PRISIONAL

No terceiro capítulo serão analisadas as noções gerais sobre o Sistema Prisional, que se desenvolverá mediante breve explanação acerca das noções históricas e evolução no Brasil, bem como sua regulamentação pela Lei de Execução Penal, evidenciando-se os direitos dos presidiários e o que de fato é oferecido atualmente aos presidiários no Brasil.

3.1 NOÇÕES HISTÓRICAS

A privação da liberdade, conforme estudado, nasce como instrumento processual de custódia dos réus que se encontravam no aguardo de seus julgamentos ou do início da execução de suas penas para, só mais tarde, tomar forma de instrumento de pena em substituição à pena de morte (BETTIOL, 1976 apud PRADO, 2005, p. 569).

Portanto, ao serem consideradas penas privativas de liberdade passaram a ser regulamentadas para atingir aos fins a que se propunham e, dessa forma, os estabelecimentos de cumprimento das referidas penas ganham destaque na história do Direito Penal, os quais, ora se analisa (BITENCOURT, 2004, p. 14-16).

Na Antiguidade em razão do aprisionamento não possuir caráter sancionatório, mas meramente custodial, os lugares onde se mantinham os acusados eram os piores possíveis, “utilizavam-se horrendos calabouços, aposentos freqüentemente em ruínas ou insalubres de castelos, torres, conventos abandonados, palácios e outros edifícios” (BITENCOURT, 2004, p. 07).

Na Idade Média igualmente não se concebe o aprisionamento como sanção, motivo por que ainda não se dispunha de arquitetura penitenciária adequada; assim, não importava a forma como ficavam encarcerados, “loucos, delinqüentes de toda ordem, mulheres, velhos e crianças esperam, espremidos entre si em horrendos encarceramentos subterrâneos, ou em calabouços de palácios e fortalezas, o suplício e a morte” (NEUMAN, 1965 apud BITENCOURT, 2004, p. 09).

A respeito do tema, Luiz Regis Prado (2005, p. 569) assevera que “o encarceramento era feito sobretudo em masmorras, mosteiros e poços, como uma espécie de ‘etapa preliminar’ da aplicação das penas corporais ou simplesmente como fruto do arbítrio dos governantes”.

As prisões somente foram admitidas como penas no Direito canônico, quando se passou a proceder ao aprisionamento de religiosos que houvessem cometido delitos eclesiásticos e, também, daqueles submetidos aos Tribunais da Igreja, visando quase que exclusivamente incitar o arrependimento (PRADO, 2005, p. 569).

Na Idade Moderna, durante os séculos XVI e XVII, a pobreza se propaga por toda a Europa e a criminalidade igualmente se manifesta; assim, diante de tanta delinquência, era inviável a aplicação da pena de morte, motivo por que se desenvolveram as penas privativas de liberdade e, consequentemente, os estabelecimentos penitenciários organizados para a correção dos apenados (BITENCOURT, 2004, p. 14-16).

Segundo os ensinamentos de Cezar Roberto Bitencourt (2004, p. 16-17), visando a manutenção da ordem social cria-se na Inglaterra o primeiro estabelecimento penitenciário, quando mediante autorização do Rei, o Castelo de Bridwell fora utilizado para isolamento dos delinquentes dessa época, objetivando a reforma dos mesmos por meio do trabalho e da disciplina. Logo mais, na Holanda, foram construídas casas de correção sendo, em 1596, destinadas aos homens (rasphuis), em 1597 às mulheres (spinhis), e em 1600 uma seção especial para jovens.

Na mesma senda, Luiz Regis Prado (2005, p. 569) informa que o mais antigo estabelecimento penitenciário é a House of Correction de Bridwell, criada em Londres em 1552 e, após, a Rasphuis, criada em Amsterdã em 1596.

Em contraposição, Pedro Rates Gomes Neto (2000, p. 47) afirma que o marco inicial do surgimento das prisões se dá com construção das penitenciárias de Amsterdã, inspiradas nos penitenciários do Santo ofício da Inquisição, no final do século XVI, mais precisamente em 1595 [prisão masculina] e 1597 [prisão feminina].

Neste ínterim, observa-se que o aprisionamento como pena é relativamente recente e, ainda assim, a doutrina não se mostra unânime quanto ao surgimento do primeiro estabelecimento penitenciário.

Conforme se extrai de Newton Fernandes (2002, p. 651-652):

Alguns autores, todavia, alegam que o primeiro presídio público surgiu em 1596, na cidade holandesa de Amsterdã; contestando, outros asseveram que a 1ª prisão oficial foi instalada no século XVI, em 1596, quando Eduardo VI, rei da Inglaterra, ordenou que se transformasse o Palácio de Bridwell num presídio para indigentes e vadios. Há os que asseguram que em Florença, no século XVI, foi fundada a primeira casa de reclusão e educação correcional para criminosos juvenis.

Seguindo-se com a explanação acerca das noções históricas do sistema prisional, observa-se que na segunda metade do século XVII fora criado pelo sacerdote italiano Filippo Franci, em Florença, o Hospício de São Felipe Neri, o qual visava à correção de jovens. E, ainda, no ano de 1704, fora fundado em Roma pelo Papa Clemente XI o Hospício de São Miguel o qual, igualmente, destinava-se à correção de jovens delinquentes. Por fim, em 1775, fora fundada por Juan Vilain XIV a prisão de Gante (PRADO, 2005, p. 570).

Considera-se, portanto, que as primeiras expressões de aprisionamento surgiram na Europa em razão da marginalidade vivenciada nos séculos XVI e XVII, objetivando-se a reforma dos delinquentes e o controle social.

Contudo, é importante destacar que essas formas de estabelecimentos penitenciários ainda se mostravam de maneira tímida, e somente no século XVIII se fixaram definitivamente, momento em que surgiu um grande número de estabelecimentos penitenciários, os quais não observavam quaisquer princípios de higiene, pedagogia e moral (OLIVEIRA, 2003, p. 47-50).

Nesse contexto afirma Pedro Rates Gomes Neto (2000, p. 47):

No século XVIII as prisões eram em geral subterrâneas, embutidas nos castelos, imundas, inóspitas, insalubres, mefíticas e geradoras da chamada ‘febre das prisões’. Os presos nelas eram jogados e relegados ao abandono, acabando muitos por morrerem esquecidos de todos, uma vez que a prisão não era generalizadamente instrumento de pena, havia muitas segregações arbitrárias, sem nenhuma culpa formada, simplesmente por animosidade, antipatias políticas, autocratismo e prepotência da nobreza e dos apaniguados políticos.

No mesmo sentido leciona Odete Maria de Oliveira (2003, p. 51):

As prisões eram geralmente subterrâneas, apresentavam-se insalubres, infectas e repelentes. Tais estabelecimentos, verdadeiras masmorras do desespero e da fome, abarrotavam-se de condenados, criando situações tenebrosas e insuportáveis. Os prisioneiros eram ali jogados e relegados ao mais completo abandono, sofrendo cruéis torturas.

Diante desse cenário, o pensador inglês John Howard manifestou reação contrária às calamidades ocorridas no sistema prisional da época, por intermédio de sua obra State of Prisons in Ingland and Wales - 1777, na qual apresentou como alvitre a reestruturação das prisões a fim de se efetivar a humanização em todo o sistema (OLIVEIRA, 2003, p. 51).

Com fundamento em princípios humanitários, Howard idealizava um modelo prisional que garantisse higiene, alimentação, educação moral, religiosa e profissional, regimes disciplinares diferentes entre presos provisórios e definitivos e, por fim, sistemas progressivos de cumprimento da pena (GOMES NETO, 2000, p. 48).

Dispensou grande importância ao trabalho, mesmo se obrigatório ou penoso, e à religião (principalmente por propiciar momentos de reflexão e meditação) como meios de regeneração moral do encarcerado (Bitencourt, 2004, p. 41).

Cezar Roberto Bitencourt (2003, p. 36) ensina que Howard propunha princípios para a classificação dos encarcerados de acordo com suas peculiaridades, dividindo-os em três classes, as quais deveriam receber tratamentos diferentes: a) os processados apenas se encontram em regime custodial, não devendo ser submetidos a nenhuma forma de castigo, b) os condenados devem ter sua condenação observada e c) os devedores. Insistiu, ainda, na separação de homens e mulheres, e jovens e maduros.

Argumentou, também, a necessidade de fiscalização pelo juiz da execução criminal sob o pessoal penitenciário, afirmando que estes devem ser honrados e humanos, porquanto desencadeiam efeitos diretos sob os encarcerados (Bitencourt, 2004, 43).

As ideias de Howard apresentavam-se muito a frente de seu tempo, é de se esclarecer, contudo, que não se observou grandes mudanças nas condições das prisões durante ou depois de serem difundidas, demonstrando a dificuldade de se obter um sistema prisional garantidor de condições mínimas de aprisionamento (BITENCOURT, 2004, p. 44).

Embora seus ideais não tenham sido totalmente aceitos à época, Howard fora vitorioso na abolição da taxa carcerária, oportunidade em que muitos presidiários foram libertados, eis que mesmo cumprindo suas penas eram mantidos presos por não disponibilizarem de recursos financeiros suficientes para o pagamento da taxa de carceragem [taxa cobrada para concessão da liberdade mesmo após o cumprimento da pena] (OLIVEIRA, 2003, p. 52).

Observadas as principais passagens históricas do sistema prisional, passa-se à explanação dos sistemas penitenciários que, classicamente, podem ser chamados: o pensilvânico, o auburniano e o progressivo.

Inicialmente, é preciso esclarecer que os sistemas penitenciários “representam corpos de doutrinas que se realizam através de formas políticas e sociais constitutivas das prisões” (PRADO, 2005, p. 572).

No que concerne ao Sistema Pensilvânico (Filadélfico, Belga ou Celular), surgido em 1790 na cidade de Filadélfia, percebe-se que impunha o isolamento absoluto e constante do prisioneiro, sendo-lhe vedado o recebimento de visitas e o trabalho, permitindo-se, tão somente, a leitura da Bíblia com vistas ao seu arrependimento e à manutenção da disciplina; dessa forma, atua-se na consciência do condenado. Esse sistema fora muito criticado porquanto a rigidez mostra-se ineficaz à ressocialização do condenado (PRADO, 2005, p. 572-573).

Preconizava, portanto, a ressocialização do apenado em completa ociosidade e isolamento, o que se observava era a solidão absoluta (OLIVEIRA, 2003, p. 56).

O Sistema Auburniano, surgido na cidade de Auburn em 1818, igualmente severo, exigia o silêncio e o isolamento noturno, contudo permitia aos condenados trabalhar de maneira isolada em suas próprias celas e, posteriormente, permitiu-se, também, a realização de trabalhos em grupos durante o dia (PRADO, 2005, p. 573).

Ocorre que mesmo com um regime de comunidade (durante o dia), o silêncio absoluto ainda era exigido, resultando, nos presos, um hábito de comunicação por sinais, o que se mantém até hoje nas prisões de segurança máxima em razão da imposição de um regime disciplinar mais severo (OLIVEIRA, 2003, p. 59).

A respeito dos Sistemas Pensilvânico e Auburniano, conclui Odete Maria de Oliveira (2003, p. 58):

Enquanto que o sistema de Filadélfia [Pensilvânico, Belga ou Celular] objetivava a transformação do criminoso em homem bom e de alma pura, por meio do arrependimento, levado pela reflexão, o sistema Auburn pretendia condicionar o apenado pelo trabalho, disciplina e mutismo. Ambos, porém, só faziam degenerar o homem.

O Sistema Progressivo, por sua vez, surgido na Irlanda em 1854, apresenta-se mais brando, condicionando o aprisionamento ao binômio conduta-trabalho. Assim, se expressa em quatro etapas, sendo a etapa inicial ou de prova a que o condenado é mantido isolado em sua cela; a segunda etapa exige o isolamento noturno, mas permite o trabalho coletivo diurno; a terceira etapa destina-se ao trabalho externo e, por fim, a quarta etapa se traduz em liberdade condicional (FERNANDES, 2002, p. 663).

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Por fim, importante destacar que o Sistema Progressivo fora adotado pelo ordenamento jurídico penal brasileiro, conforme descrito por Newton Fernandes (2002, p. 664):

O Brasil consagrou o sistema progressivo, fazendo-o, todavia, com feição peculiar visto que a pena de detenção não permite todas as fases desse modelo prisional. É a pena de reclusão que faz com que nosso ordenamento penal contemple o sistema penitenciário progressivo.

Isso porque a pena de reclusão se caracteriza pela incidência de regime de cumprimento inicialmente fechado, progredindo para o aberto e o semiaberto, enquanto na pena de detenção o regime de cumprimento inicialmente fechado simplesmente não ocorre (NUCCI, 2008, p. 378).

Partindo desse pressuposto, percebe-se com clareza que os sistemas penitenciários se tratam de políticas organizacionais aplicadas aos estabelecimentos penais, objetivando a manutenção da ordem social e a ressocialização do prisioneiro.

3.1.1 Evolução no Brasil

Analisadas, de maneira geral, as noções históricas do sistema prisional passa-se a análise de sua evolução no Brasil, fazendo-se breve explanação acerca do Direito Penal Brasileiro, classicamente resumido em três fases: Período Colonial, Código Criminal do Império e Período Republicano.

No que concerne à primeira fase (período colonial: 1500-1822), os estudos remontam à época do descobrimento, momento em que os portugueses verificaram que os índios não possuíam um direito penal organizado, aplicando-se toda a sorte de penas inspiradas na vingança privada (NUCCI, 2008, p. 68).

Assim, logo se instalou a legislação lusitana traduzida nas Ordenações do Reino. A respeito do tema, Guilherme de Souza Nucci (2008, p. 68):

Inicialmente, vigoraram as Ordenações Afonsinas (1446), da época de D. Afonso V. Posteriormente, passaram a viger as Ordenações Manuelinas (1521), da época de D. Manuel I. Antes das ordenações Filipinas (1603), do reinado de D. Filipe II, houve a aplicação da compilação organizada por D. Duarte Nunes de Leão, por volta de 1569.

Ao tempo das Ordenações Afonsinas as medidas que afetam a liberdade raramente aparecem como pena, no entanto, possuem função preventiva quanto à possível fuga do acusado, custodial para o momento posterior à sua captura e coercitiva quanto ao pagamento de penas pecuniárias (DOTTI, 1998, p. 42).

Nas Ordenações Manuelinas, a prisão igualmente não expressa caráter sancionatório, mas funciona como instrumento de coerção processual até posterior julgamento e condenação do acusado. O destaque dessa época são alguns dispositivos voltados à regulamentação do cumprimento da prisão (lugares ou situações especiais), quando considerada pena (DOTTI, 1998, p. 43).

No período de transição entre as Ordenações Manuelinas e as Ordenações Filipinas, observa-se a divulgação de diversas legislações extravagantes, as quais continham muitas regras sobre o cumprimento da pena privativa de liberdade, quando assim o era recebida, posto que, em regra, ainda contava um caráter coercitivo e retributivo (DOTTI, 1998, p. 44-45).

As Ordenações Filipinas foram marcadas pela inclusão de penas extremamente cruéis, que variavam entre penas de morte, de mutilação e perda da liberdade, além de medidas infamantes, visado à intimidação e a retribuição (DOTTI, 1998, p. 45-47).

Neste ínterim, conclui-se da primeira fase do Direito Penal Brasileiro – O Período Colonial, que a prisão ainda não fora tomada com caráter estritamente sancionatório, portanto é notável a prevalência de penas corporais e pungentes.

Em relação à segunda fase (período imperial: 1822 – 1889), observa-se a instalação de uma nova ordem jurídica em razão de o Brasil ter conquistado sua independência de Portugal, a qual merece atenção em vista das inúmeras alterações realizadas no plano do Direito Penal (DOTTI, 1998, p. 49-50).

A primeira Carta Constitucional outorgada em 18241 determinou a organização de um Código Criminal abolindo as penas cruéis, conforme se extrai dos ensinamentos de René Ariel Dotti (1998, p. 50):

Declarou, formalmente, a abolição dos açoites, da tortura, da marca de ferro quente e todas as demais penas cruéis; proibiu o confisco de bens e a declaração de infâmia aos parentes do réu em qualquer grau; proclamou que nenhuma pena passaria da pessoa do delinqüente e que ‘as cadeias serão seguras, limpas e bem arejadas, havendo diversas casas para separação dos réus, conforme suas circunstâncias e a natureza de seus crimes’ (§§ 18, 19, 20, e 21) (grifo nosso).

Ressalta-se, portanto, que o período imperial fora importantíssimo para a evolução do sistema prisional, pois a prisão aparece com forte finalidade de reforma moral do condenado, assim os locais para o cumprimento das penas exigiam adequação a fim de que referida finalidade fosse alcançada.

Por fim, relativamente à terceira fase (período republicano), registra-se que o Brasil atravessou profundas transições políticas e institucionais e, juntamente, foram vivenciados diversos diplomas legais, o que será devidamente sintetizado no presente trabalho.

Na Primeira República (1889 – 1930) fora instalado um novo Código Penal já em 1890, regulamentando as penas privativas de liberdade em: prisão celular, reclusão, prisão com trabalho obrigatório e prisão disciplinar (DOTTI, 1998, p. 54-55).

Na Segunda República (1930 – 1937) observa-se certa humanização no processo de execução penal, oportunidade em que as sanções privativas de liberdade foram consideravelmente restringidas à prisão e detenção, indicando-se medidas alternativas à pena de prisão (DOTTI, 1998, p. 61-62).

No Estado Novo (1937 – 1945), fora deflagrado o golpe de Estado em 1937, época em que o Brasil retrocedeu à ditadura, sendo restituídas as penas cruéis, inclusive de morte; ainda existiam as penas privativas de liberdade, contudo não se tinha regulamentação quanto à execução das referidas penas. Em 1940 fora publicado o Código Penal, o qual previa a reclusão e a detenção como penas privativas de liberdade, mas igualmente dispensava atenção necessária ao cumprimento das referidas penas, incitando preocupação nos juristas da época, em razão do prejuízo trazido aos objetivos ressocializadores da prisão (DOTTI, 1998, p. 62-70).

Com a queda do Estado Novo e a restauração da Democracia (1946 – 1964), fora promulgada em 1946 uma nova Constituição, na qual foram novamente banidas as penas cruéis, restaurando-se, com força, a pena de prisão. Em 1957 fora editada uma importante lei quanto ao regime penitenciário, garantindo-se a individualização das penas, a separação dos presos provisórios e dos condenados, a educação moral, intelectual, física e profissional e etc., no intuito de se promover a recuperação do delinquente (DOTTI, 1998, p. 70-71).

No Estado Autoritário (1964 – 1985), após reação militar que destituiu o governo democrático, a privação de liberdade desempenhou papel fundamental no Direito Penal, oportunidade em que se observa uma reforma penitenciária com vistas à defesa social (DOTTI, 1998, p. 74-91).

E, finalmente, com o retorno da Democracia (a partir de 1985), as penas privativas de liberdade se mantêm como modalidade principal de sanção no ordenamento jurídico penal, exigindo atenção quanto às formas de cumprimento (DOTTI, 1998, p. 94).

Atualmente, os aspectos concernentes ao cumprimento das penas privativas de liberdade constam na Lei de Execução Penal n. 7.210/84, a qual adiante receberá atenção.

Ante o exposto, infere-se que no Brasil a privação da liberdade não surge como modalidade de sanção, ou seja, num primeiro momento serve apenas para a retribuição do mal praticado ao agente infrator, despida de qualquer característica sancionatória para, somente depois, ser recebida como modalidade de sanção penal, hipótese em que veio mantendo, mesmo com as oscilações acima descritas, como plano de fundo a função ressocializadora do apenado, recebendo, inclusive, atenção e regulamentação quanto à forma de cumprimento (regime penitenciário, estabelecimentos penitenciários e etc.).

3.2 LEI DE EXECUÇÃO PENAL – LEI N. 7.210/1984

A execução das penas privativas de liberdade é pautada em princípios gerais constantes no Código Penal de 1940, contudo suas especificidades estão previstas na Lei de Execução Penal n. 7.210/1984, também conhecida como LEP (ZAFFARONI; PIERANGELI, 2008, p. 682-683).

Pedro Rates Gomes Neto (2000, p. 91-92) informa que o advento da Lei em comento, visando ao abrandamento dos problemas carcerários, acarretou significativas alterações no sistema prisional brasileiro, posto que até então a execução da pena era mera consequência da condenação.

A respeito do tema, Christiane Russomano Freire (2005, p. 77) leciona:

Paralelamente ao processo de democratização das demais instituições, assiste-se a um movimento de retirada das prisões da obscuridade do tecido social. Nesse momento, refuta-se a antiga condição de depósito de dejetos humanos em favor da tendência em dotar as prisões de um caráter de funcionalidade racional, em que o ideal reabilitador aparece como finalidade central. A adoção dos pressupostos do movimento da nova defesa social pela Lei de Execução Penal atendeu a tal demanda e acabou por introduzir no sistema prisional brasileiro dispositivos disciplinares peculiares à era moderna.

Por sua vez, Rodrigo Duque Estrada Roig (2005, p. 138-139) afirma que “a Lei de Execução Penal foi concebida como o instrumento normativo capaz de conferir humanidade e racionalidade ao tortuoso processo de injunção da pena privativa de liberdade ao indivíduo”.

Assim, percebe-se que a Lei de Execução Penal se propõe à ressocialização do apenado mediante a garantia de direitos quando do cumprimento de sua pena.

Com vistas a uma melhor compreensão do tema, faz-se imprescindível o desenvolvimento de breve explanação acerca das disposições gerais contidas na Lei de Execução Penal.

O Título I trata do objeto e da aplicação da Lei de Execução Penal, desenvolvendo meios propícios à execução da pena com vistas à ressocialização do condenado (BRASIL, 1984).

O Título II, por sua vez, volta atenção à pessoa do condenado e do internado, oportunidade em que são listados os deveres, direitos e garantias dos mesmos (BRASIL, 1984).

No que se refere ao Título III, traz considerações acerca dos órgãos da execução penal, definindo-os, bem como definindo suas respectivas atribuições (BRASIL, 1984).

Relativamente ao Título IV nota-se que trata especificamente dos estabelecimentos penais, determinando e diferenciando os diversos tipos, e expressando preocupação para que sejam adequadamente construídos em função das finalidades a que se propõem (BRASIL, 1984).

O Título V trata da execução das penas em espécies, enquanto o Título VI trata da execução das medidas de segurança (BRASIL, 1984).

E, por fim, o Título VII trata dos incidentes da execução, ao passo que o Título VIII trata do procedimento judicial, sobrevindo, ainda, o Título IX com as disposições finais e transitórias (BRASIL, 1984).

Dessa forma, percebe-se que a Lei de Execução Penal fora instituída para regulamentar o cumprimento das penas privativas de liberdade, expressando-se mediante caráter eminentemente humanitário, recomendando o tratamento do condenado.

Nesse sentido, Jason Albergaria (1993, p. 41) informa que “o tratamento penitenciário consiste numa ação empreendida junto ao delinqüente, com o objetivo de tentar modelar sua personalidade para preparar a sua reinserção social e afastá-lo da reincidência”.

Entretanto, Sidio Rosa de Mesquita Júnior (2003, p. 61) expressa descrença quanto a aplicabilidade e efetividade do ordenamento jurídico:

Infelizmente, pouco se avançou, pois, em que pese termos uma das melhores leis de execução penal do mundo, temos um sistema penitenciário semelhante ao de qualquer país de terceiro mundo, violando direitos fundamentais da pessoa humana, direitos esses resguardados na própria Constituição Federal, que prevê que nenhum preso receberá tratamento degradante.

Confirmando o que o autor citado assevera, Pedro Rates Gomes Neto (2000, p. 92) afirma que não há efetividade da norma de execução penal, sobretudo por má gestão política, no que se refere à aplicação suficiente de recursos financeiros, humanos e materiais.

Nesse contexto, infere-se que o Direito Penal brasileiro conta com satisfatória legislação regulamentadora do cumprimento das penas privativas de liberdade, não sendo, portanto, a lei propriamente dita, a matriz dos problemas encontrados no sistema prisional, mas a aplicabilidade da mesma em razão da incapacidade Estatal no desempenho das atividades que lhe incumbe a lei.

3.3 DIREITOS DOS PRESIDIÁRIOS

Visto que a função precípua do sistema prisional brasileiro constante na Lei de Execução Penal n. 7.210/1984 é a ressocialização do apenado, o fazendo mediante a garantia de seus direitos, cumpre tecer algumas considerações a esse respeito.

A princípio é de se esclarecer que o Brasil se constitui em Estado Democrático de Direito, atualmente interpretado como Estado Democrático de Direitos Fundamentais; assim, reconhecidos alguns direitos como fundamentais à própria essência do ser humano, cabe ao Estado prover suficiente garantia desses direitos (BENETI, 1996 apud Mattos, 2001, p. 49).

Relativamente aos direitos dos presidiários extrai-se do artigo 5º, inciso XLIX da Constituição da República Federativa do Brasil de 19882 a garantia à integridade física e moral e, ainda, do artigo 38 do Código Penal de 19403 que o sentenciado deve ter preservados todos os direitos estranhos à sua condenação criminal, o que sabidamente não acontece na realidade carcerária brasileira.

Nem sempre os presidiários puderam contar com um ordenamento jurídico que resguardasse seus direitos, consoante se observa das lições de Sidio Rosa de Mesquita Júnior (2003, p. 126, grifo do autor) ao citar Heleno Fragoso (1980):

É antiga a idéia de que os presos não têm direito algum. O condenado é maldito (sacer esto) e, sofrendo a pena, é objeto da máxima reprovação da coletividade, que o despoja de toda proteção do ordenamento jurídico que ousou violar. O criminoso é execrável e infame, servo da pena, perde a paz e está fora do direito. O outlaw no antigo direito inglês podia ser morto por qualquer pessoa, pois como se dizia nos próprios textos, ‘pode ser morto meritoriamente sem a proteção da lei, o que não quer viver conforme a lei’.

O artigo 40 do Código Penal de 19404 declara que os direitos dos presidiários serão regulamentados por legislação especial, sendo que atualmente a Lei de Execução Penal desempenha esta função, prevendo em seu Título IV uma gama de direitos aos presidiários expressando certa evolução da matéria.

Para Calón (apud FERNANDES, 2002, p. 660) “o condenado, que recolhido à prisão, cumpre a pena imposta, não só tem deveres a atender, mas, também, é titular de direitos que precisam ser reconhecidos e amparados pelo Estado”.

A respeito do tema, Heleno Cláudio Fragoso (1996 apud MATTOS, 2001, p. 51):

Tem o Estado o direito de executar a pena, e os limites desses direitos são traçados pelos termos da sentença condenatória, devendo o sentenciado submeter-se a ela. A esse dever corresponde o direito do condenado de não sofrer, ou seja, de não ter de cumprir outra pena, qualitativa ou quantitativamente diversa da aplicada na sentença.

Em consonância com o exposto, Guilherme de Souza Nucci (2005, p. 922) especificamente quanto à garantia dos direitos aos condenados à pena privativa de liberdade, leciona:

Quando se tratar de pena privativa de liberdade, restringe-se apenas o seu direito de ir e vir – e os direitos a ele conexos, como, por exemplo, não ter direito à integral intimidade, algo fora de propósito para quem está preso, sob tutela e vigilância do Estado diuturnamente -, mas o mesmo não se faz no tocante aos demais direitos individuais, como a integridade física, o patrimônio, a honra, a liberdade de crença e culto, entre outros.

Tais perspectivas fluem no plano teórico, contudo, infelizmente não é o que se tem observado no plano da realidade, constituindo a ressocialização do apenado uma verdadeira utopia.

A Lei de Execução Penal regulamentando o artigo 5º, inciso XLIX da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 impõe em seu artigo 405 o dever de respeito à integridade física e moral dos condenados por parte de todas as autoridades públicas.

A respeito do tema, Julio Fabbrini Mirabete (2007, p. 118) justifica:

Ninguém ignora que os presos, em todos os tempos e lugares, sempre foram vítimas de excessos e discriminações quando submetidos aos cuidados de guardas ou carcereiros de presídios, violando-se assim aqueles direitos englobados na rubrica de ‘direitos humanos’.

Logo, percebe-se que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e a Lei de Execução Penal trazem em seu bojo a proteção à integridade física e moral dos presidiários, tanto no que se refere à violência perpetrada por terceiros quanto aos atos de violência perpetrados pelas próprias autoridades públicas do sistema prisional, o que infelizmente ainda é ignorado.

A Lei de Execução Penal indica em seu artigo 41 os direitos dos presidiários, nos seguintes termos:

Art. 41 Constituem direitos do preso:

I – alimentação suficiente e vestuário;

II – atribuição de trabalho e sua remuneração;

III – previdência social;

IV – constituição de pecúlio;

V – proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação;

VI – exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena;

VII – assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa;

VIII – proteção quanto à qualquer forma de sensacionalismo;

IX – entrevista pessoal e reservada com o advogado;

X – visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados;

XI – chamamento nominal;

XII – igualdade de tratamento, salvo quanto às exigências da individualização da pena;

XIII – audiência especial com o diretor do estabelecimento;

XIV – representação e petição a qualquer autoridade em defesa de direito;

XV – contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes;

XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade da autoridade judiciária competente.

Parágrafo único. Os direitos previstos nos incisos V, X, e XV poderão ser suspensos ou restringidos mediante ato motivado do diretor do estabelecimento.

Cumpre esclarecer que o rol de direitos dos presidiários previsto no artigo 41 da Lei de Execução Penal não é exaustivo ou absoluto, isto porque tal qual ocorre fora do sistema prisional, pode haver a violação de direitos quando estes forem analisados em detrimento de outros de maior relevância (MIRABETE, 2007, p. 130).

Por fim, Julio Fabbrini Mirabete (2007, p. 118) conclui que ao invés de debruçar-se em críticas contra o sistema prisional, deve-se, antes, efetivar a preservação dos direitos dos presidiários, pois aí se estará atuando com medida eficaz para obtenção da ressocialização.

Ante o exposto, conclui-se que a Lei de Execução Penal fora uma inovação no âmbito do cumprimento da pena privativa de liberdade, sobretudo por estabelecer a necessidade de preservação dos direitos dos apenados como meio de satisfação de sua finalidade principal: a ressocialização do apenado.

3.4 O ATUAL SISTEMA PRISIONAL

Em face de tudo o que fora exposto até o presente momento, pode-se considerar que o Direito Penal atua como meio de controle social formalizado imputando ao infrator de uma norma penal, uma sanção (pena), no intuito de retribuir-lhe o mal praticado, e mais que isso, prevenir que não torne a delinquir para manutenção da ordem social.

No que concerne às sanções aplicáveis às infrações mais graves, apresentam-se as penas privativas de liberdade, que atuam diretamente na restrição de liberdade do indivíduo infrator mediante o aprisionamento, com vistas à sua ressocialização.

Neste ínterim, a manutenção de estabelecimentos adequados para o cumprimento das penas privativas de liberdade, considerando o fim a que se propõe (ressocialização), é medida imperativa nos dias atuais.

Como visto, relativamente à legislação de execução penal brasileira pode-se afirmar se tratar de uma das melhores do mundo, garantindo, inclusive, direitos aos presidiários; aliás, julga ser a partir da preservação desses direitos que se poderá efetivar o caráter ressocializador das penas privativas de liberdade.

Entretanto, no atual sistema prisional brasileiro os direitos dos presidiários não são resguardados; aliás, a situação encontra-se tão calamitosa que há quem questione a possibilidade de uma recuperação penitenciária.

Assim, passa-se à explanação acerca da atual situação do sistema prisional, iniciando-se com a análise de Renata Soares Bonavides de Mattos (2001, p. 85, grifo do autor):

Forçoso que reconheçamos que os presos na qualidade de seres humanos são titulares de direitos humanos, dentre eles o direito à vida com dignidade que, só poderá ser assegurado dentro de um meio ambiente prisional decente, que não afronte as necessidades mínimas de subsistência.

Mas sabemos que na verdade não há respeito às determinações jurídicas, visto que os presos não cumprem simplesmente as penas privativas de liberdade que lhes foram impostas, mas também são sujeitos a todas as formas de brutalidade, de contágio, de doenças oriundas da promiscuidade existente dentro dos cárceres, sendo que muitas vezes chegam ao óbito em virtude do cumprimento da pena privativa de liberdade, observando que em nossa legislação é vedada a pena de morte.

Renata Soares Bonavides de Mattos (2001, p. 86-87) aponta a superlotação carcerária como principal fator impeditivo do tratamento adequado ao condenado.

Rodrigo Haidar (2011), em notícia publicada na Revista Eletrônica Consultor Jurídico, informa que no Brasil seria necessário construir de imediato pelo menos 90 (noventa) estabelecimentos penitenciários, a fim de que se pudesse proporcionar abrigo em condições mínimas exigíveis aos presidiários.

Sem levar em consideração os inúmeros mandados de prisão que se encontram em aberto e “não são cumpridos por falta de ter onde colocar aqueles contra quem pesam esses mandados” (FERNANDES, 2002, p. 429).

A realidade, conforme revelam estatísticas disponibilizadas pelo Conselho Nacional de Justiça (2012) em seu portal eletrônico, é que o Brasil conta com 2.861 estabelecimentos penitenciários contra 490.547 presidiários, resultando em um déficit de vagas de 158.537.

E, ainda, o Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN (2008), vinculado ao Ministério da Justiça, por intermédio da Coordenação-Geral de Políticas, Pesquisa e Análise da Informação - CGPAI, divulgou dados consolidados demonstrando que a população carcerária brasileira apresentou um crescimento de 37% (trinta e sete por cento) no quinquênio 2003-2007, vejamos o gráfico:

CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO CARCERÁRIA – TOTAL GERAL

Fonte: InfoPen (Sistema Nacional de Informação Penitenciária).

Nota-se, atualmente a população carcerária é de 490.547, se acrescer-se a isso 37% (trinta e sete por cento) que se trata da média obtida no quinquênio passado, estima-se para 2017 que a população carcerária somará aproximadamente 672.049 presidiários.

Dessa forma, infere-se se tratar de número elevadíssimo, sobretudo porque não são construídos novos estabelecimentos penitenciários a fim de suportar esse quadro evolutivo.

A respeito do tema, Renata Soares Bonavides de Mattos (2001, p. 88, grifo do autor) leciona:

O que se observa é o grande desinteresse dos governantes na construção de presídios não só adequados à população carcerária, como ainda com capacidade limitada a quinhentos presos, que é a recomendação nas normas mínimas da ONU, pois presídios com capacidade inadequada, [...] constituem um grande entrave à fiscalização, disciplina e manutenção, acarretando a revolta e o descontrole da situação até mesmo no tratamento a ser dispensado aos presos.

Outro fator problemático encontrado nos estabelecimentos penitenciários; aliás, de maneira estranhamente comum, é a tortura física e/ou moral a que são submetidos os presidiários pelos próprios detentores do poder (diretor do presídio, agentes prisionais e etc.).

Nesse sentido, Renata Soares Bonavides de Mattos (2001, p. 104) ensina:

A violência física contra o corpo do preso é fato notório dentro das prisões há muito tempo, bem como a violência moral que é exercida contra a mente do presidiário, por parte da própria polícia. Mas dolorosamente, as autoridades competentes fecham os olhos para estes atos de violência tão repugnantes e covardes, ignorando que a elas são impostos o respeito à integridade física e moral dos condenados, bem como dos presos provisórios, conforme consagrado pela Lei 7.210/84, em seu artigo 40.

Fátima Souza (2008), por sua vez, define as torturas perpetradas contra os presidiários pelas próprias autoridades públicas como sendo “tortura sistemática”; informa, ainda, que o Comitê das Nações Unidas Contra a Tortura divulgou no ano de 2007 relatório demonstrando que a prática de torturas é fato comum, relatório este intitulado de “Eles nos tratam como animais”, por se tratar da frase mais mencionada pelos presidiários nas entrevistas.

Veja-se, ainda, o relato de Fátima Souza (2008, grifo do autor) acerca de quem são os torturadores e como são praticadas as torturas:

As armas usadas pelos torturadores (agentes penitenciários, carcereiros, delegados, investigadores e monitores), vão desde cabos de vassoura até aparelhos de eletrochoque, muitos deles encontrados dentro de delegacias e centros de detenção provisórios.

Choques, afogamentos e, principalmente, espancamentos são as formas mais comuns de tortura.

Em matéria escrita para o Jornal Zero Hora de Santa Catarina, o jornalista Fabiano Marques (2009), com a colaboração de Kíria Meurer e Bianca Backes, denunciou cenas de tortura praticada por agentes prisionais em uma ação de transferência dos presos, na Penitenciária de São Pedro de Alcântara, na Grande Florianópolis.

Veja-se o trecho da reportagem:

O trabalho, que era para ser uma forma de amenizar a superlotação na penitenciária, tornou-se um ato de violência. Trancados nas celas, os presos foram obrigados a inalar spray de pimenta. Alguns acabaram espancados. Aos gritos de socorro, apanharam dentro de um banheiro. Algemados com as mãos para trás, levaram socos e chutes.

Durante a surra, um preso chora por receber murros, pontapés e também por saber que terá a cabeça mergulhada em um vaso sanitário. É sempre o passo seguinte. Após o espancamento, o afogamento.

Situações como as expostas não são exclusividade de um ou outro Estado brasileiro, ao contrário ocorrem Brasil afora.

Ocorre que referidos problemas vêm se arrastando por longo tempo na realidade prisional brasileira, refletindo, de forma imensamente negativa, tanto na população carcerária que acaba se assenhoreando de um sentimento de revolta em virtude do tratamento que lhe é destinado, quanto na sociedade propriamente dita, que têm aumentadas, diariamente, suas sensações de insegurança e impunidade.

Dentro dos estabelecimentos penitenciários ocorre ainda corrupção das mais variadas modalidades. “Ela vai da simples comercialização superfaturada de produtos permitidos a favores e regalias incompatíveis com o sistema e a disciplina interna” (MATTOS, 2001, p. 112).

A título exemplificativo veja-se matéria publicada pelo jornalista Daniel Scola (2012) no G1 – Portal de Notícias da Globo: “Escutas telefônicas levantam suspeita de corrupção em presídios do RS. Detentos contam como celulares chegam até eles dentro da cadeia. Autoridades suspeitam de envolvimento de agentes penitenciários”.

No tocante às rebeliões e as fugas, que comumente se tem notícias, Romeu Falconi (1995 apud MATTOS, 2001, p. 114) entende possa vir da vontade dos presidiários de chamar atenção para a situação caótica do sistema penitenciário.

Veja-se a esse respeito que somente no Estado de Santa Catarina, na Penitenciária de Florianópolis, registraram-se duas fugas em massa em menos de cinco meses, no ano de 2011, após o que o próprio Governador do Estado admitiu falhas, conforme se observa de matéria publicada por Léo Pereira (2011) para o UOL Notícias.

E, ainda mais recente, registrou-se a ocorrência de rebelião no Presídio de Blumenau, que teria durado aproximadamente dez horas e deixado ao menos treze mortos, conforme se observa em notícia veiculada no G1 – Portal de Notícias da Globo (REBELIÃO..., 2011).

A questão da sexualidade e promiscuidade é muito grave dentro dos estabelecimentos penitenciários, isto porque as visitas íntimas – quando possíveis – ocorrem de maneira vexatória, restando, assim, a homossexualidade como alternativa aos presidiários (MATTOS, 2001, p. 116).

Ocorre que mesmo as relações homossexuais são coibidas dentro dos estabelecimentos penitenciários e, dessa forma, atuam diretamente no equilíbrio psicológico do indivíduo, primeiramente porque têm de aprender a lidar com a situação – muitos não mantinham relações homossexuais antes do cárcere, e também porque a repressão diária dos instintos sexuais propicia perversão e mudanças na esfera sexual e na personalidade do indivíduo, afastando cada vez mais o objetivo da ressocialização (Bitencourt, 2004, p. 202).

O aumento das doenças sexualmente transmissíveis também é fator proveniente desse transtorno das relações sexuais havidas dentro dos estabelecimentos penitenciários (MATTOS, 2001, p. 118).

Assim, mais que obstáculo ao processo de ressocialização, a sexualidade nos estabelecimentos penitenciários é questão de saúde pública, merecendo atenção.

Por fim, o elevado custo para manutenção dos presidiários também está na lista de problemas do sistema prisional no Brasil, conforme se observa em matéria publicada por Glauco Araújo (2009), no G1 – Portal de Notícias da Globo, o custo individual de criação de cada vaga é elevadíssimo, chegando a custar aproximadamente R$ 4,8 mil em um estabelecimento penitenciário de segurança máxima.

Não bastasse isso, o Ministério da Justiça disponibilizou em seu portal eletrônico que o governo de Santa Catarina investiu cerca de R$ 169.911.093,62 (cento e sessenta e nove milhões, novecentos e onze mil, noventa e três reais e sessenta e dois centavos) em Segurança Pública no de 2008, mas no ano de 2005 a quantia investida aproximou-se de R$ 1.055.514.185,00 (um bilhão e cinquenta e cinco milhões, quinhentos e quatorze mil e cento e oitenta e cinco reais) (BRASIL, 2012).

Assim, a sociedade brasileira está pagando um alto preço para pouco resultado.

De maneira conclusiva, Renata Soares Bonavides Mattos (2001, p. 121) afirma que ”um dos dados que refletem a efetiva demonstração do fracasso da prisão são os altos índices de reincidência, apesar da presunção de que durante a reclusão os internos são submetidos a um tratamento reabilitador”.

Dessa forma, cumpre esclarecer que outras mais são as problemáticas do cárcere, tendo sido destacadas as mais recorrentes, mediante o que já se pode inferir que o Estado vem demonstrando atuação insuficiente e falha no que concerne à administração do sistema prisional.

Ante o exposto, percebe-se com clareza a falência do sistema prisional brasileiro o que atinge diretamente o processo de ressocialização do presidiário, por isso mais se tem visto reincidência do que efetiva recuperação dos egressos.

Jorge Vasconcellos (2011) informa em notícia veiculada no portal eletrônico do Conselho Nacional de Justiça, que o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Cezar Peluso, afirma que o Brasil possui um dos maiores índices de reincidência do mundo, da ordem de 70% (setenta por cento), ou seja, a cada dez egressos sete retornam ao sistema prisional; nesta senda é que externa sua preocupação com a implementação de políticas públicas no intuito de reverter esse lamentoso quadro.

Feitas as ponderações necessárias acerca do terceiro capítulo, no qual foram abordadas as noções históricas e a evolução do sistema prisional, e ainda o que vem disposto na Lei de Execução Penal, ressaltando-se os direitos dos presidiários e a realidade atual do sistema prisional brasileiro, passa-se ao quarto e último capítulo, que versará sobre o tema principal do presente trabalho: A parceria público-privada em estabelecimentos penitenciários.

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Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Andréia Catine Cosme, Msc.

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