Resumo: O presente trabalho se propõe a enxergar música sob uma ótica voltada aos aspectos profissionais do campo e tem por objetivo apresentar e discutir alguns elementos do campo de trabalho em música. Para isso é realizada uma primeira pesquisa a fim de se delinear o campo de atuação do músico profissional abordado: as orquestras sinfônicas brasileiras. Posteriormente, são revistos e contextualizados alguns conceitos básicos referentes ao músico enquanto profissional e à orquestra enquanto corpo artístico gerido por órgãos/entidades do aparelho estatal.
1. Introdução
Pesquisas que abordam música enquanto objeto artístico é a grande maioria da produção da área; não obstante, algumas se destinam a visualizar música sob outras óticas, sendo uma delas enquanto profissão. O que nota-se, entretanto, é que existe, por muitas vezes, certa negligência por parte dos músicos sobre aspectos da profissão de músico, fato compreensível dado o cunho artístico da atividade musical. Entretanto acredita-se que tais aspectos podem trazer contribuições significativas para o campo da música, seja de caráter pragmático ou teorético. Este artigo aborda as orquestras sinfônicas como um campo de atuação profissional dos músicos e apresenta conceitos norteadores para o entendimento dessa abordagem. Inevitavelmente, aspectos jurídicos indispensáveis para um entendimento substancial do assunto são apresentados, brevemente discutidos e, principalmente, contextualizados e aplicados a situações pragmáticas do campo artístico/orquestral. Devido ao tratamento do objeto e à extensão do assunto, este artigo deter-se-á somente nas orquestras sinfônicas geridas pelo Estado, conforme explicitado e justificado no decorrer do artigo.
2. O Objeto: As Orquestras Sinfônicas Brasileiras
Como é parte do objetivo do presente trabalho traçar, mesmo que tenuemente, o possível campo de atuação para músicos profissionais em orquestras sinfônicas, foi levantado corpos artísticos em todo o território nacional que apresentassem as seguintes características:
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Sejam orquestras sinfônicas (excluindo bandas, bandas sinfônicas, orquestras de sopros e grupos de câmara, orquestras de cordas, orquestras de câmara etc., simplesmente por delimitação do foco da pesquisa);
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Cujos músicos possuam vínculo profissional (excluindo orquestras em que os músicos atuem voluntariamente, orquestras estudantis, orquestras cujos músicos são bolsistas, orquestras sem corpo artístico fixo, etc.);
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Cuja admissão de seus integrantes se dê por seleção aberta ao público (não necessariamente Concurso Público, que é regulamentado por lei).
Por não haver um cadastro ou levantamento sistemático de orquestras no Brasil, não há garantia de que todas as orquestras que se enquadram no perfil buscado pela pesquisa constem no presente trabalho, bem como novos corpos artísticos podem surgir a qualquer momento e outros podem deixar de existir ou mudar de perfil, deixando de se enquadrar nos critérios da pesquisa. Entretanto, tais fatos não invalidam a contribuição dessas informações no sentido de apresentar um panorama de atuação profissional para músicos em orquestras nacionais, além de registrar, com certo ineditismo, nesses anos de 2013-2014 as principais orquestras brasileiras, sua natureza jurídica, entre outras informações, que podem ser utilizadas posteriormente.
Pois bem, para obter-se uma primeira visão das orquestras nacionais potencialmente interessantes ao trabalho foram observadas as seguintes fontes:
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(a) O Anuário VivaMúsica! (FISCHER, 2013) faz há quinze anos um cadastro de várias orquestras do país, e a edição de 2013 (a última do anuário) foi utilizada; apesar de ser uma referência importante, o catálogo do Anuário VivaMúsica! não é sistemático o suficiente (uma vez que tal rigor não é objetivo do periódico) para ser usado como fonte, mas apenas como referência;
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(b) A lista de orquestras habilitadas e inabilitadas participantes do Prêmio Funarte de Apoio a Orquestras nos anos de 2013 e 2014;
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(c) Consultas individuais (sítios eletrônicos públicos, jornais, portais de notícias, etc.).
Esta etapa inicial do trabalho revela que, apesar de ser um importante campo de atuação de músicos profissionais, as orquestras brasileiras não são um assunto comumente contemplado em trabalhos científicos e não existe um mecanismo que agregue sistematicamente esses corpos artísticos. Uma vez construído este banco de dados, foi realizada uma consulta individual a cada um dos corpos artísticos potencialmente interessantes à pesquisa através de seus próprios sítios eletrônicos ou pelos sítios eletrônicos de suas entidades mantenedoras (públicas ou privadas) ou ainda através de notícias publicadas em jornais e revistas, diários oficiais, diplomas legais vigentes ou revogados etc. a fim de se obter dados mais específicos, verificando seu enquadramento nos critérios da pesquisa.
De um número inicial de pouco mais de 200 corpos artísticos, chegou-se a um conjunto de 51 orquestras cujo perfil interessa à pesquisa. Destas, levantou-se a (a) entidade responsável pela orquestra; sua (b) natureza jurídica, regime, quadro pessoal, quadro funcional e plano de carreira; e sua (c) localização (unidade federativa); contudo, o presente artigo ater-se-á apenas às orquestras geridas pelo Estado e apresentará apenas informações relativas à entidade responsável pela gestão de cada orquestra.
3. Contribuições do Conhecimento Jurídico para o Objeto de Discussão
As informações que serão apresentadas neste tópico dizem respeito à conceituação jurídica dos organismos que gerem as orquestras. Muitos destes conceitos são amplamente discutidos e debatidos na doutrina jurídica, principalmente no que tange o Direito Privado e o Direito Público, suas definições, responsabilidades e limites. As orquestras sinfônicas no Brasil encontram-se totalmente submergidas neste debate, contudo, não é interessante para o presente trabalho apresentar tais reflexões conceituais, visto que o objetivo aqui é contextualizar as orquestras nesse meio jurídico, suscitando informações relevantes para o entendimento da orquestra enquanto campo de trabalho. Para isso, serão apresentados os conceitos mais tradicionais e/ou aceitos na doutrina brasileira e reflexões sobre tais conceitos serão levantadas apenas se apresentarem contribuições significativas para esta abordagem.
Portanto, os órgãos/entidades gestores podem ser divididos, conforme sua natureza jurídica, na doutrina jurídica brasileira, baseado nos conhecimentos apresentados por TARTUCE (2011), em pessoas jurídicas de direito público e pessoas jurídicas de direito privado. Já aqui se encontra um ponto forte, se não central, de debates acerca do Direito Positivo1: a dicotomia Direito Público – Direito Privado. Uma das principais acepções na doutrina brasileira que diferencia o Direito Público do Direito Privado tem como base a teoria do interesse preponderante2, segundo a qual o Direito Público visa, predominantemente, a proteção do interesse coletivo e o Direito Privado, dos interesses particulares (BACELLAR FILHO, 2008).
Um ponto que merece, no mínimo, ser citado é que as tendências mais atuais do estudo do Direito enquanto ciência vislumbram um momento de transição na doutrina brasileira, no qual os conceitos clássicos de direito público e direito privado, bem como a dicotomia existente entre essas duas esferas, tendem a ser superados. Os movimentos de privatização do direito público e de publicização do direito privado frequentes no ambiente das orquestras brasileiras apontam nessa direção. Apesar de ser um assunto atual e pulsante, não será aqui discutido por não ser o foco do trabalho; PALADINO (2008) e CARMO (2010) apresentam um panorama bastante elucidativo da situação.
De maneira genérica e simplista, mas existem casos em que isso não mais se comporta assim, órgãos e entidades públicas (personalizadas no Estado) seriam regidas pelo Direito Público (tendo o Direito Administrativo como principal expoente) ao passo que as entidades privadas seriam regidas pelo Direito Privado (sendo o Direito Civil principal expoente). Contudo, é dado ao Estado a possibilidade de criar uma personalidade jurídica, que será pública por ter sido instituída pelo Estado, cujo interesse conceitualmente exprime o interesse público (MELLO, 2009), mas de direito privado (enquanto regime jurídico), regulamentada assim, além da lei que a institui e dos decretos que regulamentam a lei instituidora, pelo Código Civil (art. 41, parágrafo único). Este é o caso, por exemplo, de várias fundações públicas (estatais) de direito privado (que diferem das fundações privadas – não-estatais) responsáveis por gerir vários corpos artísticos presentes no país.
3.1. As Orquestras e o Aparelho Estatal
Gráfico 1. Orquestras sob responsabilidade do Estado x particular
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A grande maioria dos corpos artísticos pesquisados são geridos por órgãos ou entidades estatais; ou seja, o Estado é o grande mantenedor das orquestras sinfônicas profissionais no país. Este fato, todavia, não é apenas coincidência. Constitucionalmente, é dever de Ordem Social (CF3, art. 215) do Estado garantir, apoiar, valorizar e incentivar a difusão cultural, o que não impede que personalidades privadas também trabalhem neste sentido. Contudo, devido aos critérios estabelecidos pela pesquisa (principalmente o sistema de admissão dos músicos), grande parte das orquestras cujo perfil interessa à pesquisa são vinculadas de alguma maneira ao Estado, devido às normas do Direito Administrativo (que exprime, por exemplo, a necessidade de provimento de vagas, mesmo quando por contrato, através de concurso público); uma vez que as entidades civis não possuem tal obrigação, por estarem reguladas pelo Direito Civil, muitas delas selecionam seus músicos por outros meios diferentes dos critérios estabelecidos pela pesquisa. Fato é que, ainda que não-estatais, algumas orquestras presentes na pesquisa acabam por sofrer o chamado processo de publicização por estarem desenvolvendo atividades de interesse público (sendo promovidas a OSCIP e OS, e estabelecendo Contratos de Gestão com o Poder Público, deixando de ser totalmente privadas); e mesmo aquelas que permanecem como entidades “puramente” privadas, são abastecidas por provimentos e orçamentos governamentais, através de leis de Incentivo à Cultura e de Incentivo Fiscal, ou mesmo através de empresas estatais de Ordem Econômica, como a Petrobrás e o Banco do Brasil. O Gráfico 1 (acima) demonstra a proporção de orquestras sob responsabilidade de entidades/órgãos estatais em relação às de responsabilidade não-estatal.
Em suma, pode-se colocar que o campo de atuação profissional que este trabalho visa abarcar – as orquestras sinfônicas brasileiras – é mantido praticamente em sua totalidade pelo Estado; entender, portanto, sobre a organização administrativa estatal fornece informações relevantes no sentido da compreensão da gestão e funcionamento das orquestras. MELLO (2009, p. 137), de maneira sucinta, descreve o aparelho estatal administrativo:
O aparelho estatal exercente de atividades administrativas é composto pela própria pessoa do Estado, atuando por meio de suas unidades interiores – os órgãos – e por pessoas jurídicas que cria para auxiliá-lo em seus misteres – as autarquias, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as fundações governamentais, que na linguagem legal brasileira, compõem a administração indireta. (...) ao lado das entidades da administração indireta tratamos, também, de certas figuras que não integram o aparelho estatal, mas que foram previstas como eventuais colaboradoras do Poder Público em empreendimentos administrativos sobre os quais o Estado não detém titularidade exclusiva (as Organizações Sociais – e o instrumento jurídico concebido como habilitante de tal colaboração: o Contrato de Gestão – assim como as Organizações Privadas de Interesse Público).
Figura 1. O Aparelho Estatal
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Quanto à natureza jurídica das entidades do aparelho administrativo estatal, “a autarquia é pessoa jurídica de direito público; fundação e o consórcio público podem ser de direito público ou privado, dependendo do regime que lhes for atribuído pela lei instituidora; as demais são pessoas jurídicas de direito privado” (DI PIETRO, 2012, p. 478). A Figura 1 (acima) sintetiza o modelo administrativo estatal.
Os Gráficos 2 e 3 (abaixo) apresentam a dados referentes às orquestras administradas pelo Estado; a proporção de orquestras geridas pela Administração Direta e Indireta (Gráfico 2) e, das geridas pela Administração Indireta, a proporção administrativa em relação aos entes (Gráfico 3).
3.1.1. Orquestras geridas pela Administração Direta do Estado
Conforme apresentado anteriormente nas palavras de MELLO (2009), o Estado, no que diz respeito às atividades administrativas que lhes são encarregadas, pode desenvolvê-las por si mesmo ou prestá-las através de outros sujeitos. Assim, quando o Estado delega a outras entidades a função de desempenhar essas atividades, cria-se uma situação administrativa descentralizada, denominada Administração Indireta. Pelo contrário, quando o próprio Estado as desempenha, por intermédio de seus órgãos e agentes administrativos, mantendo tais atividades centralizadas, configura-se a Administração Direta (CARVALHO FILHO, 2012; Mello, 2009). A fim de proporcionar uma melhor estrutura organizacional, o Estado, enquanto titular e administrador das atividades que exerce, divide-se internamente em unidades menores, denominadas os órgãos, às quais são atribuídas competências.
Gráfico 2. Orquestras geridas por entidades/órgãos estatais
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Gráfico 3. Orquestras geridas pela Administração Indireta do Estado
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Dentre as diversas divisões orgânicas existentes na Administração Direta, os Órgãos do Poder Executivo nas esferas municipais e estaduais são os que mais nos interessam, em especial as Secretarias de Estado de Cultura e as Secretarias Municipais de Cultura, responsáveis pela administração de corpos artísticos em todo o território nacional. São corpos artísticos geridos pela Administração Direta, por meio das Secretarias Estaduais e Municipais:
Tabela 1. Orquestras geridas por órgãos do Poder Executivo nas esferas estadual, distrital e municipal
Orquestras geridas pela Administração Direta do Estado |
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Esfera Estadual/Distrital |
Esfera Municipal |
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Corpo Artístico |
Órgão Responsável |
Corpo Artístico |
Órgão Responsável |
Orquestra Filarmônica do Estado de Goiás |
Secretaria de Estado da Casa Civil de Goiás |
Orquestra Filarmônica de São Caetano do Sul |
Secretaria Municipal de Cultura de São Caetano do Sul |
Orquestra Sinfônica de Sergipe |
Secretaria de Estado da Cultura de Sergipe |
Orquestra Sinfônica de Goiânia |
Secretaria Municipal de Cultura de Goiânia |
Orquestra Sinfônica do Estado do Espírito Santo |
Secretaria de Estado da Cultura do Espírito Santo |
Orquestra Sinfônica de Santo André |
Secretaria Municipal de Cultura, Esporte e Lazer de Santo André |
Orquestra Sinfônica do Theatro da Paz |
Secretaria de Estado da Cultura do Pará |
Orquestra Sinfônica do Recife |
Secretaria Municipal de Cultura do Recife |
Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Cláudio Santoro |
Secretaria de Estado de Cultura do Distrito Federal |
Orquestra Sinfônica Municipal de Americana |
Secretaria Municipal de Administração de Americana |
Orquestra Sinfônica do Rio Grande do Norte |
Secretaria Estadual de Educação e Cultura do Rio Grande do Norte |
Orquestra Sinfônica Municipal de Botucatu |
Secretaria Municipal de Cultura de Botucatu |
Orquestra Sinfônica da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais |
Polícia Militar do Estado de Minas Gerais |
Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas |
Secretaria Municipal de Cultura de Campinas |
Orquestra Sinfônica Municipal de Santos |
Secretaria Municipal de Cultura de Santos |
3.1.2. Orquestras geridas pela Administração Indireta do Estado
A Administração Indireta está ligada ao conceito de descentralização, situação na qual o Estado ao invés de desempenhar por si as atividades públicas que lhes são competentes, cria pessoas jurídicas para desempenhá-las ou ainda, através contrato ou ato administrativo unilateral, delega a personalidades jurídicas privadas já existentes o desempenho dessas atividades, sendo ainda o Poder Público titular do serviço (DI PIETRO, 2012).
No primeiro caso supracitado da Administração Indireta, quando o estado cria personalidades jurídicas para o desempenho de serviços, o Poder Público deve observar três princípios básicos: da Reserva Legal, da Especialidade e do Controle4e, em relação ao regime jurídico, podem ser pessoas jurídicas de direito público (autarquias e fundações de direito público) ou de direito privado (das que nos são interessantes, fundação de direito privado).
Contudo, quando o Estado cria uma pessoa privada, ela possui as mesmas características das pessoas públicas, levando alguns autores a considerar que todas as pessoas jurídicas instituídas pelo Poder Público são, na verdade, de direito público (MELLO, 2009). Uma visão mais ponderada, entretanto, revela algumas diferenças que, primordialmente, estão presentes nas prerrogativas e restrições da personalidade jurídica, de modo que as pessoas privadas possuem mais liberdade e autonomia que as públicas. Isso, todavia, não será tratado no presente trabalho. Neste momento, vamos deter-nos às duas principais entidades da Administração Indireta gestoras de orquestras no país: as autarquias e as fundações. As orquestras geridas por entidades privadas (Organizações Sociais) por meio de Contrato de Gestão, apesar de didaticamente serem classificadas como pertencentes à Administração Indireta do Estado, não serão abordadas no presente trabalho pois, para um entendimento fundamentado do assunto, necessitar-se-ia de um trabalho específico sobre a temática. Para um panorama preliminar do assunto, ver CONTIN (2005) e COUTINHO (2006).
3.1.2.1. As Autarquias
O Decreto-lei nº 200/1967, que dispõe sobre a organização da Administração Federal, define autarquia, em seu art. 5º, inciso I, como:
serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada.
Apesar de vários autores entenderem essa definição como defectiva, por não dispor sobre itens jurídicos específicos, considerando-se outros diplomas do Direito Positivo Brasileiro que dispõem sobre a organização administrativa do Estado (Decreto-lei nº 6016/43 e CF, art. 37), fica claro e é de consenso que a autarquia detém as seguintes características: ser criada por lei; possuir personalidade jurídica de direito público; ter capacidade autoadministrativa; seguir ao princípio de especialização das atividades e dos fins e estar sujeita ao controle e tutela do Estado. Portanto, pode-se conceituar autarquia como “pessoa jurídica de direito público, criada por lei, com capacidade de autoadministração, para o desempenho de serviço público descentralizado, mediante controle administrativo exercido nos limites da lei” (DI PIETRO, 2012, p. 486).
Tabela 2. Orquestras geridas por entidades da Administração Indireta (autarquias)
Orquestras geridas por Autarquias |
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Esfera Federal |
Esfera Estadual |
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Corpo Artístico |
Ente Responsável |
Corpo Artístico |
Ente Responsável |
Orquestra Sinfônica da UFBA |
Universidade Federal da Bahia |
Orquestra Sinfônica da UEL |
Universidade Estadual de Londrina |
Orquestra Sinfônica da UFMT |
Universidade Federal do Mato Grosso |
Orquestra Sinfônica da USP |
Universidade de São Paulo |
Orquestra Sinfônica da UFPB |
Universidade Federal da Paraíba |
Orquestra Sinfônica de Porto Alegre |
Fundação Orquestra Sinfônica de Porto Alegre |
Orquestra Sinfônica Nacional |
Universidade Federal Fluminense |
Orquestra Sinfônica do Paraná |
Centro Cultural Teatro Guaíra |
Orquestra Sinfônica da UFMG |
Universidade Federal de Minas Gerais |
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Orquestra Sinfônica da UFRJ |
Universidade Federal do Rio de Janeiro |
Por serem pessoas jurídicas de direito público, as autarquias são também reguladas pelo Direito Administrativo e, em relação ao quadro pessoal, é formada, assim como na Administração Direta, por servidores públicos, que podem ocupar cargos ou empregos.
3.1.2.2. As Fundações Estatais
A fundação é uma pessoa jurídica oriunda do direito privado, conforme o Código Civil (atual Lei nº 10.406/2002) em seus art. 40. e 44. Diferentemente das demais pessoas jurídicas de direito privado, nas quais atribui-se personalidade jurídica à união de pessoas com ou sem fins lucrativos (sociedades e associações, respectivamente), na fundação atribui-se personalidade jurídica a um patrimônio, “que é destinado à realização de certos fins que ultrapassam o âmbito da própria entidade, indo beneficiar terceiros estranhos a ela, não havendo sócios a se beneficiarem com a fundação” (KNOPLOCK, 2012). Portanto, nas fundações privadas o instituidor destina uma parte de seu patrimônio a finalidades sociais, perdurando mesmo após o falecimento do instituidor, ficando sob a supervisão do Ministério Público.
O Estado, fazendo uso da mesma concepção, institui as fundações públicas, fundações governamentais ou como serão chamadas neste trabalho, as fundações estatais, nas quais o Poder Público destina um patrimônio para a realização de atividades de Ordem Social, dotado de personalidade jurídica, com capacidade autoadministrativa e subordinado ao controle e tutela da Administração Direta, dispensando a supervisão do Ministério Público (DI PIETRO, 2012). É interessante notar que a fundação, diferentemente da autarquia, não é um serviço, mas, como dito, um patrimônio e pode ser instituída em qualquer nível federativo (pela União, pelos Estados ou Distrito Federal e pelos Municípios).
Tabela 3. Orquestras geridas por entidades da Administração Indireta (fundações)
Orquestras geridas por Fundações Estatais |
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Esfera Estadual |
Esfera Municipal |
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Corpo Artístico |
Ente Responsável |
Corpo Artístico |
Ente Responsável |
Orquestra Sinfônica da Bahia |
Fundação Cultural do Estado da Bahia |
Orquestra Sinfônica Municipal de Campo Grande |
Fundação Municipal de Cultura de Campo Grande |
Orquestra Sinfônica de Minas Gerais |
Fundação Clóvis Salgado |
Orquestra Sinfônica Municipal de João Pessoa |
Fundação Cultural de João Pessoa |
Orquestra Sinfônica do Theatro Municipal do Rio de Janeiro |
Fundação Teatro Municipal do Rio de Janeiro |
Orquestra Sinfônica de Teresina |
Fundação Cultural Monsenhor Chaves |
Orquestra Sinfônica da Paraíba |
Fundação Espaço Cultural da Paraíba |
Orquestra Sinfônica de Barra Mansa |
Fundação de Cultura de Barra Mansa |
Orquestra Sinfônica de Criciúma |
Fundação Cultural de Criciúma |
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Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo |
Fundação Theatro Municipal de São Paulo |
Dentre todas as entidades compreendidas na Administração Indireta, a fundação é a que gera maior divergência entre os autores em relação a sua natureza jurídica e, consequentemente, maior discussão a respeito, seja no campo científico, jurídico ou legislativo. Tais discussões não serão aqui levantadas, mas cabe saber que há três linhas de pensamento sobre o assunto: há autores que consideram que todas as fundações estatais são de direito privado, já que tal posição é inerente ao conceito de fundação e é explicitado na conceituação apresentada pelo Decreto-lei nº 200/675; outros , entretanto, assumem que todas as fundações estatais são de direito público, visto que foram instituídas pelo Estado e são personalidades jurídicas públicas, independentemente de seu regime; e há quem aceite a posição dualista, em que o Estado pode instituir fundações de direito público e privado (MODESTO, 2008). Vale notar que cada perspectiva parte de pontos diferentes e se justificam em diplomas vigentes; muitas dessas divergências são de cunho mais conceitual que pragmático, visto que o Supremo Tribunal Federal já divulgou parecer sobre o assunto. Contudo, o Governo Federal em sua página oficial, no que diz respeito às autarquias, insere as fundações públicas como autarquias (PORTAL Brasil, 2012), contribuindo para a problemática das fundações, visto que se são autarquias, não são fundações, suscitando a ideia de que todas as fundações estatais são de direito privado, pois se forem de direito público, serão autarquias.
Fato é, que FERREIRA (2008) ao tratar do assunto, aponta com a precisão que lhe é característica, a origem de toda problemática: “posso dizer que o que existe é o seguinte: com o tempo, começou a haver uma promiscuidade terminológica, que levou à perplexidade” (p. 3) e mais adiante, finaliza: “sabemos, nós que lidamos com Direito, a importância das palavras” (p. 9), daí margeia-se várias interpretações do mesmo fenômeno, dita a incoerência terminológica. Um exemplo é o próprio termo público; por vezes se refere a personalidade jurídica pública, ou seja ente do setor público (em oposição ao setor privado, i.e. particular); por vezes se refere à natureza jurídica, diga-se direito público, regulada pelo Direito Administrativo; em outros momentos, às duas simultaneamente. Outro motivo de perplexidade é a própria designação da fundação estatal, que no Direito Positivo brasileiro aparece como:
a) “fundação” (art . 37, XVI I , XIX; 39, §7º; art . 40, caput ; 163, I I, 167, VI I I ; 202, §§3º e 4º, da CF e art . 8º e 61, do ADCT);
b) “fundação pública” (art. 39, caput, original, repristinado por recente decisão do STF; art 19, do ADCT);
c) “fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público” (art. 71, II e III; 150, §2º; 157, I; 158, I; 165, §5º, II e III; 169, §1º, da CF e art. 18; 35, §1º, V, e 61 do ADCT);
d) “fundações sob controle estatal” (art. 163, II , da CF e art. 8º, §5º, da ADCT) (MODESTO, 2008, p. 3).
É possível que situações como essa desencadeiem problemáticas enormes no decorrer do tempo, de impacto direto e indireto sobre as possibilidades e restrições das atividades desempenhadas pelas fundações (gestão cultural, neste caso), gerando diversas situações indesejáveis.