4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a objetivação da responsabilidade e a coletivização dos direitos fundamentais, buscou-se um maior amparo à vitima do dano pelo ordenamento jurídico. Assim, a reparação civil passou a ter por escopo a satisfação integral do dano causado, visando compensar o lesado pelos sofrimentos ocasionados pelo agente do ato ilícito, sem gerar um enriquecimento sem causa ao prejudicado.
Vive-se numa era de incertezas, onde os danos sofridos muitas vezes não são passíveis de uma comprovação robusta pela vítima. A vulnerabilidade de algumas relações sociais tem ocasionado uma procura minuciosa de institutos que supram a falibilidade dos instrumentos jurídicos existentes.
Nesse contexto, a teoria da perda de uma chance constitui-se justamente num modo de possibilitar à vítima o recebimento de alguma reparação, quando, de acordo com a teoria tradicional, este indivíduo ficaria desamparado.
A teoria, além de possuir estreita ligação com os princípios basilares da responsabilidade civil e legislação pertinente (arts. 186, 187, 402 e 927, do Código Civil), encontra seu fundamento maior no núcleo essencial do direito fundamental à indenização previsto no art. 5º, inciso V, da Constituição Federal.
As expectativas são fatores de comoção social. Algumas vezes, uma chance, pela influência psicológica que exerce sobre o indivíduo, pode representar uma gama de sonhos e esperanças na consecução de um futuro melhor, ou até mesmo possuir um valor sensorial maior do que a vantagem final esperada.
A chance pode ser caracterizada como o patrimônio ínsito de cada indivíduo consubstanciado na obtenção de uma vantagem futura ou de se evitar um prejuízo remoto. O próprio fato de viver ou sobreviver induz necessariamente a idéia de riscos e, por consequência, a perda de chances de escolhas feitas ao longo da vida. Assim, nunca se saberá o resultado do processo aleatório no qual a vítima está inserida, isto é, se a chance restaria infrutífera, apenas como mera expectativa incerta; ou se a chance resultaria na vantagem final almejada.
A doutrina e jurisprudência admitem a aplicação da teoria na seara juslaboral. Após o alargamento da competência da justiça do trabalho engendrada pela Emenda Constitucional nº 45 de 2004, as possibilidades de reparação de danos pela perda de uma oportunidade encontram um campo fértil nas indenizações por dano moral latu sensu e decorrentes de acidentes de trabalho.
Os casos mais emblemáticos da aplicação da teoria da perda de uma chance dizem respeito à seara trabalhista. Considerando que o meio ambiente de trabalho mescla o fator de produção com as chances aleatórias de cada trabalhador, muitas vezes a vítima encontra-se em uma situação vulnerável diante do poderio econômico do empregador sem ter elementos que possibilitem a comprovação do dano sofrido.
A clara situação fática da posição de inferioridade do empregado na relação de emprego o torna vulnerável no momento do ajuste das cláusulas contratuais, sendo necessário que se lhe empreste tutela jurídica específica a fim de possibilitar a garantia do equilíbrio contratual.
Assim, com o intuito de sopesar o desnível dessa relação (princípio da proteção), admite-se a aplicação desta teoria com o fito de indenizar integralmente o empregado, principalmente em hipóteses de acidente de trabalho nas quais há uma gama imensurável de chances perdidas, desde que estas se apresentem como situações de vantagens reais e sérias.
A jurisprudência não assentou um parâmetro fixo para avaliar a seriedade das chances perdidas. Por vezes, ocorre a reparação de danos extremamente hipotéticos, em total desapego aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Outras vezes, indenizam-se equivocadamente as chances conspurcadas, sendo estas enquadradas como danos morais ou lucros cessantes.
Por fim, em que pese os reiterados erros cometidos, é possível vislumbrar um gradativo aperfeiçoamento na aplicação da teoria da perda de uma chance na Justiça do Trabalho do Brasil. O grande aumento do número de demandas que envolvem este tema nos últimos anos é reflexo da repercussão desta teoria entre os operadores jurídicos. Assim, utilizando-se do modelo estrangeiro como fonte direta para a produção de soluções domésticas, as chances perdidas são reparáveis, desde que considerados os critérios fixados e probabilidades de cada caso concreto.
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Notas
[2] AGUIAR DIAS, José de. Da responsabilidade civil, 1997, p. 11.
[3] NORONHA, Fernando. Direito das obrigações, 2003, p. 540.
[4] SILVA, Rafael Peteffi. Responsabilidade civil pela perda de uma chance, 2007, p. 06.
[5] SILVA, Rafael Peteffi. Op. Cit., p. 75.
[6] Id. Ibidem, p. 76.
[7] SILVA, Rafael Peteffi. Op. Cit., p. 35.
[8] Idem.
[9] SILVA, Rafael Peteffi. Op. Cit., p. 48.
[10] Id. Ibidem, p. 49.
[11] Id. Ibidem, p. 50.
[12] SILVA, Rafael Peteffi. Op. Cit., p. 60.
[13] Id. Ibidem, p. 63.
[14] SILVA, Rafael Peteffi. Op. Cit. p. 33.
[15] Id. Ibidem, p. 68.
[16] Id. Ibidem, p. 70.
[17] MELO, Raimundo Simão de. Direito Ambiental do Trabalho e a saúde do trabalhador, 2006, p. 325.
[18] OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenização por acidente do trabalho ou doença ocupacional, 2008, p. 72-3.
[19] DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Responsabilidade civil no Direito do Trabalho, 2007, p. 106
[20] TRT3, Recurso Ordinário nº 01472-2007-109-03-00-3, 2ª Turma, Rel. Des. Sebastiao Geraldo de Oliveira, j. em 30/04/2008.
[21] TRT3, Recurso Ordinário nº 00790-2008-143-03-00-9, Turma Recursal de Juiz de Fora, Rel. Juiz Convocado Paulo Mauricio R. Pires, j. em 27/05/2009.
[22] TRT4, Recurso Ordinário nº 00623-2008-261-04-00-2, Rel. Des. Rosane Serafini Casa Nova, j. em 22/07/2009.
[23] SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance, 2006, p. 103.
[24] TRT3, Recurso Ordinário nº 01518.2003.029.03.00.7, 3ª Turma, Rel. Des. Sebastiao Geraldo de Oliveira, j. em 26/11/2003.
[25] TRT4, Recurso Ordinário nº 01118-2006-201-04-00-0, Rel. Juíza Maria Cristina Schaan Ferreira, j. em 12/07/2007.
[26] TRT23, Recurso Ordinário nº 01196.2007.001.23.00, 2ª Turma, Rel. Des. Luiz Alcântara, j. em 04/06/2008.
[27] BRANDÃO, Cláudio. Acidente do trabalho e responsabilidade civil do empregador, 2006. p. 2.
[28] MELO, Raimundo Simão de. Op. Cit., p. 336.
[29] TRT14, Recurso Ordinário nº 00709.2007.005.14.00-5, 1ª Turma, Rel. Juíza Vânia Maria da Rocha Abensur, j. em 25/06/2008.
[30] FELKER, Reginald Delmar Hintz. Op. Cit., p. 84.
[31] SANTOS, Antônio Jeová. Dano moral indenizável, 1999, p. 110.
[32] MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana, 2003, p. 37.
[33] TRT3, Recurso Ordinário nº 01518.2003.029.03.00.7, 3ª Turma, Rel. Des. Sebastiao Geraldo de Oliveira, j. em 26/11/2003.
[34] SILVA, Rafael Peteffi. Op. Cit., p. 199.
[35] SAVI, Sérgio. Op. Cit., p. 71.
[36] AGUIAR DIAS, José de. Op. Cit., p. 737.
[37] SILVA, Rafael Peteffi. Op. Cit., p. 205.
[38] AGUIAR DIAS, José de. Op. Cit., p. 297.
[39] TRT1, Recurso Ordinário nº 03119-2006-342-01-00-9, Rel. Augusto Souto de Oliveira, pub. DORJ 14. jul. 2008, p.1.
[40] TRT3, Recurso Ordinário nº 00709-2008-033-03-00-5, 10ª Turma, Rel. Juíza Convocada Taísa Maria Macena de Lima, j. em 15/07/2009.