CONCLUSÃO
O momento por que passamos é único na conjugação de análise das políticas públicas e da tentativa de solução da questão por meio do processo coletivo, até então tido como meio processual hábil (quiçá único) para o trato jurisdicional.
A investida na busca da efetividade dos direitos constitucionalmente previstos há quase 25 (vinte e cinco) anos, bem como a manifesta insuficiência na espera das políticas públicas levou a discussão a um novo locus: o Poder Judiciário, restringindo-se os questionamentos apenas sobre o modo de agir desse novo Poder, que tem ganhado recente protagonismo, sem perder de vista a Separação dos Poderes.
Surgiu, então, a ideia de finitude orçamentária em contraposição a cumprimento de decisões judiciais em casos individualizados que, por vezes, segundo o Poder Público, tem atrapalhado as políticas públicas e criado uma situação de injustiça perpetrada, na medida em que somente alguns – e, possivelmente, não os mais necessitados – teriam acesso e condições socioeconômicas de questionar em Juízo a insuficiência das políticas públicas.
Trata-se, justamente, da materialização das políticas públicas como questão de orçamento, premissa tida como válida e presumida em quaisquer ilações sobre a matéria, o que levaria à discussão da intervenção do planejamento Executivo por meio de processo coletivo atípico a ser previsto em procedimento próprio.
Tentou-se demonstrar, portanto, primeiro através da ausência de legitimidade constitucional para “criar” políticas públicas por meio do processo jurisdicional, bem como os custos dos direitos – inclusive os de primeira geração – o que transmudaria o papel do Executivo em administrar as contas públicas para uma “responsabilização” ou “administração conjunta de Poderes”, restando prejudicada, por conseguinte, a observância da efetividade dos direitos sociais.
Ainda, questionou-se as supostas soluções propostas, tais como o diálogo institucional entre os Poderes, oportunidade em que se privilegia solucionar as celeumas de “administrabilidade” do Estado em detrimento da garantia de efetivação dos direitos, como se o Estado fosse um fim em si mesmo, numa releitura vetusta da teleologia estatal.
Por fim, demonstrou-se a inconstitucionalidade do tolhimento do acesso à Justiça, o que corresponderia, em tese, a sanção individual, bem como a desnecessidade – leia-se aqui, também, ausência de legitimidade – para o Judiciário fundamentar suas decisões com base em conjecturas consequencialistas, de cunho orçamentário.
Assim, a partir do questionamento do orçamento como premissa jurídica válida, chega-se à conclusão de se tratar, em verdade, de equivocado paradigma utilizado como justificativa para a discussão das políticas públicas no campo da tutela jurisdicional, pois a legitimidade do Poder Judiciário restringe-se à garantia de efetividade dos direitos sociais, tanto em caso individual quanto coletivamente, de maneira que o panorama atual só seria realmente alterado se a população tivesse noção e exigisse a garantia dos direitos sociais constitucionalmente previstos.
Revisitar temas, noções e conceitos clássicos é uma boa oportunidade para que seja feita uma releitura da visão atual a seu respeito, e para que novas sonoridades sejam extraídas das antigas partituras, mormente porque a ‘banda’ anuncia ser alterada.
Pretende-se, por todo o exposto, apenas iniciar o debate e alertar, questionar, a partir das premissas tidas como verdade absoluta, para os rumos e refluxos que o tolhimento do acesso à Justiça pode trazer, sempre na ideia de que o processo vale pelo resultado que produz na vida das pessoas ou grupos, com base na ausência de prejuízo e escopo, com segurança jurídica para estabilizar as relações sociais e não criar mais conflitos, pacificando com segurança jurídica e respeitando a força normativa da Constituição, pilar do nosso Estado Democrático de Direito.
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Notas
[1] BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência das finanças. Rio de Janeiro: Forense, 1981, p. 387.
[2] TORRES, Ricardo Lobo. O Orçamento na Constituição, p. 76-77.
[3] OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais sociais: efetividade frente à reserva do possível, p. 209.
[4] PIOVESAN, Flávia. Proteção judicial contra omissões legislativas: ação direta de inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção. 2ª ed. rev. amp. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, pp. 78 e 80.