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Assistência judiciária gratuita: o requerimento inócuo de renovação do pedido do benefício em grau recursal perante as cortes superiores

O presente artigo aborda as exigências criadas, algumas descabidas, pelas Cortes Superiores para possibilitar a interposição de recurso especial e/ou extraordinário por parte processual beneficiária da Assistência Judiciária Gratuita.

Com a publicação da Lei nº 1.060, na década de 50, houve a criação do instituto da Assistência Judiciária Gratuita (AJG), o qual veio a beneficiar ao acesso a justiça de pessoas sem condições financeiras para o pagamento das custas e despesas judiciais.

Através da referida norma criada, o legislador objetivou proporcionar o acesso ao Poder Judiciário à todas as pessoas, independentemente de classe social ou poderio financeiro.

Para tanto, ficou definido que toda a pessoa que não possuir condições financeiras de arcar com o pagamento das custas processuais e honorários de advogado, sem que isso venha a prejudicar ao seu sustento e/ou de sua família, possui o direito à concessão da AJG, nos termos do previsto no artigo 2º, parágrafo único da lei:

Art. 2º. Gozarão dos benefícios desta Lei os nacionais ou estrangeiros residentes no País, que necessitarem recorrer à justiça penal, civil, militar ou do trabalho.

Parágrafo único. Considera-se necessitado, para os fins legais, todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.

Contudo, o objeto do presente trabalho científico não é definir e esclarecer as situações em que há a possibilidade de deferimento da AJG. Como bem retratado no título, objetiva-se descrever a extensão do efeito do deferimento da Assistência Judiciária Gratuita, em grau de recurso especial.

Em princípio, para uma conclusão à situação em apreço, basta ocorrer a análise do artigo 9º da lei, como segue:

Art. 9º. Os benefícios da assistência judiciária compreendem todos os atos do processo até decisão final do litígio, em todas as instâncias.

Em análise preliminar do dispositivo legal supracitado, o benefício da Assistência Judiciária Gratuita é estendido até que haja uma decisão final no processo, ou seja, trânsito em julgado. Além disso, a AJG produz efeitos, uma vez deferida nos autos, perante todos os graus recursais, ou seja, inclusive perante as Cortes Superiores (STJ e STF).

Entretanto, aparentemente o Egrégio Superior Tribunal de Justiça não vem interpretando o teor do artigo 9º da Lei 1.060/50 desta forma, já que vem exigindo dos recorrentes que reiterem, em grau recursal, o pedido de Assistência Judiciária Gratuita, sob pena de não recebimento da irresignação recursal, com a decretação da deserção.

Ao que parece, se quer crer que não, trata-se de um verdadeiro despautério visando não conhecer e não julgar um recurso interposto. É extremamente grave essa situação, haja vista que objetiva alegações de direito formal visando não adentrar no mérito do pleito, causando grave dano a parte na prestação jurisdicional.

Para tanto, pode se citar o julgamento proferido no Agravo em Recurso Especial nº. 587.254/RS, pelo Nobre Ministro Francisco Falcão, causa patrocinada por este que escreve o presente artigo, conforme extratos a seguir, da decisão monocrática exarada:

(...) “No entanto, a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que "na hipótese de o recorrente ser beneficiário da justiça gratuita, deve haver a renovação do pedido quando do manejo do recurso, uma vez que o deferimento anterior da benesse não alcança automaticamente as interposições posteriores” (EDcl no AgRg nos EAREsp 221.303/RS, Corte Especial, Rel. Ministro Sidnei Beneti, DJe de 27/3/2014).” (...)

(...) “No caso, a parte não efetuou o pedido de extensão da benesse para esta instância recursal, na petição do recurso especial, conforme entendimento acima citado, não se verificando, portanto, o atendimento da exigência contida no art. 511, caput, do CPC, incidindo, na espécie, também o disposto na Súmula n.º 187 deste Tribunal, o que leva à deserção do recurso.” (...)

Isto é, o Superior Tribunal de Justiça passou a desconsiderar o teor do artigo 9º da Lei 1.060/50, criando nova exigência, não prevista na lei, para que a parte possa litigar albergada pelo benefício da Assistência Judiciária Gratuita perante a referida Corte Superior.

Pior que isso, o julgamento acima citado não é único. Na verdade, na decisão monocrática proferida, o Nobre Ministro Julgador faz referência aos EDcl no AgRg nos EAREsp 221.303/RS, ao AgRg nos EDcl no AREsp 497.645/RJ, e aos EDcl no AREsp 399.852/RJ, ou seja, tal posicionamento tem se mostrado repetitivo.

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Assim, caso tenha ocorrido o deferimento da AJG à parte em 1º grau, como geralmente ocorre, para que a pessoa possa levar ao STJ a apreciação de sua irresignação, deverá reiterar o deferimento do benefício ou realizar o pagamento da guia de preparo e do porte de remessa e retorno (caso necessário), sob pena de deserção do recurso.

Não há razão para a criação dessa nova barreira pela referida Corte Superior, violando ao previsto na lei 1.060/50. Acredita-se que o único fundamento para a imposição de tal exigência às partes seja objetivar a diminuição do número de recursos que efetivamente tenham o mérito analisado pelo STJ.

É sabido por todos a grande quantidade de recursos que são interpostos perante o Superior Tribunal de Justiça, grande parte destes infundados e protelatórios. Contudo, a medida adotada, caso tenha o objetivo ventilado neste artigo, não é a mais adequada para a diminuição do número de recurso a serem apreciados.

Entretanto, não houve trânsito em julgado da decisão monocrática proferida, anteriormente citada neste artigo. Ante a violação ao disposto na Lei da Assistência Judiciária Gratuita, houve a interposição de Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial de nº. 587.254/RS, vindo o Eminente Ministro Paulo de Tarso Sanseverino a, em juízo de retratação, tornar sem efeito a decisão monocrática e eliminar a exigência de reiteração do pedido de deferimento da AJG pelo recorrente, como segue:

(...) “Assiste razão à parte agravante no que tange ao devido preparo, visto que o deferimento de justiça gratuita em primeira instância se estende aos Tribunais Superiores, sendo desnecessário renovação do pedido, a teor do que prevê o art. 9º da Lei 1.060/50” (...).

(...) “Destarte, a reconsideração do decisum é medida que se impõe, para que prossiga a análise do recurso.” (...)

Felizmente, no caso concreto, houve o reconhecimento da violação ao teor do artigo 9º da Lei 1.060/50, com a reforma do entendimento anteriormente exposto na demanda.

A situação apresentada no presente trabalho científico sequer precisaria ser objeto de maiores discussões, já que há disposição expressa em lei prevendo que a Assistência Judiciária Gratuita, uma vez deferida no processo, exceto em caso de comprovação de mudança de situação financeira da parte beneficiária, é válida até o trânsito em julgado da demanda, inclusive perante as Cortes Superiores.

A exigência que passou a ser realizada em grau de recurso perante o Superior Tribunal de Justiça trata-se de uma perigosa criação jurisprudencial, realizada pela Corte Superior e que por esta passou a ser aplicada, em violação à Lei 1.060/50.

Há de se ressaltar que a situação de perigo com relação a criação jurisprudencial realizada pelo STJ, objeto de análise neste artigo, se dá em razão da possibilidade de vir a ser estendida a exigência de reiteração do pedido de AJG em todos os graus recursais, o que originaria um total caos no Poder Judiciário e prejudicando, tão-somente, a parte com hipossuficiência financeira.

Atualmente, com a regulamentação do pagamento do preparo recursal, o Excelso Supremo Tribunal Federal, através da Resolução nº. 543, de 13 de janeiro de 2015, estabeleceu que a parte beneficiária da AJG deverá, a fim de alcançar a isenção do pagamento das custas recursais, além de informar o deferimento anterior do benefício, realizar a juntada da decisão proferida em instância inferior, deferindo a Assistência Judiciária Gratuita ao recorrente, nos termos do artigo 3º, IV e parágrafo único:

Art. 3º Haverá isenção de custas e do porte de remessa e retorno dos autos (Tabela “D”) nos seguintes casos:

IV – aos amparados pela assistência judiciária gratuita. (Lei nº 1060/50)

Parágrafo único. O beneficiário da assistência judiciária gratuita deverá comprovar a concessão do benefício, por meio de cópia de decisão judicial, quando deferido em outra instância.

Tal exigência realizada pode ser plenamente admitida. Apesar de criar novo obstáculo quando da interposição do recurso perante o STF, o recorrente não será obrigado a reiterar o pedido de deferimento da Assistência Judiciária Gratuita. Basta que acoste, com a peça de recurso perante a Corte Suprema, cópia da decisão proferida em instância inferior deferindo o benefício à parte, para ocorrer a perfeita admissão do pleito recursal, ao menos com relação ao requisito isenção do recolhimento de preparo recursal.

Portanto, conclui-se dizendo que a lei é clara no sentido de prever que, uma vez deferida a Assistência Judiciária Gratuita à parte, esta permanecerá vigendo até o trânsito em julgado do processo, excetuado eventual caso de alteração de condição financeira.

A necessidade de reiteração do pedido da Assistência Judiciária Gratuita em grau de recurso perante o Superior Tribunal de Justiça é totalmente descabida e violadora ao previsto no artigo 9º da Lei 1.060/50, não podendo prosperar e/ou ser admitida.

Como bem disciplinou o Excelso Supremo Tribunal Federal, apesar de criar nova exigência à parte recorrente quando da interposição do pleito recursal, é aceitável a determinação de juntada de cópia da decisão proferida em instância inferior que deferiu a Assistência Judiciária Gratuita, para fins de isenção do recolhimento das custas recursais e evitar possível decretação de deserção recursal.

Sobre os autores
Dartagnan Limberger Costa

Advogado militante nas áreas de Direito Empresarial, Tributário e Contratos. Contador. Foi professor de Graduação nas áreas de Direito Empresarial, Direito Civil e Falimentar. Graduação e Mestrado em Direito (UNISC) Graduação em Ciências Contábeis (UNINTER) MBA em Direito da Economia e da Empresa (Fundação Getúlio Vargas) Pós Graduado em Direito Empresarial do Trabalho pela Universidade Cidade de São Paulo Pós Graduado em Direito Tributário pela Universidade Cândido Mendes Pós Graduado em Direito Penal com fulcro em Direito Econômico pela Verbo Jurídico Pós Graduado em Contabilidade, Auditoria e Controladoria (UNINTER)

Fernando Luis Puppe

Advogado Associado na empresa Dartagnan & Stein Advogados Associados (www.dartagnanestein.com.br). Pós-Graduado em Direito Eletrônico Verbo Jurídico

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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