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Inversão do ônus da prova em sede de juizados especiais cíveis do Estado do Rio de Janeiro

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Agenda 13/04/2024 às 19:44

3. REQUERIMENTO E APRECIAÇÃO DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA

3.1. ORGANIZANDO O RACIOCÍNIO

Nesta seção almejo dar soluções fundamentadas aos seguintes questionamentos: Qual o momento processual para requerer a inversão do ônus da prova? Em qual momento processual deve o juiz apreciar o pedido de inversão do ônus da prova?

Para respondermos as questões acima, se faz necessário que apresentemos todo o rito dos Juizados Especiais Cíveis, bem como o viés processual dos princípios orientadores do microssistema apreciado.

Uma vez identificados os momentos processuais do rito será produzida análise à luz dos princípios orientadores visando estabelecer em qual etapa processual deve ser requerida e apreciada a inversão do ônus da prova em sede de juizado especial cível.

Apresentado o método passaremos a aplica-lo no tópico seguinte.

3.2. A MARCHA PROCESSUAL DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL

Para melhor explicarmos o caminhar de um processo pelo rito da lei n° 9099/95, faremos uso de um exemplo. Imaginemos que Tião, no dia 09 de novembro de 2009 está na porta de um Juizado Especial do Rio de Janeiro e vai levar a Justiça a apreciação de uma lide. Tião sabe que este Juizado Especial segue a interpretação literal da Lei n° 9099/95. Assim sendo Tião entra no juizado e dá início a marcha processual.

Primeiro momento processual, distribuição da inicial. Nos termos do artigo 14 da Lei n°9099/9523, Tião apresentou seu pedido e no dia 09/09/2009 instaurou o seu processo e como o réu não estava presente, se tornou inviável a aplicação do artigo 17 da Lei n°9099/9524. Com isso, Tião deixa o juizado, ciente de que deve retornar quinze dias depois, ficando assim cumprido o artigo 16 da Lei n°9099/9525 e findo o primeiro momento processual.

O segundo momento processual se inicia, quinze dias após a distribuição, com a audiência de conciliação. Nesse dia Tião e o réu estarão presentes perante o conciliador. Este passo da marcha se finda quando escolhida uma das três opções: Uma, Tião entram em acordo; Duas, Tião e o réu decidem que o processo será julgado por um árbitro; Três, Tião e o réu não chegam a consenso algum e o processo será julgado pelo juiz. Assim se finda o segundo momento processual em sede de juizado especial cível.

Finda a conciliação Tião pode ter dois destinos: Pode voltar para a sua casa, já ciente que retornará quinze dias após, para o próximo momento processual, ou então, pode simplesmente trocar de sala para que se inicie o próximo momento processual. Nos termos do artigo 27 da Lei n°9099/9526 a regra é Tião trocar de sala e seguir a marcha processual no mesmo dia, no entanto o §único do artigo 2727 trás a exceção e caso haja prejuízo para a defesa Tião retornará para a sua casa.

O terceiro passo processual se inicia com a abertura da audiência de instrução e julgamento. Nesse momento estarão Tião e réu na presença, ou do juiz, ou do árbitro dependendo da escolha realizada. Tal ato se finda quando proferida a sentença ou o laudo arbitral. Nos termos do artigo 26 ou do artigo 28 da Lei n°9099/9528 Tião sairá da audiência com a resposta jurídica para o seu problema, ou virá busca-la cinco dias depois. Assim a marcha processual em sede de juizado especial cível se encerra, dando-se início a toda uma movimentação para a execução da decisão ou uma movimentação recursal.

Não sendo nenhuma das duas movimentações objeto do presente trabalho finalizo essa etapa.

3.3. OS PRINCÍPIOS ORIENTADORES DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL

Nesse ponto do trabalho apresentamos de forma sucinta, os princípios orientadores do juizado especial cível. Trabalharemos com os princípios do artigo 2° da Lei n°9099/9529 de forma objetiva, demonstrando como deve ser tomada uma decisão processual respaldada nesses princípios.

3.3.1. Oralidade

De acordo com o dicionário Houaiss o sentido jurídico de oralidade é procedimento exclusivamente verbal30.

Sendo assim diante de uma encruzilhada processual, que disponibiliza um caminho com a produção de atos processuais pela via escrita e um outro com a produção de atos processuais pela via oral, deve o operador do direito escolher o meio físico oral, para a produção dos atos.

3.3.2. Simplicidade

O dicionário Houaiss não traz um sentido jurídico para o vocábulo, no entanto, a melhor definição seria: ausência de luxo, de pompa, de sofisticação31. Interpreto assim que o princípio se vincula a escolha do vocabulário quando da produção dos atos processuais.

Sendo necessário que o operador do direito se expresse deve optar por um vocabulário acessível, deixando de lado as petições e manifestações orais recheadas de termos técnicos e expressões em latim.

3.3.3. Informalidade

O sentido jurídico do termo é ausência de conjunto de prescrições quanto ao ritual e procedimentos que devem ser observados na formação de um ato para que este produza efeitos jurídicos32. Interpreto que o princípio se vincula a marcha processual e suas regras de conduta.

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Quando o operador do direito se encontra diante de exigências processuais infundadas, como protocolização apenas via protocolo geral (PROGER), produção de efeitos jurídicos só com a publicação em imprensa oficial, ordem fixa e rígida para a produção de atos em audiência, nulidade de ato por falta de assinatura, entre outras, este deve deixa-las de lado, pois só assim estará seguindo o princípio da informalidade.

3.3.4. Economia Processual

O sentido jurídico da expressão equivale ao conjunto de precauções e medidas adotadas pelo sistema judiciário com o objetivo de tornar a justiça distributiva mais rápida e menos onerosa para as partes33.

Interpreto assim, que, dentre as opções processuais deve ser escolhida a que exija menos recursos tanto para as partes, quanto para a máquina judicial.

3.3.5. Celeridade

A definição do vocábulo é simples e consiste na característica do que é célere, agilidade, rapidez, velocidade34. Baseado no significado interpreto o princípio por dois prismas: Pelo primeiro vislumbro que as partes devem requerer e informar na primeira oportunidade; Pelo segundo orienta que dentre as opções processuais deve o operador do direito escolher a que atinja sua finalidade de forma mais veloz.

3.4. QUANDO REQUERER

Agora estamos no tópico que pretende esclarecer quando o operador do direito deve requerer a inversão do ônus da prova em sede de juizado especial cível do estado do Rio de Janeiro.

Para orientar o leitor informo que não existem limites legais, jurisprudenciais ou doutrinários no que tange ao momento processual para requerer a medida em estudo. Sendo assim, a princípio o operador do direito poderia efetuar o pedido de inversão do ônus da prova em qualquer um dos seis momentos processuais que elenco abaixo.

Primeiro quando da apresentação do pedido. Segundo entre a apresentação do pedido e a citação. Terceiro entre a citação e a conciliação. Quarto, em audiência de conciliação. Quinto entre a audiência de conciliação e a audiência de instrução e julgamento. Sexto e último momento, seria durante a audiência de instrução e julgamento.

Defendemos, neste trabalho, que o momento adequado para requerer a inversão do ônus da prova em sede de juizado especial cível do estado do Rio de Janeiro é quando da apresentação do pedido. Fundamentamos tal posicionamento nos parágrafos que se seguem.

À luz do princípio da economia processual, a apresentação do pedido é o único momento processual que não geraria um dispêndio extra. Feito o requerimento em qualquer outro momento processual a parte desprenderia recursos para requerer a medida, incidentalmente, por sua vez, a máquina judicial teria gastos promovendo a movimentação processual extraordinária e eventual intimação de resultado. Sendo assim o pedido pela inversão do ônus da prova após a apresentação do pedido alteraria o curso padrão do processo no rito do juizado especial ampliando assim o custo processual.

Pelo ponto de vista do princípio da celeridade as partes devem requerer medidas na primeira oportunidade possível e tal oportunidade acontece quando da apresentação do pedido. Destaco que, nas demandas que viabilizam a inversão do ônus da prova não há justificativa para se dar início a demanda e retardar o pedido de inversão do ônus da prova. Se o autor não consegue trazer provas mínimas para embasar um pedido de inversão do ônus da prova este deve aguardar e reunir provas, e não dar início a uma demanda.

Tendo o bom senso e a boa-fé como norte, concluo que o pedido de inversão do ônus da prova deve ser feito quando da apresentação do pedido, sob pena de preclusão. Admitir o contrário seria desrespeitar os princípios da celeridade e da economia processual. Viabilizar o pedido em outros momentos processuais seria premiar tanto o aventureiro jurídico, que move demanda sem qualquer lastro probatório inicial, quanto o profissional anti-ético que guarda provas visando prejudicar a defesa.

3.5. QUANDO APRECIAR

Passamos agora a esclarecer quando o juízo deve apreciar o pedido de inversão do ônus da prova em sede de juizado especial cível do estado do rio de janeiro. Visando nortear o leitor informo que não existem limites legais nem doutrinários para a presente questão, no entanto a jurisprudência já se posicionou em duas oportunidades, como demonstrado em tópico anterior.

Para orientar o raciocínio elenco os seis momentos processuais nos quais o juízo pode apreciar o pedido de inversão do ônus da prova: primeiro entre a apresentação do pedido e a citação. Segundo entre a citação e a conciliação. Terceiro em audiência de conciliação. Quarto entre a audiência de conciliação e a audiência de instrução e julgamento. Quinto em audiência de instrução e julgamento. Sexto e último em sentença.

Vamos agora trabalhar excluindo cada um dos momentos inadequados, para que ao final do tópico cheguemos a uma resposta sólida. Teremos como base os seis momentos elencados no parágrafo anterior e os apreciaremos em ordem aleatória.

Não é viável a apreciação de inversão do ônus da prova em sentença pelos seguintes fundamentos: A uma tal posicionamento é contrário a súmula 91 do tribunal de justiça do Rio de Janeiro que transcrevo. “A inversão do ônus da prova, prevista na legislação consumerista, não pode ser determinada na sentença”35.

A duas a inversão do ônus da prova como técnica de sentença significa violação ao devido processo legal, tanto para o autor quanto para o réu. Imaginemos que em uma partida de futebol, depois de findo o jogo, o árbitro decida que ganhou a partida o time que fez menos gols, tal decisão inviabiliza sequer que os times defendam a vitória já que preferida quando findo o jogo. Inverter o ônus da prova em sentença prejudica tanto o réu, quanto o autor, pois ambos passarão pela fase probatória sem saber o que devem provar.

Assim sendo, defendo que o posicionamento defendido pelo item 9.1.2 do encontro de juizes dos juizados especiais36 não é compatível com o devido processo legal, já que muda regras probatórias após fase probatória.

Pelos dois fundamentos apresentados excluo o sexto movimento processual (em sentença) como momento adequado para a apreciação de pedido de inversão do ônus da prova em sede de juizado especial cível do Rio de Janeiro.

A audiência de instrução e julgamento também não é uma fase adequada para a apreciação do pedido em tela, pelos seguintes fundamentos. A uma o artigo 28 da Lei n° 9099/9537 informa que ao final da audiência de instrução e julgamento será proferida a sentença, sendo assim valem os mesmos argumentos do momento processual anterior, já que não haveria tempo hábil para réu e autor reunirem as provas necessárias.

A duas a marcação de outra data para continuar a audiência e viabilizar a produção de provas, quando já decidida a inversão do ônus da prova, viria a ferir os princípios da celeridade e da economia processual, pois importariam respectivamente em atraso da marcha processual e movimentação onerosa da máquina judicial. Assim sendo afasto a audiência de instrução e julgamento como momento adequado para apreciar o pedido de inversão em tela.

O segundo, terceiro e quarto momentos processuais devem ser afastados com base na mesma fundamentação. A uma a decisão judicial em qualquer dos momentos indicados (entre a citação e a conciliação, em audiência de conciliação e entre a audiência de conciliação e a audiência de instrução e julgamento) importaria em movimentação incidental do processo para apreciação judicial (conclusão), logo ficaria prejudicada a economia processual, tanto para a parte que desprende recursos para provocar o juízo, quanto para a máquina judicial que se desgasta com a movimentação.

A duas a celeridade e mais uma vez a economia processual são atacadas, pois haverá necessidade de intimação das partes a respeito da decisão incidental. A três o juízo violaria o princípio da celeridade ao se manifestar de forma tão tardia a respeito de um pedido feito quando da apresentação da demanda, como demonstro no tópico anterior.

Assim sendo afasto os momentos processuais indicados no parágrafo anterior, uma vez que inadequados e incompatíveis com os princípios orientadores do juizado especial cível, logo não deve o juízo apreciar o pedido de inversão do ônus da prova em nenhum desses momentos processuais.

Por exclusão concluo que o primeiro momento processual (entre a apresentação do pedido e a citação) é o adequado para a apreciação da inversão do ônus da prova. Como fundamento nos próximos parágrafos.

A uma, como defendido no tópico anterior que o único (a inversão deve ser requerida quando da apresentação do pedido sob pena de preclusão) é coerente e razoável que para prestigiar a celeridade o juízo aprecie tal pedido no momento processual seguinte.

A duas o principio da economia processual ficaria resguardado, pois não haveria necessidade de gastos cartorários para intimar o réu da decisão (deferindo ou não a inversão), pois tal apreciação seguiria junto com a correspondência da citação.

Diante do duplo argumento entendo que o juízo deve apreciar o pedido de inversão do ônus da prova logo após a apresentação do pedido, ou antes da citação do réu. Caso efetuada a citação sem a devida apreciação, surge para as partes o direito de impetrar mandado de segurança com fundamento na violação ao devido processo legal, forte na burla ao direito de saber o que cada parte deve provar e ao direito de produzir provas.

Sobre o autor
Tiago Duque de Almeida

Mediador de Conflitos junto ao Grupo de Mediação do Ministério Público do Rio de janeiro. Advogado, Bacharel em Direito (2005) pela Universidade Federal Fluminense. Mestrando em Direito e Sociologia pela Universidade Federal Fluminense (PPGSD). Pós graduado com especialização em Direito Público e Privado (2009) através de convênio EMERJ (Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro) e Universidade Estácio de Sá. Experiência em Direito de Família com ênfase em Mediação e Resolução de Conflitos.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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