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A possibilidade jurídica do impeachment da Presidente Dilma Rousseff

Agenda 07/12/2015 às 14:12

A diferenciação entre fundamentos e fatos jurídicos, do clamor popular pelo impeachment da Presidente Dilma. Uma análise critica da manipulação do povo brasileiro.

          O clamor de parcela da população, somada à vontade do Presidente da Câmara Federal são fatores suficientes, para a cassação de mandato da Presidente da República?

          De inicio é preciso se fazer uma separação clara entre: opinião popular que endossa manobra política, de fundamentos e fatos jurídicos, provas estas que podem conduzir à extinção de mandato eletivo de um Presidente da República.

           A leitura dos artigos 85 e 86 da Constituição Federal de 1988 respondem esta indagação, tendo-se em visa que é preciso prova cabal e inequívoca, de que a Presidente Dilma burlou a Lei Maior de 1988; ou agiu contra a existência da União; ou desfavor do funcionamento dos Poderes Legislativo e Judiciário, dentre outras instituições; ou em face do exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; ter ainda a Presidente abalado a segurança interna do Brasil, o que não se constatou, mediante os inflamados discursos de parcela do bloco oposicionista.

         Um questionamento, por parte da oposição, que mais se aproxima do caráter técnico que a questão merece, é em relação à lei orçamentária. Por outro lado, o jurista Dalmo Dalarri (2015) destaca que além de os atrasos de repasses aos bancos públicos terem se dado no mandato anterior, o que a Constituição Federal veda como requisito de cassação do atual mandato; nem os defensores da cassação levantaram a hipótese de proveito pessoal da Presidente, ao promover tais atrasos. Nesta esteira, vale destacar que o § 4° do art. 86 da Lei Maior veda cassação do mandato da Presidente, em virtude de fatos que ocorreram no mandato anterior. Portanto, pela via Constitucional, descartada a possibilidade de impeachment, devido ao suposto equivoco na execução orçamentária.

       Outro ponto decantado pelos defensores da cassação é a responsabilidade, na modalidade culposa, da Presidente Dilma. Uma analise do inciso II do art. 18 do Código Penal Brasileiro o qual define crime culposo, mediante um agir com imprudência, imperícia e /ou negligência. No entanto, o texto Constitucional, o qual na hierarquia das leis está acima de toda a legislação pátria, em seu art. 84 é claro ao condenar um ato doloso (e não culposo), por parte do Chefe de Estado. Neste sentindo, o jurista Dallari (2015) também descarta a possibilidade de cassação de mandato presidencial, com base em crime culposo.

       Assim, é possível ter o entendimento que o clamor, leigo e desprovido de fundamentação jurídica, de parcela da população, pró cassação, se dá em relação ao fraco desempenho atual da economia.

       Estapafúrdio correlacionar a popularidade como fundamento jurídico. Neste contexto, relembra-se o governo Médici, uma das fases mais cruéis da Ditadura Militar, o qual gozava de alto índice de aprovação popular, graças tão somente aos frutos da economia internacional, conforme elucidado pelo Cientista Social CANCIAN (2006), em sua obra.

      Sobre a questão de a crise política atual despertar tanto incomodo, vale destacar que o próprio povo brasileiro, por duas vezes, em 1963 e em 1993, erroneamente rejeitou o sistema parlamentarista, mediante o qual o parlamento é dissolvido e novas eleições convocadas, em ambientes de crise política, como o atual.

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        Nesta linha de raciocínio, a jurista Maria Victória Benevides (1993) já alertava ao país, a respeito da concentração de poderes nas mãos do Poder Executivo, problema este que é no mínimo atenuado, no Parlamentarismo, quando o Chefe de Governo permanece, cara a cara, com os demais parlamentares, discutindo as grandes questões nacionais e não blindados, pela atual “harmonia” dos poderes que impede, por exemplo, que um Presidente da República seja sequer convocado a prestar esclarecimentos, direitamente aos parlamentares, em reunião do Congresso Nacional.

      Se por um lado, a população tem o sagrado direito de se manifestar pacificamente contra ou a favor ao impeachment, esta garantia fundamental não pode ser confundida com fundamentação jurídica, que sustente a cassação do mandato presidencial de Dilma Rousseff. Parecendo-nos, assim, que muitas outras crises políticas virão, fruto do analfabetismo funcional e político desta parcela da população tal feroz em pedir a cassação, e ao mesmo tempo tão omissa ao exigir de nossos representantes, um sistema educacional no mínimo eficiente, para que nossos jovens aprendam, desde os primórdios de sua formação escolar que voto é coisa muito séria e que os conflitos do Presidente da Câmara, não podem, por si só, cassar um mandato eletivo de Presidente da República.

REFERENCIA:

ANGELO, Vitor Amorim. Parlamentarismo (2): João Goulart e o plebiscito de 1963. In: UOL Educação. Disponível em: < http://educacao.uol.com.br/disciplinas/historia-brasil/parlamentarismo-2-joao-goulart-e-o-plebiscito-de-1963.htm > Acesso em 07 de Dez. 2015;
BENEVIDES, Maria Victoria. O plebiscito de 1993 à luz do precedente de 1963. Versão rev. Seminário sobre Plebiscito e Revisão Constitucional, patrocinado pelo Conselho Federal da OAB, Brasília, 25 e 26 de junho de 1992. In: Lua Nova: Revista de Cultura e Política, ISSN 0102-6445. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-64451993000100004 >. Acessado em 07 de Dez. de 2015;
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 2010;

CANCIAN, Renato. Governo Médici (1969-1974): "Milagre econômico" e a tortura oficial. In: UOL Educação. Disponível em: < http://educacao.uol.com.br/disciplinas/historia-brasil/governo-medici-1969-1974-milagre-economico-e-a-tortura-oficial.htm > Acessado em 04 de Dez. de 2015;
Citar constituição, codigo penal, pedro lenza, agencia senado, agencia camara;
DALARRI. Dalmo de Abreu. Atrasos de repasses não dão fundamentação para impeachment, diz Dalmo Dallari. In: EBC Disponível em: < http://www.ebc.com.br/noticias/2015/10/atrasos-de-repasses-nao-dao-fundamentacao-para-impeachment-diz-dalmo-dallari >. Acesso em 06 de Dez. 2015;
DALARRI. Dalmo de Abreu. Parecer de Dalmo de Abreu Dallari contra o Impeachment de Dilma, in: Jota. Disponível em: < http://jota.info/parecer-de-dalmo-de-abreu-dallari-contra-o-impeachment-de-dilma >. Acesso em 07 de Dez. 2015;
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, 16.ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2012;

NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. – versão compacta – São Paulo: editora Revista dos Tribunais, 2009.

Sobre o autor
José Alves Capanema Júnior

Advogado, professor designado de Língua Inglesa, da rede Pública de MG.Pós-graduando em Direito Administrativo, pela Faculdade Pedro II, formado em Direito, pela Universidade de Itaúna - Estado de Minas Gerais.ELEITO MELHOR ESTAGIÁRIO DE DIREITO 2015 - UNIVERSIDADE DE ITAÚNA - MG

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Em um importante momento histórico-político que o país passa, importante destacar, ao leitor, que o simples clamor popular não é elemento suficiente para a cassação de mandato eletivo, de modo que questão muito mais importante, qual seja, o abandonado setor público educacional, sequer é ventilado, pelos grupos pró e contra Dilma Rousseff, de modo que se espera que os equívocos da política nacional continuem.

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