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A função extrafiscal no imposto de renda e a redução da desigualdade social.

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Agenda 24/02/2016 às 16:53

3 REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA

3.1 Hipótese de incidência

A hipótese de incidência é o pressuposto normativo de um evento que ao se concretizar resultará na incidência do tributo. É a descrição abstrata de um possível fato na qual acarretará a incidência tributária.

Nesta assentada, é possível identificar alguns critérios para a incidência do IR, quais sejam o material, o temporal, o espacial, o pessoal, e o quantitativo.

3.2 Critério material

Através do critério material, o IR incidirá sobre a aquisição do contribuinte de disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou proventos de qualquer natureza.

É dizer que a tributação do IR incidirá somente nos valores acrescidos ao patrimônio do contribuinte, ou seja, incidirá somente em riqueza nova, na qual o contribuinte consiga dispor livremente.

3.3 Critério temporal

O exercício financeiro, que se inicia em 1º de janeiro e se finda em 31 de dezembro, é o período determinado para se aferir as variações da renda a incidir o IR. No dia 31 de dezembro, data da ocorrência do fato gerador, o contribuinte fará o ajuste anual apurando as diferenças das entradas de capital e as saídas com despesas. O resultado da diferença apurada determinará se o contribuinte terá direito a restituição ou saldo a pagar.

Vale lembrar que pelo princípio da anterioridade anual, disposto no art. 150, III, “b”, CR/88, tem-se uma vedação à União quanto a cobrança de tributo no mesmo exercício financeiro em que tenha sido majorada, princípio este, resultante do princípio da não surpresa.

3.3 Critério espacial

O critério espacial possibilita a tributação do IR, tanto em acréscimo patrimonial obtido no Brasil como também o obtido no exterior.

Ainda sobre o assunto:

O fato gerador, que também se entende como hipótese de incidência, do imposto sobre a renda da pessoa física é a aquisição de disponibilidades econômica ou jurídica de renda ou proventos (art. 43 do CTN/1966)4, sendo que estes podem ser sucedidos no Brasil ou no exterior. (BOGGI, 2011, p. 17).

Assim sendo, não há limitação espacial para a tributação do IR, podendo a mesma “incidir sobre rendas auferidas fora do território nacional, oportunidade em que se fará presente o princípio da universalidade” (DEL NEGRO, 2007, p. 4).

3.4 Critério pessoal

Toda relação jurídica compõe-se com o sujeito ativo da obrigação e o sujeito passivo. No IR, figura no polo ativo da obrigação, a União, nos termos do art. 153, III, CF/88. Já no polo passivo da obrigação, encontra-se o contribuinte titular de disponibilidade econômica ou jurídica, conforme assevera o art. 45 do CTN.

3.5 Critério quantitativo

Através da base de cálculo e a alíquota calcula-se o quantum debeatur da obrigação. Dessa forma, fixa-se o valor devido ao adimplemento da obrigação tributária.

3.5.1 Base de cálculo

Base de cálculo é a mensuração da riqueza nova obtida durante o exercício financeiro em que irá incidir a hipótese de incidência. O CTN, em seu art. 44, define a base de cálculo do IR como sendo “o montante real, arbitrado ou presumido, da renda ou dos proventos tributáveis”, ou seja, base de cálculo é o lucro obtido pelo contribuinte no exercício financeiro.

Segundo Ricardo Alexandre (2012), o lucro real é o cálculo do montante com abatimento das despesas; lucro presumido é o cálculo de um percentual sobre o valor da receita bruta presumindo-se daí o lucro; e lucro arbitrado ocorre com a junção da impossibilidade de cálculo sobre o lucro real e o descumprimento dos requisitos do lucro presumido pelo contribuinte.

3.5.2 Alíquota

Alíquota é o percentual incidente sobre o valor a ser tributado.

Neste ponto, faz jus a aplicação do princípio da progressividade “caracterizando este pela tributação proporcional das possibilidades de cada contribuinte, ou seja, suportará uma maior carga aquele que auferir uma maior renda” (DEL NERO, 2007, p. 2).

As alíquotas incidentes sobre o Imposto de Renda estão previstas na lei 11.482/2007, em seu art.1º, VIII, a saber:

Art. 1o O imposto de renda incidente sobre os rendimentos de pessoas físicas será As alíquotas incidentes sobre o Imposto de Renda estão previstas na lei 11.482/2007, em seu art.1º, VIII, a saber:calculado de acordo com as seguintes tabelas progressivas mensais, em reais: VIII - para o ano-calendário de 2014 e nos meses de janeiro a março do ano-calendário de 2015 (BRASIL, 1988)

Tabela Progressiva Mensal

IMG1- quadro com esses dados Base de Cálculo (R$) Alíquota (%) Parcela a Deduzir do IR (R$) Até 1.787,77 - - De 1.787,78 até 2.679,29 7,5 134,08 De 2.679,30 até 3.572,43 15 335,03 De 3.572,44 até 4.463,81 22,5 602,96 Acima de 4.463,81 27,5 826,15 - 

3.6 Fato gerador do IR  

O fato gerador é a ocorrência do fato previsto em lei, conforme disposto no art. 114 do CTN do qual se extrai que “fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência”.

Nesse sentido, infere-se do art. 43 do CTN, que o fato gerador do IR será o acréscimo patrimonial, a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica de rendas ou proventos de qualquer natureza.

O fato gerador se confunde com a hipótese de incidência. Podemos perceber que o fato gerador, inclusive, está contido no critério quantitativo da H.I.  8 .


4 TRIBUTAÇÃO ROBIN HOOD ÀS AVESSAS

No Brasil ocorre a tributação vulgarmente conhecida como “Robbin Hood às avessas”, devido a sua incidência ocorrer de forma mais gravosa sobre os produtos de consumo, atingindo assim, principalmente, as classes mais baixas que são público alvo do mercado consumerista, visto que os mesmos são consumidores assíduos.

Por consequência, tal tributação favorece uma minoria de maior poder aquisitivo agravando a atual desigualdade social.

Nas palavras de Sérgio Abranches, a situação em que o país se encontra ocorre pois “não tomamos consciência de como os impostos que pagamos são usados para agravar as desigualdades, subsidiando os ricos e remediados, e não para reduzi-las” (ABRANCHES, 2001, p. 105).

Nessa linha, “Piketty constata que a desigualdade entre ricos e pobres tende sempre a aumentar na medida em que a taxa de rendimento do capital torna-se maior do que a taxa de crescimento da renda e da produção nacionais” (RIBEIRO, 2015, p. 199).

Contudo, existem defensores da ideia de uma tributação mais pesada sobre o consumo, sob o argumento de que é mais vantajoso “tributar as pessoas pela quantia que elas tiram do fundo comum, e não pela quantia que a ele acrescentam” (RIBEIRO, 2015, p. 206).

É notório que a tributação sobre o consumo envolve interesses de uma minoria poderosa e influente, e não é de se espantar que tenham defensores a ideia da tributação ser mais gravosa sobre o consumo, visto que:

Não é difícil perceber que a tributação sobre o consumo, embora dirigida à população por inteiro, atinge mais pesadamente os mais pobres que gastam todos os seus rendimentos na aquisição de bens e serviços essenciais à sua própria sobrevivência. A estes, não é possível amealhar patrimônio. Já a tributação da renda, em geral dirigida aos estratos que superem o mínimo existencial, atinge em maior grau, em um plano ideal, os rendimentos mais elevados. Por essas razões, a tributação sobre o consumo favorece a acumulação de capital, sendo um meio inferior de promoção da justiça distributiva tendo quase sempre um efeito regressivo, na medida em que os consumidores suportam a carga tributária sobre os bens e serviços cuja aquisição para os mais pobres, por meio de itens essenciais à própria sobrevivência, esgota inteiramente todos os seus recursos. Essas camadas excluídas também não conseguem poupar o suficiente para formar patrimônio a ser tributado (RIBEIRO, 2015, p. 206).

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Em síntese, no Brasil é o país em que há a maior incidência de tributação sobre o consumo, ao passo que a incidência de sua tributação sobre as rendas, o Brasil é o segundo país com a menor incidência, ficando atrás somente da Turquia.

Ninguém dúvida que a carga tributária no Brasil é elevada, tendo alcançado 35,8% do Produto Interno Bruto em 2008. Pior do que a elevada carga tributária é o retorno à sociedade, em bens e serviços prestados pelo Estado – praticamente nenhum. Paga-se em duplicidade, pois saúde, educação e segurança pública, dentre outros, ficam muito aquém das necessidades da população; não prestados os serviços públicos pelo Estado, a sociedade é compelida à contratação de serviços privados. Convivemos com carga tributária de primeiro mundo e serviços públicos de país subdesenvolvido (CUNHA, 2009, p. 1)

Como é de se notar, a política tributária adotada pelo país influenciará sua ordem econômica podendo aumentar ou diminuir a desigualdade de renda e patrimônio do mesmo. Nesse sentido, Thomas Piketty destaca a tributação como instrumento eficaz ao combate das desigualdades sociais:

“o instrumento privilegiado da redistribuição pura é a redistribuição fiscal, que, por meio das tributações e transferências, permite corrigir a desigualdades das rendas produzida pelas desigualdades das dotações iniciais e pelas forças do mercado, ao mesmo tempo que preserva o máximo a função alocativa do sistema de preços” (PIKETTY, 2015, p. 85)

É óbvio, pois que o combate às desigualdades sociais não se pautara exclusivamente na redistribuição de renda, posto que seria muito cômodo aos mais pobres dependerem de prestações positivas do Estado obtidas por meio da tributação dos mais ricos. O combate às desigualdades sociais por meio da tributação se pautará em uma divisão equânime do ônus fiscal através da capacidade contributiva, e também por meio da progressividade.

A justiça de um sistema tributário está na adequada distribuição da carga tributária entre os detentores de patrimônio e renda de um lado, e aqueles que nada têm, senão despesas, de outro. Os objetivos de cada sociedade vão presidir tais escolhas que desaguarão na formulação do seu sistema tributário. (RIBEIRO, 2015, p. 206)

Deste modo, conclui-se que o meio capaz de se alcançar a justiça social e a consequente redução das desigualdades sociais, por melhor viabilizar a redistribuição de renda, é a tributação sobre a renda e proventos de qualquer natureza do contribuinte.

Nesse mesmo diapasão:

Se a receita de Piketty para combater a desigualdade social pela via da tributação nos países ricos passa pelo aumento da tributação do patrimônio e da renda a partir da pesquisa que teve por base regimes em que esta se apresenta muito mais robusta do que no Brasil, em nosso país, sob a ótica distributiva por ele defendida, necessária seria uma verdadeira revolução que desonerasse os salários e o consumo em detrimento de patrimônio e renda, por meio de uma reforma tributária igualitária. (RIBEIRO,2015,p.207)

4.1 Deduções ilimitadas do imposto de renda e a consequente tributação regressiva

Em linhas gerais, para se cumprir uma ideal tributação do IRPF, deve-se atentar aos princípios constitucionais, alcançando assim a redução das desigualdades sociais por meio de uma tributação progressiva sobre os mais ricos e redistribuindo o produto arrecadado aos serviços públicos, tais como a saúde.

Ao contrário disso, são concedidas aos mais ricos deduções ilimitadas na base de cálculo do IR em relação aos gastos com despesas médicas e planos privados de saúde. Tal dedução acarreta na regressividade do sistema tributário.

Tal dedução acarreta na regressividade do sistema tributário pois os referidos abatimentos geram fortes impactos aos serviços de saúde pública, visto que os mesmos carecem de recursos financeiros que poderiam ser angariados pela arrecadação do IR.

Dados empíricos levantados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística comprovam que no Brasil aproximadamente 87% do consumo de serviços de saúde relativo à parcela mais rica da população ocorre no âmbito das prestações privadas, enquanto que no caso da fatia populacional mais pobre essa porcentagem cai para cerda de 44%, ou seja, aproximadamente a metade. (NETO, 2013/2014, P. 3)

A desigualdade se faz presente ainda, quando se verifica que os mais ricos além de condições de consumir serviços de saúde privados, consequentemente, de maior qualidade, recebem benefícios fiscais por usufruí-los sendo abatidos integralmente de sua base de cálculo do IR, reduzindo consideravelmente a alíquota incidente. Enquanto que para os mais pobres não há a mesma sorte, visto que tem como única opção o SUS, que é um serviço público de saúde de péssima qualidade.

A justificativa para o abatimento integral das despesas com saúde privada é de que não haverá a utilização do SUS pelo mesmo. Contudo, não se justifica tal procedimento visto que “não se paga o imposto sobre a renda por ter utilizado serviço público de saúde, mas simplesmente por ter auferido renda” (NETO, 2013/2014, p. 4).

Além disso, não pode prevalecer o argumento de que os consumidores de saúde privada paguem menos IR do que os consumidores de saúde pública, pois o SUS é um serviço disponível a todo e qualquer cidadão, e deverá ser financiado por toda sociedade, como dispõe o art. 195 da CR/88.

Para isso, é necessária uma tributação mais pesada sobre os mais ricos, levando em conta sua capacidade econômica, redistribuindo a arrecadação aos serviços públicos. Nos dizeres de Neto: “Somente assim a redução das desigualdades sociais será alcançada, diminuindo as profundas iniquidades que predicam o acesso aos direitos sociais no Brasil, notadamente, o acesso ao direito à saúde” (NETO, 2013/2014, p. 4).

Contudo, as deduções de forma integral sobre os gastos com saúde pública, desvirtuam essa lógica, pois os ricos se abstêm, por meio do IR, de financiar a saúde pública, tão utilizada pelos mais pobres.

Inclusive, por meio de decisões judiciais e com a facilidade para acessar o Poder Judiciário, os ricos enxugam os recursos destinados ao SUS, pois, “capturam por meio de decisões judiciais a alocação de tais recursos para a realização de gastos que lhes aproveitem individualmente” (NETO, 2013/2014, p. 4).

Dessa forma, cria-se no Brasil, dois sistemas de saúde distintos. O primeiro é direcionado aos mais pobres que não tem acesso à saúde privada, dependendo da saúde pública a qual é sustentada pelas receitas públicas obtidas por meio de despesas. Nesse primeiro sistema, os mais pobres tem acesso somente aos tratamentos e remédios elencados na lista do SUS. O segundo sistema, é destinado aos mais ricos, e estes tem acesso a uma saúde privada de qualidade os quais são custeados “tanto por verbas públicas diretas (despesas públicas), quanto indiretas (por meio de renúncia de receitas)” (NETO, 2013/2014, p 5).

Aos mais ricos, tem-se a possibilidade de acesso tanto dos tratamentos e remédios elencados na lista do SUS, quanto os que lá não se encontram, pois, poderão ser consumidos no mercado privado e deduzidos integralmente do IR, e assim, os valores gastos com a saúde privada, deixam de entrar no Erário e voltam às mãos do mesmo.

Em suma:

Tais deduções ilimitadas da base de cálculo do imposto sobre a renda para os gastos com saúde privada são danosas, pois: (i) ferem a lógica progressiva do imposto sobre a renda; (ii) desvirtuam o viés republicano do financiamento da saúde pública; (iii) acentuam as desigualdades sociais e a concentração de renda; (iv) criam dois sistemas distintos de saúde no Brasil, sendo um para os ricos e outro para os pobres; (v) rompem com o caráter de direito social da saúde, admitindo que os particulares tomem as rédeas das políticas públicas do setor; e (vi) mantém as estruturas econômicas. (NETO, 2013/2014, p. 2)

De fato, a concessão desse benefício fiscal serve como álibi ao Estado que se exime de prestar melhores serviços públicos à população. Como resultado, também ocorre uma função de amortecimento social, devido ao fato de o cidadão mais abastado pensar que o Estado estaria cumprindo sua parte em relação ao oferecimento de serviços públicos de qualidade a população carente ao desonerá-lo dos gastos com saúde privada. E assim, tem-se um sentimento de conformismo com a péssima qualidade da saúde pública.

 Segundo Michel Haber Neto (2013/2014), a falta de discussões jurídicas sobre o assunto, inibe a intenção de manutenção das estruturas econômicas através do abatimento integral das despesas com saúde privada. Infelizmente, existe a pressão da saúde privada para que ocorra a “manutenção desses incentivos, como forma de induzir o comportamento dos cidadãos ao consumo da saúde privada” (NETO, 2013/2014, p. 5). Fato este comprovado visto ser 53% dos gasto com saúde no Brasil, decorrerem da saúde privada.

Michel Haber Neto (2013/2014) lista propostas capazes de tornar a tributação do IR progressiva sobre quem de fato pode contribuir mais. Para esse fim, propõe que sejam criadas

(i) travas para as deduções, estabelecendo-se limites às mesmas, tais quais atualmente existentes no caso de gastos privados com educação; e/ou (ii) tratamentos médicos e remédios específicos que possam vir a ser abatidos, permitindo-se apenas aqueles disponibilizados no âmbito do SUS, o que impediria que toda e qualquer despesa médica fosse abatida do imposto sobre a renda, trazendo a solução para a questão da decisão política acerca dos gastos com saúde pública que retornaria às mãos do Poder Público (NETO, 2013/2014, p. 7).

As deduções aos proprietários de empresas também ensejam um dano à tributação do IR, visto que serão tributados os lucros e dividendos da empresa, e por esta razão, não serão tributados pelo IRPF se desvencilhando assim da progressividade das alíquotas. Vale dizer que “a renda dos trabalhadores assalariados é proporcionalmente mais onerada do que os lucros e dividendos dos proprietários de empresas” (RIBEIRO, 2015, p. 209).

Insta ressaltar que enquanto os trabalhadores assalariados sendo tributados pelo IRPF podem ter alíquotas incidentes de até 27,5%, aos proprietários de empresas incidirá uma alíquota de 15% sobre os ganhos do capital.

Mais uma vez, fica demonstrado que no Brasil:

“temos um leão que ruge mais alto para os trabalhadores e consumidores do que para os investidores, proprietários, empresários e herdeiros. E essa questão nenhum dos governos brasileiros ousou enfrentar, muito embora as políticas de congelamento da tabela do IRPF no Governo Fernando Henrique Cardoso tenham contribuído para o agravamento do quadro. Deste modo, temos um sistema tributário que, longe de contribuir para a redução das desigualdades sociais, as cristaliza quando não as aprofunda” (RIBEIRO, 2015, p. 209)

A isenção quanto aos lucros ou dividendos de empresa estão previstos no art. 10 da lei 9.249/95.

A saber:

Art. 10. Os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, não ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integrarão a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no País ou no exterior.

§ 1o No caso de quotas ou ações distribuídas em decorrência de aumento de capital por incorporação de lucros apurados, a partir do mês de janeiro de 1996, ou de reservas constituídas com esses lucros, o custo de aquisição será igual à parcela do lucro ou reserva capitalizado, que corresponder ao sócio ou acionista. (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014) (Vigência)

§ 2o A não incidência prevista no caput inclui os lucros ou dividendos pagos ou creditados a beneficiários de todas as espécies de ações previstas no art. 15 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, ainda que a ação seja classificada em conta de passivo ou que a remuneração seja classificada como despesa financeira na escrituração comercial. (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014) (Vigência)

§ 3o Não são dedutíveis na apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL os lucros ou dividendos pagos ou creditados a beneficiários de qualquer espécie de ação prevista no art. 15 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, ainda que classificados como despesa financeira na escrituração comercial. (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014) (Vigência);

Sendo o rol do artigo acima transcrito ampliado pelo art. 51, § 2º da instrução normativa IN SRF 11/1996.

Art. 51. Não estão sujeitos ao imposto de renda os lucros e dividendos pagos ou creditados a sócios, acionistas ou titular de empresa individual. (…)

§ 2º No caso de pessoa jurídica tributada com base no lucro presumido ou arbitrado, a parcela dos lucros ou dividendos que exceder o valor da base de cálculo do imposto, diminuída de todos os impostos e contribuições a que estiver sujeita a pessoa jurídica, também poderá ser distribuída sem a incidência do imposto, desde que a empresa demonstre, através de escrituração contábil feita com observância da lei comercial, que o lucro efetivo é maior que o determinado segundo as normas para apuração da base de cálculo do imposto pela qual houver optado, ou seja, o lucro presumido ou arbitrado.

Entretanto, tais isenções são eivadas de inconstitucionalidade formal, tendo em vista que se deu por ato infralegal, visto que as isenções somente poderão ser instituídas por lei, conforme dispõe o art. 176 do CTN, além de afrontar os princípios constitucionais da isonomia, generalidade, universalidade e capacidade contributiva.

Art. 176. A isenção, ainda quando prevista em contrato, é sempre decorrente de lei que especifique as condições e requisitos exigidos para a sua concessão, os tributos a que se aplica e, sendo caso, o prazo de sua duração.

Para tanto, propõe Albino Pimenta da Cunha (2009), soluções cabíveis a presente questão, quais sejam: a propositura de ação direta de inconstitucionalidade junto ao STF, com fulcro no art. 102, I, “a”, da CR/88, a fim de revogar o § 2º do art. 51 da IN SRF 11/1996, e a promulgação de lei ordinária, para que a mesma complemente a lei 9.249/95 no que se refere a impossibilidade de distribuição dos lucros com isenção.

Dessa forma, os beneficiados pela isenção contribuirão em menor escala se comparado aos trabalhadores assalariados, desrespeitando os princípios da isonomia e da capacidade contributiva. Os artistas de renome, âncoras de telejornal, e etc, destinatários dessa isenção e detentores de uma renda anual de milhões, a partir dessa norma “foram ‘legalizadas’ as empresas de ‘fachada’ por meio das quais estes profissionais já trabalhavam” (CUNHA, 2009, p. 5).

Dar, a alguns poucos, o privilégio de contribuir para as receitas públicas (que têm por objeto satisfazer a necessidades públicas da sociedade) de modo diferenciado, onerando-os em percentuais significativamente menores, é particularmente injusto, e por isso mesmo inconstitucional – especialmente levando-se em conta que tais contribuintes são detentores de elevada capacidade contributiva (CUNHA, 2009, p. 6)

Em razão dessa incidência mínima com uma tributação favorável, pode-se afirmar que o Brasil se caracteriza um verdadeiro paraíso fiscal, incentivando, inclusive, a lavagem de dinheiro. Visto as diversas vantagens que a tributação brasileira oferece aos que detém maior poder aquisitivo, fazendo jus ao apelido de “Robin Hood às avessas”.

A ‘empresa’ prestadora de serviços paga o imposto de renda (IRPJ, com alíquota de 15%) incidente dobre o lucro presumido de 32% da receita. Entretanto, de acordo com os cálculos apresentados, o titular da ‘empresa’ poderá retirar, como rendimento isento, 85,47% da receita (14,53% são os gastos tributários, suas únicas despesas). Dos lucros isentos distribuídos, a parte excedente ao lucro presumido, de 53,47% da receita, não paga nenhum centavo de imposto (nem na ‘empresa’, nem na pessoa física – mais da metade da receita auferida). Tal situação se aplica a todos aqueles prestadores de serviços intelectuais que desenvolvem atividades personalíssimas, sem necessidade de contratação de auxiliares (CUNHA, 2009, p. 6)

Vale dizer que o IR deve incidir sobre todo acréscimo patrimonial, não havendo a tributação do mesmo, se caracteriza em privilégio infundado. Assim conclui-se que uma correta tributação do IR em prol de uma justiça fiscal, faz-se necessária alterações tendentes a eliminar a isenção inconstitucional e aumentar a progressividade, atendendo assim os princípios da progressividade, isonomia e capacidade contributiva.

4.2 Críticas ao imposto de renda retido na fonte

Com o IRRF9 se faz presente um efeito inibidor no que se refere à aplicação dos princípios constitucionais do IR, principalmente os princípios da capacidade contributiva e da progressividade, visto que incidem sobre cada renda auferida pelo contribuinte, não considerando o patrimônio em sua totalidade, nem tampouco tributando progressivamente.

Outro fator decorrente do IRRF que acarreta em um obstáculo à uma correta tributação, ocorre em sua arrecadação, pois, o produto de sua arrecadação é para terceiros que não o órgão arrecadador.

Neste sentido ensina Paulo Ayres Barreto:

“Dissemos que a efetiva manifestação da capacidade econômica relativamente ao imposto sobra a renda dá-se na ação de auferi-la. Imaginar possa ser construída uma regra matriz autônoma, decorrente da incidência do imposto sobre a renda na fonte, implicaria identificar materialidade outra que não auferir renda. Incidiria o imposto sobre a ação de ‘pagar renda” (BARRETO apud DEL NEGRO, 2007, p. 3)

4.3 O desrespeito ao principio da capacidade contributiva e progressividade do IRPF

Os princípios da progressividade e da capacidade contributiva são as normas que promovem a personalização do imposto, pois as alíquotas incidentes sobre o IR devem ser majoradas conforme aspectos pessoais e econômicos do contribuinte.

Contudo, as alíquotas previstas na atual tabela progressiva do IR, são as mesmas previstas desde o ano de 2009, ou seja, as alíquotas de 7,5%, 15%, 22,5%, e 27,5%. Consequentemente, percebemos uma tímida progressão, ou melhor dizendo, quase um congelamento da progressividade das alíquotas.

A aplicação do princípio da progressividade e da capacidade contributiva, ensejarão um consequente efeito extrafiscal sobre o IRPF, o que é primordial para que ocorra a redução da desigualdade social, pois os mais ricos “arcarão, efetivamente mais, pelos serviços públicos em geral, em favor daqueles que pouco ou nada possuem e, portanto, não podem pagar” (COSTA, 2003, p. 26).

Entretanto, economistas acreditam no princípio da proporcionalidade como ideal a tributação que atenda a capacidade contributiva, visto que se baseia na variação de tributação devido a diferença da base de cálculo, tendo como base a aplicação de uma mesma alíquota.

Por óbvio que a proporcionalidade não atenderá a capacidade contributiva do contribuinte que deverá ser tributado conforme aspectos pessoais e econômicos.

Nas lições de Costa: “A progressividade tributária, por seu turno, implica seja a tributação mais do que proporcional à riqueza de cada um. Um imposto é progressivo quando a alíquota se eleva à medida que aumenta a quantidade gravada” (COSTA, 2003, p. 38).

Como já foi demonstrado neste trabalho, a tributação do IR, infelizmente tem caráter regressivo, tendo em vista as ilimitadas deduções, e o desrespeito aos princípios inerentes ao IR.

Além disso:

Ao grave declínio da progressividade tributária soma-se como fator de aumento da desigualdade a possibilidade de os detentores das grandes riquezas, aproveitando-se de um ambiente de concorrência fiscal entre os Estados nacionais em um contexto de livre circulação de capitais, escolherem o montante tributário que irão suportar, o que vem promovendo a arrecadação regressiva no topo da pirâmide tributária (RIBEIRO, 2015, p. 200).

Faz-se necessária uma reforma tributária em relação ao IRPF, incluindo mais alíquotas progressivas sobre os rendimentos dos mais abastados, a fim de melhor redistribuir as rendas através deste instrumento de justiça fiscal no combate das desigualdades sociais.

Nesse mesmo sentido, segue ensinamento de Ribeiro:

A adoção de uma progressividade mais acentuada em nosso país não deve ser mais uma medida de mais oneração da classe média. Nas alíquotas majoradas deve incidir a taxa marginal de renda a partir de patamares bem mais elevados do que os atuais, atingindo o topo da pirâmide que concentra a maior parte da riqueza nacional. Em contrapartida devem ser desonerados os contribuintes nas faixas mais baixas da atual tabela, a dim de aliviar os assalariados, a partir da elevação dos limites nominais de cada uma das suas faixas (RIBEIRO, 2015, p. 216).

Sobre o autor
Gustavo Firmino dos Santos

Bacharel em Direito pela Escola Superior Dom Helder Câmara

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Gustavo Firmino. A função extrafiscal no imposto de renda e a redução da desigualdade social.. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4620, 24 fev. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/46177. Acesso em: 5 nov. 2024.

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