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A greve e o sindicalismo no Brasil

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Agenda 11/12/2016 às 17:13

GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO

Verifica-se que, nos regimes constitucionais anteriores a Carta de 1988, os servidores públicos não possuíam direito à organização sindical e, por consequência, ao exercício do direito de greve. Desta maneira, fora a atual Constituição Federal que revolucionou essa questão garantindo ao servidor público civil o direito à livre-associação sindical e o exercício da greve nos termos e limites que seriam definidos em lei específica (art. 37, incisos VI e VII, da CF/88).

Ante o supracitado, como bem observa Raimundo Simão de Melo16, duas correntes buscam explicar acerca de tal direito. A primeira defende que se trata de um direito de eficácia limitada, sendo assim, só poderá ser exercido a partir da regulamentação em lei estabelecendo seus limites, haja vista que a norma constitucional não é autoaplicável, entendimento que encontra respaldo em decisão do STF (sem efeito vinculativo) que sustentava a impossibilidade de seu exercício antes da edição de lei complementar, logo, o preceito constitucional que reconheceu o direito de greve ao servidor público civil constitui norma de eficácia meramente limita, desprovida, em consequência, de autoaplicabilidade, razão pela qual, para atuar plenamente, depende da edição da lei complementar exigida pelo próprio texto da Constituição17.

Nota-se que o STF reconheceu a inércia do Congresso Nacional, mas nada fez no intuito de efetivar tal direito. Não obstante, para a segunda corrente, os mandamentos constitucionais acerca da greve do servidor público civil são de eficácia contida, com incidência imediata, devendo ser exercido aplicando, por analogia, a Lei de Greve n. 7.783/89, até que lei específica seja aprovada. Desta forma, seria plenamente exercitável possuindo aplicabilidade plena, integral e imediata, que, em contrapartida, poderá ser reduzida pelo advento de uma lei específica infraconstitucional, logo, sendo considerada direito fundamental, não aplicá-la por mora legislativa seria negar direito estampado na Lei Maior. Além do mais, percebe-se que o constituinte originário, expressamente, só teve o intuito de negá-lo no caso do servidor público militar (art. 142, §3º, inciso IV).

Casos mais recentes, como os Mandados de Injunção nº 670 e 712-8, após muitos debates, o STF tem entendido que a Lei de Greve (Lei n. 7.783/89), que se refere aos trabalhadores de iniciativa privada, também se aplica, por analogia, às greves no serviço público, sendo necessária apenas sua adaptação ao caso concreto. Neste último, o voto do Ministro Relator Eros Grau propôs como solução para tal omissão legislativa a aplicação, no que couber, da lei referida, momento este que a Corte reconheceu a mora do Congresso Nacional e estabeleceu a necessária normatização para que fosse possível seu exercício, logo, o entendimento firmado é de que incumbe ao poder Judiciário produzir a norma suficiente para tornar viável o exercício do direito de greve dos servidores públicos. Sendo assim, a greve é um poder de fato e a arma mais eficaz que dispõe a classe trabalhadora como meio para obtenção de melhoria apresentando-se como direito fundamental de natureza instrumental, devendo então receber concretização imediata e ter sua autoaplicabilidade reconhecida.

No que se refere a essa “norma supletiva” firmada pelo Tribunal, este entendeu que ela abrange não somente o caso concreto que fora submetido, mas sim a totalidade dos casos semelhantes, isto é, deve ser estendido o entendimento a outras impetrações futuras versando sobre situações análogas. Com isso, depreendeu-se que a função do mandado de injunção é normativa, de forma alguma legislativa, dando efetividade ao mesmo. Dessa maneira, fora “regulamentado” tal direito mediante a aplicação da Lei nº 7.783/89 atentando as devidas alterações em face das peculiaridades do serviço público.

Questão interessante diz respeito ao desconto no pagamento de servidores em greve. Encontra-se suspenso desde 02 de setembro de 2015, em razão do pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso, o Recurso Extraordinário 693456, repercussão geral reconhecida, no qual se discute a constitucionalidade do desconto nos vencimentos dos servidores públicos como consequência dos dias não trabalhados por adesão a greve. Até o momento em que fora suspenso, já haviam votado o relator, Ministro Dias Toffoli, a favor do desconto em razão da suspensão, e o Ministro Edson Facchin, que sustenta que apenas por ordem judicial pode determinar o corte no pagamento.

Para o Ministro Dias Toffoli18, a greve do servidor público se equipara à suspensão do contrato de trabalho não sendo devidos, desta forma, os dias não trabalhados. Assim, mesmo que o movimento grevista não seja considerado abusivo, a regra é o não pagamento dos salários, em contrapartida, pode haver a compensação dos dias parados e o parcelamento dos descontos seja objeto de negociação. Já para Facchin, sendo a greve o principal instrumento de reivindicações do servidor público frente ao Estado, a regra para suspensão do pagamento não pode ser aplicada, haja vista que tais servidores não podem fazer uso do instrumento do dissídio coletivo nem a possibilidade de intervenção da Justiça do Trabalho para mediar o conflito. Dessa forma, só seria possível o corte dos salários a partir de determinação judicial, não havendo acordo entre as partes ou sendo constatada a ilegalidade ou abusividade da paralisação. Ante o exposto, no setor público a lógica seria inversa, pois, muitas vezes, o poder público posterga ao máximo o início das negociações, por consequência, permitir o desconto imediato no salário dos servidores públicos representaria todo o prejuízo do movimento suportado por apenas uma das partes praticamente aniquilando o direito de greve no setor público previsto na Constituição Federal.19

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NOTAS CONCLUSIVAS

Para alguns, o ato de produção e reprodução da vida humana realiza-se pelo trabalho, pois é a partir do mesmo que o homem torna-se ser social, distinguindo-se de todas as formas não humanas, no entanto, na sociedade capitalista tem se tornado degradado e desonrado, apresentando-se como um meio de subsistência, transformando a forma humana de realização do próprio indivíduo em uma mercadoria com a finalidade direta de produzir mercadorias.

Ante o exposto, apesar da carência informativa quanto seus direitos trabalhistas e acerca das funções e tamanha importância dos sindicatos, cumpre observar que estes se apresentam como grandes aliados da classe operária, logo, a própria razão de sua gênese fora a luta pela obtenção gradativa de melhoria das condições de trabalho e, por consequência, maior dignidade aos indivíduos. Observa-se que sua função negocial e de representação é de suma importância para as árduas conquistas, haja vista que o sindicato não representa apenas os associados, mas sim toda a classe, além de participar das negociações coletivas que resultam em acordos ou convenções coletivas de trabalho, estas que são verdadeiras normas benéficas a serem aplicadas à categoria. Há real necessidade, portanto, de que as informações referentes às suas funções sejam amplamente difundidas para maior conscientização da população em geral e, em consequência, maior apoio nos movimentos benéficos à classe trabalhadora.

Diante da hipossuficiência, seja ela financeira ou política, do trabalhador frente à força econômica do empregador, a greve se apresenta como ferramenta essencial e de maior eficácia para estabelecer maior proporcionalidade e harmonia na relação laboral. Dependendo de lei que regulamente seu exercício, o direito de greve no serviço público só passou a ser efetivado após consequentes debates através dos Mandados de Injunção nº 670 e 712-8 impetrados em razão da mora legislativa. Com isso, o inciso VI do art. 37 da CF/88 fora “regulamentado” pelo STF mediante aplicação da Lei nº. 7.783/89, arts. 1º ao 9º e 14, 15 e 17, com as devidas alterações e reduções que devem ser adotadas em razão das peculiaridades do serviço público e os serviços considerados essenciais. Quanto às discussões no Recurso Extraordinário 693456 no que diz respeito à constitucionalidade do desconto nos vencimentos pelos dias não trabalhados, deve haver ponderação e cautela em consideração as peculiaridades do serviço público, logo, o desconto imediato nos salários implicaria em uma postergação ainda maior por parte do Poder Público em atender as reivindicações, sendo que, por outro lado, os servidores, necessitando da remuneração para subsistência, não conseguiriam levar adiante o movimento, aniquilando-se indiretamente tal direito expresso na Constituição Federal.


REFERÊNCIAS

AROUCA, José Carlos. Curso básico de direito sindical. 4. ed. São Paulo: LTr, 2014.

ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? : ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 15. ed. São Paulo: Cortez, 2011.

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CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do trabalho. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014.

Dias Toffoli. Recurso extraordinário 693.456 Rio de Janeiro – Voto. Disponível em: <https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/RE_693_456__VOTO.pdf> Acesso em 10 de maio de 2016.

LOBATO, Marthius Sávio Cavalcante. O valor constitucional para efetividade dos direitos sociais nas relações de trabalho. São Paulo: LTr, 2006

MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 30. ed. São Paulo: Atlas, 2014.

MELO, Raimundo Simão de. A greve no direito brasileiro. 3. ed. São Paulo: LTr, 2011.

Notícias STF. Disponível em: <https://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=298959>. Acesso em 10 de maio de 2016.

PASTORE, Eduardo. O trabalho sem emprego. São Paulo: LTr, 2008.

Projeto Integrador. Trabalhadores e Sindicatos. UniCentro AGES. Paripiranga/BA, 2015.2.


2 CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do trabalho. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. p. 1278.

3 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 30. ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 936.

4 AROUCA, José Carlos. Curso básico de direito sindical. 4. ed. São Paulo: LTr, 2014. p. 348.

5 Projeto Integrador. Trabalhadores e Sindicatos. UniCentro AGES. Paripiranga/BA, 2015.2. p. 42.

6 Projeto Integrador. Trabalhadores e Sindicatos. UniCentro AGES. Paripiranga/BA, 2015.2. p. 25.

7 CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do trabalho. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. p. 1223.

8 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 30. ed. São Paulo: Atlas, 2014. pp. 825/828.

9 Projeto Integrador. Trabalhadores e Sindicatos. UniCentro AGES. Paripiranga/BA, 2015.2.

10 PASTORE, Eduardo. O trabalho sem emprego. São Paulo: LTr, 2008. p. 34.

11 MELO, Raimundo Simão de. A greve no direito brasileiro. 3. ed. São Paulo: LTr, 2011. p. 81.

12 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 30. ed. São Paulo: Atlas, 2014. pp. 940/941.

13 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 30. ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 946.

14 LOBATO, Marthius Sávio Cavalcante. O valor constitucional para efetividade dos direitos sociais nas relações de trabalho. São Paulo: LTr, 2006. p. 88.

15 ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 15. ed. São Paulo: Cortez, 2011.

16 MELO, Raimundo Simão de. A greve no direito brasileiro. 3. ed. São Paulo: LTr, 2011.

17 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Injunção: 20/DF, Relator: CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 19/05/1994, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 22-11-1996. Disponível em: <https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/748172/mandado-de-injuncao-mi-20-df>. Acesso em: 11/05/2016.

18 Disponível em: https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/RE_693_456__VOTO.pdf Acesso em 10 de maio de 2016.

19 Disponível em: https://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=298959. Acesso em: 10 de maio de 2016.

Sobre o autor
José Lucas Rodrigues de Oliveira

Graduando em Direito pela UniAges.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, José Lucas Rodrigues. A greve e o sindicalismo no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4911, 11 dez. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/51517. Acesso em: 22 dez. 2024.

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