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União civil entre pessoas do mesmo sexo

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Agenda 06/04/1997 às 00:00
Este trabalho não tem o propósito de estabelecer uma crítica pessoal ao tipo de relação que aborda. Não temos o objetivo de julgar ou opinar sobre a preferência sexual de quem quer que seja, até porque não temos competência para isso.

O verdadeiro objetivo deste trabalho é estritamente técnico, ou seja, tentar criticar de forma construtiva, o Projeto da Deputada Marta Suplicy, para que ele, caso seja aprovado, não venha a ser objeto de inoportunas discussões doutrinárias ou jurisprudenciais, que somente atrapalham a vida dos verdadeiros interessados na solução de sua peleja judicial, mediante uma prestação jurisdicional célere, justa e eficiente por parte do Estado.

No mais, nossa modesta contribuição é dedicada a todas as pessoas que tiveram participação efetiva na sua realização.

A minha filha Bianca e a minha querida Rachel, por terem me mostrado o verdadeiro significado do amor.

Aracaju, março de 1997




1 - INTRODUÇÃO

1.1 - CASAMENTO

1.1.1 - origens e evolução histórica

Originariamente, a primeira forma de união entre um homem e uma mulher ocorreu através da força, isto é, o macho simplesmente pegava a fêmea pela qual sentia desejo. Tratava-se de uma captura, de uma união forçada e não de casamento.

O instituto do casamento, no que diz respeito ao seu aspecto jurídico, desperta interesse como objeto de estudo a partir do período de dominação do Império Romano, onde se observa a existência de normas que regulavam a existência do instituto, o qual era dividido em três espécies distintas: a "confarretio", a "coemptio" e o "usus".

A "confarretio" era o casamento dos patrícios, ou seja, dos cidadãos romanos, e que correspondia ao matrimônio religioso, caracterizado pela oferta de um pão de trigo aos deuses, o que demonstra contemporaneamente, de modo estilizado, a origem do bolo de noiva. Todavia, no império romano, esta forma caiu em desuso.

A "coemptio" era o matrimônio dos plebeus, ou seja, aqueles que não eram cidadãos romanos, enquanto o "usus" era equivalente a um usucapião, já que a mulher era adquirida pela posse. Posteriormente, o instituto evolui até o casamento livre, no qual era exigido apenas a capacidade dos nubentes, o seu consentimento e a inexistência de impedimentos.

Com o passar do tempo, a Igreja se apodera dos direitos sobre a regulamentação e celebração do matrimônio, excluindo o Estado de qualquer participação.

Em um outro momento histórico, pelos mais variados fatores, os Estados começaram a rever esta situação. Todavia, a iniciativa foi tomada pelos ingleses, que passaram a regulamentar o instituto sem a interferência da igreja.

No Brasil, esta situação perdurou até o ano de 1861, quando o Estado regulamentou o casamento dos acatólicos, formados em sua grande maioria pelos imigrantes. Mais tarde, com o advento da proclamação da República, houve a separação entre o poder temporal e espiritual, conforme explica o Professor Washington de Barros. "Ex positis", desde então temos, entre nós, o casamento civil, apesar de a Constituição Federal de 1988, em seu art. 226, parágrafo segundo, equiparar o casamento religioso ao casamento civil.

1.1.2 - Conceito e natureza jurídica

Conceituar o casamento tem sido um grande desafio para os doutrinadores. Existem inúmeros conceitos para o matrimônio, de acordo com a concepção que cada um tem do instituto.

Vários exemplos interessantes podem ser encontrados no livro do Professor Washington de Barros, onde ele cita definições de vários autores. Entre as quais destacamos as seguintes: "fundamento da sociedade, base da moralidade pública e privada ", é a definição de Laurent. Para Shopenhauer, "casar é perder metade de seus direitos e duplicar seus deveres". Para Maugham, o casamento "é uma ridícula instituição dos filisteus". Outra definição que apesar de muito antiga, mas que deve ser mencionada é a de Modestino: "nuptiae sunt conjunctio maris et feminae consortium omnis vitae, divini et humani juris communicatio" (casamento é a conjunção do homem e da mulher, que se associam para toda a vida, a comunhão do direito divino e do direito humano.

Outros interessantes exemplos encontrados foram os dos ingleses Aldous Huxley, para quem o casamento "é um ato inoportuno e obsceno", e Lockeridge, que afirma ser o casamento "um tipo de funeral no qual emprestamos uma parte de nós mesmos".

Entretanto, juridicamente, adotamos o conceito de Washington de Barros, que conceitua o matrimônio como "a união permanente entre o homem e a mulher, de acordo com a lei, a fim de se reproduzirem, de se ajudarem mutuamente e de criarem os seus filhos".

Quanto a natureza jurídica do casamento, a doutrina também não chegou a um ponto pacífico, uma vez que existem duas correntes distintas no direito pátrio. A primeira corrente afirma que o casamento é de natureza contratual, tendo entre os seus adeptos o Professor Silvio Rodrigues, que o conceitua como sendo um contrato de direito de família, seguindo o mesmo raciocínio do ilustre jurista baiano Orlando Gomes.

A segunda corrente afirma que o casamento é uma instituição, tendo entre os seus adeptos a Professora Maria Helena Diniz e o ilustre jurista paulista Washington de Barros.

A corrente contratualista tem se apoiado no direito canônico, segundo a qual o consentimento dos nubentes é o fator preponderante na formação do vínculo matrimonial. Por este motivo, a Igreja entende que o casamento é um contrato. Da mesma forma a escola jusnaturalista acolheu esta concepção, a qual inspirou várias legislações, inclusive o Código de Napoleão.

Há doutrinadores que modernamente atribuem ao matrimônio a qualidade de um ato complexo, de natureza institucional, uma vez que depende da manifestação livre da vontade dos nubentes, mas que se completa pela celebração, a qual é ato privativo de representante do Estado.

Para a corrente institucionalista, existem diversos fatores que diferenciam o contrato da instituição. Nesse passo, a Profª. Maria Helena Diniz cita o jurista argentino Guilhermo Borda, que destacou tais diferenças de forma bastante elucidativa. Então vejamos: "a) o contrato é uma especulação (o vendedor procurando o preço mais alto e o vendedor o mais baixo); a instituição é um ´consortium´, onde os interesses são coincidentes; b) o contrato rege-se pela igualdade; a instituição pela disciplina; c) o contrato é uma relação que só produz efeitos entre as partes; a instituição impõe deveres tanto para as partes quanto para terceiros; d) o contrato é uma relação exterior aos contratantes, é um laço obrigacional; a instituição, uma interiorização; e) o contrato representa uma trégua na batalha dos direitos individuais, sendo produto da concorrência; a instituição, um corpo cujo destino é ser compartilhado por seus membros, portanto produto da comunicação; f) o contrato é precário, desata-se como foi formado, extinguindo-se com o pagamento; a instituição é feita para durar; g) o contrato é uma relação subjetiva de pessoa a pessoa; as relações institucionais são objetivas e estatutárias."

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Hodiernamente, a doutrina continua tentando determinar a natureza jurídica do matrimônio. Nesse passo, o Professor Orlando Gomes, destacou três formas, com as quais se tentou explicar a natureza jurídica do casamento. A primeira delas, afirma que o casamento teria a natureza jurídica de um negócio complexo, pois o simples consentimento dos nubentes não seria suficiente para sua formação, uma vez que também é necessário a intervenção da autoridade para que o ato se complete.

A segunda forma entende que o casamento é um acordo, pois haveria uma soma de vontades por parte dos nubentes. Todavia, a grande maioria da doutrina ainda não chegou a um consenso a respeito do acordo, mas a grande maioria entende que o acordo sempre se reduz a um contrato.

Finalmente, a terceira corrente entende que o casamento é um ato condição, porque as partes ao consentirem, necessariamente aderem ao estatuto matrimonial, ingressando na mesma situação jurídica das pessoas casadas, o qual tem que ser aceito sem qualquer alteração.

Dentre todas as correntes citadas, nos filiamos a corrente contratualista, pela origem do casamento no direito canônico, que o considerava um contrato e por entender que o casamento forma-se pelo acordo de vontades.

1.1.3 - conseqüências oriundas do casamento

Uma vez celebrado o casamento, várias conseqüências serão projetadas na vida social dos nubentes, nas suas relações econômicas, nos deveres a serem cumpridos por ambos, bem como nas suas relações com seus filhos.

Deste modo, a doutrina divide os efeitos do casamento em três categorias, que seriam: os efeitos sociais, os efeitos pessoais e os efeitos patrimoniais.

Os efeitos sociais seriam a criação da família legítima, conforme preceitua o art. 226, parágrafos 1º e 2º da Constituição Federal de 1988, combinado com o art. 229 do Código Civil; o estabelecimento do vínculo de afinidade entre cada cônjuge e os parentes do outro; emancipação do cônjuge de menor idade, conforme determina o art. 9º, parágrafo primeiro, inciso II do Código Civil e a constituição do estado de casado.

Quanto aos efeitos pessoais do casamento, destacamos os direitos e deveres de ambos os consortes que seriam o de fidelidade mútua, coabitação e mútua assistência, todos regulados no Código Civil, em seu art. 231. Além destes, existem os direitos e obrigações do marido, regulados no art. 233 ao 239 do Código Civil, bem como os direitos e deveres da mulher, regulados no art. 240 ao art. 255 do mesmo diploma legal.

Finalmente, quanto aos efeitos matrimoniais do casamento, estes irão variar de acordo com o regime de bens, que pode ser o da comunhão parcial de bens, no qual os bens adquiridos a partir da celebração do casamento serão de ambos os cônjuges, conforme estabelece o art. 269 e seguintes do CC. Caso o regime seja o da comunhão universal, todos os bens pertencentes aos cônjuges serão integrantes do patrimônio do casal, conforme determina o art. 262 e seguintes do CC. Finalmente, caso o regime seja o da separação de bens, os bens de cada cônjuge permanecerá sob a sua exclusiva administração, conforme os arts. 276 e 277 do CC.

1.2 - HOMOSSEXUALISMO

1.2.1 - conceito e espécies de homossexualismo

Etimologicamente a palavra homossexual é formada pela junção dos vocábulos "homo" e "sexu". Homo, do grego "hómos", que significa semelhante, e sexual, do latim "sexu", que é relativo ou pertencente ao sexo. Portanto, a junção das duas palavras indica a prática sexual entre pessoas do mesmo sexo.

Sob o ponto de vista médico legal, homossexualismo configura a atração erótica por indivíduos do mesmo sexo, atingindo aos dois sexos, ou seja, pode ser praticado entre homens ou entre mulheres, sendo denominado, portanto, homossexualismo masculino e homossexualismo feminino.

Na literatura médico legal brasileira, mais precisamente nos livros "Manual de Medicina Legal" de Delton Croce e Delton Croce Júnior e o clássico "Medicina Legal" do Professor Hélio Gomes, a homossexualidade é tratada como "aberração sexual" e "perversão sexual", respectivamente.

As duas obras abordam a homossexualidade masculina e feminina, indicando outras denominações, tais como uranismo, pederastia e sodomia. Uranismo, segundo Ulrichs, citado por Delton Croce, é a prática sexual entre homens, por falta de mulher. Já a Pederastia é caracterizada pela relação ano-sexual de um homem com uma criança ou menino. A Sodomia é a prática sexual entre homens, ambos adultos.

Relativamente à homossexualidade feminina, os autores supramencionados também fazem uma tripartição didática, utilizando-se dos vocábulos safismo, lesbianismo ou tribadismo. A palavra lesbianismo deriva de Lesbos, ilha onde antigamente vivia um grupo de mulheres homossexuais chefiado pela poetisa Safo. As tribadistas atritam os órgãos sexuais em práticas recíprocas. Já as safistas ou lésbicas, praticam a sucção do clitóris, alternativamente, ou se masturbam reciprocamente.

1.2.2 - origens e evolução histórica

O cientista inglês George V. Hamilton pesquisou o comportamento dos macacos e concluiu que a homossexualidade está presente não só entre os primatas, mas também em inúmeros animais mamíferos, observa-se a prática do homossexualismo.

O Homossexualismo também é encontrado entre muitos povos selvagens, como também nas antigas civilizações, visto que era conhecida e praticada pelos romanos, egípcios, gregos e assírios. Entre outros povos chegou a ser relacionada à religião e a carreira militar, pois a pederastia era atribuída aos deuses Horus e Set, que representavam a homossexualidade e as virtudes militares entre os cartagineses, dórios, citas e mais tarde pelos normandos. Todavia, foi entre os gregos que o homossexualismo tomou maior feição, pois além de representar aspectos religiosos e militares, os Gregos também atribuíam à homossexualidade características como a intelectualidade, estética corporal e ética comportamental, sendo por muitos considerada mais nobre do que o relacionamento heterossexual.

Com o advento do Cristianismo, a homossexualidade passou a ser encarada como anomalia psicológica, sendo considerada um vício baixo, repugnante, sendo inclusive considerada crime entre os ingleses até a recente década de 60. Nos países islâmicos, ainda hoje o homossexualismo é considerado um tipo delituoso por ser contrário aos costumes religiosos

Na Idade Média, segundo alguns historiadores, a homossexualidade floresceu nos mosteiros e acampamentos militares. No período Renascentista, vários intelectuais da época como Miguel Ângelo e Francis Bacon cultivaram paixões homossexuais.

A homossexualidade também é comum entre as mulheres, inclusive entre mulheres casadas e adolescentes, atingindo percentuais bem próximos dos homens.

Outra questão importante, é saber se a homossexualidade é adquirida ou é congênita. A questão também não apresenta um ponto de vista pacífico, pelo menos sob o ponto de vista científico. É cientificamente provado que existem indivíduos que geneticamente nascem com uma diferença hormonal, que se exterioriza através de comportamentos não comuns ao sexo original, ou seja, nos homens verificam-se traços afeminados e nas mulheres traços masculinos, seja na aparência física, seja no comportamento. Todavia, estas características não estão presentes em inúmeros casos, onde verifica-se a prática da homossexualidade entre indivíduos que externamente não apresentam nenhuma característica homossexual em seu comportamento. A Psicanálise também verificou a ocorrência da homossexualidade em um momento tardio da vida do indivíduo, ou seja, mesmo após uma longa parte de sua vida mantendo relações exclusivamente heterossexuais, inúmeros indivíduos passaram a manter relacionamentos homossexuais de forma intensa e apaixonada.

Contemporaneamente, a homossexualidade passa por uma fase de maior abertura, isto é, há uma tendência maior à sua aceitação pelas sociedades modernas, especialmente no ocidente.

Hoje é comum observar a existência de entidades e organizações criadas para defender os interesses dos homossexuais, tal como o "DIALOGAY", aqui em Sergipe.

Também na capital sergipana foi celebrada uma cerimônia que, simbolicamente, resultou no "casamento" entre dois homossexuais, sendo tal fato amplamente divulgado pela imprensa local, causando grande polêmica.

Mais recentemente, foi divulgado no jornal CINFORM, nº 703, na coluna Olho Vivo, assinada pelo jornalista Márcio Lyncoln, a seguinte notícia:

" O Nordeste vem quebrando dia-a-dia as regras da rusticidade e das definições machistas preestabelecidas, superando muitas vezes as outras regiões do país tidas como plugadas com a modernidade.

Aqui em Aracaju, no mês de março, o CINFORM registrou o casamento entre dois indivíduos do sexo masculino. Em Teresina (PI), uma Boate resolveu inovar oferecendo um musculoso rapaz como prêmio ao vencedor de um bingo gay pilotado pela casa de diversões. O primeiro colocado levou o vitaminado modelo a um motel da cidade, com tudo pago, para duas horas de ´aquendação´. Se a moda pega..."

Portanto, apesar de se tratar de um estado nordestino, caracterizado pela figura do "cabra-macho", dos "coronéis" e de uma forte influência religiosa, a sociedade sergipana já encara a questão do homossexualismo com outros olhos. Tanto é assim, que uma recente pesquisa realizada na cidade de Aracaju, concluiu que a maior parte dos entrevistados é favorável a união entre pessoas do mesmo sexo, como também ocorreu em outras capitais do sul do Brasil.


2 - DESENVOLVIMENTO

2.1 - ATOS JURÍDICOS

2.1.1 - CONCEITO E ESPÉCIES

Não há como falar sobre atos jurídicos, sem antes falar sobre os fatos jurídicos. Desta forma, cabe agora definir o que vem a ser um fato jurídico. O Código Civil Brasileiro, no Livro III, do art. 74 ao art. 80, traz as disposições preliminares sobre os fatos jurídicos, que seriam entendidos como sendo tudo aquilo a que a norma jurídica atribui um efeito jurídico, ou seja, é o elemento que dá origem aos direitos subjetivos. Portanto, seriam os acontecimentos em virtude dos quais nascem, se extinguem ou subsistem as relações jurídicas.

Doutrinariamente, a expressão fato jurídico é empregada em "lato sensu" e "strictu sensu". No sentido amplo, fato jurídico é todo evento, dependente, ou não, da vontade humana, a que o direito atribui eficácia.

O fato jurídico em sentido restrito, seria todo ato de vontade humana que produz efeitos jurídicos. Desta forma, seriam considerados fatos jurídicos, em sentido amplo, os acontecimentos naturais, tais como o nascimento, a morte, o decurso de tempo, a maioridade, etc. Já em sentido restrito, seriam considerados fatos jurídicos, ou atos jurídicos, ou ainda negócio jurídico, teríamos o casamento, os contratos, etc.

Deste modo, verificamos que conceitualmente falando-se, existe diferença entre fato e ato jurídico. Uma vez que o fato jurídico é o gênero do qual o ato jurídico é espécie. Aquele é um acontecimento natural, que não depende da vontade humana para ser concretizado, enquanto este é um acontecimento voluntário, produto da vontade, desejado pela pessoa.

Observando o Código Civil, no seu art. 81, encontramos o conceito de ato jurídico: "Todo ato lícito, que tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos, se denomina ato jurídico."

Ainda observando o Código, verificamos no art. 82, que os atos jurídicos só terão validade quando forem praticados por um agente capaz, quando for lícito o seu objeto e quando sua forma for prescrita ou não defesa em lei.

Também verificamos que os atos jurídicos possuem elementos constitutivos, denominados pelos antigos romanos da seguinte forma: "essentialia negotii", "naturalia negotti" e "accidentalia negotii", ou seja, elementos essenciais, naturais e acidentais. Os primeiros são essenciais, ou seja, faltando alguns deles, o ato não existe. Por exemplo, na compra e venda são elementos essenciais a coisa, o preço e o consentimento. Como elemento natural, encontramos as conseqüências que decorrem do próprio ato, que seriam a obrigação do vendedor de responder pelos vícios redibitórios. Finalmente, em se tratando dos elementos acidentais, estes correspondem à faculdade dos agentes de modificar alguma de suas conseqüências naturais, como por exemplo, o prazo para pagamento ou entrega do bem.

2.1.2 - CASAMENTO COMO ATO JURÍDICO

Diante do conceito de ato jurídico e do conceito de casamento anteriormente expostos, fica evidenciado que o casamento vem a ser um ato jurídico, uma vez que o casamento somente se realiza quando houver o consentimento dos nubentes e a intervenção de uma autoridade para a sua consumação.

Evidentemente que esta óbvia conclusão somente será aceita caso estejam presentes todos os elementos essenciais dos atos jurídicos e do casamento.

Entre os elementos essenciais dos atos jurídicos, nos referimos aos elementos necessários a sua validade com tal, ou seja, os previstos no art. 82, especialmente a referência ao art. 145.

Da mesma forma, para que o casamento, como ato jurídico que é, uma vez que modifica a situação jurídica dos nubentes, deve observar a realização das formalidades preliminares, dos impedimentos e da sua celebração.

2.2. - CONSEQÜÊNCIAS JURÍDICAS DA LEI DE CONVIVÊNCIA ENTRE HOMOSSEXUAIS

2.2.1 - DIREITO BRASILEIRO

No direito brasileiro a convivência entre pessoas do mesmo sexo não tem nenhuma regulamentação. Deste modo, o Poder Judiciário pátrio já ficou frente a frente com situações em que casais homossexuais buscam a tutela jurisdicional, para solucionar litígios de natureza variada.

Recentemente, a televisão mostrou um caso interessante, ocorrido em Santa Catarina, no qual dois homossexuais viviam sob o mesmo teto, sendo um brasileiro e o outro inglês. Acontece que o inglês tinha um passaporte com visto de permanência temporário, o que lhe obrigava a retornar à Inglaterra para renovar o seu visto, uma vez que as autoridades brasileiras lhe negaram o visto permanente, alegando que a situação só se resolveria em virtude do casamento com uma brasileira ou se tivesse filhos brasileiros. A solução adotada pelo casal, foi o casamento do inglês com a mãe do brasileiro.

Outro caso famoso, foi o do filho do Sr. Jorge Guinle, conhecido nas colunas sociais cariocas. Jorginho Guinle era homossexual declarado e vivia com outro homossexual, Marco Rodrigues, que era fotógrafo. Jorginho adquiriu o vírus da AIDS e veio a falecer. Abandonado pela família e pelos amigos, só obteve amparo e atenção de seu parceiro, que cuidou dele até o dia de sua morte. Assim sendo, o seu companheiro ingressou na Justiça para pleitear o seu quinhão na partilha dos bens deixados pelo "de cujus".

O caso causou polêmica, mas a Justiça foi favorável ao parceiro de Jorge, que teve a sua parte assegurada, em virtude dos serviços prestados durante o período em que conviveu com seu parceiro.

Do mesmo modo em dezembro de 1995, um Juiz de Porto Alegre concedeu a um homossexual o direito de morar no apartamento de seu companheiro que morreu em julho de 1995.

No Brasil , já existe desde 1995 um projeto que visa disciplinar a união civil entre pessoas do mesmo sexo. Trata-se do projeto de lei número 1.115, de autoria da deputada federal Marta Suplicy (PT/SP).

O referido projeto possui 18 artigos que objetivam, sobretudo, proteger os direitos à propriedade e à sucessão das pessoas do mesmo sexo que tiverem reconhecida a sua união civil.

Oportunamente, na terceira parte deste trabalho, o projeto da deputada Marta Suplicy será analisado de forma mais detalhada.

2.2.2 - DIREITO COMPARADO

Desde 1986 a Dinamarca reconhece alguns direitos patrimoniais entre casais homossexuais. A união civil foi legalizada em 1989.

A Noruega acompanhou a Dinamarca em 1992.

Nos Estados Unidos existem dezenas de cidades, entre elas São Francisco (1991) e Nova Iorque (1993), que reconhecem a casais homossexuais alguns direitos relativos ao patrimônio, seguro saúde e outros.

O parlamento sueco, desde 1o. de janeiro de 1995, reconhece a "paternariat", que oficializa os laços entre pessoas do mesmo sexo.

Barbro Westerholm, autora da "Lei da Parceria" sueca declarou que apesar da legislação ter entrado em vigor em 1995, já foi oficializada quase mil uniões. Médica heterossexual e deputada filiada ao Partido Liberal, afirmou que inspirou na legislação de outros países escandinavos.

Contudo, o Consulado da Suécia em Paris, não está autorizado a unir homossexuais suecos que sonham passar lua-de-mel na França. Segundo o Ministério francês das Relações Exteriores " a nossa concepção de ordem pública não permite o reconhecimento da união matrimonial de pessoas do mesmo sexo".

Desde setembro de 1995, diversos municípios franceses já entregaram alguns "certificats de vie commune" a casais homossexuais. Seu valor muito mais simbólico do que jurídico, todavia, permitem autorizar o debate de reconhecimento da aliança homossexual.

Na Holanda, em 16 de abril de 1996, com 81 deputados a favor e 60 contra, adotou-se uma proposta forçando a colisão governamental dos socialistas e liberais a apresentar até agosto de 1997, um projeto de lei permitindo o casamento entre homens ou mulheres. Os deputados seguiram o resultado de pesquisas de opiniões, as quais demonstraram que 70% da população é favorável a tal medida.

Sobre o autor
Jadson Dias Correia

advogado em Aracaju (SE), pós-graduado em Obrigações e Contratos

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CORREIA, Jadson Dias. União civil entre pessoas do mesmo sexo: (Projeto de Lei 1151/95). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 2, n. 10, 6 abr. 1997. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/554. Acesso em: 25 dez. 2024.

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