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Como uma relação de consumo pode invalidar a prática do Código Civil até mesmo em uma hipoteca

Agenda 05/04/2017 às 12:58

Se você comprou um imóvel de uma construtora e acha que vai perde-lo porque a hipoteca não foi quitada junto ao banco, leia meu artigo.

A súmula abaixo é apenas um exemplo de que se comprovada a relação de consumo em uma relação jurídica que estamos acostumados a tratar por leis ordinárias federais, por exemplo o código civil que regulamenta transações de compra e venda de imóveis, inclusive HIPOTECA, o cenário poderá mudar de figura completamente. Foi então o que aconteceu com as hipotecas firmadas entre as incorporadoras e os bancos, uma vez que a súmula mostra o caminho para exclusão do gravame no imóvel do antes "Adquirente" e agora "Consumidor" que tiver adquirido de uma construtora que lhe deu quitação, independente do pagamento da construtora em favor do banco.

Com isso podemos fazer analogia em qualquer outro caso em que as leis ordinárias forem contra nossa apelação, mas que possamos comprovar a relação de consumo para então aplicarmos o CDC que é lei superior para inversão de responsabilidades, ônus da prova, entre outras questões.

Tenha cuidado para não utilizar o conceito de má fé, uma vez que serão observadas diversas questões de adequação social. No caso das hipotecas firmadas entre as construtoras e os bancos, não houve o que discutir no quesito vulnerabilidade do consumidor e a justa inaplicabilidade das normas civis no que regem as transações imobiliárias. O mesmo não pode ser aplicado, por exemplo, em uma transação particular, onde, na falta de dever de cuidado, o "Adquirente", neste caso, não sendo um "Consumidor", compra do "Tramitente", neste caso não sendo "Fornecedor", um imóvel com gravame, seja HIPOTECA ou qualquer outro, não podendo então solicitar ao registro de imóveis a exclusão deste sem o cumprimento da obrigação ali contida.

Súmula 308 – STJ

“A HIPOTECA FIRMADA ENTRE A CONSTRUTORA E O AGENTE FINANCEIRO, ANTERIOR OU POSTERIOR À CELEBRAÇÃO DA PROMESSA DE COMPRA E VENDA, NÃO TEM EFICÁCIA PERANTE OS ADQUIRENTES DO IMÓVEL.”

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. SFH. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 12, 13 E 14 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. ALEGAÇÃO DE OFENSA A SÚMULA. INADMISSIBILIDADE. HIPOTECA DADA PELA INCORPORADORA EM FAVOR DO BANCO FINANCIADOR. INEFICÁCIA EM RELAÇÃO AO COMPRADOR. ENUNCIADO N.º 308 DA SÚMULA DESTA CORTE. 1. A ausência de manifestação do acórdão recorrido acerca de dispositivo legal indicado como violado impede o conhecimento do recurso especial. Súmula 211/STJ. 2. O recurso especial não se presta à análise de ofensa a súmula, a dispositivo constitucional ou a qualquer ato normativo que não se enquadre no conceito de lei federal, conforme disposto no art. 105, III, a, da CF/88. 3. A hipoteca concedida pela incorporadora em favor do banco financiador é ineficaz em relação ao particular, comprador do imóvel, ante a natureza peculiar das normas do SFH. Precedentes do STJ. 4. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (STJ – REsp nº 963.278 – MG – 3ª Turma – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJ 03.06.2011)

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos etc.

PAULO EDUARDO RODERO E OUTROS interpuseram recurso especial, com fundamento no art. 105, inciso III, alíneas 'a' e 'c', da Constituição Federal, contra acórdão proferido pela Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, que deu parcial provimento à apelação manejada nos autos da ação em que contendem com FONSECA E FREITAS COM. CONSTRUTORA LTDA, BANCO DE DESENVOLVIMENTO DE MINAS GERAIS S/A - BDMG e ESTADO DE MINAS GERAIS. O acórdão recorrido foi ementado nos seguintes termos:

Apelação cível. Ação ordinária de cancelamento de registro e hipoteca c/c ação de adjudicação compulsória de imóvel. Aquisição de imóvel junto a construtora, sobre o qual pendia garantia real (hipoteca), registrada em cartório antes da compra do bem pelos Autores. Incidência do Código de Defesa do Consumidor em operação de crédito bancário. Inadequação do pedido de pré-questionamento, ante a ausência de qualquer abusividade quanto às relações de consumo que regem o contrato firmado. Validade da hipoteca, não havendo que se falar em boa-fé dos adquirentes, eis que a compra do imóvel se deu após a origem e inscrição da garantia real sobre o mesmo, situação em que não cabe a alegação de boa-fé por parte dos adquirentes, pois a eles foi conferida oportunidade de conhecimento prévio sobre o ônus da hipoteca. Recurso a que se dá parcial provimento, para alterar os honorários sucumbenciais fixados em sentença.

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Sustentaram que o acórdão recorrido violou os arts. 12, 13 e 14 do Código de Defesa do Consumidor e a Súmula n.º 308 desta Corte. Alegaram que o acórdão recorrido deu a lei federal entendimento diverso daquele pacificado por este Tribunal, apontando a necessidade de se declarar a nulidade da garantia hipotecária, determinando seu cancelamento junto ao Registro de Imóveis competente. Defenderam a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso em tela. Argumentaram que as regras gerais relativas à hipoteca não são aplicáveis à hipótese em comento, considerando que é de conhecimento do agente financiador que as unidades habitacionais que lhe foram dadas em garantia pela construtora destinam-se à venda a terceiros, que não responderão pela eventual inadimplência da construtora. Asseveraram que o consumidor, adquirente de boa-fé, após a quitação do valor do imóvel, tem o direito de efetuar o registro imobiliário de seu bem sem que sobre ele incida qualquer ônus real que tenha sido objeto de avença entre a construtora e o banco financiador. Reiteraram que a garantia hipotecária instituída em favor do agente financiador não pode alcançar o direito dos promitentes compradores, citando julgados desta Corte nesse sentido. Defenderam que o contrato deve ser interpretado de forma favorável ao consumidor, mormente considerando seu caráter adesivo. Requereram o provimento do recurso.

O ESTADO DE MINAS GERAIS apresentou as contrarrazões, nas quais sustentou a inadmissibilidade do recurso, em razão da aplicação do enunciado 284 da Súmula deste Tribunal. Apontou, ainda, estar ausente o prequestionamento dos dispositivos legais tidos por violados. Afirmou não estar caracterizado o dissídio jurisprudencial, em razão da ausência de cotejo analítico entre o acórdão recorrido e os acórdãos citados. No mérito, afirmou a impossibilidade de cancelamento da hipoteca e a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor.

Relatei.

Passo a decidir.

No tocante à alínea a do inciso III do art. 105 da Constituição Federal, o recurso especial não deve ser conhecido.

De um lado, os enunciados normativos dos arts. 12, 13 e 14 do Código de Defesa do Consumidor não foram devidamente prequestionados pelo acórdão recorrido, razão pela qual, em relação a eles, incide o óbice da Súmula 211 desta Corte.

De outro lado, não pode ser conhecido o recurso quanto à suposta violação à Súmula 308/STJ, pois os verbetes ou enunciados dos tribunais não se equiparam às leis federais para a finalidade prevista no art. 105, inciso III, da Constituição Federal.

No que concerne à alínea c do permissivo constitucional, conquanto os recorrentes não tenham procedido ao necessário cotejo analítico, entendo haver dissídio notório entre o acórdão recorrido e os julgados cujas ementas foram transcritas, devendo ser examinado o mérito da irresignação, que diz respeito à ineficácia da hipoteca instituída em favor do agente financiador em relação aos promitentes compradores.

Este Superior Tribunal de Justiça tem entendimento assente no sentido de que, diante das peculiaridades do contrato regente do Sistema Financeiro de Habitação, é ineficaz perante o adquirente de unidade habitacional a hipoteca concedida pela empresa incorporadora em favor da instituição financeira.

Nesse sentido, foi editado o enunciado n.º 308 da Súmula desta Corte, verbis :

Súmula 308 - A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel.

A propósito:

RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. IMÓVEL HIPOTECADO. GRAVAME FIRMADO ENTRE A CONSTRUTORA E O AGENTE FINANCEIRO. INEFICÁCIA EM RELAÇÃO AO ADQUIRENTE. SÚMULA 308/STJ. 1. "A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel" (súmula 308/STJ). 2. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. (REsp 593.474/RJ, Rel. MinistroPAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/11/2010, DJe 01/12/2010 )

CIVIL E PROCESSUAL. ACÓRDÃO. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. RECURSO ESPECIAL. PREQUESTIONAMENTO INSUFICIENTE. EMPREENDIMENTO HABITACIONAL. HIPOTECA INCIDENTE SOBRE UNIDADE AUTÔNOMA. PAGAMENTO INTEGRAL DO DÉBITO PELOS PROMITENTES COMPRADORES. CONSTRUTORA QUE NÃO HONROU SEUS COMPROMISSOS PERANTE O BANCO FINANCIADOR DO EMPREENDIMENTO. EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA. EMBARGOS DE TERCEIRO. PROCEDÊNCIA. I. Ausência de prequestionamento em relação à temática vinculada à Lei de Falencias. Incidência das Súmulas ns. 282 e 356 do C. STF. II. O adquirente de unidade habitacional somente é responsável pelo pagamento integral da dívida relativa aos imóvel que adquiriu, não podendo sofrer constrição patrimonial em razão do inadimplemento da empresa construtora perante o banco financiador do empreendimento, posto que, após celebrada a promessa de compra e venda, a garantia passa a incidir sobre os direitos decorrentes do respectivo contrato individualizado, nos termos do art. 22 da Lei n. 4.864/65, de sorte que havendo a quitação do preço respectivo, o gravame não subsiste. III. Precedentes do STJ. IV. Recurso especial não conhecido. (REsp600.528/PR, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 13/09/2005, DJ 17/10/2005, p. 300)

CIVIL E CONSUMIDOR. IMÓVEL. INCORPORAÇÃO. FINANCIAMENTO. SFH. HIPOTECA. TERCEIRO ADQUIRENTE. BOA-FÉ. NÃO PREVALÊNCIA DO GRAVAME. 1 - O entendimento pacificado no âmbito da Segunda Seção deste STJ é no sentido de que, em contratos de financiamento para construção de imóveis pelo SFH, a hipoteca concedida pela incorporadora em favor do Banco credor, ainda que anterior, não prevalece sobre a boa-fé do terceiro que adquire, em momento posterior, a unidade imobiliária. Súmula 308 do Superior Tribunal de Justiça. 2 - Agravo regimental não provido. (AgRg no Ag 664.695/RJ, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 02/08/2005, DJ 22/08/2005, p. 296)

Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial, para reconhecer a ineficácia da hipoteca perante os recorrentes, determinando o seu cancelamento.

Mantenho os ônus de sucumbência arbitrados pelo acórdão recorrido com relação à ré Fonseca e Freitas Com. Construtora LTDA e inverto-os com relação ao Estado de Minas Gerais, condenando-o ao pagamento do restante das custas processuais e de honorários advocatícios aos patronos dos autores, arbitrados em R$1.500,00.

Publique-se.

Intimem-se.

Brasília (DF), 31 de maio de 2011.

MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO – Relator.

Dúvidas: kallel@grupo.fr

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Defesa dos direitos do consumidor em transações imobiliárias, mostrar que uma hipoteca não é absoluta quando em conflito com o CDC.

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