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Os reflexos do uso pessoal da maconha no poder público e o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado

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Reflexões acerca da violação do princípio da supremacia do interesse público, frente à liberação da maconha. Saiba um pouco mais sobre isso.

RESUMO: O presente trabalho tem como tema a análise da violação do princípio da supremacia do interesse público, frente a liberação da maconha,tendo em vista os reflexos negativos que o uso pessoal traz a sociedade num todo. Destarte, os princípios individuais não podem prevalecer, haja vista prejudicar de maneira generalizada um meio social, do contrário, o princípio basilar coletivo, considerado de maior relevância, será ferido. Ademais, as consequências dos já sucateados serviços públicos essências como saúde, educação e segurança, seriam ainda mais agravadas, tendo em vista que o uso pessoal da maconha, num contexto geral, aumentaria em demasia, a demanda no atendimento à população.

Palavras-chave: Descriminalização da Maconha; Interesse Público; Segurança Pública; Lei n. 11.343/2006.


1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como tema a análise os reflexos causados na sociedade pelo uso pessoal da maconha, levando em consideração o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado. Assim, será verificado os prejuízos que a maconha traz ao corpo social, não podendo os princípios individuais prevalecerem, haja vista prejudicar de maneira generalizada um meio social, devendo-se aplicar o princípio basilar coletivo, considerado de maior relevância.

Para tanto, busca-se apresentar os efeitos trazidos pela droga tanto socialmente quanto para o usuário exclusivamente, informando mediante dados médicos os efeitos físicos e psíquicos que esta causa.

Assim, valendo-se de pesquisas, será demonstrado os danos causados pela maconha no organismo, na família e na vida social do usuário. Sendo, portanto, enfatizado que esses danos fogem da esfera individual e atingem toda uma sociedade, refletindo na educação, na segurança pública e principalmente na saúde pública, que se acentuará em longo prazo.


2 O PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO SOBRE O PRIVADO

O princípio da Supremacia do Interesse Público não encontra disposto na Constituição Federal de 1988, conquanto seja um dos princípios mais importantes do ordenamento jurídico brasileiro. Isso, porque a ele está atrelado o princípio da Indisponibilidade do Interesse Público, também implícito no ordenamento constitucional, com literalidade expressa somente no direito administrativo.

Os dois princípios encontram-se atrelados e dizem respeito ao direito administrativo, pois estão diretamente ligados à Administração Pública, e primam pela supremacia da coletividade em detrimento do particular, ou seja, primam pelo interesse público em detrimento do privado (DI PIETRO, 2013):

O principio do interesse Publico está expressamente previsto no artigo 2º, caput, da Lei nº 9.784/99, e especificado no parágrafo único, com a exigência de “atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei” (inciso II). Fica muito claro no dispositivo que o interesse Público é irrenunciável pela autoridade Administrativa. (DI PIETRO, 2013, p. 66).

O princípio do interesse público existe para formalizar o instituto que atende as finalidades de interesses gerais, cujos fins são coletivos, envolvendo toda a população. As atividades de interesses gerais ou coletivos, em razão do princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, são sempre colocadas em primariedade, haja vista a necessidade de se prezar por uma norma coletiva antes de qualquer coisa.

Neste sentido, prevalece o Princípio da Supremacia do Interesse Público, quando houver conflito entre o interesse público e o privado, prevalecendo o primeiro, respeitando-se, contudo, os direitos e garantias individuais expressos na Constituição. Para Mello (2012), prevalecer os interesses da coletividade perante os interesses particulares é pressuposto lógico de toda ordem social, cujas prerrogativas se apresentem a favor da Administração Pública.

Desta feita, a legalização para o uso pessoal da maconha, crime atualmente estipulado no art. 28 da lei nº 11.343/06, ofende de forma notória o princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o Privado. Igualmente, o Estado já demonstra de forma objetiva a falta de estrutura no atendimento à população com os problemas já existentes. Portanto, é de presunção absoluta que a descriminalização, agravaria ainda mais a prestação do serviço advindo dos institutos constitucionalmente resguardados, como saúde, educação e segurança pública, os quais já se apresentam problemáticos.

2.1 Os Reflexos da Maconha na Saúde Pública

A saúde pública é um bem jurídico tutelado pelo Estado e colocado a disposição de toda a sociedade. Como apresentado anteriormente, por ser de interesse coletivo tem respaldo no princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, prevalecendo sempre que o direito privado cercear o direito, acesso ou até mesmo prejudicar a saúde pública.

A liberação para o uso da maconha é um tema bastante preocupante, pois do ponto de vista particular, o indivíduo pode fazer o que quiser, respeitando o seu direito constitucional de ir e vir. Todavia, a maconha é droga e como toda droga prejudica a saúde de quem usa. Esse prejuízo quando afeta apenas o indivíduo, por vontade própria, o Estado não pode intervir nem fazer muito. Ocorre que, afetando a saúde de quem usa a droga, o Estado passa a ter a obrigação de cuidar através do sistema de saúde pública, dever do Estado e direito do cidadão.

A partir do momento em que o Estado toma pra si a responsabilidade da saúde de cada indivíduo, o uso da maconha não passa a ser apenas de interesse individual e se estende para o interesse coletivo, haja vista a utilização do sistema de saúde oferecido gratuitamente (MACHADO, 2011), assim preceitua o autor:

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que permitiu passeatas pela descriminalização da maconha trouxe o assunto da liberação para o debate, nesta semana. O SRZD consultou especialistas em prevenção de dependência química e também da Associação Brasileira de Alcoolismo e Drogas para saber se o entorpecente oferece algum benefício para população. Eles se declararam a favor do debate sobre o tema, mas enfatizaram que o país ainda não está preparado e que a droga seria mais um problema (MACHADO, 2011).

De acordo com Jaber citado por Machado (2011), destaca que o país ainda não está preparado para a descriminalização, podendo ser a droga mais um problema, especialmente para a saúde, conforme se observa:

A liberação da maconha vai trazer um problema de saúde pública para o Brasil. A nossa rede de saúde não está preparada para atender os casos. (...). Fumar não faz bem aos pulmões vai causar mais problemas pulmonares e também ocasionar alguns problemas mentais, como alguns casos de surtos psicóticos e outras síndromes. A maconha pode afetar a memória recente (JABER apud MACHADO, 2011).

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Como apresentado por médicos e científicos da área, é possível perceber que a Saúde Pública ficará eminentemente sobrecarregada e ineficiente com o seu uso exacerbado. Primeiro, do ponto de vista coletivo o Estado não tem condições de atender a demanda trazida pela descriminalização. Outrossim, deve-se realizar pesquisas mais profundas, pois do ponto de vista individual, mesmo que cada indivíduo seja responsável por gerir sua vida e saúde, é notório que o uso da maconha é prejudicial.

O ato de fumar vai causar mais problemas pulmonares e a droga, mesmo que em pequena proporção possui efeitos alucinógenos capazes de causar distúrbios mentais (MACHADO, 2011). O Dr. Dráuzio Varella, para tratar do assunto, entrevista seu colega de profissão, médico Elisaldo Carlini, que desenvolve um trabalho de reação da Cannabis sativa no organismo humano. Assim, ele apresenta os efeitos psicóticos trazidos pelo uso da droga:

Existe outro efeito curiosíssimo da maconha: ela diminui a taxa de testosterona circulante nos homens e reduz o número de espermatozoides, embora não os faça desaparecer completamente. Não interfere na libido, mas, se o homem quiser ter filhos, fumar maconha é mal negócio. Num congresso nos Estados Unidos, levantou-se até a possibilidade, não comprovada, de que seu uso constante pudesse representar o primeiro anticoncepcional masculino. Nesse caso, também, suspendendo-se o uso, a produção de espermatozóides volta ao normal (CARLINI apud VARELLA, 2011).

Logo, há que se comparar o direito individual de descriminalizar o uso da droga com seus consequentes efeitos na saúde do indivíduo de modo particular e a sua proibição, haja vista a obrigação do Estado em zelar pela Saúde Pública. Além de haver imensuráveis prejuízos à saúde, não há nenhum trabalho científico que comprove benefícios para quem fuma maconha:

Não há nenhuma experiência positiva sequer neste sentido em todo o mundo: sempre houve aumento no consumo de substâncias que fazem mal à saúde e podem causar dependência no momento da liberação, e os mais jovens são as maiores vítimas. Já encontramos casos de câncer de garganta e de boca  em jovens que fumam baseados. O efeito nocivo da maconha é mais lento que outras drogas e atualmente o teor psicótico que antes era de 0,5% agora esta quase 20 vezes maior( CARAKUSCHANSKY apud MACHADO, 2011).

Conforme se depreende, o uso constante da maconha pode ocasionar os mesmos problemas das pessoas que fumam tabaco, como asma, enfisema pulmonar, bronquite e câncer. Ademais, seu uso traz imensuráveis problemas a saúde individual e pública. Diante disso, o Brasil ainda não possui um sistema de saúde capaz de atender a excessiva demanda que geraria com a liberação da droga.

2.2 Os Reflexos da Maconha na Educação

A educação é um direito social, respaldado no princípio da igualdade entre as pessoas. Antes da promulgação da Constituição Federal de 1988 não havia uma obrigatoriedade do Estado em promover a Educação, não passando esta de uma mera assistência àqueles que não podiam pagar pelo aprendizado. Após o advento da Constituição, essa realidade mudou e hoje o interesse do Estado e a garantia constitucional de todo cidadão é o acesso a educação fundamental na rede Pública. É o que preceitua o art. 205 da Carta Maior:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRASIL, 1988).

O  direito surge com a sociedade, que necessita de normas de conduta para organizar o comportamento humano coletivo, valendo-se naturalmente da educação. Essas normas de conduta baseiam inicialmente nos valores morais e religiosos, aprimorando em seguida para uma educação organizada e formal, com a intervenção do Estado, pra assegurar e propiciar o ensino. Dessa forma, onde houver sociedade, haverá educação:

Todos aqueles que lutam ou atuam na defesa do direito à educação encontram no Direito um instrumento pedagógico-didático e jurídico fundamental, não apenas para disciplinar o comportamento humano, mas, sobretudo um instrumento para garantir a igualdade de condições para acesso e permanência na escola (JOAQUIM, 2017, p. 6).

Com a Constituição de 1988, o direito educacional toma a dimensão de direito social fundamental, conforme preceitua o artigo 6º:

Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta constituição (BRASIL, 1988).

Cumulado com este artigo da Constituição, o artigo 205, anteriormente citado, também traz para o direito educacional a dimensão política, pedagógica e ética, responsabilizando a família, o Estado e a sociedade. Nesse momento, o direito além de social também passa a ser fundamental. Na opinião de Joaquim, “todos têm o direito à educação, que é dever do Estado e da família, mas a sociedade tem a responsabilidade social de promover e incentivar a educação”. (JOAQUIM, 2017, p. 6).

A Carta Maior prevê em seu artigo 206 e 208 punições ao Estado, caso o mesmo não proporcione a educação básica obrigatória e gratuita, que vai dos 04 aos 17 anos de idade, se estendendo àqueles que a ela não tiveram acesso na idade própria.

Nessa vertente, aprofunda-se o direito a educação, relacionando-o com os reflexos que o uso da droga maconha pode acarretar. Jaber citado por Gandra (2014), se posiciona contrário a descriminalização do uso da droga e, defende seu ponto de vista também com base nos argumentos educacionais, apresentando que o uso da droga causa danos nos neurônios:

Ele (Jorge Jaber) disse à Agência Brasilque já está comprovado que o uso da maconha, em especial por pessoas jovens, compromete de forma significativa os neurônios. “Há uma morte dos neurônios cerebrais, que ocorre lentamente. Isso leva a um transtorno cognitivo, isto é, a uma perda da capacidade de memória e de desempenho intelectual. Então, sob o ponto de vista neurológico, há a destruição do cérebro”, informou (JABER apud GANDRA, 2014).

Wagner Bento também se posiciona sobre os reflexos da maconha na educação: “os efeitos reais sobre os jovens são inevitáveis: aumentando o consumo de maconha, aumentará também a evasão escolar – por confusão mental, diminuição da memória e rebaixamento da inteligência” (BENTO, 2014).

Diante dos dados apresentados, verifica-se que quando o Estado não se preocupa em promover a educação correta, ele sofre punições, já que a educação passou a ser considerada direito fundamental e social, relacionado a dignidade da pessoa humana. Destarte, a descriminalização do uso da maconha de pronto, conforme os dados médicos apresentados, provocaria perda da capacidade mental e evasão escolar, por confusão mental, diminuição da memória e rebaixamento da inteligência, despertando o desinteresse dos alunos em frequentar uma escola.

Ora, o direito fundamental a educação, que é um direito público e coletivo não pode, portanto, ser sobreposto ao direito individual e pessoal, provando mais uma vez que o país não deve autorizar o uso da droga.

Para Joaquim (2017), a concepção de educação foi ampliada e com ela a responsabilidade social, pois a educação hoje é um processo de toda a sociedade e não somente da escola. Dessa forma, o acesso educacional afeta as pessoas e as instituições, uma vez que toda a sociedade educa quando transmite e busca ideias, valores e conhecimentos.

Mais uma vez, a representação da educação e do direito a ela perante a sociedade transmite claramente a incompatibilidade com a liberação do uso da maconha. Os reflexos causados na sociedade com essa liberação seriam imediatos, já que atinge a parte neurológica do indivíduo. O Dr. Dráuzio Varela realiza brilhante entrevista sobre o assunto, relacionando a maconha e a memória:

Maconha e Memória.  Dráuzio – E em relação à memória, qual é o efeito da maconha?

Elisaldo Carlini– Em relação à memória, o efeito da maconha é bastante curioso e foi muito estudado em nosso departamento. Ela bloqueia a memória de curto prazo, isto é, a memória de pequena duração da qual precisamos num determinado instante e da qual nos desfazemos em seguida. Por exemplo: ao ouvir os números de um telefone, se tivermos que procurar papel e lápis para anotá-los, eles se esvairão de nossa memória e seremos obrigados a pedir que sejam repetidos, o que não acontecerá se tomarmos nota imediatamente. No entanto, muitas pessoas costumam queixar-se de lapsos de memória quando fumam maconha. Foi o que aconteceu com uma moça que trabalhava no PBX de um hotel e não conseguia completar as transferências de ligação porque se esquecia do número pedido segundos antes, o que não ocorria se não estivesse sob o efeito da droga, e com o jovem bancário que, mal acabava de atender um cliente no balcão, se esquecia do nome que deveria procurar no arquivo.

Esse efeito, que de fato existe, pode trazer grande prejuízo especialmente para os estudantes. Quem vive chapado o tempo todo não consolida a memória de longo prazo, uma vez que ela se solidifica pela repetição do que é registrado na memória de curto prazo. Trata-se, porém, de um efeito transitório que desaparece quando a pessoa se afasta da droga. (CARLINI apud VARELA, 2011).

Nessa perspectiva, não há como fechar os olhos para as garantias constitucionais e infraconstitucionais, assim com para a opinião desses renomados especialistas. A devida atenção as leis e aos médicos, leva ao entendimento de que maconha e educação não são conciliáveis. Ademais, precisa-se respeitar o direito primordial a vida, bem supremo tutelado e anterior a qualquer instituto jurídico positivado. Por isso, o direito à vida é visto não apenas no aspecto material, mas também pelo aspecto mental e  social, “levando em consideração não só as condições de sanidade física, mas, sobretudo as condições psíquicas, moral e uma vida digna, que certamente depende da educação” (JOAQUIM, 2017).

Assim como o corpo precisa de alimento para sobreviver, a mente precisa de conhecimento para existir. O conhecimento parte da educação. O uso da maconha corta a eficiência da educação perante o indivíduo e consequentemente, perante toda a sociedade. Como liberar o uso da maconha se o mesmo traz influências negativas diretamente ligadas a mente do indivíduo. Educação é considerada direito fundamental. Logo, é considerado indispensável à pessoa humana e sua existência digna, livre e igual. Por isso, não basta ao Estado reconhecer esse direito e formalizá-lo. O Estado tem o dever de concretizá-lo e incorporá-lo a sociedade.

Por fim, ainda existem dois argumentos relacionados ao psicológico e educacional capazes de impedir a descriminalização da droga, qual seja o direito de personalidade e o direito público subjetivo, respectivamente. O direito a educação é também considerado um direito de personalidade, uma vez que esta é o primeiro bem da pessoa, adquirido, exercitado e evoluído através da educação. Em uma vertente mais ampla, o direito a educação é também um direito público subjetivo e, por isso,  exige do Estado o dever jurídico em propiciar educação de qualidade e garantir seu acesso a todos incansavelmente.

2.3 Os Reflexos da Maconha na Segurança Pública

A segurança pública a cada dia agrava e passa a ser considerada problema fundamental e principal desafio ao estado de direito no Brasil. Os problemas estão relacionados com o gradual e exponencial aumento das taxas de criminalidade, sensação de insegurança  e impunidade por parte do governo, degradação dos espaços públicos, a violência policial, a ineficiência preventiva das instituições, a superlotação nos presídios, rebeliões, fugas, corrupção, tráfico, entre tantos outros intermináveis problemas e desafios para a política do Brasil.

Para citar os problemas da segurança pública, necessário seria uma dissertação apenas sobre o assunto, todavia, a relação aqui é apenas com a repercussão da descriminalização do uso da maconha.

É sabido, que a pena de prisão não é eficaz para quem foi autuado como usuário, mas a legalização de uma droga que traz sérios prejuízos ao homem também não é a melhor saída. Investimentos em infraestrutura para que as leis já em vigor sejam aplicadas de forma mais eficaz seria a melhor maneira de iniciar o combate aos males trazidos pelo uso da maconha, que saem da esfera individual , e atingem toda  coletividade, inclusive com os prejuízos públicos imensuráveis nas principais garantias constitucionais. O Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP provocou o seguinte comentário:

Os países com menor consumo de maconha, como Suécia e Japão, têm mais rigor e restrições. A solução não é colocar os usuários na prisão, mas nesses lugares há uma certa intolerância com o consumo. Ou vamos por esse caminho ou liberamos e aumentamos o uso. Será que a minoria vai determinar e pautar o que a gente quer como sociedade? (SÃO PAULO, 2016)           .

Diante do apresentado, verifica-se que antes de se realizar a liberação do uso de determinada droga, é extremamente necessário preparar e estruturar todo o país para receber a nova legislação não apenas de forma legal, mas principalmente de forma prudente, correta e serena, para que os problemas não se tornem maiores do que já são.

Antes mesmo de adentrar opinativamente pela descriminalização ou não, é necessário entender que o Brasil não possui cenário seguro para liberar o uso da maconha. Além do tráfico de drogas, existe o tráfico de pessoas, o tráfico de armas, a corrupção, os grandes assaltos e todos os outros crimes não relacionados com droga. Não obstante, existiria ainda o tráfico relacionado às outras drogas que não a maconha, ainda mais difíceis de serem combatidos.

O Coronel de Polícia Militar Mário Sérgio Duarte é contra qualquer facilitação legal de acesso às drogas, justificando sua opinião de forma consistente:

O pessoal pró-legalização assegura que a violência irá diminuir, porque não haverá disputa de mercados e cessará a corrida armamentista entre bandidos. “Será o fim dos fuzis em mãos criminosas”. Além disso, “os usuários irão usar droga sem impurezas, compradas em farmácias, ou até em mercados, sem riscos de sofrerem violência”, eles garantem. Eu não acredito nesses resultados positivos. Muito pelo contrário, vislumbro um crescimento da violência com a legalização. Primeiro porque as armas de guerra não são de “uso exclusivo do tráfico”. Ladrões de carro-forte, de banco, de cargas (cigarros, bebidas, alimentos, eletroeletrônicos, remédios e combustíveis são as mais visadas), todos usam fuzis. Só que, em poder dos traficantes, elas são aos milhares e serão “terceirizadas”, como eventualmente já fazem para os bandidos do asfalto (DUARTE, 2013).

A população carcerária é imensa ao ponto de fugir do controle governamental, acarretando fugas, investigações infrutíferas e falta de segurança para a população. Além de ser necessária uma readequação da segurança pública antes de liberar o uso da droga, para a sua liberação o país precisaria estar apto a realizar as internações compulsórias, passando a vê-las com maior relevância.

Isso porque, já foi provado acima, que o uso da maconha traz problemas mentais, psíquicos, e a saúde do usuário, prejudicando a educação e saúde pessoal. Se o uso é descriminalizado, não haverá mais penas, proibições ou meios de coerção para não se fazer mais uso da substância, haja vista esta não ser mais ilícita. Diante disso e, para tratar os problemas de saúde e psicológicos futuramente acarretados pelo uso, o país precisaria investir em clínicas públicas de recuperação e reabilitação de qualidade. Passaria a ser dever do Estado fornecer esse tipo de tratamento aos usuários de forma pública, já que o uso passaria a ser permitido.

Ora, se o país não tem, e ainda não se programou para modificar e evoluir suas estruturas sociais capazes de atender toda a população, não pode se falar em descriminalizar. A descriminalização é uma medida de política pública, assim como a estrutura governamental para receber essa nova legislação também é.

A citação a seguir traz uma breve explicação sobre a internação voluntária, involuntária e compulsória quando for o caso:

Quando a pessoa não quer se internar voluntariamente, pode-se recorrer às internações involuntária ou compulsória, e isso já foi definido pela lei há mais de 10 anos. É a Lei Federal de Psiquiatria (Nº 10.216, de 2001). De acordo com essa lei referida acima o familiar ou terceiros pode solicitar a internação involuntária, desde que o pedido seja feito por escrito e aceito como procedente pelo médico psiquiatra. A lei determina ainda que, nesses casos, os responsáveis técnicos do estabelecimento de saúde têm prazo de 72 horas para informar ao Ministério Público da comarca sobre a internação e seus motivos. O objetivo é evitar a possibilidade desse tipo de internação ser utilizado para a prática de cárcere privado. Para a internação compulsória não é necessária a autorização familiar. O artigo 9º da lei 10.216 estabelece a possibilidade da internação compulsória quando determinada pelo juiz competente, depois do pedido formal feito por um médico atestando que a pessoa não tem domínio sobre a sua condição psicológica e física, ou seja, está incapaz de autodeterminar-se em decorrência da dependência. De forma geral, a internação involuntária é um procedimento médico realizado no mundo todo há muitos anos e obedece a critérios objetivos, técnicos e médicos. A visão médica não vai deixar o dependente químico se matar em nome do demagógico e fictício discurso em prol da liberdade de se fazer o que se quer. O médico, no mundo todo, não acha que é um direito do ser humano se matar, pois entende que esse paciente geralmente está doente e tem de ser tratado. (PSIQWEB.MED, 2010).

Além de todos os problemas apresentados, que levariam com certeza ao caos da segurança pública no país, a descriminalização no cenário atual somente prejudicaria ainda mais a sociedade. Entrementes, mesmo que houvesse anteriormente uma readequação da segurança, em muito pouco, esta seria melhorada com a liberação do uso da droga.

A segurança é dever do Estado e garantia constitucional para toda a população, não podendo ser ainda mais prejudicada. O Estado deve se preocupar em não correr riscos de degradar ainda mais esse direito, que já se apresenta bem defasado à população que não pode contar efetivamente com segurança pública de qualidade.

Conforme visto neste capítulo, a saúde, a educação e a segurança, por serem públicas e de competência do Estado, prevalece a inserção do princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, sendo dever do Estado zelar por esses direitos acima de qualquer direito particular. Por isso é que mais uma vez, argumenta-se pela impossibilidade da liberação do uso da maconha, haja vista prejudicar direta e acentuadamente toda a estrutura estatal do país e colocar em risco toda a população, seja do ponto de vista social, educacional, político, de segurança, de saúde, dentre imensuráveis outros fatores.

Sobre os autores
Anderson Luiz Matheus dos Santos

Graduando em Direito, cursando o 9º período pela Faculdade Pitágoras de Betim (MG).

Gilcimar da Silva Vargas

Graduando em Direito, cursando o 9º período pela Faculdade Pitágoras de Betim (MG).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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