PROTEÇÃO INTERNACIONAL AOS DIREITOS DA MULHER NO TRABALHO
Indubitavelmente, ainda há enorme discriminação em relação à mulher no mercado de trabalho, o que não poderia passar desapercebido pelo Direito Internacional do Trabalho. Assim, a tentativa de diminuir as desigualdades entre homens e mulheres no mercado de trabalho está presente nos objetivos da OIT, que por meio de suas convenções e recomendações, influencia a legislação trabalhista dos seus Estados-membros no sentido de garantir proteção ao trabalho da mulher.
As primeiras convenções da OIT que possuem alguma relação com a questão de gênero foram ainda em 1919, o ano de criação da Organização. A Convenção nº 3 diz respeito aos direitos da mulher gestante e no pós-parto, proibindo-a de trabalhar durante seis semanas após o parto, mantendo-se por meio de indenização também prevista. Além disso, estabelece que ao retornar ao trabalho, a mulher deve ter assegurada uma folga para amamentação da criança (MAZZUOLI, 2011).
A proibição trazida pela Convenção nº 3 não garante exatamente um direito que busque a igualdade da mulher no mercado de trabalho. Muito mais parece que se buscou preservar a reputação e a “honestidade” da mulher, duas grandes heranças da sociedade patriarcal.
Ainda, tal convenção considera como “mulher” pessoa do sexo feminino, de qualquer idade ou nacionalidade, sendo casada ou não, conforme seu artigo 2º. Também, considera como “filho” qualquer filho, sendo legítimo ou não, avanços que as legislaçãos dos Estados-membros não possuíam.
A outra convenção datada de 1919 é a de nº 4. Ela refere-se ao trabalho noturno da mulher, estabelecendo o que é o período noturno e as diferenças entre os países. Além disso, traz a proibição para as mulheres de exercerem trabalho à noite, exceto quando o estabelecimento tem como empregados os mesmos de uma mesma família. Assim como a Convenção nº 3, a nº 4 parece também traduzir o pensamento da época, que valorizava o que chamavam de “mulher honesta”.
Novamente em relação ao trabalho noturno, existe a Convenção nº 89, de 1948, ainda proibindo as mulheres de exercer cargos nesse período, em empresa industrial, pública ou privada.
A próxima Convenção foi a nº 100, elaborada em 1953, que trata da remuneração. Ela traz como princípio que deve haver uma igualdade na remuneração de homens e mulheres que exerçam trabalho de igual valor.
Posteriormente, foi elaborada a Convenção nº 111, em 1958, que trata da discriminação baseada em raça, cor, sexo, religião, opinião política, nacionalidade ou origem social. Em seu artigo 1º, ela define o que é a “discriminação”:
“1. Para os fins da presente convenção o termo "discriminação", compreende:
a) Toda distinção, exclusão ou preferência fundada na raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou de tratamento em matéria de emprego ou profissão;
b) qualquer outra distinção, exclusão ou preferência que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou tratamento em matéria de emprego ou profissão, que poderá ser especificada pelo Membro interessado depois de consultadas as organizações representativas de empregadores e trabalhadores, quando estas existam e outros organismos adequados.
2. As distinções, exclusões ou preferências fundadas em qualificações exigidas para um determinado emprego não são consideradas como discriminação.
3. “Para os fins da presente convenção as palavras “emprego” e “profissão” incluem o acesso à formação profissional, ao emprego e às diferentes profissões, bem como as condições de emprego.”
Há uma previsão de proteção às mulheres em estado de gravidez ou amamentação em relação a trabalhos que provocam uma exposição ao benzeno ou produtos que o contém, na Convenção nº 136 da OIT, de 1971.
Além dessas, a Convenção nº 156 e a Recomendação 165 da OIT, datadas de 1981, tratam de trabalhadores com encargos de família, tendo como consideração o Parágrafo 14 do preâmbulo das Nações Unidas, de 1979, sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação da Mulher. Tal Convenção visa uma efetiva igualdade de oportunidade e de tratamento para homens e mulheres trabalhadores com responsabilidade com relação a seus filhos dependentes. Conforme seu artigo 3º:
“1. Com vista ao estabelecimento de uma efetiva igualdade de oportunidade e de tratamento para homens e mulheres trabalhadores, todo País-membro incluirá, entre os objetivos de sua política nacional, dar condições a pessoas com encargos de família, que estão empregadas ou queiram empregar-se, de exercer o direito de fazê-lo sem estar sujeitas a discriminação e, na medida do possível, sem conflito entre seu emprego e seus encargos de família.
2. Para fins do Parágrafo 1 deste Artigo, o termo "discriminação" significa discriminação no emprego ou profissão, conforme definido pelos Artigos 1º e 5º da Convenção sobre a Discriminação (Emprego e Profissão), de 1958.”
Sobre a proteção da maternidade, há também a Convenção nº 183, elaborada em 2000.
Na 100ª Conferência Internacional do Trabalho, ocorrida em 2011, foi discutido o tema “trabalho decente para as/os trabalhadoras/es domésticas/os”, do qual surgiu a Convenção sobre o Trabalho Decente para as Trabalhadores e os Trabalhadores Domésticos (nº 189) e a Recomendação nº 201, que possui o mesmo título. Ambas levam em consideração a divisão sexual do trabalho e a desvalorização do trabalho reprodutivo, bem como reconhecem o desrespeito aos direitos humanos e fundamentais do trabalho sofrido pelos trabalhadores/as domésticos/as.
Nota-se que há diversas convenções e resoluções em âmbito internacional do trabalho sobre as mulheres trabalhadoras. Contudo, ainda não existe plenamente uma garantia de dignidade nas relações de trabalho para elas, muito menos de igualdade de oportunidades.
Em todos os países, constata-se que ainda há diferença salarial entre homens e mulheres.
Como visto, a realidade das mulheres abrange tantas dificuldades, muitas delas inclusive ainda invisibilizadas, que seria impossível que meras previsões, em convenções internacionais, de igualdade entre homens e mulheres mudassem radicalmente tal situação.
CONCLUSÃO
A Organização Internacional do Trabalho, por meio de seus instrumentos jurídicos, busca há muitos anos uma proteção internacional ao direito dos trabalhadores.
As mulheres trabalhadoras, por estarem em situação mais desfavorável do que os homens receberam algumas proteções além das já existentes no Direito Internacional do Trabalho, como algumas convenções específicas sobre a questão de gênero.
Por fim, as dificuldades que as mulheres enfrentam no mercado de trabalho são diversas, a igualdade está longe de ser alcançada. As reais necessidades delas não são abarcadas por estas proteções buscadas pela OIT, pois a discriminação no âmbito do trabalho ainda é uma realidade presente na vida de todas as mulheres.
REFERÊNCIAS
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de direito internacional público. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
ALVARENGA, Rúbia Zanotelli de. A Organização Internacional do Trabalho e a proteção aos Direitos Humanos do trabalhador.
MAGALHÃES, Luana Elainy Rocha. O trabalho da mulher à luz da OIT.
MATEUS, Elizabeth do Nascimento. A Organização Internacional do Trabalho e os direitos humanos da mulher na contemporaneidade. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIII, n. 79, ago 2010. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8221>.
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 14 ed. São Paulo: LTR, 2015.
UCHOA, Marcelo Ribeiro. Mulher e mercado de trabalho no Brasil: um estudo sobre igualdade efetiva: baseado no modelo normativo espanhol. São Paulo: LTR, 2016.
VENTURI, Gustavo; GODINHO, Tatau. Mulheres Brasileiras e Gênero nos Espaços Público e Privado: uma década de mudanças na opinião pública. São Paulo: Fundação Perseu Abramo; Edições Sesc SP, 2013.