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Dano moral nos crimes contra a honra no distrito Riacho Pequeno, Município de Belém do São Francisco-PE

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7. Dados estatísticos da Comarca de Belém do São Francisco/PE

Em entrevista com o Chefe de Secretaria da Vara Única da Comarca de Belém do São Francisco/PE, foi dito pelo mesmo que tramitava no Fórum local muitos processos, entre os quais duas centenas são sobre os crimes contra a honra, e uma dezena se requer a aplicabilidade do dano moral. São cerca de quatrocentos termos circunstanciado de ocorrência. Além disso, é importante ressaltar que não se faz registro na Comarca de Belém do São Francisco/PE de nenhum processo que tramite sobre os crimes contra a honra que tenham como demandantes os habitantes de Riacho Pequeno.

PROCESSOS

VARA ÚNICA DA COMARCA DE BELÉM DO SÃO FRANCISCO

Nº de processos que tramitam na Comarca

4.572

Nº de processos recebidos no mês

60

Nº de processos sobre os crimes contra a honra

200

Nº de processos que tramitam sobre os crimes contra a honra que se requerem a aplicabilidade do dano moral

10

Nº de processos que se requer a aplicabilidade do dano moral por pessoas do Riacho Pequeno-Belém do São Francisco

0

Nº de sentenças proferidas no mês

69

Média das despesas

R$ 300,00

% de processos que se requerem a Justiça Gratuita

90%

Tempo usado para prolatar uma sentença

1 a 2 anos

FONTE: Levantamento feito pela autora nos meses de outubro a dezembro de 2015 na Vara Única da Comarca de Belém do São Francisco/PE.

A partir desses dados se nota que os litigantes do município, em sua grande maioria, são hipossuficientes econômicos, e que, considerando que o Juiz de Belém do São Francisco/PE exerce jurisdição dentro do território municipal, bem como no município de Itacuruba/PE, chegando a cerca de trinta e cinco mil jurisdicionados, e que dentre os processos apenas dez requerem o dano moral, então se conclui que são poucos os que buscam a reparação do dano na justiça no município, quando sua honra é violada.

No que se refere aos dados coletados acerca da ocorrência do dano moral nos crimes contra a honra no distrito Riacho Pequeno se verifica que mais de oitenta por cento dos entrevistados já foram vítimas de atos que trouxeram desonra a sua pessoa e que muitas destas, devido a aspectos culturais da localidade, não buscam a reparação do dano quando sua honra é violada.     

Nesse sentido, a autoridade judiciária local, o juiz Carlos Fernando Arias, relatou que praticamente não havia processos que demandavam a aplicabilidade do dano moral por injúria, difamação e calúnia e, nos casos que ocorrem, o que motiva as pessoas a requererem o dano não é a busca por uma resposta judicial, mas as pessoas veem a via judicial como uma forma de se vingarem da outra parte. Muitas pessoas, ainda, apontaram que a distância entre Riacho Pequeno e Belém do São Francisco/PE também se constitui um obstáculo para elas pleitearem seus direitos.

Portanto, os fatores relacionados acima, indicam que a aplicabilidade do dano moral, no que diz respeito aos crimes contra a honra, não tem sido promovida nesse contexto e a responsabilidade civil dos que praticam tais atos não tem sido reconhecida judicialmente, tendo em vista que o Poder Judiciário não tem sido acionado pelas pessoas vítimas da lesão.  Nesse sentido, Mauro Cappeletti e Bryan Garth:

Identificam, no movimento de acesso à justiça, três ondas e barreiras que deveriam ser superadas para que os indivíduos, sobretudo os mais carentes tivessem de fato, seus direitos garantidos, transformando-se em cidadãos. A primeira garantia da assistência jurídica aos pobres. A segunda se manifesta na representação dos direitos difusos e a terceira ocorre com a informalização de procedimentos de resolução de conflitos. (CAPPELETTI E GART apud SADEK, 2014, p. 58).

Ante o exposto, os referidos autores apontam a pobreza como fato social, o qual se constitui como obstáculo entre as pessoas e a justiça, no que se refere ao fato de que muitas pessoas, por serem pobres, não têm acesso a níveis elevados de conhecimento.

Isso resulta na falta de entendimento necessário para buscar o reconhecimento de seus direitos, isto é, as possibilidades jurídicas de exigi-lo judicialmente.

Esse fato ocorre na referida localidade Riacho Pequeno, na medida em que muitas pessoas desconhecem a existência de Defensorias Públicas e muito menos conhecem a sua função, as quais existem para suprir o problema da hipossuficiência, como se pode entender da leitura da Lei Federal n.º 1.060, de 1950, e do inciso LXXIV, do artigo 5º, da Constituição Federal, que dispõe: “O Estado prestará assistência integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”.

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No entanto, o juiz da comarca de Belém do São Francisco/PE, Carlos Fernandes Arias, acredita que a falta de conhecimento não é um problema, pois o mesmo em entrevista disse: “não acredito que a falta de conhecimento seja um problema, pois as pessoas por qualquer coisa estão buscando seus direitos”.

O mesmo, ainda, defendeu a ideia de que o excesso de formalidades não é um impedimento para as pessoas buscarem o acesso à justiça, mas ressaltou que as pessoas mais idosas geralmente compõem o grupo de pessoas que tem temor em relação à figura que o magistrado representa, ou seja, a sua imposição.

Acerca da linguagem muito técnica, uma das entrevistadas falou que tinha medo de não saber se expressar diante do juiz, e que isso se constituía um dos fatores que lhe desmotivava no que tange a busca dos seus direitos.

Essa realidade social é confirmada por Ailton Alfredo de Souza quando este leciona que:

A dominação legal se apresenta hoje, por meio do normativismo jurídico o qual, [...] pretende colonizar “o “mundo da vida” com suas disposições normativas, estrategicamente cunhadas na linguagem escrita e formal.

Nesta perspectiva, aos dominados resta obedecer sem questionar e, se questionar, o fará por meio de quem exerce a dominação, ou seja, advogados procuradores, promotores etc..., todos experts na linguagem falada pelo Estado de direito. (SOUZA, 2005, p.163).

Dessa forma, não se pode negar que o tecnicismo tem se colocado como um fator que distancia muitas pessoas de exercer diretamente os seus direitos, as quais estão obrigadas a se submeterem as imposições do Estado.

Acerca da morosidade esta se dá porque a quantidade de juízes e servidores não é suficiente para atender a imensidão de demandas.

O problema, no entanto, da celeridade da justiça não se resolve assim pelo que se entende da concepção de Maria Tereza Aina Sadek:

Argumentos baseados na necessidade de gerenciamento se contrapõem a esse diagnóstico focado no número insuficiente de juízes e servidores. Ao invés de “mais do mesmo”, alega-se que a organização do trabalho, o estabelecimento de metas, a administração de Varas e Tribunais teriam maior possibilidade de provocar diferenças significativas no grau de produtividade dos juízes, desembargadores, ministros e serventuários judiciais e, consequentemente, no combate a morosidade, do que o aumento de magistrados e servidores. A proposta encontra suporte em pesquisas que demonstrem os efeitos positivos do gerenciamento na morosidade processual. (SADEK, 2014, p. 62).

O planejamento das atividades é, pois, um instrumento eficiente para se chegar a bons resultados, no sentido de ele desencadeia de forma mais rápida o desentrave dos processos em trâmite no judiciário.

O juiz, da Comarca de Belém do São Francisco/PE, apontou medidas que poderiam ser tomadas para diminuir o número de processos do Judiciário: “Tem que mudar a estrutura do Poder Judiciário, tem que se criar meios extrajudiciais de resolução dos conflitos”. Para ele tem que acabar com a cultura de que tudo tem que se resolver em juízo, pois as comarcas vivem lotadas de processos.

Aliás, esse é um pensamento que é idealizado e defendido, majoritariamente, pelos operadores do direito.

Já no que diz respeito ao aspecto econômico, esse problema tem sido minimizado, pois, com a instituição de Defensorias Públicas, para atender aos hipossuficientes, isso vem representando um avanço muito grande para a justiça brasileira.

Permanece, no entanto, o desafio de educar as pessoas para recorrer aos mecanismos jurídicos para a busca efetiva da tutela jurisdicional quando sofrer ameaça dos direitos.

Maria Tereza Aina Sadek assevera: “Atendimento que não se restringe ao ajuizamento de ações junto ao judiciário, mas que engloba também uma série de atividades, desde a educação em direitos até a solução de conflitos extrajudicialmente”. (SADEK, 2014, p. 63). Logo, investir em meios alternativos de resolução de conflitos é um meio viável para a efetividade do direito.


8. Conclusão

Diante dos casos analisados, percebe-se que há no distrito Riacho Pequeno uma predominância dos valores morais, pois é costume das pessoas não resolverem seus conflitos com a intervenção estatal, pois quando ocorre algum fato que poderia dar ensejo a uma ação judicial, como nos casos configurados como crimes contra à honra, as pessoas em virtude de serem conhecidas entre si, e muitas vezes por questões religiosas, por não querer prolongar o conflito, acabam optando por não litigar na justiça porque acreditam que dessa forma se evitam contritos prolongados.

Além disso, muitos fatores como a falta de conhecimento, a morosidade processual, a linguagem incompreensiva e o medo de sofrer alguma vingança as impedem de recorrer à justiça.

Há também que se falar nos entraves psicológicos, como o medo do poder judiciário, a falta de interação com as formalidades e o tecnicismo exacerbado, típico do linguajar usado pelos operadores do direito, bem como o modus operandi, considerado difícil e o ambiente intimidador que são os tribunais. Esses aspectos foram apontados pelos entrevistados como obstáculos para a busca da tutela jurisdicional.

Devido à falta de costume que as pessoas não têm de lidar com autoridades como o Juiz, isso as levam, muitas vezes, a sentirem um determinado temor quando estas se deparam com situações que envolvem a justiça, pois a primeira lembrança que vêm as suas mentes é a figura da polícia e o uso abusivo de autoridade e devido aos fatos históricos abordados sobre a localidade em que envolve casos de justiça.

Além disso, devido à falta de informações, muitas pessoas têm uma imagem distorcida do que representa o aparelho repressivo, pois não conseguem discernir com mais profundidade o que representa e qual é a função dessas pessoas. É importante frisar que parte da população é analfabeta, e esse é o fator preponderante que impede às pessoas de buscar seus direitos, mas o problema não se resume ao analfabetismo na medida em que muitas pessoas concluíram o ensino médio e têm o ensino superior completo, pois lhes faltam a devida instrução, ou educação, para despertá-las para o exercício da cidadania.

Outro entrave que se constitui obstáculo é a morosidade processual, pois muitos dos entrevistados alegaram que a justiça é lenta e que se demoram muitos anos para se realizar um julgamento.

Durante a entrevista, foi perguntado ao juiz se ele conhecia os aspectos sociais do município, o que envolve o distrito de Riacho Pequeno, e ele em resposta afirmou: “conheço muito pouco”. Assim, esse fato revela que os juízes não estão inseridos na realidade dos jurisdicionados, pois ele, bem como a maioria dos magistrados, desconhece a verdadeira realidade na qual está inserido o povo belemita, e mais especificamente, a realidade do Riacho Pequeno, na medida em que muitas pessoas apesar de terem nível médio, superior, isso não lhes garantem que tenham conhecimento de seus direitos e de como pleiteá-los e principalmente aquelas pessoas que residem distante da Comarca, como as que moram nos distritos e nas fazendas circunvizinhas, onde o acesso é mais difícil.

Diante do exposto, conclui-se que a demanda de processos que requerem o dano moral nos casos configurados crimes contra a honra é pouca no município e pela pesquisa realizada não se faz nenhum registro de processo que tenha como demandantes os habitantes do Riacho Pequeno.  Tendo em vista esse aspecto, surge a necessidade de ampliar o acesso à justiça, buscando-se efetivar os direitos individuais, simplificando o formalismo exacerbado dos procedimentos que integram o processo, bem como a criação de outras formas de resolução desses problemas.

 Assim, além de combater o excesso de formalismo, é necessário criar outras formas de solucionar os litígios, o que funcionará como uma medida eficaz para reduzir a quantidade de processos que são impetrados no judiciário, pois, diante da lentidão com que são julgados os processos, surge à necessidade de combater a morosidade processual, minimizar os problemas da pobreza, como já vem sendo feito com a ampliação de acesso cada vez maior à justiça gratuita, da falta de acesso ao conhecimento dos mecanismos necessários para se pleitear no judiciário, permitindo às pessoas amplo acesso à cultura jurídica, impedindo que o acesso seja de poucos, combatendo, pois, a exclusão social daqueles que por fatores sociais, históricos, econômicos, culturais e psicológicos ficam a margem do cenário jurídico, arcando em decorrência disso com o ônus da desigualdade.

A educação se revela, também, um instrumento poderoso para tornar possível a efetivação da tutela jurisdicional dos direitos e, mais especificamente, no que se refere aos crimes contra a honra, pois é por meio dela que as pessoas terão a oportunidade de serem conscientizadas dos seus direitos, com a obtenção de informações. 

Por isso, é fundamental que os planos de educação elaborados para ser executados nas escolas contemplem o conhecimento básico da cultura jurídica, pelo menos, abrangendo na grade curricular a disciplina da Constituição Federal, pois essa será uma forma de despertar as pessoas para o exercício dos seus direitos.

Casos como esses, de injúria racial, que ocorrem diariamente, necessitam ser coibidos e o importante é que os ofendidos busquem a reparação do dano como uma forma de serem compensadas pela lesão de ordem moral e a integridade psicológica, bem como os juízes devem arbitrar um valor que faça o ofensor refletir sobre a sua conduta.

Portanto, o que falta é uma ampla socialização do conhecimento a respeito dos direitos das pessoas, por meio das instituições sociais, bem assim pelos meios de comunicação de massa e a criação de meios alternativos para que as pessoas possam buscar a tutela desses direitos.

Além disso, existe o problema da distância entre a Comarca local (sede do município) e o distrito de Riacho Pequeno, apontado como um obstáculo pelas pessoas para requererem a indenização pela lesão de seus direitos, sendo um argumento até razoável, de certa forma. Isso, pois, leva a pensar que as autoridades competentes deveriam facilitar o acesso das pessoas à justiça, criando algum meio extrajudicial dentro da própria localidade para que muitas pessoas tenham seus direitos tutelados.

Assim, muitas pessoas, sentir-se-iam motivadas a buscar a reparação do dano, bem como seria uma forma de reprimir os ofensores, na medida em que estes não se sentiriam livres para violar a honra de outras pessoas, sem que fossem punidos de alguma forma.


Referências

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Sobre os autores
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARROS, Jordana Rafaela Nogueira; PEREIRA, Manoel Messias. Dano moral nos crimes contra a honra no distrito Riacho Pequeno, Município de Belém do São Francisco-PE. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5299, 3 jan. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60310. Acesso em: 22 dez. 2024.

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