RESUMO: Pretende-se com o presente artigo, diante da complexidade que é o direito previdenciário, fazer uma abordagem sobre a fase recursal do processo administrativo no âmbito do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS e do Conselho de Recursos do Seguro Social – CRSS. O objetivo é contribuir com informações relevantes que podem garantir o exercício do direito do segurado na fase recursal de forma mais eficaz, tendo em vista que o desconhecimento das normas internas, somado às irregularidades praticadas pelo ente autárquico, obstaculizam, em muito, a obtenção do direito pretendido na prática. Os trâmites do recurso da interposição ao julgamento. Da sustentação oral das razões do recurso e sua importância no julgamento pelo CRSS.
Palavras-chave: Processo Administrativo Previdenciário. Fase recursal. Conselho de Recursos do Seguro Social – CRSS. Julgamento. Sustentação Oral no Processo Administrativo.
SUMÁRIO:1. Introdução. 2. O Processo Administrativo Previdenciário. 3. Fase Recursal. 4. Do Recurso. 5. Dos Órgãos Julgadores do Recurso. 6. Da Interposição do Recurso e Prazos. 7. Das Prioridades nos Julgamentos. 8. Processo Eletrônico – e-Recursos. 9. Do Julgamento e da Sustentação Oral do Recurso. 10. Conclusão
1.Introdução
Considerando que no processo administrativo previdenciário (PAP) a capacidade postulatória pode ser exercida por qualquer pessoa, pretende-se, com presente artigo fazer uma abordagem sobre as particularidades do recurso, considerando a importância da fase recursal no âmbito do processo administrativo previdenciário, em respeito aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.
Inicialmente, serão abordados pontos da legislação e das normas internas aplicáveis ao processo administrativo no âmbito do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e do Conselho de Recursos do Seguro Social (CRSS), com objetivo de analisar a fase recursal da interposição do recurso ao julgamento, inclusive, ponderando sobre a importância do uso da sustentação oral no julgamento.
2.O Processo Administrativo Previdenciário
O PAP inicia-se com o requerimento do segurado ou dependente, podendo igualmente ser instaurado de ofício pelo INSS ou por terceiro legitimado.
O processo administrativo decorre, portanto, do poder do INSS de administrar e manter benefícios previdenciários, e também do direito de petição constitucionalmente assegurado aos segurados e dependentes. (LAZZARI, CASTRO, KRAVCHYCHYN, 2016, p.239).
Não há uma lei específica que regule o processo administrativo previdenciário. Suas bases estão presentes em diversas leis e normas, das quais a principal é a Lei nº 9.784/99, por ser a única lei que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.
A finalidade da Lei 9.784/99 está em seu primeiro artigo, que assim dispõe:
Art. 1º Esta Lei estabelece normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta, visando, em especial, à proteção dos direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da Administração.
O processo que tramita tanto no INSS quanto no CRSS, na fase recursal, deve obedecer não só ao que disciplina a Lei Federal nº 9.784/99 como também às normas internas dos respectivos órgãos, a Instrução Normativa INSS/PRES nº 77/2015 e a Portaria MDSA nº 116/2017 - Regimento Interno do CRSS.
3.Fase Recursal
Após a conclusão do processo administrativo, com a decisão do INSS, abre-se ao interessado o direito de interpor recurso contra decisão, e inicia-se a fase recursal.
Tão importante quanto exercer o direito de petição na fase inicial do processo administrativo é o recurso para a garantia do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.
Outrossim, a Lei 9.784/99 que regula o processo administrativo no âmbito federal determina que a Administração Pública Federal deve obedecer aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.[3]
É amplamente divulgado que em nenhuma fase do processo administrativo o segurado necessita da intervenção terceiros.
No entanto, essa afirmação só seria válida se não houvesse o complicador do desconhecimento da norma pelo beneficiário somado ao fato de que o INSS, como responsável pela concessão e manutenção dos benefícios, deixa a desejar quanto ao dever de verificação do direito e de orientação como determina a lei.
Reputa-se necessária a atuação de profissionais especializados em direito previdenciário para a garantia dos direitos dos beneficiários junto ao INSS na via administrativa. Haja vista que, embora seja um dever do INSS prestar aos interessados os esclarecimentos necessários para o exercício dos seus direitos em todas as fases do processo, não é o que ocorre na prática.
4.Do Recurso
O recurso é o meio pelo qual o beneficiário tem de contestar as decisões desfavoráveis do INSS quanto ao seu pleito inicial, a fim de obter uma reavaliação para a satisfação do seu requerimento de concessão ou revisão de um benefício.
A interposição do recurso pelo beneficiário ocorre perante a Agência da Previdência Social que proferiu a decisão. Esta irá proceder a instrução do mesmo e poderá acolher as razões do recurso, reformando a decisão proferida.
A Instrução Normativa nº 77/2015, no que diz respeito à reanálise do ato recorrido por parte do INSS e, quanto à possibilidade de reforma da decisão, assim dispõe:
Art. 539. Quando houver interposição de recurso do interessado contra decisão do INSS, o processo deverá ser encaminhado para a Unidade que proferiu o ato recorrido e, no prazo estabelecido para contrarrazões, será promovida a re-análise, observando-se que:
I - se a decisão questionada for mantida, serão formuladas as contrarrazões e o recurso deverá ser encaminhado à Junta de Recursos;
II - em caso de reforma parcial da decisão, o recurso será encaminhado para a Junta de Recursos para prosseguimento em relação à matéria que permaneceu controversa; e
III - em caso de reforma total da decisão, deverá ser atendido o pedido formulado pelo recorrente e o recurso perderá o seu objeto, sendo desnecessário o encaminhamento ao órgão julgador.
Caso não haja o juízo de retração, o INSS deverá apresentar as contrarrazões no prazo legal e, se assim não proceder, os autos devem ser encaminhados imediatamente para julgamento pelas Juntas de Recursos ou Câmara de Julgamento do CRSS.
Ressalta-se a importância do conhecimento das normas que regem a atuação do INSS para a elaboração do recurso que deve para maior chance de êxito, expor os motivos que sustentam o direito do beneficiário.
É imprescindível o acesso a cópia do processo administrativo que culminou com o indeferimento, isso para conhecimento dos detalhes e fundamentos que embasaram a decisão denegatória.
Outrossim, é dever do INSS conceder, quando solicitado, a cópia do processo administrativo, tendo em vista o respeito ao princípio da publicidade e da motivação de suas decisões.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro, na obra Direito Administrativo, assim leciona:
Por ser pública a atividade da Administração, os processos que ela desenvolve devem estar abertos ao acesso dos interessados. Esse direito de acesso ao processo administrativo é mais amplo do que o de acesso ao processo judicial; neste, em regra, apenas as partes e seus defensores podem exercer o direito; naquele, qualquer pessoa é titular desse direito, desde que tenha algum interesse atingido por ato constante do processo ou que atue na defesa do interesse coletivo ou geral, no exercício do direito à informação assegurado pelo artigo 5º, inciso XXXIII, da Constituição. (DI PIETRO, 2011, p. 627).
A Instrução Normativa INSS nº 77/2015 quanto a obrigação do INSS em fundamentar suas decisões assim dispõe:
A Decisão administrativa, em qualquer hipótese, deverá conter despacho sucinto do objeto do requerimento administrativo, fundamentação com análise das provas constantes nos autos, bem como conclusão deferindo ou indeferindo o pedido formulado, sendo insuficiente a mera justificativa do indeferimento constante no sistema corporativo da Previdência Social.
Todos os requisitos legais necessários à análise do requerimento devem ser apreciados no momento da decisão, registrando-se no processo administrativo a avaliação individualizada de cada requisito legal.[4]
As normas e preceitos não são seguidas como deveriam; não há cumprimento de prazos por parte do INSS; as análises dos requerimentos são superficiais culminando com indeferimentos; fazem exigências descabidas e indeferem por falta de documentos quando a norma impõe ao servidor, o dever de emitir carta de exigências elencando as providências e documentos necessários; as decisões não são fundamentadas com todo o esclarecimento necessário para a compreensão do segurado; sem contar os erros das decisões ou mesmo nos atos de concessões que, sem um mínimo de conhecimento jurídico da parte interessada, torna-se impossível diagnosticar, passando despercebido.
Diante da hipossuficiência jurídica do segurado em relação à soberania do ente autárquico, a máxima de que o segurado não precisa da intervenção de procurador ou representante com um mínimo de conhecimento jurídico, não é verdadeira.
5.Dos Órgãos Julgadores do Recurso
Como mencionado anteriormente, o recurso é interposto perante ao órgão que proferiu a decisão, mas não será por ele julgado.
O regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto 3.048/99, determina que, das decisões do INSS nos processos de interesse dos beneficiários, caberá recurso para o CRPS, conforme o disposto no regulamento do INSS e no regimento do CRPS.
O Conselho de Recurso da Previdência Social – CRPS[5] atualmente Conselho de Recursos do Seguro Social – CRSS é o órgão de controle jurisdicional das decisões do INSS e tem por finalidade o julgamento dos recursos administrativos.
O CRSS tem sede em Brasília, jurisdição em todo o território nacional e é composto de vinte e nove Juntas de Recursos (JR), quatro Câmaras de Julgamento (CAJ) e um Conselho Pleno.
Compete às Juntas de Recursos o julgamento dos Recursos Ordinários interpostos contra as decisões do INSS (primeira instância[6]); às Câmaras de Julgamento (segunda instância) compete julgar os Recursos Especiais interpostos contra as decisões proferidas pelas Juntas de Recursos e; ao Conselho Pleno compete uniformizar a jurisprudência previdenciária mediante a emissão de enunciados e resoluções.[7]
6.Da interposição do recurso e prazos
O recurso deve ser interposto no prazo de trinta dias da ciência da decisão proferida pelo INSS. O mesmo prazo, após o protocolo do recurso é concedido ao INSS para apresentar as contrarrazões.
O Regimento Interno do CRSS[8] no §3 do art. 31 dispõe que:
Na hipótese de Recurso Ordinário, serão considerados como contrarrazões do INSS os motivos do indeferimento. Em se tratando de Recurso Especial, expirado o prazo para contrarrazões, os autos serão imediatamente encaminhados para julgamento.
O prazo que o interessado tem para interpor o recurso é, na verdade, para o agendamento deste, tendo em vista ser um serviço que exige prévio agendamento.
Portanto, agendar o recurso dentro dos 30 (trinta) dias da ciência da decisão a ser recorrida é imprescindível para a sua tempestividade.
O recurso será apresentado somente na data marcada para o atendimento presencial, o que hoje demora em média cento e vinte dias.
Uma vez encaminhado o processo para a Junta de Recursos ou Câmara de Julgamento, o prazo será de 85 (oitenta e cinco) dias[9] para a decisão final.
Reputa-se de fundamental importância conhecer as normas internas do INSS e do CRSS para o bom andamento e eficácia do recurso interposto.
Outrossim, vale ressaltar que a propositura, pelo interessado, de ação judicial que tenha objeto idêntico ao pedido sobre o qual versa o processo administrativo, importa em renúncia tácita ao direito de recorrer na esfera administrativa e desistência do recurso interposto.[10]
Para fins de identificar o que é objeto idêntico citado anteriormente, vale citar o que dispõe o §1º do art. 545 da IN nº 77/2015, “Considera-se idêntica a ação judicial que tiver as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido do processo administrativo”.
A tramitação do recurso não é tão rápida. Embora estejam definidos os prazos, estes raramente são cumpridos, obstaculizando a garantia de direitos dos interessados que, sem um mínimo de conhecimento das normas, muitas vezes, ficam com seus processos parados e nada conseguem fazer.
7.Das Prioridades nos Julgamentos
Como ocorre nos processos judiciais por determinação legal, no processo administrativo do CRSS, algumas prioridades são conferidas.
O Regimento Interno do CRSS em seu artigo 38 dispõe:
§1º - As Juntas de Recursos e as Câmaras de Julgamento priorizarão a análise e solução dos seguintes recursos:
I - que tenham como parte beneficiários com idade igual ou superior a sessenta anos; e
II - relativos às prestações de auxílio-doença, de aposentadoria-por-invalidez" data-type="category">aposentadoria por invalidez e do benefício assistencial de que trata o art. 20 da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993.
Há, ainda, outras prioridades que podem ocorrer tanto no julgamento quanto no trâmite e no julgamento.
Para fins de prioridade, na sessão de julgamento considerar-se-ão os processos que tiverem requerimento de sustentação oral e nos casos em que as partes estiverem presentes.[11]
Já no que diz respeito à prioridade no trâmite e no julgamento, esta será conferida aos processos que versem sobre revisão de ofício dos atos dos órgãos julgadores – CRSS.[12]
8.Processo Eletrônico - e-Recursos
O recurso protocolizado na Agência da Previdência Social (APS) é digitalizado e disponibilizado no e-Recursos, ferramenta implantada no site para gerenciar a tramitação de processos recursais.
O e-recursos é uma ferramenta do Ministério da Previdência Social que permite aos usuários acompanhar todas as etapas processuais de um recurso administrativo contra uma decisão do INSS.[13]
A ferramenta seria de muita utilidade, não fosse as dificuldades enfrentadas no que diz respeito, inclusive, ao próprio acesso.
Qualquer pessoa pode visualizar o andamento dos processos, porém, o acesso aos documentos que lá estejam disponíveis e são de interesse da parte, somente pode ser feito mediante o uso de senha – Cadsenha.
A Cadsenha[14] é a senha para acesso aos dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS que é cadastrada nas agências da Previdência Social, sendo faculdade do segurado obtê-la.
Com as alterações recentes da forma de consulta ao CNIS, pela central de serviços do INSS – Meu INSS[15], a Cadsenha que também era usada para o e-Recursos, deixou de ser de quatro dígitos, passando agora ser alfanumérica de oito caracteres, o que a tornou incompatível com a então, senha de apenas quatro dígitos usada no e-Recursos.
Com isso, somente quem possui a antiga senha de quatro dígitos consegue hoje, usar o e-Recursos. Sem a senha antiga para o acesso aos documentos lá inseridos, tanto pelo INSS quanto pelo CRSS, o segurado deverá obrigatoriamente dirigir-se às agências do INSS.
Infelizmente, verifica-se na prática que a ferramenta e-Recursos está voltada mais para uso interno do INSS e do CRSS.