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Estudo sobre a responsabilização das empresas e do Estado na ocorrência do dano ambiental

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Agenda 23/11/2019 às 08:40

4 CONclusão

A responsabilidade civil tem sua origem no preceito alterum nom laedere, de Ulpiano, que fundamentou o direito romano e a partir de então passou por constante evolução, ultrapassando o preceito “olho por olho, dente por dente” da Lei de Talião até a introdução da prestação pecuniária, em substituição ao antigo sistema da motu próprio, pela Lex Aquila de damno. Foi neste período que despontou a noção de culpa lato sensu como pressuposto essencial para a caracterização da responsabilidade civil.

Em meados do século XVIII, a Revolução Industrial com todas as suas inovações, notadamente a introdução do maquinismo, foi responsável por um significativo aumento dos acidentes de trabalho, os quais eram considerados, simplesmente, como risco da atividade da classe proletária. Assim, a vulnerabilidade das vítimas diante de seus empregadores dificultava a comprovação da culpa destes, tornando-se praticamente impossível a reparação.

Somado a isto, o modo de produção fabril também colaborou para a eclosão da crise ambiental, no século XX, quando o sistema econômico passou a interferir de maneira dilacerante no meio ambiente, acarretando o desgaste dos recursos naturais e reduzindo a capacidade dos ecossistemas de absorver os impactos provocados pela ação humana.

Diante disso, constatou-se que a responsabilidade civil baseada na culpa não era suficiente para tratar da reparação relativa aos acidentes de trabalho e dos danos ao meio ambiente, assim, surgiu a teoria objetiva, enfatizando a ocorrência do dano e não o seu causador e, para fundamentá-la desabrochou a teoria do risco, pela qual o responsável pelos prejuízos causados por certa atividade é o sujeito que a explora, limitada, no entanto, a situações específicas, como os danos ao meio ambiente.

Como se pode observar, os riscos que motivaram consolidação da objetivação da responsabilidade civil e a teoria do risco são aqueles concretos e previsíveis, decorrentes da sociedade moderna. No entanto, com o passar do tempo, a sociedade pós-industrial, chamada de “sociedade de risco” pelo sociólogo alemão Ulrich Beck, caracteriza-se pela ocorrência de riscos abstratos, globais e imprevisíveis, como é o caso dos danos ambientais provocados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana/MG, no ano de 2015.

Até a década de 1980, eram escassas e pouco eficazes as normas de proteção ambiental no Brasil. Todavia, este cenário mudou com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, em 1988, que recepcionou as regras de proteção ambiental anteriormente existentes e inovou ao dedicar um capítulo específico para cuidar destas questões, adotando a visão antropocêntrica protecionista, sob os mandamentos do princípio do Desenvolvimento Sustentável, o qual foi legitimado desde a Conferência de Estocolmo Sobre o Meio Ambiente Humano, em 1972.

O Código Civil, sancionado em 2002, adota a teoria subjetiva como regra geral, indicando o dolo e a culpa como critérios indispensáveis para caracterizar a obrigação de reparar o dano, segundo dispõe do seu artigo 186, sendo a teoria objetiva aplicada como exceção em casos especiais.

Entretanto, no campo do Direito Ambiental, a responsabilidade civil é tratada de maneira peculiar, prevalecendo normas específicas estabelecidas, sobretudo, a partir da Constituição Federal de 1988 e da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente.

Na atualidade, após anos de aperfeiçoamento, em especial no campo do Direito Ambiental, consagrou-se quanto à responsabilidade civil objetiva, três espécies da teoria do risco, quais sejam: risco proveito, risco criado e risco integral, que diferem entre si, especialmente, no que se refere à incidência de fatos excludentes do nexo de causalidade.

A ordem constitucional brasileira elenca o meio ambiente como um direito fundamental, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de assegurar a todos um meio ambiente equilibrado, colocando-o, concomitantemente, na posição de direito objetivo e subjetivo. Assim sendo, considerando que a prova do nexo de causalidade na ocorrência de dano ambiental  é bastante complexa e difícil de ser produzida pelas vítimas, o Superior Tribunal de Justiça em harmonia com a doutrina majoritária, adota a teoria objetiva, assentada na teoria do risco integral, para fazer frente aos desastres ambientais da “sociedade de risco”, dispensando, portanto, as causas excludentes do nexo de causalidade, como o caso fortuito, força maior, fato de terceiro ou culpa exclusiva da vítima.

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Pois bem, considerando que as atividades de exploração mineral produzem riscos e efeitos prejudiciais como os que ocorreram na Bacia do Rio Doce após o rompimento da barragem de Fundão, os sujeitos diretos e indiretos que a ela se dedicam devem atrair para si o ônus da reparação/indenização, passando a responder objetivamente em face das presentes e futuras gerações, sem demonstração de culpa, porque vigora, no Brasil, o modelo de responsabilidade objetiva pautada na teoria do risco integral.

Isto posto, espera-se que os danos sociais, ambientais e econômicos decorrentes do rompimento da barragem de Fundão não restem impunes, uma vez que eventual invocação de causas excludentes do nexo de causalidade, à luz da teoria do risco integral, não poderão ser acolhidas, favorecendo uma efetiva realização das funções repressiva, reparatória e social da responsabilidade civil, levando às famílias e comunidades diretamente atingidas por este desastre o sentimento de justiça e esperança de um recomeço. 


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THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental. 6. ed. rev., atual e ampl. Salvador: JusPODVIM, 2016.


Notas

[1] O CFC é um gás sintético bastante utilizado em sistemas de refrigeração de eletrodomésticos e aerossóis por não ser inflamável, corrosivo e nem tóxico.

[2] É o complexo de regras impostas aos indivíduos nas suas relações externas, com caráter de universalidade, emanadas dos órgãos competentes. Trata-se, pois, de um conjunto de leis que nascem da vontade geral e passam a integrar o ordenamento jurídico. Portanto, o Direito Objetivo estabelece normas de conduta social, que disciplinam a conduta dos indivíduos. Disponível em: <https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/direito/direito-objetivo-e-direito-subjetivo/20104>;

[3] Se caracteriza por ser um atributo da pessoa, conferindo aos seus sujeitos, poderes, obrigações e faculdades estabelecidos pela lei. Assim, um direito subjetivo requer a presença de três elementos, quais sejam: um sujeito titular do direito, um objeto e uma relação jurídica;

[4] São os indivíduos que residem em quilombos, ou seja, áreas ocupadas por comunidades remanescentes dos antigos quilombos. Disponível em: < http://www.palmares.gov.br/archives/19099>;

[5] Segundo Darcy Ribeiro, trata-se de “um novo modo de vida que se difunde paulatinamente a partir das antigas áreas de mineração e dos núcleos ancilares de produção artesanal e de mantimentos que a supriam de manufaturas, de animais de serviço e outros bens (...)” (RIBEIRO, 1995, p. 380 apud ACP/MPF n° 60017-58.2015.4.01.3800);

[6] Comunidade de origem europeia, que após crises e perseguições sucessivas na Europa, fugiram para o território brasileiro a partir do início da segunda metade do século XIX, e se instalaram, principalmente, nos estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Espírito Santo e Rondônia. Hodiernamente, o Espírito Santo abriga uma das maiores colônias pomeranas do mundo, com aproximadamente 140 mil indivíduos, os quais são regionalmente conhecidos como “alemão da grota”.   Disponível em: < http://midiacidada.org/os-pomeranos-um-povo-sem-estado-finca-suas-raizes-no-brasil/>;

[7] Por serem todos titulares do direito ao meio ambiente equilibrado;

[8] Apesar de o desastre ambiental ter iniciado no estado de Minas Gerais, o governo do Espírito Santo, deve colaborar na mitigação e compensação dos danos que atingiram este ente da federação.

Sobre a autora
Bruna Aparecida Souza Franco

Advogada, graduada pela Universidade do Estado de Minas Gerais-Unidade Ituiutaba, pós graduanda em Direito Ambiental e Urbanístico pela PUC Minas e em Direito do Trabalho pela FAEL.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FRANCO, Bruna Aparecida Souza. Estudo sobre a responsabilização das empresas e do Estado na ocorrência do dano ambiental. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5988, 23 nov. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/64514. Acesso em: 25 nov. 2024.

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