INTRODUÇÃO
Para quem não é da área jurídica, grande parte dos Crimes em Espécie previstos no ordenamento jurídico brasileiro estão tipificados no Código Penal, que nada mais é que o Decreto-Lei Nº 2.848/1940.
Nele também constam a Teoria do Crime (Dolo, Culpa, Punibilidade, Lugar do Crime entre outros) bem como a Teoria da Pena (Dosagem, Fixação e Aplicação da Pena, Atenuantes e Agravantes, Prescrição, Efeitos da Condenação entre outros).
Além do Código, existem legislações penais especiais que tipificam outros crimes, com a mesma força de punição dos Crimes em Espécie contidos no instrumento codificado comentado, como é o caso da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006 ) e a Lei de Crimes Ambientais (lei 9.605/98), entre outras diversas.
Além disso, visando o acompanhamento das relações sociais, o Direito, sempre que possível, o faz através de novas leis, elaboradas pelo poder Legislativo e posteriormente sancionadas pelo Executivo, para só então o Poder Judiciário ter alcance de aplicação do conteúdo da norma.
Nessa linha, sempre que uma lei que altera algum instituo do Direito Penal é sancionada, tal lei pode vir para acrescentar nova redação, criando novos dispositivos, bem como, revogando os que já estavam em vigor. Foi o que aconteceu, por exemplo, com o início da vigência da lei 12.234/2010, que revogou em partes o instituto da Prescrição Retroativa, presente no artigo 110 do Código Penal.
ADVENTO DA LEI 13.654/2018: MODIFICAÇÕES AO CÓDIGO PENAL DE 1940
Nesse contexto, em 23 de Abril do corrente ano, foi sancionada a Lei 13.654/2018, que altera alguns pontos do Código Penal, em específico, os artigos 155 e 157 (furto e roubo, respectivamente).
Ao que cerne o artigo 155, que dá vida a conduta antijurídica do Furto, a lei prevê as seguintes alterações:
“Art. 155. …………………………………………………………..
………………………………………………………………………….
§ 4º-A A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se houver emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum.
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§ 7º A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego.”
Em relação à antiga redação do Código Penal anterior à vigência da lei 13.654/2018, no Código não constava menção acerca dos artefatos explosivos, o que foi inserido pela nova lei.
Ou seja, além das “causas de aumento da pena” já preconizados anteriormente, a nova norma acrescentou outras atividades que possam vir a agravar a conduta delitiva do furto.
Para ilustrar melhor, talvez o leitor não perceba de imediato, mas uma conduta que foi impulsionada ao longo dos anos no Brasil foi a de ataques a caixas eletrônicos. Para êxito no furto às cédulas presentes nos cashings das agências, corriqueiramente, foi e é noticiado que os agentes ao cometerem tal ação utilizam substâncias explosivas, como dinamites.
Daí, mais uma vez, o legislador tenta, através da criminalização de condutas, reduzir atividades delituosas. Para isso, acrescentou o aumento da pena em até 10 (dez) anos se o Crime de Furto (art. 155/CP) for cometido com uso de agentes explosivos (parágrafo 4º).
Além disso, a nova lei acrescentou ainda o paragráfo 7º no artigo 155 do CP, que prevê o aumento da pena em até 10 (dez) anos se a subtração (elemento que configura o Furto) for de agentes explosivos, bem como, se forem de outros agentes que configurem a sua fabricação, seja conjunta ou isoladamente.
Um outro elemento destacável com o advento da recente lei 13.654/2018 é atinente ao crime de roubo (art. 157 do Código Penal). Para a referida conduta, a lei prevê:
“Art. 157. …………………………………………………………..
………………………………………………………………………….
§ 2º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade:
I — (revogado);
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VI — se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego.
§ 2º-A A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços):
I — se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo;
II — se há destruição ou rompimento de obstáculo mediante o emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum.
§ 3º Se da violência resulta:
I — lesão corporal grave, a pena é de reclusão de 7 (sete) a 18 (dezoito) anos, e multa;
II — morte, a pena é de reclusão de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, e multa.”(NR)
Ao que se refere o crime de roubo (artigo 157), o primeiro elemento a ser destacado refere-se a possibilidade de não ser mais considerada como causa de aumento o emprego de “arma branca” como forma de violência ou grave ameaça para a subtração da coisa.
Antes da nova lei, o Código era amplo, pois, estabelecia a necessidade de se aumentar a pena “se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma”, sendo que arma seria tanto arma de fogo ou arma branca (como faca, canivete, por exemplo). De tão logo, a lei revogou o antigo inciso I do § 2º do 155 do CP acrescentando o § 2º-A e, como substituição do referido inciso, a lei foi específica ao enquadrar que será uma causa de aumento da pena se o crime de roubo for cometido com o “emprego de arma de fogo”.
Ou seja, não existe mais a previsão legal de causa de aumento para os agentes que concorrerem para o crime de roubo e estejam portando quaisquer armas brancas, nos termos da lei.
Frisa-se novamente, a preocupação do legislador com a temática dos explosivos, pois, foi acrescentado também o inciso II que trata por aumentar a pena se houver destruição ou rompimento de obstáculo mediante o emprego de explosivos ou de artefato que venha ser análogo a um.
Outro ponto que merece destaque é do aumento acrescentado no Crime de roubo acerca do § 3º, quando a conduta do agente resultar em violência com lesão corporal à vítima, haja vista, havendo lesão corporal grave o crime pode ser majorado em até 18 (dezoito) anos, algo que não havia previsão antes da lei.
Por fim, não menos importante, o famoso “Roubo seguido de morte” foi majorado pela lei penal, passando, como examinado na lei, a majorar o crime de roubo em até 30 (trinta) anos, caso o agente além de subtrair o patrimônio venha a matar a vítima (latrocínio). Frisa-se que tal “teto” que a pena majorada pode chegar é o teto máximo da aplicação da pena, pois, o parâmetro que o ordenamento jurídico brasileiro permite que a lei penal tenha força é de 30 (trinta) anos.
Destacável também é o que cerne à Teoria da aplicação da pena, pois com essas novas disposições elencadas pela nova lei, se o crime de roubo for cometido com o emprego de arma de fogo (art. 157, § 2º-A, inciso I) e qualquer outra causa de aumento no que dispõe o art. 157, § 2º, como concurso de agentes ou restrição da liberdade da vítima, exemplificando, somente será possível aplicar a causa de aumento relativa ao emprego de arma de fogo, conforme estabelece o artigo 68, parágrafo único, do Código Penal, que afirma:
Art. 68 — […].
Parágrafo único — No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua.
Nesse teor, caso o crime de roubo seja cometido em concurso de agentes (art. 157, § 2º, inciso II) e com emprego de arma de fogo (art. 157, § 2º-A, inciso I), somente incidirá na terceira fase da dosimetria a causa de aumento de 2/3, devendo ser analisada a situação do concurso de agentes nas circunstâncias judiciais, quando da análise da primeira fase da dosimetria da pena.
Uma questão polêmica acerca do advento da lei 13.654/2018 é atinente a revogação da majorante do crime de roubo para quem o cometeu com o emprego de arma branca, como bem dispôs o inciso I, § 2º do art. 155 anteriormente.
Isso porque a Lei Penal é alçada com as lentes ajustadas em alguns princípios, um deles é o da Irretroatividade da Lei Penal, ou seja, se uma lei penal entrar em vigor ela jamais atingirá aqueles que já foram condenados, desde que esta mesma lei seja prejudicial ao réu. Não sendo, ela poderá retroagir para o beneficiar, que é o caso da referida lei 13.654/2018, uma vez que revogou uma majorante presente em inúmeras condenações no Brasil, já que além do crime de roubo, boa parte dos apenados possuem a pena aumentada por estarem portando “armas brancas” (faca, canivete) para o cometimento do ato ilícito.
A divergência entre operadores do mundo jurídico é patente. Poderá a lei beneficiar quem já cumpre pena e obteve na condenação o aumento por portar “arma branca”?
A partir da análise sistemática do Garantismo Penal, a lei não só pode retroagir para benefício dos réus, bem como, possui esse dever.
Frisam-se os ensinamentos do Professor Luigi Ferrajoli (2000) acerca do Garantismo Penal, uma vez que, segundo o Italiano, o Garantismo é a outra cara do Constitucionalismo, uma vez que lhe correspondem a elaboração e implementação dos instrumentos de garantias de direitos que assegurem “[…] o máximo de efetividade dos direitos constitucionalmente reconhecidos.”
Em suma, a nova lei trouxe divisões. Para muitos, trata-se de uma lei que trouxe a preocupação do legislador em acompanhar a evolução social, inclusive dos novos moldes das atividades delituosas. Para outros, trata’se de mais uma lei que não assegura muita coisa, mas sim, abranda mais a situação dos réus que cumprem pena (o que foi abordado nesse último tópico).
O que não se pode deixar de lado é que a Lei Penal possui, seja eficaz ou não, a maior força que o ordenamento jurídico dá a uma lei: a de privar outrem de um direito fundamental (liberdade).
Por isso, o teor de quaisquer leis que possuam natureza jurídica na seara criminal deve ser vetorizada pela devida efetivação de Direitos Fundamentais, os quais são Universais (para todos).