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O Brasil não precisa de uma nova Constituição

A atual Carta Magna assegura direitos individuais, sociais e políticos indispensáveis e garante a independência de Poderes. Se necessita de modificações, que se faça por meio de emendas.

A Constituição Federal de 1988 completa 30 anos no dia 5 de outubro de 2018.

A Carta Magna foi rotulada pelo Presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Deputado Federal Ulysses Guimarães, como a Constituição Cidadã, em virtude de assegurar diversos direitos e liberdades a todos os brasileiros.

A celebração da data ganha importância diante da elevada polarização eleitoral e do fato de alguns candidatos e partidos políticos defenderem a necessidade de uma nova Constituição.

Por exemplo, o candidato Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores (PT), disse, em entrevista para a imprensa, que, se eleito, vai “criar as condições” para uma nova Constituinte.

Já o candidato a Vice-presidente General Mourão, na chapa do candidato Jair Bolsonaro, do Partido Social Liberal (PSL), defendeu a ideia uma nova Constituição feita por “notáveis”.

Mas a pergunta é: o Brasil precisa de uma nova Constituição? A resposta é: absolutamente não!

A Constituição de 1988 é a mais democrática e com mais direitos e garantias individuais e sociais, dentre todas as 07 Constituições que o Brasil já teve (1824, 1891, 1934, 1937, 1946, 1967/69 e 1988).

Vejamos.


Constituição de 1824

A Constituição de 1824, primeira constituição e a que vigorou por mais tempo, tinha um considerável rol de direitos e garantias, por influência da Revolução Americana (1776) e da Revolução Francesa (1789).

Um artigo (179), com 35 incisos, garantia direitos como liberdade, segurança individual e propriedade.

Todavia, de forma não forma expressa, permitia a escravidão, o que fazia com que o direito à liberdade se consubstanciasse em mera retórica.


Constituição de 1891

Primeira constituição da República, a Carta de 1891 teve como relator Rui Barbosa, sendo influenciada pela Constituição dos Estados Unidos da América, de 1787.

O seu art. 72, com 34 incisos, assegurava direitos relacionados à liberdade, segurança e propriedade.

Porém, apesar de abolir o voto censitário, restringiu o direito de votar apenas para pessoas alfabetizadas e homens.


Constituição de 1934

A Carta de 1934 sofreu influência da Constituição Weimar, da Alemanha (1919), e da Revolução Mexicana de 1917, sendo caracterizada pela constitucionalização de direitos fundamentais de segunda geração (ou dimensão), como os direitos sociais e a constitucionalização do voto das mulheres, estabelecido pelo Código Eleitoral de 1932.

É marcada ainda pela presença de disposições sobre família, educação, cultura e pela instituição do mandado de segurança e da ação popular.


Constituição de 1937

A Carta de 1937, redigida por Francisco Campos, é conhecida como “polaca”, em decorrência de ter influência fascista e da Constituição da Polônia de 1935.

É caracterizada pela restrição de direito fundamentais, como a censura prévia à imprensa, a proibição da greve e a instituição da pena de morte para crimes políticos e não militares.


Constituição de 1946

A Carta Magna do Pós-Segunda Guerra Mundial foi influenciada pelo fim do Estado Novo, de Getúlio Vargas, e pelos horrores praticados pelo Nazismo e Fascismo.

Dessa forma, assegurou direitos fundamentais, com o restabelecimento do mandado de segurança, da ação popular, do direito de greve e da liberdade da imprensa, sendo marcada pela evolução de direitos sociais, direitos fundamentais de segunda geração (ou dimensão).


Constituição de 1967/69

É caracterizada pela forte restrição de direitos fundamentais, notadamente após o Ato Institucional nº 05, de 1969, o qual deu poderes para o Presidente da República: a) decretar o recesso do Congresso Nacional; b) legislar em todas as matérias; c) suspender os direitos políticos pelo prazo de 10 anos; d) cassar mandatos eletivos federais, estaduais e municipais; e) suspender a garantia de habeas corpus, nos casos de crimes políticos, contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e a economia popular.

A suspensão de direitos políticos implicava na liberdade vigiada, proibição de frequentar determinados lugares e domicílio em local determinado.As ações praticadas com base do Ato Institucional nº 05 não podiam ser submetidas a questionamentos perante o Poder Judiciário.


Constituição Federal de 1988

A Constituição Cidadã é caracterizada pelo extenso rol de direitos fundamentais. Por exemplo, o seu artigo 5º, que estabelece os direitos fundamentais, possui 78 incisos.

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Assegura direitos individuais, sociais, de nacionalidade e políticos, bem como amplia direitos trabalhistas, tutela a meio ambiente, amplia os poderes do Ministério Público, cria o mandado de injunção, a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO), a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), o mandado de segurança coletivo e o habeas data.Outrossim, coloca a cidadania e a dignidade da pessoa humana como fundamentos da República, além de considerar a tortura e o racismo como crimes inafiançáveis.

Desta forma, constata-se que a Constituição de 1988 é a mais democrática e com mais direitos e garantias individuais e sociais dentre todas as 07 (sete) Constituições que o Brasil já teve.

A Carta Magna de 1988 já foi alterada 99 vezes, por meio de Emenda Constitucional.

Para ser alterada, a Constituição prevê que a Emenda Constitucional deve ser aprovada por cada Casa do Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal), em duas votações, com quórum mínimo de 3/5 de seus membros (art. 60, § 2º).

Todavia, a própria Carta Magna proíbe a deliberação de proposta de emenda constitucional tendente a abolir: a forma federativa de Estado, a separação dos Poderes, os direitos e garantias individuais, e o voto direto, secreto, universal e periódico (art. 60, § 4º).

Trata-se das cláusulas pétreas, dispositivos que não podem ser modificados, nem mesmo por meio de emenda constitucional.

Mas retornando à pergunta inicial: o Brasil precisa de uma nova Constituição?A resposta é: absolutamente não!

Para que uma nova Constituição se a atual vai completar apenas 30 anos?

Para que uma nova Constituição se a atual assegura inúmeros direitos individuais e sociais?

Para que uma nova Constituição se atual assegura a independência de Poderes?

Para que uma nova Constituição se a atual pode ser modificada por meio de Emenda Constitucional (como já foi feito 99 vezes)?

Assim, é necessário que a imprensa, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), todos os operadores do Direito (Magistrados, Membros do Ministério Público, Advogados, Defensores Públicos e Advogados Públicos) e todos os setores da sociedade questionem o motivo pelo qual alguns candidatos e partidos políticos afirmam ser necessário uma nova Constituição.

Se não explicarem o motivo, infere-se que a intenção escamoteada de se criar uma nova Constituição é a de fazer o que a atual Constituição não permite: a) retirar direitos e liberdades individuais; b) retirar direitos sociais; c) controlar e restringir a independência do Poder Judiciário e do Ministério Público, os quais têm atuado de forma excepcional no combate a crimes de colarinho branco, contra a Administração Pública e lavagem de dinheiro, bem como atuado contra a improbidade administrativa, a corrupção e desvio de dinheiro público.

Uma nova Constituinte é um quadro de pintura em branco: não se sabe o que vai sair!

É preciso que todos defendam a nossa Constituição de 1988.

Não há motivo para se fazer uma nova Constituição.

Se a atual precisa de ajustes, que se faça da forma como a própria Constituição determina: por meio de Emenda Constitucional.


Conclusão

Conclui-se que o Brasil não precisa de uma nova Constituição, pois a atual Carta Magna assegura inúmeros direitos individuais, sociais e políticos, e garante a independência de Poderes.

Conforme descreveu Ulysses Guimarães, Presidente da Assembleia Nacional Constituinte, a Constituição Cidadã é “o documento da liberdade, da dignidade, da democracia, da justiça social do Brasil”.

Se a Constituição necessita de modificações, que se faça da forma como a própria Constituição determina: por meio de Emenda Constitucional!

Sobre os autores
Robledo Moraes Peres de Almeida

Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Piauí. Foi Oficial da Polícia Militar do Espírito Santo (PMES) por 15 anos, ocupando atualmente o Posto de Capitão PM da Reserva Não Remunerada. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Graduado pela Escola de Formação de Oficiais da PMES. Pós-graduado em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera Uniderp/Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes (LFG). Pós-graduado em Direito Público pela Universidade Anhanguera Uniderp/Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes (LFG). Pós-graduado em Gestão, Educação e Segurança de Trânsito pela Faculdade Cândido Mendes. Membro Titular da Associação Colombiana de Direito Processual Constitucional. Finalista da categoria Obra Técnica do X Prêmio Denatran de Educação no Trânsito, promovido pelo Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN) no ano 2010. Aprovado no Exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Aprovado nos concursos públicos para os cargos de: a) Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Piauí; b) Promotor de Justiça do Ministério Público do Tocantins; c) Defensor Público da Defensoria Pública do Espírito Santo; d) Oficial de Justiça Avaliador Federal do Tribunal Regional Federal da Segunda Região (TRF-2)

Felipe Lyra da Cunha

Capitão da Polícia Militar do Estado do Espírito Santo (PMES). Graduado em Direito pela Universidade Federal do Estado do Espírito Santo. Graduado em Segurança Pública pela Escola de Formação Oficiais da PMES. Já atuou em diversas áreas da segurança pública, como a área de inteligência e na área operacional.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Robledo Moraes Peres; CUNHA, Felipe Lyra. O Brasil não precisa de uma nova Constituição. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5574, 5 out. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/69455. Acesso em: 25 nov. 2024.

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