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As inovações legislativas aos crimes sexuais no enfrentamento à criminalidade: comentários à Lei n. 13.718/2018

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A Lei nº. 13.718/2018 tipificou os crimes de importunação sexual e de divulgação de cena de estupro, tornou pública incondicionada a natureza da ação penal dos crimes contra a liberdade sexual e dos crimes sexuais contra vulnerável, estabeleceu causas de aumento de pena para esses crimes e definiu como causas de aumento de pena o estupro coletivo e o estupro corretivo.

Introdução

No ímpeto desenfreado de produção legislativa, da inflação legislativa, populismo penal e ano eleitoral, o legislador ordinário aprovou a Lei nº. 13.718/2018, publicada e com vigência a partir da data de sua publicação, ou seja, com plena vigência a partir do dia 25/09/2018 (inteligência do art. 4º da citada lei). Será que uma legislação mais severa tenderá a reduzir ataques sexuais que viram e mexe estão nas páginas de jornais?

A Lei nº. 13.718/2018 em comento, conforme o seu artigo 1º, tipificou os crimes de importunação sexual e de divulgação de cena de estupro, tornou pública incondicionada a natureza da ação penal dos crimes contra a liberdade sexual e dos crimes sexuais contra vulnerável, estabeleceu causas de aumento de pena para esses crimes e definiu como causas de aumento de pena o estupro coletivo e o estupro corretivo.


Conceito de dignidade sexual

O legislador objetivou proteger a liberdade sexual, em vista da dignidade sexual da pessoa humana. Cada indivíduo tem a livre opção de escolher o seu parceiro ou sua parceira que sexualmente se relacionará. A par disso, trazendo à tona os ensinamentos de Julio Fabrinni Mirabete (2012, p. 388) a denominação “dada ao Título VI – ‘Dos crimes contra a dignidade sexual’ -, embora não seja isenta de críticas1, tem o mérito de evidenciar o deslocamento do objeto central de tutela da esfera da moralidade pública para a do indivíduo. (...) No contexto normativo em que foi utilizado, o termo ‘dignidade’ deve ser compreendido em conformidade com o sentido que lhe empresta a Constituição Federal, que prevê a ‘dignidade da pessoa humana’ como conceito unificador de todos os direitos fundamentais do homem que se encontram na base de estruturação da ordem jurídica (art. 1º, inciso III). (...) Assim, ao tutelar a dignidade sexual, protege-se um dos vários aspectos essenciais da dignidade da pessoa humana, aquele que se relaciona com o sadio desenvolvimento da sexualidade e a liberdade de cada indivíduo de vivenciá-la a salvo de todas as formas de corrupção, violência e exploração”.

Conceito de liberdade sexual: Liberdade sexual pode ser entendido como o direito que todo ser humano tem de poder dispor do próprio corpo. Neste sentido, salienta Cleber Masson (2016, p. 998) que “cada pessoa tem o direito de escolher seu parceiro sexual, e com ele praticar o ato desejado no momento que reputar adequado, sem qualquer tipo de violência ou grave ameaça. O Código Penal protege o critério de eleição sexual que todos desfrutam na sociedade”.

Dito isto, insta salientar que as modificações introduzidas pelo legislador através da Lei nº. 13.718/2018, impactaram diretamente nos crimes contra a Liberdade Sexual, previsto no Capítulo I do Título VI do Código Penal.


IMPORTUNAÇÃO SEXUAL – ANÁLISE DO ART. 215-A, CP

Art. 215-A. Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro:

Pena: reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o ato não constitui crime mais grave.

Introdução: o crime de importunação sexual trata-se de novatio legis incriminadora e, por face do princípio da reserva legal e anterioridade da lei penal, terá sua aplicação a fatos futuros, pois não há crime sem lei anterior que o defina e não há pena sem prévia cominação legal. Tal delito vem a corrigir uma vacância existente entre os delitos de estupro (art. 213, CP) e a antiga contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor (o revogado art. 61. da LCP). Para a caracterização do delito de estupro era imprescindível a configuração da elementar da violência ou da grave ameaça, portanto, por mais ofensivo que fosse o ato contra a vítima, se não houvesse a configuração da violência ou grave ameaça, restaria como soldado de reserva a punição do agente pela prática da contravenção penal da importunação ofensiva ao pudor (o revogado art. 61. da LCP). Como noticiado nos últimos meses, fato que ganhou repercussão nacional, determinado indivíduo no interior de um ônibus coletivo, se masturbou e ejaculou em uma passageira que se encontrava sentada em uma das cadeiras do coletivo. Observe que tal ato, não foi praticado com emprego de violência ou grave ameaça, logo não havia que se falar em delito de estupro - apesar dos infindáveis debates sobre essa celeuma2. O caso foi enquadrado como importunação ofensiva ao pudor, contravenção penal, portanto, ficando sujeito à Lei nº. 9.099/1995, o que por via de consequência, gerou a lavratura de um Termo Circunstanciado de Ocorrência e a consequente liberação do suspeito, após a assinatura do termo e o comprometimento de comparecimento a Audiência.

Ademais, observe que topograficamente o delito está inserido dentro do capítulo I (Dos Crimes Contra a Liberdade Sexual), logo não se aplicará aos vulneráveis.

Deve ser observado ainda que para que se configura o delito em tela não há a necessidade que seja realizado em local público ou acessível ao público, ao contrário do que ocorria com a antiga contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor (o revogado art. 61. da LCP).

Objeto jurídico: É a dignidade sexual de qualquer pessoa (Título VI - Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual) e, de forma mais precisa, a liberdade sexual de cada pessoa (Capítulo I – Dos Crimes Contra a Liberdade Sexual), ou seja, o direito de cada pessoa poder dispor do próprio corpo.

Objeto material: é a pessoa, de qualquer sexo, contra quem se dirige a conduta criminosa. Atente-se que esta pessoa não pode se enquadrar no conceito de vulnerável do art. 217-A, caput e §1º.

Núcleo do tipo: O núcleo do tipo é “praticar”, isto é, realizar ou efetuar na presença de alguém e sem o seu consentimento, qualquer ato libidinoso idôneo e diverso da conjunção carnal, com a finalidade de satisfazer a própria lascívia ou a lascívia de terceiro.

Meios de execução: É classificado como crime de forma livre, isto é, pode ser praticado por qualquer meio de execução.

Sujeito ativo: Trata-se de crime comum ou geral, isto é, podendo ser cometido por qualquer pessoa seja do sexo masculino, feminino ao até mesmo transexuais. Não exigindo o tipo penal qualquer qualidade especial do agente.

Sujeito passivo: Pode ser qualquer pessoa, desde que não esteja no conceito de vulnerável. Pois, caso a vítima seja menor de 14 anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência, incorrerá o agente no delito do art. 217-A.

Elemento subjetivo: É dolo, seja ele direto ou eventual, acrescido de uma finalidade específica que é “com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiros”. Não há expressa previsão legal da modalidade culposa, o que torna inviável a punição por culpa.

Consumação: Trata-se de crime formal, independendo do resultado no mundo naturalístico.

Tentativa: pela classificação dos crimes quanto o resultado naturalístico os crimes formais são compatíveis com o conatus. Todavia, em casos práticos seria de difícil visualização.

Subsidiariedade expressa: Ao cominar a pena do delito do art. 215-A, o legislador deixou claro que o crime de importunação sexual se trata de delito subsidiário. Ou seja, ao agente só será imputado este delito “se o ato não constitui crime mais grave”. A título de exemplo, se o agente, praticar conjunção carnal, sem o consentimento da vítima, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima, responderá por crime mais grave (violação sexual mediante fraude – pena de reclusão de 2 a 6 anos).

Ação penal: É Pública incondicionada. Em conformidade com a nova redação do art. 225. do CP todos os crimes previstos no capítulo I e II são apurados mediante ação penal pública incondicionada. Sobre o assunto remetemos o leitor aos comentários do aludido dispositivo.

Lei nº. 9.099/1995: O delito de importunação sexual é crime de médio potencial ofensivo, tendo em vista que a sua pena mínima (1 ano) autoriza a incidência da suspensão condicional do processo, desde que presente os requisitos do art. 89. da Lei nº. 9.099/1995. Todavia, tal benefício será vedado, se, no caso concreto, for aplicável a majorante do art. 226. ou a majorante do art. 234-A, pois em ambas as hipóteses o mínimo da pena privativa de liberdade ultrapassa o limite admitido pelo art. 89. da Lei nº. 9.099/1995.

Pena cominada: reclusão de 1 a 5 anos. Observe os comentários pertinentes à subsidiariedade expressa do delito em comento.

Causa de aumento específica: O art. 226. do Código Penal, com nova redação dada pela Lei nº. 13.718/2018, contempla causas de aumento de pena aplicáveis aos delitos do Capítulo I (Dos Crimes Contra a Liberdade Sexual) e aos delitos do Capítulo II (Dos Crimes Contra Vulneráveis). As causas de aumento de pena, em conformidade com o sistema trifásico de dosimetria da pena, deverá incidir na terceira fase da mesma, podendo elevá-la além do máximo legalmente previsto. Pode ocorrer a situação de no mesmo crime incidir mais de uma causa de aumento de pena, sendo neste caso aplicado às regras do art. 68, parágrafo único do Código Penal.

Sendo assim, conforme o art. 266. do CP:

Sobre os comentários completos referente a cada um dos incisos do art. 226, CP remetemos o leitor ao tópico do referido artigo.

Causa de aumento de pena genérica: prevista no art. 234-A, aplica-se a todos os delitos previsto no título VI do CP. Assim, “Art. 234-A. Nos crimes previstos neste Título a pena é aumentada: III – de metade a dois terços, se do crime resultar gravidez. IV - de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o agente transmite à vítima doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador, ou se a vítima é idosa ou pessoa com deficiência”.

Ato obsceno (art. 233) e importunação sexual (art. 215-A) – confrontação: o que distingue tais delitos é a percepção de alguém. Assim, se o agente se masturba na presença de alguém pelo fato da pessoa lhe despertar um impulso sexual estará caracterizado o delito de importunação sexual (art. 215-A). Todavia, se o agente apenas de forma contemplativa, se dirige a um lugar público ou um espaço aberto ou exposto ao público e ali vem a se masturbar, sem visar qualquer tipo de pessoa, estará incorrendo no delito de ato obsceno (art. 233, CP).

Segredo de justiça: Conforme o art. 234-B, do CP, os processos em que se apuram crimes contra a dignidade sexual correrão em segredo de justiça.


NORMAL PENAL EXPLICATIVA NO CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL – COMENTÁRIOS AO §5º DO ART. 217-A

Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:

Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

§ 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.

§ 2º (VETADO)

§ 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave:

Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.

§ 4º Se da conduta resulta morte:

Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.

§5º - As penas previstas no caput e nos §§ 1º, 3º e 4º deste artigo aplicam-se independentemente do consentimento da vítima ou do fato de ela já ter mantido relações sexuais ao crime.

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Interpretação autêntica ou legislativa: o §5º do art. 217-A do Código Penal traz uma hipótese de interpretação autêntica ou legislativa, isto é, aquela realizada pelo próprio legislador com o propósito de estabelecer o alcance dos significados de determinada norma. Este método de interpretação é obrigatório, imposto pelo legislador, não podendo o intérprete se afastar dele. Assim, com a edição do §5º do art. 217-A, põe-se fim às discussões que circundavam acerca da experiência sexual da vítima e do seu possível consentimento.

A Súmula 593 do STJ: Através do julgamento (REsp 1.480.881-PI – 3ª s, 26.08.2015 – djE 10.09.2015)3 – acordão publicado na íntegra, o STJ já havia firmado entendimento neste sentido, não por acaso editou a Súmula nº. 593, nestes termos: “O crime de estupro de vulnerável configura-se com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante o eventual consentimento da vítima para a prática do ato, experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente”.

A questão da exceção de Romeu e Julieta: Segundo o delegado de polícia, Joaquim Leitão Júnior e o promotor de justiça João Biffe Júnior, a Exceção de Romeu e Julieta se dá: “Por meio dessa exceção, a vulnerabilidade etária poderá ser relativizada, considerando a diferença de idade entre as partes (exceção de Romeu e Julieta).

Como é cediço, os fenômenos sociais vivenciados nas últimas décadas indicam que os adolescentes estão, a cada dia, mais expostos a conteúdos ligados a sexualidade. A maturidade sexual nos dias atuais chega muito cedo, num contexto social não concebido pela legislação pátria ao definir a idade de consentimento para as relações sexuais. Certamente, ao conceber o patamar de 14 anos, o legislador infraconstitucional não previu o surgimento de uma série de fenômenos sociais, tais como a sexualidade precoce, a sexualidade fluída, o gênero neutro, dentre diversos outros desdobramentos da chamada geração Z.

Tal teoria preconiza que, em que pese a literalidade do Código Penal, não se deve considerar estupro de vulnerável quando a relação sexual ocorre com uma pessoa com diferença etária de até cinco anos, pois ambas as partes se encontram na mesma etapa de desenvolvimento sexual. Nesse cenário, não seria razoável considerar estupro a relação consentida entre namorados (por exemplo: “A”, com 13 anos, e seu namorado(a), com 18 anos).

Dessa forma, quando a situação de idade do acusado é de apenas alguns anos a mais do que a vítima, a situação deverá receber um tratamento jurídico diverso.

Alguns Estados norte-americanos, diante dessa circunstância, desenvolveram as “Romeo and Juliet Laws”, “segundo as quais não há crime em caso de relacionamento sexual entre pessoas cuja diferença de idade é pequena, considerando que ambos estão no mesmo momento de descoberta da sexualidade” (GARCIA, 2015).

A expressão é inspirada na obra de William Shakespeare e refere-se a tragédia escrita entre 1591 e 1595, nos primórdios de sua carreira literária, na qual narra a morte de dois jovens amantes.

Observe-se que na peça Julieta tinha apenas 13 anos quando manteve relação amorosa com Romeu, fato que ocasionaria, a luz do nosso ordenamento jurídico, a responsabilização de Romeu por ato infracional análogo ao estupro de vulnerável.

Embora a terminologia seja inusitada, já foi citada por diversas decisões judiciais. Dentre estas, destaque-se a decisão da juíza Placidina Pires, da 10.a Vara Criminal de Goiânia (GO), que absolveu um homem que manteve relações sexuais com uma jovem de 13 anos, pois, conforme o Direito Comparado, poderia o Direito brasileiro ter adotado orientação semelhante (“Romeo and Juliet Laws”) para os casos em que não for constatada a exploração sexual dos adolescentes, ou seja, para as hipóteses em que o ato sexual consentido resultou de relação de afeto, conforme notícia publicada no Conjur14(BIFFE JUNIOR; LEITÃO JUNIOR, 2017, p. 6-7).

Assim, à aplicação pura e simples da lei penal conduziria a possíveis exageros punitivos, motivo pela qual em vários estados americanos se editaram uma legislação, objetivando conter o avanço da criminalização desses comportamentos nas esferas penais. Essas legislações foram cunhadas de Romeo and Juliet Law, afastando a criminalização entre o sexo consentido entre menores de 18 anos.

Essa Exceção de Romeu e Julieta já foi citada em inúmeros julgados de juízes singulares e Tribunais de 2ª instância.

Todavia, a Lei nº 12.015/2009 seguiu caminho diverso ao proposto, ao afastar o elemento normativo do tipo, e passou a tipificar o estupro de vulnerável no art. 217-A, já não se falando mais em presunção de violência, segundo a maioria da doutrina e posicionamento dos Tribunais Superiores. Desse modo, segundo a visão proposta por não mais haver “brechas interpretativas”, os menores de 14 anos, por exemplo, não podem mais se relacionar sexualmente.

A propósito, sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que: “Para a caracterização do crime de estupro de vulnerável, previsto no artigo 217-A do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos. O consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime” (STJ - REsp 1.480.881/PI, 2014/0207538-0).


DIVULGAÇÃO DE CENA DE ESTUPRO OU DE CENA DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL, DE CENA DE SEXO OU DE PORNOGRAFIA

Art. 218-C. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio - inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia:

Pena: reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato não constitui crime mais grave.

§1º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação.

§2º Não há crime quando o agente pratica as condutas descritas no caput deste artigo em publicação de natureza jornalística, científica, cultural ou acadêmica com a adoção de recurso que impossibilite a identificação da vítima, ressalvada sua prévia autorização, caso seja maior de 18 (dezoito) anos.

Introdução: o crime de divulgação de cena de estupro ou estupro de vulnerável, e de sexo ou pornografia sem o consentimento da vítima se trata-se de novatio legis incriminadora e, por face do princípio da reserva legal, terá sua aplicação a fatos futuros, pois não há crime sem lei anterior que o defina e não há pena sem prévia cominação legal. Tal delito tem por objetivo central frear a circulação de material (vídeo, fotografia etc.) contendo cenas de estupro, estupro de vulnerável, incitação a tais crimes, apologia de estupradores, bem como, divulgar sem o consentimento da vítima cenas de sexo com essa. Com a informatização dos meios de comunicação e da facilidade de se ter ao alcance dispositivos com câmeras, as condutas descriminadas no presente tipo penal passaram a ser comumente observadas e não poderiam passar despercebidas pelo legislador.

O famoso “nudes” que é a fotografia ou imagem contendo cena de nudez estaria enquadrada no caso – art. 218-C, caput.

Embora o delito em tela tenha como sujeito passivo tanto homens como mulheres, o número, em especial, de mulheres vítimas de “câmeras escondidas” e, mesmo que filmadas com o seu consentimento, sob o argumento daqueles que diziam a “amar” e, libertadas pelo desejo sexual de terem aquele momento íntimo gravado e, posteriormente, caiam no engodo de verem suas imagens íntimas divulgadas, sem o consentimento, muitas vezes a título de demonstração de “machismo” ou vingança e humilhação, se tornou recorrente, havendo, inclusive, sítios especializados na divulgação de tais vídeos. Com o novo dispositivo o legislador passou a incriminar as seguintes condutas:

Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio, inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual:

  1. que contenha cena de estupro (art. 213, CP);

  2. que contenha cena de estupro de vulnerável (art. 217-A, CP);

  3. que faça apologia (de estuprador ou estuprador de vulnerável);

  4. que induza a prática (de estupro ou estupro de vulnerável)

  5. que contenha cena de sexo, nudez ou pornografia, sem o consentimento da vítima;

Observe que as quatro primeiras hipóteses independem de consentimento da vítima; por outro lado, a quinta e última hipótese dependerá do consentimento da vítima.

Objeto jurídico: É a dignidade sexual de qualquer pessoa (Título VI - Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual) e, de forma mais precisa, a liberdade sexual de cada pessoa (Capítulo I – Dos Crimes Contra a Liberdade Sexual), ou seja, o direito de cada pessoa poder dispor do próprio corpo e das imagens referentes aos atos sexuais consentidos. No que tange aos atos sexuais não consentidos (estupro e estupro de vulnerável) e os casos de incitação ou apologia não podem ser divulgados.

Objeto material: O objeto material são as fotos, vídeos ou outros registros audiovisuais que contenham cena de estupro ou estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, bem como fotos, vídeos ou outros registros audiovisuais com cenas de sexo, nudez ou pornografia sem o consentimento da vítima.

Núcleo do tipo: Oferecer (expor, abastecer, exibir ou propor para que seja aceito), trocar (permutar), disponibilizar (tornar disponível, acessível, viabilizar), transmitir (propagar, disseminar, difundir), vender (alienar por determinado preço) ou expor à venda (apresentar, colocar à mostra para alienação), distribuir (entregar a várias pessoas) ou divulgar (tonar público, tornar conhecido, popularizar, propagandear) por qualquer meio, inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual:

  1. que contenha cena de estupro (art. 213, CP);

  2. que contenha cena de estupro de vulnerável (art. 217-A, CP);

  3. que faça apologia (de estuprador ou estuprador de vulnerável);

  4. que induza a prática (de estupro ou estupro de vulnerável);

  5. que contenha cena de sexo, nudez ou pornografia, sem o consentimento da vítima;

Tipo penal misto alternativo: diversos são os núcleos do tipo (oferecer, trocar, disponibilizar etc.), por isso se falar em tipo misto alternativo, assunto diretamente relacionado ao conflito aparente de normais penais. Isto é, caso o agente pratique no mesmo contexto fático mais de uma conduta descrita no tipo penal (p. ex. o agende disponibiliza e vende), responderá por um único delito do art. 218-C, não havendo que se falar em concurso de crimes. Por outro lado, se o agente, em contextos fáticos distintos, como, por exemplo, em um momento oferece fotografias de cenas de estupro, em outro distribui vídeos com estupro de vulnerável, e em outros divulga cena de sexo, sem o consentimento da vítima, neste caso, haverá concurso de crimes.

Interpretação analógica: O legislador ao expressar que a divulgação poder ser feita “por qualquer meio” lançou mão da denomida interpretação analógica, isto é, segue-se uma fórmula casuística (por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual), acompanhada de uma fórmula genérica (por qualquer outro meio). Assim, este “por qualquer meio” deve ser interpretado de acordo com aqueles aduzidos na fórmula expressa – em resumo, capazes de levar a conhecimento de terceiros.

Meios de execução: É classificado como crime de forma livre, isto é, pode ser praticado por qualquer meio de execução, como exemplo o legislador cita os meios de comunicação de massa (p. ex. internet), sistema de informática (p. ex. computadores, periféricos, softwares) ou telemática (telefonia, satélite, cabo, fibras ópticas), fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual (p. ex. GIF, fita cassete, CD, DVD).

Sujeito ativo: Trata-se de crime comum ou geral, isto é, podendo ser cometido por qualquer pessoa seja do sexo masculino, feminino ao até mesmo transexuais. Não exigindo o tipo penal qualquer qualidade especial do agente. Observe que na primeira parte da causa de aumento do §1º “a pena é aumentada de um a dois terços se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima”, se trata de crime próprio.

Sujeito passivo: pode ser qualquer pessoa (homem ou mulher).

Elemento subjetivo: É dolo, seja ele direto ou eventual. Não há expressa previsão legal da modalidade culposa, o que torna inviável a punição por culpa. Há de salientar que se o agente, por exemplo, fizer um vídeo com celular, consentido com sua companheira e, posteriormente, por negligência ou imprudência, o celular onde se encontrava o vídeo vier a ser subtraído e o terceiro que subtraí vem a divulgar os vídeos ali contidos, incorrerá no crime apenas o terceiro que divulgou, ficando o proprietário do celular isento de pena.

Consumação: O crime se consuma quando o agente pratica qualquer das condutas previstas no caput. Por se tratar de delito formal ou de consumação antecipada, não se exige a produção de qualquer resultado naturalístico. Via de regra os núcleos do tipo são instantâneos, se consumando no exato momento que se realiza a conduta. Todavia, nas condutadas oferecer, disponibilizar, divulgar e expor à venda a depender da situação pode configurar crime permanente, sendo compatível com a realização da prisão em flagrante a qualquer momento. Por exemplo, o agente “disponibiliza” no interior da sua residência o acesso a vídeos e fotografias de cenas de estupro.

Tentativa: Por se tratar de crime plurissubsistente, onde a conduta pode ser perfeitamente fracionada, é admissível o conatus.

Subsidiariedade expressa: Ao cominar a pena do delito do art. 218-C, o legislador deixou claro que o crime de divulgação de cena de estupro ou estupro de vulnerável, e de sexo ou pornografia se trata de delito subsidiário. Ou seja, ao agente só será imputado este delito “se o ato não constitui crime mais grave”. A título de exemplo, se o agente, “oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente”, responderá por crime mais grave (art. 241-A, do ECA – pena de reclusão de 3 a 6 anos, e multa).

Esse crime não se confunde com o art. 154-A5, do Código Penal Brasileiro, embora autores advogassem a ideia da incidência de injúria qualificada ou até mesmo do próprio art. 154-A, do Código Penal Brasileiro em caso de invasão de dispositivo ou nas demais condutas do tipo em cartaz. Agora com a nova Lei nos parece que poderia se falar em prevalência do tipo em cartaz, e até mesmo em concurso de crime com aquele dispositivo (art. 154-A, do Código Penal Brasileiro), vez que se tutelam bens jurídicos diversos.

Causa de aumento de pena: O §1º estabelece que a pena é aumentada de um a dois terços se o crime for praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima, ou com o fim de vingança ou humilhação. A relação íntima de afeto engloba até mesmo os namoros, relações com amantes, não sendo necessário, portanto, conforme abalizada jurisprudência a coabitação entre autor e vítima para a caracterização da mesma6. Por fim, a segunda hipótese de causa de aumento de pena é a vingança ou humilhação, esta última observe que não se faz necessário qualquer tipo de relação íntima de afeto, basta que haja a divulgação movida por forma vingativa7 (por exemplo, divulgar a cena de sexo, pois a vítima após o relacionamento de uma noite recusou ter outros relacionamentos com o(a) agente) ou como forma de humilhar a vítima, por exemplo, divulgar a cena de sexo para grupos de aplicativos de mensagens, buscando humilhar a vítima perante estudantes do colégio ou faculdade).

Divulgação legal ou permitida: O §2º traz hipótese legal de causa especial de exclusão da ilicitude. Ao nosso ver o aludido disposto ficou mal redigido, como tantas outras mudanças legislativas ocorridas nos últimos anos, vejamos: “não há crime quando o agente pratica as condutas descritas no caput deste artigo em publicação de natureza jornalística, científica, cultural ou acadêmica com a adoção de recurso que impossibilite a identificação da vítima, ressalvada sua prévia autorização, se ela for maior de dezoito anos”.

As condutas descritas no caput do art. 218-C são quatro, em resumo: 1) “divulgar cena de estupro”; 2) “divulgar cena de estupro de vulnerável”; 3) “divulgar apologia ou incitações ao estupro ou estupro de vulnerável”; e 4) “divulgar cena de sexo sem o consentimento da vítima”. Observe que as três primeiras condutas são delitos de ação penal pública incondicionada (art. 213, 217-A e 218-D), portanto, a apuração sai da esfera de disponibilidade da vítima e ingressa no interesse estatal. Em relação a última conduta (divulgação de cena de sexo sem o consentimento da vítima) o delito é o próprio art. 218-C. Observe que ao final do aludido dispositivo o legislador lança a seguinte redação “ressalvada sua prévia autorização, se ela for maior de 18 anos”.

Dito isto, as indagações a serem feitas são as seguintes:

  1. a vítima de estupro, maior de 18 anos, pode autorizar a exibição das imagens do seu estupro?

  2. a vítima de estupro de vulnerável, no conceito do §1º, do art. 217-A, pode autorizar a exibição das imagens do seu estupro?

  3. A vítima no delito de apologia ou incitação ao estupro ou estupro de vulnerável é a coletividade (crime vago), portanto, como se autoriza a “vítima” maior de 18 anos a divulgar tais vídeos?

Nosso entendimento: a publicação de natureza jornalística, científica, cultural ou acadêmica dos casos de estupro, estupro de vulnerável e de incitação ou apologia deverão sempre estar acompanhadas com a adoção de recurso que impossibilite a identificação da vítima. Neste caso, por se tratar de delitos de ação penal pública incondicionada não existe possibilidade de se consentir para que se publique. Observe ainda que se a publicação da cena de estupro tiver por intuito jornalístico a identificação do autor do crime, preservando, todavia, a imagem da vítima, não há que se falar em prática de crime. No tocante a última hipótese (divulgar cena de sexo sem o consentimento da vítima), nesta única hipótese admitir-se-ia o consentimento da vítima maior de 18 anos, pois entraria neste conceito os filmes pornôs, onde as pessoas (homem, mulher ou transexuais) consentem com a divulgação da sua imagem.

Nessa ótica também, para interessante abordarmos a situação de que não se identificando a vítima, com a sua prévia autorização, se ela for maior de dezoito anos, permite vídeos ou imagens de swing (troca de casais e outras modalidades de sexos que haja prática sexual de várias pessoas no mesmo ambiente do ato sexual).

Ação penal: É Pública incondicionada. Em conformidade com a nova redação do art. 225. do CP todos os crimes previstos no capítulo I e II são apurados mediante ação penal pública incondicionada. Sobre o assunto remetemos o leitor aos comentários do aludido dispositivo.

Lei nº. 9.099/1995: O delito de importunação sexual é crime de médio potencial ofensivo, tendo em vista que a sua pena mínima (1 ano) autoriza a incidência da suspensão condicional do processo, desde que presente os requisitos do art. 89. da Lei nº. 9.099/1995. Todavia, tal benefício será vedado, se, no caso concreto, for aplicável a majorante do §1º, do art. 226. ou a majorante do art. 234-A, pois em todas as hipóteses acima enumeradas o mínimo da pena privativa de liberdade ultrapassa o limite admitido pelo art. 89. da Lei nº. 9.099/1995.

Pena cominada: reclusão de 1 a 5 anos. Observe os comentários pertinentes à subsidiariedade expressa do delito em comento.

Segredo de justiça: Conforme o art. 234-B, do CP, os processos em que se apuram crimes contra a dignidade sexual correrão em segredo de justiça.

Distinção – art. 218-C do CP e art. 241-A da Lei nº. 8.0691/1990: Com o advento da Lei nº. 13.718/2018 e a criação do novo tipo penal do art. 218-C teria havido revogação tácita do delito do art. 241-A do Estatuto da Criança e do Adolescentes? Para responder esta pergunta, vejamos a tabela abaixo:

Art. 218-C, CP

Art. 241-A, ECA

Art. 218-C. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio, inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia:

Pena: reclusão, de um a cinco anos, se o fato não constitui crime mais grave.

§1º A pena é aumentada de um a dois terços se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima, ou com o fim de vingança ou humilhação.

§2º Não há crime quando o agente pratica as condutas descritas no caput deste artigo em publicação de natureza jornalística, científica, cultural ou acadêmica com a adoção de recurso que impossibilite a identificação da vítima, ressalvada sua prévia autorização, se ela for maior de dezoito anos.

Art. 241-A. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:

Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.

§ 1º Nas mesmas penas incorre quem:

I – assegura os meios ou serviços para o armazenamento das fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo;

II – assegura, por qualquer meio, o acesso por rede de computadores às fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo.

§ 2º As condutas tipificadas nos incisos I e II do § 1º deste artigo são puníveis quando o responsável legal pela prestação do serviço, oficialmente notificado, deixa de desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito de que trata o caput deste artigo.

Total de nove (09) núcleos – verbos.

Total de sete (07) núcleos – verbos.

Pode ser praticado por qualquer meio, inclusive os de informática.

Pode ser praticado por qualquer meio, inclusive os de informática.

Objeto material: fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de:

  1. estupro ou;

  2. estupro de vulnerável ou;

  3. que faça apologia ou induza a sua prática, ou;

  4. Sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia.

Objeto material: fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de:

  1. sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente.

Há causa de aumento de pena no §1º, onde “A pena é aumentada de um a dois terços se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima, ou com o fim de vingança ou humilhação”.

Não há causa de aumento de pena.

Não há figura equiparada.

Há figura equiparada no §1º.

Há hipótese de exclusão da ilicitude (§2º).

Não há hipótese de exclusão da ilicitude. Há uma condição de punibilidade no §2º.

A grande questão reside na seguinte indagação: qualquer cena de sexo envolvendo criança ou adolescente até 14 anos incompletos8 (se trata de estupro de vulnerável), portanto, percebe-se que a conduta do novo delito do art. 218-C, abrange quase que por completo a conduta do art. 244-A do ECA. A única situação que permaneceria intacta no art. 244-A do ECA é a situação de divulgação de cena de sexo consentido de maior de 14 e menor de 18 anos. Observe que no caso de sexo consentido de maior de 14 e menor de 18 anos, não há estupro, nem se quer estupro de vulnerável, mas, ainda assim, haveria o delito do art. 244-A, tendo em vista que o legislador é peremptório em afirmar que constitui crime a simples divulgação de cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente. Do exposto, levando em consideração a subsidiariedade expressa do delito do art. 218-C, CP e da plena vigência do art. 244-A do ECA, temos o seguinte:

  1. Divulgação de cena de estupro de vulnerável (diga-se, de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente menor de 14 anos): Aplica-se o art. 244-A, do ECA, com pena de reclusão de três (03) a seis (06) anos e multa. Ficando afastado, neste caso, o delito subsidiário do art. 218-C, do CP.

  2. Divulgação de cena de sexo consentido envolvendo maior de 14 e menor de 18 anos e a divulgação sendo consentida: Neste caso não há estupro, nem se quer estupro de vulnerável, e muito menos a divulgação sem o consentimento da vítima. Portanto, em tais situações não há que se falar na aplicação do art. 218-C, CP. Todavia, resta a ser aplicado ao caso o delito do art. 244-A, ECA, tendo em vista que o legislador dispensa eventual consentimento da vítima, sendo taxativo ao tratar tal conduta como delituosa.

  3. Divulgação de cena de sexo, nudez ou pornografia consentido envolvendo maior de 18 anos, sem consentimento da vítima: neste caso haveria o delito do art. 218-C do CP, com pena de um (01) a cinco (05) anos de reclusão.

  4. Divulgação de cena de estupro de vulnerável no conceito do §1º do art. 217-A, CP: O §1º do art. 217-A do CP, também considera vulnerável as pessoas que “por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência”. Neste caso, restaria a aplicação do delito do art. 218-C, CP, tendo em vista que tais condutas não estão abrangidas pelo art. 244-A, ECA.

  5. Divulgação de cena de estupro de maior de 18 anos: neste caso aplica-se o delito do art. 218-C do CP, com pena de um (01) a cinco (05) anos de reclusão.

  6. Divulgação de incitação ou apologia de crime de estupro ou estupro de vulnerável: neste caso também se aplica do delito do art. 218-C do CP, com pena de um (01) a cinco (05) anos de reclusão.

Em resumo, a parte do dispositivo do art. 218-C que trata da “divulgação de cena de estupro de vulnerável” é em certa parte nitidamente subsidiário e letra morta no que tange aos menores e adolescentes, primeiro, pelas condutas do art. 244-A do ECA englobar por completo a modalidade de vulnerável do caput do art. 217-A, CP; segundo, pela subsidiariedade expressa do art. 218-C. Do exposto, verifica-se, nitidamente, que o legislador desconhece por completo o emaranhado de leis penais que estão atualmente em vigência no nosso país. Analisando os trâmites legais do processo legislativo da lei em análise, e a quantidade de “revisões” etc. é de se pensar o que, de fato, fazem os “revisores” e os legisladores em seus gabinetes, tendo em vista a tamanha incongruência na elaboração dos dispositivos penais. Até mesmo para os estudiosos do assunto se torna complicado sistematizar e buscar uma aplicação lógica e coerente das Leis Penais. Pelo visto, em breve, se fará necessário um novo Vicente de Piragibe, para consolidar e melhor sistematizar as Leis Penais que se encontram atualmente em vigor no nosso país.

Sobre os autores
Marcel Gomes de Oliveira

Delegado de Polícia no Estado do Mato Grosso, atualmente lotado na Coordenadoria de Plantão Metropolitano. Formado pelo Centro Universitário Jorge Amado - UNIJORGE. Foi Advogado e consultor jurídico. Especialista em Direito do Estado. Especialista em Metodologia do Ensino Superior. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Penal e Direito Processual Penal. Foi professor de Criminologia, Ética, Direitos Humanos e Cidadania do Curso de Formação de Oficiais da Polícia Militar do Estado da Bahia. Atuou também como professor de Direito Penal, Legislação Penal Especial e Medicina Legal das Faculdades 2 de Julho. E, como professor de Direito Penal e Direito Processual Penal do Centro Universitário da Bahia (Estácio de Sá). Atualmente é professor de cursos preparatórios para concursos públicos e professor da Academia de Polícia Judiciária Civil do Estado do Mato Grosso - ACADEPOL/MT.

Joaquim Leitão Júnior

Delegado de Polícia no Estado de Mato Grosso. Atualmente lotado no Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (GAECO). Mentor da KDJ Mentoria para Concursos Públicos. Professor de cursos preparatórios para concursos públicos. Ex-Diretor Adjunto da Academia da Polícia Judiciária Civil do Estado de Mato Grosso. Ex-Assessor Institucional da Polícia Civil de Mato Grosso. Ex-assessor do Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Palestrante. Pós-graduado em Ciências Penais pela rede de ensino Luiz Flávio Gomes (LFG) em parceria com Universidade de Santa Catarina (UNISUL). Pós-graduado em Gestão Municipal pela Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT e pela Universidade Aberta do Brasil. Curso de Extensão pela Universidade de São Paulo (USP) de Integração de Competências no Desempenho da Atividade Judiciária com Usuários e Dependentes de Drogas. Colunista do site Justiça e Polícia, coautor de obras jurídicas e autor de artigos jurídicos.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Marcel Gomes; LEITÃO JÚNIOR, Joaquim. As inovações legislativas aos crimes sexuais no enfrentamento à criminalidade: comentários à Lei n. 13.718/2018. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5579, 10 out. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/69534. Acesso em: 22 dez. 2024.

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