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Função social da farmácia como estabelecimento de saúde

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Agenda 02/11/2023 às 11:28

CONCLUSÃO

Os estabelecimentos farmacêuticos exercem relevante papel junto à sociedade, carregando ao longo dos anos uma elevada responsabilidade no ramo da saúde em razão da capilaridade de sua distribuição geográfica, e o farmacêutico, pela sua competência e disponibilidade.

Por vezes representam a primeira e única possibilidade de acesso das pessoas ao cuidado em saúde, especialmente para as famílias com piores condições socioeconômicas.

O estabelecimento de saúde, embora possua aspecto comercial, diferencia-se da maioria dos outros comércios pela peculiaridade de ter como mercadoria um insumo à saúde, qual seja: o medicamento.

A responsabilidade do profissional farmacêutico na orientação ao paciente, esclarecendo os riscos do uso de medicamento de maneira desnecessária ou exagerada, respeitando o direito do usuário de conhecer o medicamento que lhe é dispensado e de decidir sobre sua saúde e seu bem-estar, é imprescindível à saúde da população.

Sua atuação constitui condição primordial à proteção e à recuperação da saúde individual e coletiva. Nesse contexto, o farmacêutico contemporâneo atua no cuidado direto ao paciente, promove o uso racional de medicamentos e de outras tecnologias em saúde, redefinindo sua prática a partir das necessidades do paciente, da família, dos cuidadores e da sociedade.

Ressalte-se, ainda, que a Lei nº 5.991/73, em seu artigo 41, determina ao responsável técnico pelo estabelecimento farmacêutico solicitar confirmação expressa ao profissional que prescreveu dosagem de medicamento que porventura ultrapasse os limites farmacológicos ou apresente incompatibilidades e, desse modo, vem demonstrar claramente ser do profissional farmacêutico a responsabilidade final dos riscos decorrentes da dispensação inadequada de medicamentos.

Depreende-se, assim, que a legislação sanitária sobre o medicamento inclui todas as etapas; abrange desde a pesquisa clínica até o consumo, passando pela produção, distribuição, prescrição e dispensação. Uma falha em algum dos pontos dessa cadeia poder influenciar negativamente a saúde das pessoas.

Nesse diapasão, a farmácia não pode ser considerada como uma “loja”, um estabelecimento que não considera a natureza especial do seu produto – o medicamento – e, em consequência, não pode realizar um serviço de qualidade não condizente com a defesa da saúde dos indivíduos e da sociedade.

Cabe ao estabelecimento preconizar uma racionalidade da ciência e do compromisso social que sua atividade envolve, a exemplo do que ocorre nos países desenvolvidos.

Assinale-se, por oportuno, que, considerando as distintas realidades e as demandas singulares da população, a sociedade clama por mais cuidado e atenção às suas necessidades de saúde.

Atender a esse chamado é um grande desafio, mas também uma oportunidade ímpar para que o farmacêutico assuma de vez um papel relevante como protagonista das ações em prol da saúde da população brasileira.

Sendo assim, a partir da recente regulamentação da prescrição farmacêutica, farmacêutico pode se ver amparado para cumprir sua missão perante a sociedade, qual seja: a de proporcionar aos pacientes o máximo de benefício possível dos medicamentos que utilizam e o acesso a um serviço qualificado.

Desse modo, mais uma vez a presença e a responsabilidade técnica do farmacêutico, bem como o conceito de estabelecimento de saúde às farmácias tiveram e se mantêm em destaque no país.

Um ponto preocupante diagnosticado com a pesquisa é o fato de a propaganda e marketing das grandes empresas farmacêuticas sobre os prescritores, tornando a utilização excessiva do medicamento uma prática comum, gerando problemas, ao invés de combatê-los.

Os grandes laboratórios se utilizam de seu poder econômico para expandir seu negócio muitas das vezes sem ter como referência princípios éticos, mas tão-somente visando o melhor custo-benefício para auferir lucros exponenciais.

Esta questão é ainda agravada pela prática da “empurroterapia”, ou seja, a indução ao cliente para comprar e consumir medicamentos desnecessariamente, trazendo vantagens materiais aos dispensadores, na medida em que intensifica a prática inadequada da utilização de remédios.

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Reconhece-se que o uso irracional de medicamentos ocorre por excesso, por falta, por uso desnecessário ou impróprio. Vários fatores contribuem para este problema, entre eles a falta de informações claras e objetivas sobre os medicamentos para os que prescrevem e para os que consomem.

Isto influencia a escolha dos medicamentos e encoraja as pessoas a usarem medicamentos inadequadamente em situações que talvez nem fossem necessários.

Sabe-se que os custos do uso irracional de medicamentos e dos erros de medicação são imensos para a sociedade. A má utilização de medicamentos é uma questão discutida há algumas décadas pela OMS, que desde a vigésima oitava Assembleia Mundial de Saúde, em 1975, está convencida da necessidade do desenvolvimento de políticas de medicamentos que ligassem a pesquisa de fármacos, produção e distribuição às reais necessidade de saúde.

Dessa forma, a elaboração de políticas de medicamentos constitui estratégia fundamental para garantir acesso da população aos medicamentos essenciais e promover o uso racional.

A Política Nacional de Medicamentos (PNM), fruto de uma longa discussão que se iniciou em 1986, na 8ª Conferência Nacional de Saúde, veio como uma proposta para reorganizar a assistência farmacêutica e adequá-la às diretrizes do Sistema Único de Saúde.

Desde então, no Brasil, desenvolvem-se programas de assistência farmacêutica dentro de uma nova concepção de saúde, sendo esta mais um elemento importante da reforma sanitária no país.

A assistência farmacêutica, dentro desse contexto, é um dos setores fundamentais e de crescente importância, tendo o medicamento como insumo essencial e requer farmacêuticos preparados para sua gestão.

Contudo, atualmente muitos municípios ainda não possuem farmacêutico no gerenciamento da assistência farmacêutica.

É cada vez mais evidente que a formação crítica de dispensadores, prescritores, gestores e a do público em geral é elemento importante na implantação de políticas que visam melhorar a utilização de medicamentos.

Cabe acrescentar que, complementarmente ao trabalho do farmacêutico, está a comprovação do impacto na redução de custos, devida à sua atuação no planejamento e na avaliação de compra e utilização dos medicamentos, refletindo, inclusive, na redução nas internações hospitalares.

Estas, na maioria dos casos, poderiam ser evitadas, por meio de ações de promoção do uso correto e racional de medicamentos e atividades clínicas do farmacêutico atuando junto a equipes de saúde e aos pacientes.

Estima-se que mais de 50% de todos os medicamentos são prescritos, dispensados ou vendidos inapropriadamente e que metade dos pacientes não tomam seus medicamentos corretamente.

Esbarra-se, uma vez mais, na importância do profissional farmacêutico para minimizar a automedicação, dada a sua formação técnica para desempenhar suas atividades com segurança e observância a princípios éticos.

O Brasil possui leis suficientes para garantir o funcionamento adequado do estabelecimento farmacêutico e do profissional respectivo. O problema não é a falta de lei, mas a negligência de sua aplicação.

O desafio encontra-se em dar real efetividade à legislação que regula o ramo farmacêutico e medicamentoso, sendo que seu cumprimento e dever de todos.


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Sobre o autor
Lucas Calvi Akl

Advogado, com atuação especializada em concurso público e processo disciplinar.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AKL, Lucas Calvi. Função social da farmácia como estabelecimento de saúde. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7428, 2 nov. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/70385. Acesso em: 23 nov. 2024.

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