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A aplicabilidade do acordo de leniência na lei anticorrupção

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3 LEI Nº 12.846/2013 (LEI ANTICORRUPÇÃO)

3.1 ORIGEM

Como o foco deste trabalho, é o Acordo de Leniência, é necessário entender onde este instrumento está inserido em nosso ordenamento jurídico, e tudo isso passa pela conhecida Lei Anticorrupção, que trouxe diversas novidades para o combate à corrupção.

De forma inédita, esta lei trouxe a ideia de que era preciso responsabilizar as pessoas jurídicas que cometem os atos corruptivos contra o poder público, seja ele nacional ou até mesmo internacional, tanto de forma civil como de forma administrativa.

Somente a partir desta lei, o governo passou a ter possibilidades efetivas de punir as pessoas jurídicas, pois antes somente era possível a punição de pessoas físicas que agiam em nome de empresas.

Esta lei surgiu de ideias debatidas em encontros internacionais sobre o tema, onde firmaram compromissos firmados entre diversos países que seria necessário o combate a estas empresas que agem de forma ilícita, pois também afeta os aspectos econômicos.

Um grande encontro que marcou esta época, foi a Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, fechada em Paris, no dia 17 de dezembro de 1997, onde foi trazida para nosso ordenamento por meio do Decreto 3.678/2000. Mais precisamente o texto adotado com relação a Organização para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento (OCDE), no qual o Brasil acabou adotando mesmo não sendo membro efetivo deste grupo.

Para ter uma melhor noção sobre o que está sendo abordado, assim fala a convenção:

Artigo 2

Responsabilidade de Pessoas Jurídicas

Cada parte deverá tomar todas as medidas necessárias ao estabelecimento das responsabilidades de pessoas jurídicas pela corrupção de funcionário público estrangeiro, de acordo com seus princípios jurídicos.

Artigo 3

Sanções

1. A corrupção de um funcionário público estrangeiro deverá ser punível com penas criminais efetivas, proporcionais e dissuasivas. A extensão das penas deverá ser comparável àquela aplicada à corrupção do próprio funcionário público da Parte e, em caso de pessoas físicas, deverá incluir a privação de liberdade por período suficiente a permitir a efetiva assistência jurídica recíproca e a extradição.

2. Caso a responsabilidade criminal, sob o sistema jurídico da Parte, não se aplique a pessoas jurídicas, a Parte deverá assegurar que as pessoas jurídicas estarão sujeitas a sanções não-criminais efetivas, proporcionais e dissuasivas contra a corrupção de funcionário público estrangeiro, inclusive sanções financeiras.

3. Cada Parte deverá tomar todas as medidas necessárias a garantir que o suborno e o produto da corrupção de um funcionário público estrangeiro, ou o valor dos bens correspondentes a tal produto, estejam sujeitos a retenção e confisco ou que sanções financeiras de efeito equivalente sejam aplicáveis.

4. Cada Parte deverá considerar a imposição de sanções civis ou administrativas adicionais à pessoa sobre a qual recaiam sanções por corrupção de funcionário público estrangeiro.

Após este período, o Brasil deu mais um passe ao ratificar o texto da Convenção Interamericana contra a Corrupção por meio do Decreto 4.410/2002. Esta convenção objetivou mais ainda a consciência dos países membros para o necessário combate a conduta lesiva de pessoas e empresas que corrompem agentes públicos.

Artigo VIII

Suborno transnacional

Sem prejuízo de sua Constituição e dos princípios fundamentais de seu ordenamento jurídico, cada Estado Parte proibirá e punirá o oferecimento ou outorga, por parte de seus cidadãos, pessoas que tenham residência habitual em seu território e empresas domiciliadas no mesmo, a um funcionário público de outro Estado, direta ou indiretamente, de qualquer objeto de valor pecuniário ou outros benefícios, como dádivas, favores, promessas ou vantagens em troca da realização ou omissão, por esse funcionário, de qualquer ato no exercício de suas funções públicas relacionado com uma transação de natureza econômica ou comercial.

Após este decreto, o Brasil se tornou filiado da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, cujo conteúdo foi incorporado pelo Decreto 5.567/2006. Este acordo foi muito importante pois trouxe em seu texto assuntos que auxiliaram para a formação de uma legislação para responsabilizar as pessoas jurídicas. Desta convenção, podemos destacar dois artigos que foram destinados a esta matéria, o artigo 12, que fala do Setor Privado e o artigo 26, que trata da Responsabilidade das pessoas jurídicas, como consta abaixo:

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Artigo 12

Setor Privado

1. Cada Estado Parte, em conformidade com os princípios fundamentais de sua legislação interna, adotará medidas para prevenir a corrupção e melhorar as normas contábeis e de auditoria no setor privado, assim como, quando proceder, prever sanções civis, administrativas ou penais eficazes, proporcionadas e dissuasivas em caso de não cumprimento dessas medidas.

Artigo 26

Responsabilidade das pessoas jurídicas

1. Cada Estado Parte adotará as medidas que sejam necessárias, em consonância com seus princípios jurídicos, a fim de estabelecer a responsabilidade de pessoas jurídicas por sua participação nos delitos qualificados de acordo com a presente Convenção.

É nítido o maior comprometimento do Brasil no cenário internacional, isso se dá principalmente com as medidas mais duras para a punição de pessoas jurídicas que cometem atos lesivos, assim se adequando a outros países que já haviam adotado em seu ordenamento jurídico.

3.2 CARACTERÍSTICAS

3.2.1 Alcance

A primeira característica que podemos destacar desta lei é que o seu alcance de punição se restringe apenas as pessoas jurídicas, sendo aplicadas a todas as sociedades empresárias e sociedade simples, personificadas ou não, seja qual for sua forma de organização ou modelo societário que adota, assim como a algumas fundações, associações de entidades ou pessoas, ou até mesmo sociedades estrangeiras sediadas ou com alguma representação no Brasil, constituída de fato ou de direito, mesmo que de forma temporária.

3.2.2 Esferas

A segunda característica fica por conta de duas esferas distintas de responsabilização, sendo elas de forma civil ou de forma administrativa. Não será necessário a comprovação de dolo ou culpa nos dois casos, com isso pode destacar o caráter objetivo da Lei.

Apesar de que a lei não dispõe sobre penas aplicadas a pessoas físicas, para isso, existem outras legislações que cuidam deste assunto, isto quer dizer que as pessoas por trás das empresas corruptoras não ficarão de fora da responsabilização

3.2.3 Responsabilidade Administrativa

Para a devida responsabilização administrativa de pessoa jurídica por ato lesivo à administração pública, nacional ou estrangeira, deverá ter uma prévia instrução do processo administrativo de responsabilização (PAR), que obedecerão aos requisitos legais contidos na Lei Anticorrupção, assim também considerando sua natureza sancionatória, será garantido o princípio da ampla defesa e contraditório, assim quando cabível, os princípios do Direito Penal.

3.2.4 Responsabilidade Judicial

Mesmo que não concluído o processo administrativo, poderá a autoridade competente propor ao seu órgão de representação judicial para adotar as medidas necessárias para o ingresso da ação judicial, em nome dos entes lesados.

Além destes entes que foram lesados, o Ministério Público terá legitimidade ativa para propor ação judicial de que trata a Lei Anticorrupção, podendo ainda o MP cumular ao pedido a imposição das medidas administrativas que constam na Lei, quando for demonstrada a omissão da autoridade competente para promovê-las.

3.2.5 Norma Penal Comunicativa

Uma das características que não pode deixar de ser abordada é a comunicação da Lei Anticorrupção com as normas penais. Pode-se perceber alguns exemplos desta ideia, como a comparação do artigo 5º da LAC e o artigo 333, do Código Penal.

Art. 5o Constituem atos lesivos à administração pública, nacional ou estrangeira, para os fins desta Lei, todos aqueles praticados pelas pessoas jurídicas mencionadas no parágrafo único do art. 1o, que atentem contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, contra princípios da administração pública ou contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, assim definidos:

I - prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada;

Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício:

Pena - reclusão, de 1 (um) ano a 8 (oito) anos, e multa.

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)

Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.

Contrabando ou descaminho

Ao mesmo tempo que for comprovada a responsabilidade administrativa da pessoa jurídica, pode-se perceber também a conduta praticada por pessoa natural, com isso o ajuizamento de uma ação penal em seu desfavor, por isso a comunicação entre as duas normas.

3.3 REGULAMENTAÇÃO

A regulamentação da LAC ocorreu por meio do Decreto 8.420, que somente foi publicado no dia 19 de março de 2015, passando de um ano sobre a data imposta pela Lei.

Após o Decreto, a CGU, no dia 7 de abril de 2015 publicou quatro normas para esclarecer mais ainda a aplicação da LAC. Estamos falando das portarias 909, que trata sobre documentos, informações e relatórios que deverão ser disponibilizados pelas pessoas jurídicas e 910, que trata dos procedimentos de apuração da responsabilidade administrativa das pessoas jurídicas e a celebração do acordo de leniência, e das instruções normativas 1, que trata do modo da apuração do faturamento e dos tributos excluídos do cálculo da multa estabelecida pela Lei e 2, que trata do registro das informações no CEIS (Divulga os nomes das pessoas naturais e jurídicas impedidas de atuar em licitações públicas) e no CNEP (Publicidade das sanções aplicadas com base na LAC).

Logo após um ano, no dia 16 de dezembro de 2016, outra portaria foi publicada, agora a Portaria Interministerial 2.278, de 15 de dezembro de 2016, assinada pelo Ministro de Estado da Transparência, Fiscalização e CGU e pela AGU, onde indicou os procedimentos que deverão ser observados para a celebração do acordo de leniência pela CGU e dispõe acerca da participação da AGU.

Este Decreto acabou revogando os dispositivos que tratavam da negociação do acordo de leniência da portaria 910, em seus artigos 27 a 37.

Mesmo com da revogação expressa, pouca mudança ocorreu com a regulamentação deste novo dispositivo. Serviu mais para impor a participação da AGU no caminhar do processo.

Sobre os autores
Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Monografia apresentada como exigência parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação de conteúdo do professor Me. José Clauber Matos Brayner e orientação metodológica do professor Dr. Francisco Hélio Monteiro Júnior.Sobral – CE

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