RESUMO: O setor empresarial brasileiro tem sofrido ao longo dos anos com o excesso de burocracia para a obtenção de registro empresarial e exercício das atividades. Tal fator tem sido determinante para que o empreendedor prefira atuar na informalidade, sonegando impostos, sem gerar empregos formais, o que afeta o desenvolvimento econômico do país. Neste sentido, promover a desburocratização do setor se apresenta com relevante importância para incentivo à abertura de novos empreendimentos, contribuindo diretamente para ampliar o desenvolvimento econômico do país. Assim, promover a desburocratização no intuito de facilitar e agilizar o processo de formalização e operação das empresas é essencial para o desenvolvimento socioeconômico. Há a necessidade de simplificar as leis que regulamentam as empresas, diminuindo excesso que gera entraves aos empreendedores e instigam a corrupção. Para análise e melhor compreensão do tema, foi realizada uma pesquisa de cunho bibliográfico exploratório, com estudo de doutrinas, artigos jurídicos, estudos científicos e jurisprudência.
Palavras - chave: burocracia – corrupção – desenvolvimento – empresa – empreendedor
1. INTRODUÇÃO
A atividade empresarial não se define tão somente pela obtenção do registro de pessoa jurídica, com inscrição Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica. É necessário que a pessoa tenha vocação para gerenciar e transformar uma ideia em um negócio. É necessário investimento de recursos, mão de obra, insumos e tecnologias para que se possa produzir bens e serviços que devem ser úteis para a sociedade, caso contrário, será um investimento sem retorno. Logo, ao empreendedor exige-se vocação e competência para realizar a estruturação da atividade e viabilização da oferta do seu produto ou serviço ao mercado consumidor, com competitividade e qualidade.
Historicamente, a atividade empresarial começou a surgir quando as pessoas pararam de produzir apenas os itens que precisavam, abria-se espaço para as trocas de mercadorias com os vizinhos, que produziam em excesso determinado produto. [3]
A intensificação das atividades comerciais proporcionou o surgimento, ainda no século XIX do Direito Comercial, com o intuito de regular as relações comerciais. O Direito Comercial foi substituído pela Teoria da Empresa. Teoria italiana datada de 1942, que foi instituída para regular as atividades econômicas particulares. Neste sentido, Israel Mendes Góes Oliveira leciona:
A Teoria da Empresa surge na Itália em 1942, como um novo sistema de regulação das atividades econômicas dos particulares. O Codice Civile passa a disciplinar tanto matéria civil como a comercial. A teoria da empresa muda o foco do Direito Comercial, que deixa de ser “atos de comércio” e passa a ser da “empresa”. No Brasil, o Código Comercial de 1850 sofreu forte influência da teoria dos atos de comércio. Mas a defasagem entre a teoria dos atos de comércio e a realidade disciplinada pelo Direito Comercial, e a atualidade do sistema italiano de bipartir o direito privado começaram a ser apontadas na doutrina brasileira nos anos 1960. O direito brasileiro já incorporava então a teoria das empresas, mesmo antes da entrada em vigor do Código Civil, nas lições da doutrina, na jurisprudência e em leis esparsas. Com a entrada em vigor do Código, conclui a demorada transição do sistema francês para o italiano. (OLIVEIRA, 2016:1)
Assim, deu-se início à regulação das atividades mercantis no mundo. No Brasil, a atividade comercial surgiu junto com o seu descobrimento, conforme relata Genesis José:
O início da atividade empresarial no Brasil se deu desde o seu descobrimento, no momento em que a coroa portuguesa deseja a exploração das novas terras descobertas. O primeiro produto fonte de capital no país foi o pau-brasil, que foi altamente explorado e exportado, quase sendo extinto no território brasileiro, posteriormente várias outras fontes de capital foram criadas, como o plantio da cana de açúcar, a mineração do ouro o cultivo do café e por fim, a indústria criou força.Hoje, em século XXI, a economia brasileira não mais se concentra somente na área rural ou de mineração, foi bem difundida. O empreendedorismo no Brasil e altíssimo, um dos mais elevados do mundo, vários fatores podem proporcionar esses números, como por exemplo o desemprego. (JOSÉ, 2018:5)
Boris Fausto explica que Portugal foi o principal explorador econômico do Brasil:
[...] entre 1500 e 1535, a principal atividade econômica foi a extração do pau-brasil, obtida principalmente mediante troca com os índios. As árvores não cresciam juntas, em grandes áreas, mas encontravam-se dispersas. À medida que a madeira foi-se esgotando no litoral, os europeus passaram a recorrer aos índios para obtê-la. O trabalho coletivo, especialmente a derrubada de árvores, era uma tarefa comum na sociedade tupinambá. Assim, o corte do pau-brasil podia integrar-se com relativa facilidade aos padrões tradicionais da vida indígena. Os índios forneciam a madeira e, em menor escala, farinha de mandioca, trocadas por peças de tecido, facas, canivetes e quinquilharias, objetos de pouco valor para os portugueses.[4] (FAUSTO, 1996:23)
Outro momento importante da atividade empresarial no Brasil foi a exploração de metais preciosos, que provocou uma grande corrente migratória para o Brasil. Após essa fase deu-se início à comercialização do café, que tornou-se o principal produto da economia brasileira, gerando riquezas e impulsionando o desenvolvimento do país com a exportação do grão. Mais tarde, com o Governo Vargas iniciou-se a era industrial do país o que impulsionou a criação de empresas de diversas áreas. E, daí por diante o surgimento de novas empresas tornou-se o grande fator de desenvolvimento econômico. Murilo Rodrigues Alves destaca que:
Na comparação mundial, o Brasil se destaca com a maior taxa de empreendedorismo, quase 8 pontos porcentuais à frente da China, o segundo colocado, com taxa de 26,7%. O número de empreendedores entre a população adulta no país é também superior ao dos Estados Unidos (20%), Reino Unido (17%), Japão (10,5%) e França (8,1%). Entre as economias em desenvolvimento, a taxa brasileira é superior à da Índia (10,2%), África do Sul (9,6%) e Rússia (8,6%). (ALVES, 2015:3)
Para regular esse mercado empreendedor, o Brasil possui atualmente no Código Civil de 2002 diversos dispositivos legais que tratam da atividade empresarial. Um deles trata da definição conceitual da figura do empresário: “Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços” (BRASIL, 2015:212). Este é o responsável por desenvolver as atividades relacionadas à comercialização de bens e serviços. A atividade empresarial é revestida de procedimentos jurídicos destinados a garantir a segurança jurídica da atividade. Para Israel Mendes Góes Oliveira
A atividade empresarial é econômica, pois tem a finalidade de obter-se, na maioria dos casos, o lucro. O lucro é essencial para manter a empresa, uma vez que se as despesas superam os rendimentos, fica impossível de se auto sustentar. Claro que existem exemplos em que o lucro não é a finalidade, mas eles continuam sendo essenciais para o custeio do empreendimento. Nesse caso, o lucro passa a ser um meio e não mais uma finalidade. (OLIVEIRA, 2016:1)
Para iniciar uma atividade empresarial, o empresário deve atender a uma série de requisitos jurídicos, para que sua atividade possua segurança jurídica e não seja uma atividade ilícita, pois se o empreendedor não observar os preceitos legais e atuar na informalidade estará infringindo a lei e sonegando impostos.
A burocracia passou a ser adotada como um modelo de administração pública no Brasil por reivindicação dos trabalhadores que sofriam com os tratamentos desiguais e até mesmo a corrupção como afirma Giovanna Carranzo:
Surge na segunda metade do século XIX, na época do estado liberal,como forma de combater a corrupção e o nepotismo patrimonialista. Constituía-se numa alternativa muito superior à administração patrimonialista do Estado. Tal modelo foi adotado inicialmente nas empresas, principalmente em organizações industriais, em decorrência da necessidade de ordem e exatidão e das reivindicações dos trabalhadores por um tratamento justo e imparcial. É necessário diferenciar quando surgiu a burocracia no mundo e no Brasil. No mundo, a administração burocrática surge na segunda metade do século XIX, no auge do Estado Liberal. O objetivo era combater o nepotismo e a corrupção, entraves para o capitalismo, para o desenvolvimento dos mercados. Influenciado pelos ideais de Weber, Getúlio Vargas, no Brasil, implementou o modelo burocrático, a partir de 1930, em plena ditadura.(CARRANZO, 2016:366)
Ocorre que o modelo de administração burocrático reivindicado como uma necessidade, passou a ser visto também como uma barreira devido ao emprego exagerado de formalidades que estorvam a celeridade dos processos. Em novembro 1.999 o Ministro Adylson Motta do Tribunal de Contas da União, discorreu em decisão, sobre o reflexo do excesso de burocracia na administração pública
[...] o apego a formalismos exagerados e injustificados é uma manifestação perniciosa da burocracia que, além de não resolver apropriadamente problemas cotidianos, ainda causa dano ao Erário, sob o manto da legalidade estrita. Esquece o interesse público e passa a conferir os pontos e vírgulas como se isso fosse o mais importante a fazer. Os princípios da proporcionalidade e razoabilidade acarretam a impossibilidade de impor conseqüências de severidade incompatível com a irrelevância de defeitos. Sob esse ângulo, as exigências da Lei ou do edital devem ser interpretadas como instrumentais. (BRASILIA, 1999: 50)
A atividade empresarial informal é grande pelo país afora. Isso se deve a diversos fatores inclusive ao excesso de burocracia que dificulta a abertura de novas empresas. Para inibir essa informalidade, o Estado tem dispensado esforços, ao longo dos anos, para incentivar a busca pela formalização dos empreendimentos. Contudo, ainda assim, é possível encontrar diversos entraves para realizar a formalização de um negócio, tais como as altas taxas de tributação, excesso de burocracia e a falta de informação.
Para evitar a informalidade, é importante que o empresário faça o registro de sua empresa no Registro Público de Empresas Mercantis, antes do início da atividade (art. 967, CC/2002). Este registro é integrado e atende ao Departamento de Registro Empresarial e Integração e também à Junta Comercial. Segundo Israel Mendes Góes Oliveira suas funções são:
Suas principais funções são: I) supervisionar e coordenar a execução do registro de empresa; II) orientar e fiscalizar Juntas Comerciais; III) promover ou providenciar medidas correcionais do Registro de Empresa e IV) organizar e manter atualizado o Cadastro Nacional das Empresas Mercantis. Por essas atribuições, fica claro que o DREI não tem funções executivas (não realiza os registros em si), mas deve fixar as diretrizes gerais para o ato do registro, feito pelas Juntas Comerciais, acompanhando a sua aplicação e corrigindo distorções.Já a Junta Comercial, cabe a ela, dentre outras funções, a execução do registro de empresa. Destacam-se as competências I) assentamento dos usos e praticas mercantis; II) habilitação e nomeação de tradutores públicos e interpretes comerciais e III) expedição da carteira de exercício profissional de empresário e demais pessoas legalmente inscritas no registro de empresa. (OLIVEIRA, 2016:1)
Mais recentemente, o país tem realizado reformas para melhorar o tempo de abertura de uma empresa. Com tais reformas o Brasil alcançou a posição 109 no ranking global do Banco Mundial em relação à facilidade de abertura de negócios no mundo. O relatório Doing Business do Banco Mundial indicou que o tempo necessário para abrir uma empresa no país caiu de 82 dias para 20 dias em média, isso se deu em função das facilidades introduzidas nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo com processos de certificação eletrônica para empresas. Nestes lugares um sistema online permite o registro, licenciamento e notificação de emprego. O avanço não é maior porque os procedimentos para abertura de um negócio no país correspondem a 11 tipos diferentes.[5]
Diante destes fatos, este estudo buscará tratar de dois aspectos importantes no desenvolvimento empresarial: o excesso de burocracia e a corrupção proveniente deste entrave ao desenvolvimento empresarial. Logo, pretende-se analisar a burocracia para a atividade empresarial, entender como o excesso de burocracia prejudica o desenvolvimento empresarial, discutir a corrupção apresentada no setor oriunda do excesso de burocracia, demonstrar quais os mecanismos legais podem auxiliar na desburocratização do setor empresarial. O problema deste estudo refere-se a como a burocracia em excesso pode ser prejudicial ao desenvolvimento empresarial e contribuir para o cometimento de corrupção no setor? Para responder a esse problema será apresentada uma pesquisa de cunho bibliográfico exploratório, com estudo de doutrinas, artigos e estudos científicos e jurisprudência.
2. PRINCÍPIO DA LIVRE INICIATIVA
Um dos princípios de grande destaque no cenário econômico é o da livre iniciativa, considerado como fundamento da ordem econômica. Este princípio está expresso na Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB/88) de 1988:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. (BRASIL, 2015:5)
Tem relação íntima com a ordem econômica que é fundada na valorização do trabalho e na livre iniciativa, cuja finalidade é garantir que todas as pessoas possuam uma existência digna conforme pilares da justiça social. Sobre a ordem econômica, o artigo 170 da CRFB/88 prevê:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II -propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente; VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital nacional de pequeno porte.Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei. (BRASIL, 2015:59)
Nota-se no parágrafo único do artigo 170 que o legislador assegurou o direto do exercício livre de qualquer atividade econômica. Assim, o país conta com um modelo econômico fundado na liberdade de iniciativa. Deste modo, empresas de natureza privada ou pública são regidas pelos princípios previstos na constituição. Neste contexto, Werter Rotunno Faria explica:
[...] as normas de defesa de concorrência não se aplicam a nenhuma empresa-órgão gerida pela União, nem as que executam serviços públicos, estrito senso, sob a titularidade dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Aplica-se, todavia às empresas-órgãos dê natureza industrial e comercial que operam em regime de concorrência, administradas pelos Estados, pelo Distrito Federal e os Municípios. Excetuam-se os organismos federais, porque não se concebe a União como sujeito passivo das normas que promulga para proteger o mercado contra as práticas comerciais restritas.[6] (FARIA, 1990:201)
Pelo princípio da livre iniciativa, a iniciativa privada produz e faz circular bens e serviços, envolvendo a liberdade de indústria e comércio. A livre iniciativa garante o exercício de qualquer atividade econômica sem prévia autorização dos órgãos públicos. Porém, este princípio não é absoluto neste aspecto, já que em determinados casos há a exigência de autorização para o exercício da atividade econômica.
Há certa relatividade deste princípio, pois restrições impostas por lei determinam que para o livre exercício de uma atividade econômica não se deve infringir a dissociação entre este direito de exercício livre da atividade e o direito de administrá-la. A livre iniciativa é fundada nos valores da justiça social e do bem estar coletivo. Por este princípio, reconhece-se o direito de exploração de atividades empresariais.
2.1 O EXCESSO DE NORMAS E SUFOCAMENTO DAS EMPRESAS
Uma das mais reconhecidas realidades no meio empresarial é a complexidade de normas para o exercício da atividade empresarial. As taxações de impostos e a burocratização dificultam o exercício de uma atividade empresarial no país. Em pesquisa realizada pela Confederação Nacional de Indústria (CNI) ficou claro que os brasileiros sentem que o excesso de burocracia dificulta o desenvolvimento empresarial e é um estímulo à corrupção e à informalidade, é o que relata Verene Wolke:
Os brasileiros acreditam que o excesso de burocracia aumenta os gastos públicos, estimula a corrupção e a informalidade e é um dos principais entraves ao crescimento econômico. Por isso, a redução da burocracia deve ser uma das prioridades do governo. As conclusões são da pesquisa Retratos da Sociedade Brasileira - Burocracia, feita pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), em parceria com o Ibope, com 2.002 pessoas em 142 municípios. De acordo com a pesquisa, 77% dos entrevistados consideram o Brasil um país muito burocrático ou burocrático, e 72% dizem que a redução da burocracia deve ser uma das prioridades do governo. Entre os entrevistados, 74% concordam total ou parcialmente que o excesso de burocracia desestimula os negócios, incentiva a corrupção e a informalidade e faz o governo a gastar mais do que o necessário. A pesquisa indica que 77% acreditam que o excesso de burocracia é uma das principais dificuldades para o crescimento da economia brasileira. Entre as pessoas com renda familiar acima de cinco salários mínimos, esse número sobe para 82%. (WOLKE, 2015:1)
A burocratização imposta às empresas compromete o crescimento econômico e incentiva a informalidade. Além disso, fica evidente que o excesso de burocracia favorece a corrupção e desestimula a criação de novos investimentos. Tais fatores também contribuem para o encerramento precoce das atividades empresariais, pois as empresas não conseguem se manter competitivas no mercado. O excesso de burocratização inibe o crescimento da economia, dificulta a implantação de novos negócios e provoca insegurança jurídica, como afirma José Augusto Fernandes, citado por Theo Saad e Rodrigo Caetano:
Uma empresa que quer investir no Brasil não pode ficar refém de uma licença qualquer, que precisa ser analisada por diversos entes antes de ser emitida. Também não pode ter incertezas quanto ao respeito aos contratos ou quanto às questões tributárias, que mudam a toda hora. (FERNANDES apud SAAD; CAETANO, 2013: s/p)[7]
Desta forma, o que se tem é de um lado a legislação vigente que é fundamental para a regulamentação do processo empresarial, e de outro lado um déficit no planejamento público para que as empresas sejam abertas com mais agilidade. Segundo Theo Saad e Rodrigo Caetano:
O excesso de burocracia no Brasil afeta as empresas de duas maneiras: na demora na aprovação das licenças para investimentos, principalmente em infraestrutura, e na operação, na qual os principais focos estão na tributação e nas relações do trabalho. Devido aos impactos negativos que a burocracia causa no Brasil, é preciso tomar medidas urgentes, e ao mesmo tempo simples e eficazes, para melhorar a eficiência do Estado. (SAAD; CAETANO, 2013:1)
Segundo o presidente da FIESP é emergente as mudanças nos processos burocráticos para que o comércio se mantenha competitivo e haja maior geração de empregos. Com esta realidade, o setor econômico do país, é ainda afetado pelo período de recessão, com perda de empregabilidade, perda de arrecadação e consequentemente perda de investimento. Solange Solon Borges destaca que:
Na totalidade das empresas, os procedimentos mais burocráticos foram fechamento de empresas; procedimento para a obtenção de financiamento público; e emissão de certificados/licenças ambientais e procedimentos de informações de obrigações ambientais. Para as empresas de grande porte, entre as principais também aparecem permissões de comércio exterior e normas regulamentares. Para as pequenas e médias também estão entre as mais burocráticas as licitações públicas e os procedimentos para a obtenção de financiamento público. (BORGES, 2017:1)
É indiscutível que toda esta burocratização vem gerando incertezas, descréditos e desestimulação de investimento em novas empresas. Estes fatores contribuem para o cometimento de atos de corrupção e sonegação.
Percebe-se, portanto, ser de grande importância que o Estado atue efetivamente na busca de reformulação das leis proporcionando maior agilidade e incentivos às pessoas que desejam adentrar ao mercado empresarial. Isto porque é essencial que os processos sejam otimizados, as transações sejam realizadas com mais agilidade e consequentemente não haja “jeitos” de burlar as leis, em função do excesso de exigências.
2.2. A CORRUPÇÃO NO BRASIL E SUA LIGAÇÃO COM A BUROCRACIA
No meio empresarial a presença da burocracia significa um entrave, pois para regularizar uma empresa no país, o empreendedor brasileiro enfrenta desafios econômicos e uma luta enorme de processos burocráticos que se arrastam por meses. O Banco Mundial realizou um levantamento no qual observou que as empresas brasileiras dispensam, em média, o equivalente a 1.958 horas por anos com obrigações tributárias. Este é um exemplo do excesso de burocracia, que faz com o empreendedor gaste muito capital e tempo atendendo as demandas burocráticas, gerando perda de eficiência e produtividade.[8]
Mesmo assim, o brasileiro sempre está empreendendo. A atividade empresarial apesar do período de recessão demonstra bons resultados no que se refere ao surgimento de novos negócios no. Graça Adjuto fez um levantamento sobre a atividade empreendedora no país:
Cerca de 52 milhões de brasileiros em idade produtiva estavam envolvidos com alguma atividade empreendedora no ano passado. É o que mostra a pesquisa GEM (Global Entrepreneurship Monitor), realizada em 49 países e que, no Brasil, contou com o apoio do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). Esse foi o segundo melhor desempenho para a taxa de empreendedorismo brasileira desde 2002, quando o índice começou a ser medido. Em 2018, 2 em cada 5 brasileiros entre 18 e 64 anos estavam à frente de uma atividade empresarial ou tinham planos de ter um negócio. A pesquisa mostra que a taxa total de empreendedorismo, que reúne novos empreendedores e donos de negócios já estabelecidos, chegou a 38%. (ADJUTO, 2019:1)
Essa expansão de negócios encontra na burocracia dificuldades para dar continuidade à manutenção e criação de empreendimentos. Solange Sólon Borges descreveu os dados de uma pesquisa realizada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) e pelo Centro de Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP) em que foram realizadas entrevistas com diversas pessoas no Estado de São Paulo, com o intuito de detectar a perspectiva da sociedade em relação à burocracia brasileira observo que 84% das pessoas consideram o país burocrático:
A maioria da população (84%) considera o país burocrático, enquanto os que consideram o país pouco burocrático somaram apenas 9% do total. Seu excesso pode ser prejudicial e mecanismo de estímulo à corrupção (75%), dificultando o desenvolvimento do país (78%) e a compra de bens (77%). O combate à burocracia deve ser priorizado (65%) com a adoção de medidas como a redução da quantidade de leis e normas vigentes, estabelecimento de datas para mudança de regras ou aplicação de novas leis e normas, simplificação da linguagem das leis/normas e a comunicação dos custos de novas leis/normas. E apenas 36% concordam que o Governo tem sido capaz de implementar políticas de desburocratização. (BORGES, 2017:1)
As inúmeras exigências impedem o início ou a expansão de negócios. Além disso, a burocracia em excesso é um fator ampliador da corrupção, é o que observou na pesquisa realizada pela FIES e CIESP, conforme registrou Solange Sólon Borges:
Para a maioria das empresas participantes da pesquisa (83,2%), o alto Custo Brasil já foi impeditivo para o início ou expansão de seus negócios. O excesso de burocracia abre espaço para a corrupção (90,2%), dificulta o desenvolvimento econômico e o ambiente de negócios no Brasil (94,7%), com impacto na competitividade das empresas (91,4%). Na totalidade das empresas, os procedimentos mais burocráticos foram fechamento de empresas; procedimento para a obtenção de financiamento público; e emissão de certificados/licenças ambientais e procedimentos de informações de obrigações ambientais. Para as empresas de grande porte, entre as principais também aparecem permissões de comércio exterior e normas regulamentares. Para as pequenas e médias também estão entre as mais burocráticas as licitações públicas e os procedimentos para a obtenção de financiamento público. (BORGES, 2017:1)
Tal fato é corroborado pelo relatório apresentado pela Controladoria Geral da União, que também entende que a burocracia é um fator facilitador da corrupção:
Em pesquisa realizada em 2003 pela Transparência Brasil sobre corrupção e fraude no país sob a perspectiva do setor privado, para 96% das empresas respondentes a corrupção se apresentava como um obstáculo muito importante ou importante para o desenvolvimento empresarial no Brasil. No Relatório Global de Fraude, produzido pela Kroll e publicado em 2008, uma média de 20% de uma amostra de 890 empresas sofreu os efeitos de atos de corrupção/suborno nos três anos anteriores. Nesse caso, quando se diz que uma empresa sofreu um ato de corrupção, não significa especificamente que tenha sido corrompida ou corruptora. Suas perdas podem ter sido decorrentes de atos de corrupção praticados, por exemplo, por outras empresas em procedimentos licitatórios. Prevenir a corrupção deve ser, então, assunto de interesse de todas as empresas. (BRASILIA, 2009:15)
Percebe-se que a corrupção está institucionalizada tanto no setor público quanto no setor privado. Assim, o Estado tem dispensado esforços para reduzir estes casos a partir da intensificação de ações para identificar casos de corrupção, na promoção de políticas públicas de transparência e de promoção da integridade em ambos os setores. Tais medidas visam reduzir ou eliminar situações de corrupção no meio empresarial, tais como a sonegação de tributos, fraudes nos processo de licitação, de contratos.
2.3. MEDIDA PROVISÓRIA (MP) 876 DE 13 DE MARÇO DE 2019: A MP DA DESBUROCRATIZAÇÃO
O excesso de burocracia imposta pelo Estado na abertura de empresas é considerado um dos entraves para a ampliação do desenvolvimento do setor empresarial, pois o excesso de burocracia representa um retrocesso para a economia como um todo. Assim, é necessário viabilizar melhorias nos processos de abertura de empresas, para tanto foi editada em 13 de março de 2019, a Medida Provisória n° 876 implantando dispositivos para facilitar a vida do empreendedor desburocratizando o setor.
Com a nova medida o processo de abertura de empresas torna-se mais ágil. Isto se dá em virtude dos mecanismos destinados a acelerar os procedimentos de abertura de uma empresa, como explica Leonara Rocha:
A Medida Provisória 876/2019 alterou a Lei de Registro de Empresas (Lei nº 8.934/94) e trouxe duas importantes alterações quanto ao registro de alguns tipos societários e a necessidade de autenticação de documentos. A primeira alteração se deu no âmbito do deferimento do arquivamento dos atos constitutivos de uma empresa ou comumente chamada "abertura de empresa". Agora, o Empresário Individual, a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (Eireli) e a Sociedade Limitada (LTDA) terá seus atos constitutivos aprovados automaticamente, ou seja, não precisarão esperar pelo deferimento e terão a possibilidade de sair da Junta Comercial já com o seu CNPJ. A análise das formalidades legais para identificação de vício sanável ou insanável será feita a posteriori. No entanto, só se beneficiará do registro automático a empresa que cumprir os requisitos básicos de: utilização do instrumento padrão, consulta prévia da viabilidade do nome empresarial e viabilidade de localização. Para as sociedades anônimas, as fusões e os consórcios, o prazo para registro passou a ser de 5 dias úteis contados da data do recebimento do pedido. (ROCHA, 2019:1).
Com esta MP as empresas alcançam maior agilidade quando da entrada de processos de abertura de empresas, conseguindo obter a liberação do CNPJ para funcionamento de forma automática. Em relação aos documentos, a medida prevê menos burocracia para o empreendedor. É o que afirma Leonara Rocha:
A segunda alteração se deu no âmbito de autenticação de documentos. A Medida Provisória dispensou a autenticação feita em cartório quando houver declaração da autenticidade do documento pelo advogado ou contador da parte interessada.Esta mudança significou a reafirmação da confiabilidade dos profissionais da advocacia e da contabilidade, reforçando a importância destes no âmbito do direito empresarial.(ROCHA, 2019:1)
Com a MP também se tornou possível agilizar os procedimentos de arquivamento de uma empresa. Tal previsão conta no artigo 41 da MP n° 876/2019, onde está definido que os pedidos de arquivamento serão decididos em até 5 dias úteis, a partir do recebimento do pedido. Já o artigo 42 com a medida provisória traz modificações no que tange às decisões dos atos constitutivos e arquivamento das empresas:
Art.42. [...] § 1º Os vogais e os servidores habilitados a proferir decisões singulares serão designados pelo presidente da junta comercial.§ 2ºOs pedidos de arquivamento de atos constitutivos não previstos no inciso I do caput do art. 41 serão decididos no prazo de dois dias úteis, contado da data de seu recebimento, sob pena de os atos serem considerados arquivados, mediante provocação dos interessados, sem prejuízo do exame das formalidades legais pela procuradoria.§ 3ºO arquivamento dos atos constitutivos não previstos no inciso I do caput do art. 41 terá o registro deferido automaticamente caso cumpridos os requisitos de:I - aprovação da consulta prévia da viabilidade do nome empresarial e da viabilidade de localização; eII - utilização pelo requerente do instrumento padrão estabelecido pelo Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração da Secretaria de Governo Digital da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia.§ 4º O disposto no § 3º não se aplica às sociedades cooperativas.§ 5º Na hipótese de que trata o § 3º, a análise do cumprimento das formalidades legais será feita posteriormente, no prazo de dois dias úteis, contado da data do deferimento automático do registro.§ 6º Após a análise de que trata o § 5º, na hipótese de identificação da existência de vício:I - insanável, o arquivamento será cancelado; ouII - sanável, será seguido o procedimento estabelecido pelo Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração da Secretaria de Governo Digital da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia. (BRASIL, 2019: s/p)
Em se tratando da documentação que deve ser analisada para a constituição de uma empresa a MP 876/19 determina:
Art. 63 [...] § 1º A cópia de documento, autenticada na forma prevista em lei, dispensará nova conferência com o documento original.§ 2º A autenticação do documento poderá ser realizada por meio de comparação entre o documento original e a sua cópia pelo servidor a quem o documento seja apresentado.§ 3º Fica dispensada a autenticação a que se refere o § 1º quando o advogado ou o contador da parte interessada declarar, sob sua responsabilidade pessoal, a autenticidade da cópia do documento. (BRASIL, 2019: s/p)
Desta forma fica estabelecido que a regulamentação para a abertura de empresas deve seguir as exigências impostas pela MP 876/19 mediante análise da junta responsável por auferir a legalidade da abertura da empresa, fica então estabelecido que mediante a análise formal, caso haja impedimentos a constituição da empresa poderá ser cancelada como afirma Eduardo Menna Barreto e Camilla Cazetta:
Contudo, importante destacar que, a análise formal do ato constitutivo foi postergada para o momento após o registro, no prazo máximo de dois dias úteis. E na eventualidade de a Junta Comercial entender pela presença de inconsistências nas informações apresentadas (o que costuma-se chamar de “cair em exigência”), o registro será mantido, mas será exigida a apresentação de documentos adicionais para sanar a “exigência". Do contrário, caso o vício seja considerado insanável, as inscrições sociais serão imediatamente canceladas, tornando nulo todos os atos praticados pelo referido ente jurídico. (BARRETO; CAZETTA, 2019:1).
Ressalta-se que a desburocratização é uma ação de formalizar e otimizar o processo de trabalho, mas é essencial que se siga todos os passos legais para a constituição da empresa, visto que quando se encontrar irregularidade mesmo que já tenha sido liberado o CNPJ o mesmo será cancelado por inconstitucionalidade.