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O processo de execução fiscal e a desconsideração da personalidade jurídica

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Agenda 08/01/2020 às 17:27

7. Procedimento Para a Execução de Cobrança da Dívida Ativa da Fazenda Pública

O procedimento para a execução de cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública é feito dentro do chamado processo de execução fiscal previsto na Lei nº 6.830/80 (LEF) com algumas alterações feitas pelo Código de Processo Civil de 2015, até porque este Código deve ser aplicado de forma subsidiária nos termos do disposto no artigo 1º da referida Lei nº 6.830/80:

Art. 1º - A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil.

Numa apertada síntese, pode-se dizer que basicamente o procedimento se inicia pela petição inicial, que deve atender aos requisitos do artigo 319 do CPC/2015 e do artigo 6º da LEF, sendo a inicial instruída obrigatoriamente pelo título executivo (líquido, certo e exigível) denominado certidão de dívida ativa (LEF, art. 6º, § 1º), que tem correspondência também com os artigos 771, 783 e 784, inciso IX do CPC/2015:

LEF

Art. 6º.

§ 1º - A petição inicial será instruída com a Certidão da Dívida Ativa, que dela fará parte integrante, como se estivesse transcrita. 

CPC/2015

Art. 771. Este Livro regula o procedimento da execução fundada em título extrajudicial, e suas disposições aplicam-se, também, no que couber, aos procedimentos especiais de execução, aos atos executivos realizados no procedimento de cumprimento de sentença, bem como aos efeitos de atos ou fatos processuais a que a lei atribuir força executiva. 

Art. 783. A execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título de obrigação certa, líquida e exigível.

Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais:

(...)

IX - a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, correspondente aos créditos inscritos na forma da lei;

Estando em ordem a petição inicial, o juiz ordena a citação do executado para pagar o débito ou garantir o juízo, nos termos do artigo 8º da LEF.

Se o executado não optar por pagar o débito, ele pode garantir o juízo da execução devendo a nomeação do bem à penhora seguir, de regra geral, o artido 11 da LEF, devendo ser frisado que o § 2º do artigo 835 do CPC/2015 reflete no processo de execução fiscal para fins de substituição da penhora por fiança bancária ou seguro garantia judicial, nos seguintes termos:

Art. 835.

§ 2º Para fins de substituição da penhora, equiparam-se a dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao do débito constante da inicial, acrescido de trinta por cento.

Se não houver apresentação de embargos à execução fiscal ou seje estes forem julgados improcedentes, serão aplicados os artigos 19 e 24 da LEF:

Art. 19 - Não sendo embargada a execução ou sendo rejeitados os embargos, no caso de garantia prestada por terceiro, será este intimado, sob pena de contra ele prosseguir a execução nos próprios autos, para, no prazo de 15 (quinze) dias:

I - remir o bem, se a garantia for real; ou

II - pagar o valor da dívida, juros e multa de mora e demais encargos, indicados na Certidão de Divida Ativa pelos quais se obrigou se a garantia for fidejussória. 

Art. 24 - A Fazenda Pública poderá adjudicar os bens penhorados:

I - antes do leilão, pelo preço da avaliação, se a execução não for embargada ou se rejeitados os embargos;

II - findo o leilão:

a) se não houver licitante, pelo preço da avaliação;

b) havendo licitantes, com preferência, em igualdade de condições com a melhor oferta, no prazo de 30 (trinta) dias.

Parágrafo Único - Se o preço da avaliação ou o valor da melhor oferta for superior ao dos créditos da Fazenda Pública, a adjudicação somente será deferida pelo Juiz se a diferença for depositada, pela exeqüente, à ordem do Juízo, no prazo de 30 (trinta) dias.

Por outro lado, após a intimação da penhora, que deve ser feita nos termos do artigo 12 da LEF, o executado pode opor embargos à execução para atacar o processo de execução e/ou o título executivo, que no caso é a certidão de dívida ativa.

O prazo para oferecimento dos embargos à execução fiscal é de 30 (trinta) dias (art. 16 da LEF), sendo que nos termos do artigo 219 do CPC/2015 a contagem deve ser feita em dias úteis conforme entendimento jurisprudencial:

Apelação. Embargos à execução fiscal rejeitados, ante o reconhecimento de sua intempestividade. Pretensão à reforma. Desacolhimento. Embargos opostos quando já transcorridos mais de 30 dias úteis contados da efetiva intimação da penhora. Inteligência do art. 16, III, da LEF. Observância do entendimento firmado no julgamento do REsp repetitivo n. 1.112.416/MG. Embargos intempestivos. Recurso desprovido. (TJSP;  Apelação Cível 1006952-04.2018.8.26.0533; Relator (a): Ricardo Chimenti; Órgão Julgador: 18ª Câmara de Direito Público; Foro de Santa Bárbara D'Oeste - SEF - Setor de Execuções Fiscais; Data do Julgamento: 07/11/2019; Data de Registro: 07/11/2019)

APELAÇÃO – Interposição após o transcurso do prazo de 30 (trinta) dias úteis contados a partir da ciência inequívoca da sentença – Inteligência dos arts. 183, 219, 220 e 1.003, todos do CPC – Intempestividade configurada – Recurso não conhecido. (TJSP;  Apelação Cível 0502221-88.2013.8.26.0309; Relator (a): Erbetta Filho; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Público; Foro de Jundiaí - Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 12/09/2019; Data de Registro: 20/09/2019)

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Caso os embargos à execução fiscal sejam julgados procedentes, esta decisão terá reflexo no processo de execução fiscal e/ou no título executivo no sentido de rachaçar o processo e/ou a certidão de dívida ativa.


8. Previsão do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica no Código de Processo Civil

A desconsideração da personalidade jurídica está alocada no CPC/2015 como uma das intervenções de terceiros, que por sim necessita de um contraditório para que o terceiro possa ser ou não incluído como responsável pecuniário por dívida da sociedade empresária ou esta por dívida de seu sócio.

Existe uma hipótese prevista no CPC/2015 que o terceiro pode ser atingido, sem, entretanto, a instauração do incidente para tal finalidade. É o caso em que o pedido de desconsideração da personalidade jurídica é feito na própria petição inicial. Para tanto, segue o magistério de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

Em todos esses casos de desconsideração da personalidade jurídica, seja para possibilitar o alcance de bens do sócio por dívida da sociedade, seja para ensejar a constrição de bens da sociedade por dívida do sócio (desconsideração inversa da personalidade jurídica, art. 133, § 2º), o terceiro só poderá ser alcançado pela eficácia da decisão judicial se regularmente desconsiderada a personalidade jurídica mediante incidente de desconsideração, que demanda contraditório específico e prova igualmente específica sobre a ocorrência dos pressupostos legais que a autorizam. A única hipótese em que o terceiro pode ser alcançado sem incidente específico é aquela em que a desconsideração já vem desde logo requerida com a petição inicial, hipótese em que o sócio (desconsideração) ou a pessoa jurídica (desconsideração inversa) será desde logo citada (art. 134, § 2º). Isso não quer dizer, porém, que o contraditório e a prova dos pressupostos legais da desconsideração estejam dispensados: de modo nenhum. Num e noutro caso é imprescindível o respeito ao direito a contraditório e ao direito à prova do terceiro. (2015, p. 106)

Pois bem, nos termos do artigo 133 do CPC/2015 o incidente é instaurado a pedido da parte ou do ministério público, quando este couber intervir no feito judicial, sendo que o incidente é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e no processo de execução, tal como dispõe o artigo 134 do CPC/2015.

Cumpre observar que a instauração do incidente tem o condão de suspender o processo, salvo se o pedido de desconsideração ter sido formulado já na petição inicial.

Uma vez instaurado o incidente, é oportunizado ao ao sócio ou à pessoa jurídica, por meio da citação, para apresentação de defesa no prazo de 15 dias. Além disso, efetivada a instrução processual no incidente, o juiz profere o julgamento sobre a desconsideração da personalidade jurídica por meio de decisão interlocutória, e, caso o incidente tenha sido instaurado em sede de Tribunal, cuja decisão seja proferida pelo relator, o recurso cabível é o agravo interno. (art. 136, CPC/2015).

No caso de o juiz reconhecer a desconsideração da personalidade jurídica, o deferimento do pedido tem o condão de reconhecer a ineficácia em relação ao requerente do incidente, de eventual alienação ou oneração de bens havia em fraude à execução.              

Nos dizeres de Cassio Scarpinella Bueno o sócio ou a sociedade empresária que teve bem penhorado, indepedentemente do incidente, tem legitimidade para opor embargos de terceiro:

A citação (e não mera intimação) dos sócios ou terceiros é indispensável, estabelecendo-se, de maneira incidental ao processo em curso, independentemente da fase que ele se encontre, o cabível contraditório sobre a existência, ou não, de fundamento para a desconsideração da personalidade jurídica pretendida. O prazo para a defesa é de quinze dias. Produzidas as provas que se façam necessárias, o incidente é julgado por decisão interlocutória agravável de instrumento. A previsão está em consonância com a do inciso IV do art. 1015.  Sendo o incidente processado no âmbito dos Tribunais, esclarece o parágrafo único [parágrafo único do art. 136 do CPC/2015], a hipótese é de agravo interno (art. 1034), o que se harmoniza com a previsão do art. 932, VI, que reserva ao relator a competência (monocrática) para decidir o incidente aqui anotado, quando ele, o incidente, for instaurado originariamente perante o Tribunal. O art. 137 quer evidenciar que a alienação de bens nas condições que especifica é considerada fraude à execução e, como tal, ineficaz em relação àquele que pediu a instauração do incidente. O inciso VII do art. 790 preceitua  que fica sujeito à execução os bens do responsável, nos casos de desconsideração da personalidade jurídica. Cabe destacar que a instauração do incidente será imediatamente comunicada ao distribuidor (art. 134, § 1º), o que dará ensejo, certamente, a interessantes questões sobre o instante em que cessa a boa-fé do eventual terceiro adquirente, máxime diante do § 3º do art. 792, segundo o qual a fraude à execução considera-se ‘a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar’. O sócio (ou a sociedade) que teve seu bem penhorado independentemente da instauração do incidente aqui anotado tem legitimidade  para propor embargos de terceiro, como expressamente prevê o inciso III do § 2º do art. 674. (2015, p. 134)

Com efeito, verifica-se que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica é o instrumento adequado a prever o contraditório, e só após eventual reconhecimento da prática ensejadora de abuso, fraude ou outros requisitos previstos nas legislações de direitos materiais é que se pode desconsiderar a personalidade jurídica para atingir seus sócios, ou aplicar a desconsideração da personalidade jurídica inversa, conforme o caso.

Em se tratando de processo de execução fiscal a jurisprudência é divergente no que tange à aplicação ou não do incidente de desconsideração da personaliade jurídica, haja visto que o procedimento do executivo fiscal é tratado por lei especial (Lei 6.830/80).

Por outro lado, a própria legislação especial que disciplina o procedimento no processo de execução, dispõe em seu artigo 1º que a execução fiscal é regida pela Lei 6.830/80, e nos casos em que não há previsão expressa para uma determinada regulamentação, o Código de Processo Civil deve ser aplicado, portanto, aplicando-se os dispostos nos artigos 133 a 137 do CPC/2015.

Ante tais divergências de entendimentos, passa-se a abordar os posicionamentos de alguns tribunais para então concluir chegar ao atual entendimento aplicado pelo Superior Tribunal de Justiça, órgão que tem por um de seus objetivos uniformizar as interpretações de leis federais infraconstitucionais, que no caso concreto são as Leis 6.830/80, 13.105/2015 (CPC), 10.406/2002 (CC) e 5.172/66 no que concerne a aplicabilidade ou não do incidente de desconsideração da personalidade jurídica no processo de execução fiscal.

Sobre o autor
JOSE WILSON BOIAGO JUNIOR

Advogado de Empresas. Professor Universitário. Mestre em Direito pela Universidade Metodista de Piracicaba. Autor de artigos jurídicos. Autor e coautor de Livros jurídicos. Aula Individual de Processo Civil e Dir. Civil / Discussão de Casos. Whatsapp: (15) 99791-1976 Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/1046181932802135 LinkedIn: http://linkedin.com/in/josé-wilson-boiago-júnior-104674b8 Instagram: @professor_boiago

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