A Constituição Federal preceitua que “a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro” (art. 5º, inciso XXIV).
Indenização justa, nos termos do art. 12 da Lei 8.629/93, significa indenização pelo valor atual de mercado do bem.
“Art. 12. Considera-se justa a indenização que reflita o preço atual de mercado do imóvel em sua totalidade, aí incluídas as terras e acessões naturais, matas e florestas e as benfeitorias indenizáveis, observados os seguintes aspectos”. (Grifei).
Não obstante a enorme divergência doutrinária a respeito dos elementos[1] da justa indenização, “o critério básico a ser considerado pela Administração Pública expropriante em sua proposta ou pelo juiz para pautar a definição do justo preço é o valor de mercado do bem” [2].
O valor atual de mercado, por regra, é apurado na data da avaliação do perito judicial (quando há perícia).
“Conforme precedentes do STJ, o valor da indenização nos casos de desapropriação deve se reportar ao momento em que foi realizada a perícia judicial que serviu de fundamento para a decisão judicial, e não a data da imissão na posse do imóvel ou da realização do laudo administrativo, pois mais consentânea com o valor de mercado da propriedade (...). CONCLUSÃO. 15. Recursos Especiais não providos (REsp. 1.767.987/SP, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 25.4.2019)”. (Grifei).
Após a entrega do Laudo, há correção monetária até a data do efetivo pagamento, e, conforme o caso, juros.
“Segundo a jurisprudência desta Corte de Justiça, o termo inicial da correção monetária, nas ação de desapropriação, deve ser a data da confecção do laudo pericial judicial, nas hipóteses em que o juiz adotá-lo como parâmetro para aferir o quantum indenizatório, contando-se a partir da avaliação administrativa somente quando for considerado o preço de mercado do imóvel ao tempo da imissão na posse” (AgInt no REsp 1682794 / SE. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. Relator(a) Ministro GURGEL DE FARIA. T1 - PRIMEIRA TURMA. Data da Publicação/Fonte DJe 05/04/2019). (Grifei).
Portanto, além do valor atual de mercado, há medidas econômicas corretivas, a saber: a) correção monetária, b) juros moratórios e c) juros compensatórios.
“O juro é fenômeno eminentemente econômico, com repercussão no Direito. [...] os juros moratórios e os juros compensatórios, em matéria expropriatória, encontram-se bem discriminados: os primeiros, devidos pelo retardamento no pagamento da indenização fixada; os compensatórios, pelo apossamento prematuro da coisa”[3].
Para a correção monetária, pode-se mencionar, como textos ou fontes mais relevantes: (i) a Súmula 561 do STF; (ii) a Súmula 67 do STJ; (iii) e também o art. 1º da Lei 6.899/81, que dispõe: “A correção monetária incide sobre qualquer débito resultante de decisão judicial”.
Para os juros moratórios, art. 15-B do Decreto-Lei 3.365/41 c/c art. 100 da Constituição Federal, quando a expropriante for Fazenda Pública (ou equiparada[4]), seguindo o regime de precatórios[5], ou Súmula 70 do STJ, a partir o trânsito em julgado, quando a desapropriação ocorrer por concessionária de serviço público (art. 3º do Decreto-Lei 3.365/41).
“Nos casos em que a ação de desapropriação for proposta por pessoa jurídica de direito privado, não se aplica o regime do art. 15-B do Decreto-Lei 3.365/1941 quanto ao termo inicial dos juros moratórios, visto que não submetem as suas dívidas ao sistema de precatórios. Em tais casos, os juros são devidos a contar do trânsito em julgado. Aplicabilidade da Súmula 70/STJ. 4. Agravo conhecido para conhecer parcialmente do recurso especial e, nessa extensão, negar-lhe provimento”. (AREsp 1.230.018/GO, Relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, Julgamento em 10/4/2018, DJe 16/4/2018).
Por fim, acerca dos juros compensatórios, o assunto é mais complexo.
Eis uma definição:
“Os juros estão incluídos na classe dos frutos civis, como rendimento de capital, sendo, portanto, coisas acessórias (art. 92 do CC). Duas classificações não podem ser desprezadas:
a) conforme a sua destinação, podem ser divididos em juros compensatórios ou moratórios – Os juros compensatórios ou remuneratórios objetivam remunerar o capital emprestado no período em que o seu titular dele ficou privado. Eles representam uma espécie de preço pelo ‘aluguel’ do capital e também uma álea que sobre ele recai, a partir do momento em que o credor dele é alijado”[6]. (Grifei).
Pelos comentários retro transcritos, é possível concluir: a) os juros são frutos civis; b) e os juros compensatórios são como um “aluguel”, para compensar o credor pelo tempo que ficou privado da coisa.
Nas desapropriações, os juros compensatórios, ao menos em sua compreensão mais recente, destinavam-se a compensar a perda antecipada da posse, quando há, por exemplo, imissão provisória na posse (desapropriação direta) ou ocupação do bem pelo expropriante (desapropriação indireta)[7].
“Os juros compensatórios são aqueles devidos pelo expropriante a título de compensação pela ocorrência da imissão provisória e antecipada na posse do bem”[8].
A jurisprudência também se consolidou para fixar que os juros compensatórios são devidos até mesmo quando há improdutividade do imóvel, consoante exemplifica o seguinte Recurso Especial (REsp repetitivo):
2. A incidência de juros compensatórios na desapropriação de imóvel improdutivo.
2.1. A eventual improdutividade do imóvel não afasta o direito aos juros compensatórios, pois esses restituem não só o que o expropriado deixou de ganhar com a perda antecipada, mas também a expectativa de renda, considerando a possibilidade do imóvel "ser aproveitado a qualquer momento de forma racional e adequada, ou até ser vendido com o recebimento do seu valor à vista" (EREsp 453.823/MA, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Rel. p/ acórdão Min. Castro Meira, DJU de 17.05.04). Precedentes: REsp 675.401/RO, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 10.09.09; REsp 984.965/CE, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe de 04.08.09; REsp 1.099.264/PA, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe de 19.08.09; REsp 1.034.014/CE, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJU de 26.06.08; REsp 1.090.221/PE, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJe de 29.09.09; REsp 1.066.839/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 31.08.09.
2.2. São indevidos juros compensatórios quando a propriedade se mostrar impassível de qualquer espécie de exploração econômica seja atual ou futura, em decorrência de limitações legais ou da situação geográfica ou topográfica do local onde se situa a propriedade, nos termos do entendimento sedimentado na Primeira Seção desta Corte nos autos dos EREsp 519.365/SP, de relatoria do Exmo. Senhor Ministro Teori Albino Zavascki. (REsp 1116364/PI,Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, Julgado em 26/05/2010,DJE 10/09/2010). (Grifei).
A novidade, embora nem tão recente assim[9], é que a incidência de juros compensatórios para praticamente todos os casos de perda antecipada da posse acabou, ou, ao menos, deveria acabar.
Eis um trecho do Acórdão da ADI 2.332 (ementa):
“4. Constitucionalidade dos §§ 1º, 2º e 4º, do art. 15-A, do Decreto-lei nº 3.365/1941, ao determinarem a não incidência dos juros compensatórios nas hipóteses em que (i) não haja comprovação de efetiva perda de renda pelo proprietário com a imissão provisória na posse (§ 1º), (ii) o imóvel tenha ‘graus de utilização da terra e de eficiência na exploração iguais a zero’ (§ 2º),
[...]
7. Ação direta julgada parcialmente procedente. Fixação das seguintes teses:
“(i) É constitucional o percentual de juros compensatórios de 6% (seis por cento) ao ano para a remuneração pela imissão provisória na posse de bem objeto de desapropriação;
(ii) A base de cálculo dos juros compensatórios em desapropriações corresponde à diferença entre 80% do preço ofertado pelo ente público e o valor fixado na sentença;
(iii) São constitucionais as normas que condicionam a incidência de juros compensatórios à produtividade da propriedade;
(iv) É constitucional a estipulação de parâmetros mínimo e máximo para a concessão de honorários advocatícios em desapropriações, sendo, contudo, vedada a fixação de um valor nominal máximo de honorários.” (Grifei).
Como se nota, o STF decidiu que devem ser de 6%, e não mais de 12%, os juros compensatórios incidentes sobre as desapropriações. Porém, também prevaleceu o entendimento que os juros compensatórios devem existir apenas para compensar a perda de renda comprovada (§ 1º do art. 15-A do Decreto-Lei 3.365/41), e não incidem quando verificada a improdutividade do imóvel.
Em suma: ficou decidido, com o julgamento de mérito da ADI 2.332, que só há juros compensatórios para compensar perda de renda de imóveis produtivos, com a perda antecipada da posse, comprovadamente sofrida pelo proprietário (critério de existência, quando existirão juros), e que esses juros, quando existirem, serão devidos à taxa de 6% ao ano. Não há mais juros compensatórios aplicados de forma automática, porque o art. 15-A do Decreto-Lei 3.365/41 é constitucional.
Eis o teor da Lei:
“Art. 15-A
[...]
§ 1º Os juros compensatórios destinam-se, apenas, a compensar a perda de renda comprovadamente sofrida pelo proprietário”. (Grifei).
Explica Sérgio Ferraz, em lição agora ratificada pelo STF:
“Os juros compensatórios têm em mente a recomposição de lucros cessantes. [...] Doutra parte, contudo, se verdade é que a finalidade dos juros compensatórios é aquela reiteradamente proclamada nesse trabalho, de todo descabe essa cominação quando não tenha havido imissão na posse do bem. Torna-se evidente, às escâncaras, que, nessa hipótese, não há incidência da figura dos lucros cessantes. Igualmente descabem tais juros quando o bem não produzia renda, não tendo havido, pelo desapossamento, prejuízo, para o expropriado”[10]. (Grifei).
Sem lucros cessantes, não há juros compensatórios, não há uma situação patrimonial a compensar[11].
“Os juros compensatórios destinam-se a ressarcir, no caso, pelo impedimento do uso e gozo econômico do imóvel, constituindo solução pretoriana para cobrir os lucros cessantes, como parcela indissociável da indenização, ressarcindo o impedimento de usufruição dos frutos derivados do bem. Integrando, pois, a indenização reparando o que o proprietário deixou de lucrar. Assim, descabe cumular os juros compensatórios com lucros cessantes”. (REsp nº 39842 / SP. Publicado no DJ 30/05/1994). (Grifei).
Destarte, certificado – porque não existem lucros cessantes hipotéticos – por prova pericial a presença de lucros cessantes, os juros compensatórios devem existir (critério de existência, quando existirão juros), a taxa de 6% ao ano. A prova não apontando a presença, efetivamente comprovada, de lucros cessantes, não há pagamento de juros compensatórios.
Dispõe o art. 402 do Código Civil: “Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar”.
“O conceito de indenização contém, em si, o de reparação do dano, que significa diminuição no patrimônio, isto é, dano é a perda de uma parte material do patrimônio ou a perda de expectativa juridicamente firmada. Se o proprietário expropriado por utilidade pública experimenta um prejuízo, tem razão de ser ressarcido e, pois, tem direito a que seu patrimônio seja colocado nas mesmas condições em que se achava antes da desapropriação”[12]. (Grifei).
Uma indenização compreende os danos emergentes e os lucros cessantes.
“[...] a indenização há de compreender, para que justa seja, não apenas a recomposição dos prejuízos atuais e imediatos, provocados pela expropriação, mas, também, a da margem de lucros que a coisa expropriada efetivamente já assegurava projetar no futuro.
[...]
Entre outras palavras, a indenização deve compreender não apenas os danos emergentes, mas, igualmente, os lucros cessantes indiscutíveis”[13].
O que o expropriado efetivamente perde (em outras palavras, o dano emergente) é pago pelo valor da justa indenização (pelo preço atual de mercado, incluindo desvalorização (quando há), corrigido até a data do efetivo pagamento), cumprimento, assim, ao que prescreve o art. 27 do Decreto-Lei 3.365/41 e o art. 12 da Lei 8.629/93.
Por outro lado, para os lucros cessantes, com a declaração de constitucionalidade dos §§ 1º e 2º do art. 15-A do Decreto-Lei 3.365/41 (juros compensatórios devem existir apenas para compensar a perda de renda comprovada), não basta ao imóvel ser produtivo. São dois critérios, ser produtivo e haver lucros cessantes comprovadamente sofridos, pois não se indeniza algo hipotético, até porque hipoteticamente tudo é possível.
Como acerto, Sérgio Ferraz, in verbis:
“Não nos parece cabível, entretanto, no sistema jurídico positivo brasileiro, a indenização do mero prejuízo possível ou vagamente previsível. Imprescindível será que este prejuízo se afigure potencialmente indiscutível, ou então, que se trata de hipótese de lucro defluente necessariamente do uso da coisa, e que se torna inalcançável por força da expropriação”[14].
No mesmo sentido, precedentes do STJ, com julgamento (o primeiro citado) pela sistemática dos recursos repetitivos:
4. O suposto prejuízo sofrido pelas empresas possui natureza jurídica dupla: danos emergentes (dano positivo) e lucros cessantes (dano negativo). Ambos exigem efetiva comprovação, não se admitindo indenização em caráter hipotético, ou presumido, dissociada da realidade efetivamente provada. Precedentes.
[...]
9. Recurso especial não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
(REsp 1347136 / DF. Relator(a): Ministra ELIANA CALMON (1114). S1 - PRIMEIRA SEÇÃO. Data do Julgamento: 11/12/2013. Data da Publicação/Fonte DJe 07/03/2014). (Grifei).
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“A jurisprudência do STJ não admite a indenização de lucros cessantes sem comprovação, rejeitando os lucros hipotéticos, remotos ou presumidos, incluídos nessa categoria os lucros que supostamente seriam gerados pela rentabilidade de atividade empresarial que sequer foi iniciada. Precedentes" (AgInt no AREsp 964.233/SP, Rel. p/ acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, DJe de 23/05/2017). (Grifei).
Lucros cessantes não comprovados, remotos e meramente hipotéticos não são indenizáveis (não é uma “perda de renda comprovada”).
Ressalta-se, também, que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) uniformizou o entendimento que veda a cumulação entre lucros cessantes e juros compensatórios. Assim, constatando-se lucros cessantes, então há apenas juros compensatórios, sob pena de bis in idem.
“ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO. INDENIZAÇÃO. CUMULAÇÃO DE JUROS COMPENSATÓRIOS E LUCROS CESSANTES. INVIABILIDADE. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO (EREsp. 1.190.684/RJ, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, Rel. p/ Acórdão Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 2.8.2012)”.
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"[...] a indenização devida em ação de desapropriação não comporta a cumulação dos lucros cessantes com os juros compensatórios, sob pena de ocorrer um bis in idem, uma vez que os juros compensatórios abrangem os lucros cessantes." (REsp 1.094.950/MG, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 18.12.2008, DJe 26.2.2009.)
Como exposto, não se admite a cumulação de indenização a título de lucros cessantes com juros compensatórios. Os precedentes do STJ não deixam dúvida que os juros compensatórios abrangem os lucros cessantes, e não é admissível dois pagamentos com o mesmo fundamento (cumulação indevida, pagamento em bis in idem).
Em síntese: havendo lucros cessantes comprovados (não meramente hipotéticos, remotos ou presumidos), por não se permitir a sua cumulação com juros compensatórios, aí sim será caso de incidência de juros compensatórios, a taxa de 6% ao ano. Sem lucros cessantes efetivamente comprovados, não há juros compensatórios.
Por fim, uma observação. Embora se tenha mencionado que a indenização deve incluir o valor da desvalorização (quando há), importante ressaltar, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que para a valorização há três possibilidades.
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. CONSTRUÇÃO DE RODOVIA. VALORIZAÇÃO DA ÁREA REMANESCENTE. ABATIMENTO. ART. 27 DO DECRETO-LEI 3.365/41. INTERPRETAÇÃO.
[...]
3. Na desapropriação, direta ou indireta, quando há valorização da área remanescente não desapropriada em decorrência de obra ou serviço público, dispõe o Estado de três instrumentos legais para evitar que a mais valia, decorrente da iniciativa estatal, locuplete sem justa causa o patrimônio de um ou de poucos: a desapropriação por zona ou extensiva, a cobrança de contribuição de melhoria e o abatimento proporcional, na indenização a ser paga, da valorização trazida ao imóvel.
4. A valorização imobiliária decorrente da obra ou serviço público pode ser geral, quando beneficia indistintamente um grupo considerável de administrados, ou especial, que ocorre quando o benefício se restringe a um ou alguns particulares identificados ou, pelo menos, identificáveis.
5. A mais valia geral subdivide-se em ordinária e extraordinária. A primeira tem lugar quando todos os imóveis lindeiros à obra pública se valorizam em proporção semelhante. A segunda, diferentemente, toma parte quando algum ou alguns imóveis se valorizam mais que outros, atingidos pela mais valia ordinária.
6. Na hipótese de valorização geral ordinária, dispõe o Poder Público da contribuição de melhoria como instrumento legal apto a "diluir", entre os proprietários beneficiados com a obra, o custo de sua realização.
7. No caso de valorização geral extraordinária, pode o Estado valer-se da desapropriação por zona ou extensiva, prevista no art. 4º do Decreto-Lei 3.365/41. Havendo valorização exorbitante de uma área, pode o Estado incluí-la no plano de desapropriação e, com a revenda futura dos imóveis ali abrangidos, socializar o benefício a toda coletividade, evitando que apenas um ou alguns proprietários venham a ser beneficiados com a extraordinária mais valia.
8. Por fim, tratando-se de valorização específica, e somente nessa hipótese, poderá o Estado abater, do valor a ser indenizado, a valorização experimentada pela área remanescente, não desapropriada, nos termos do art. 27 do Decreto-Lei 3.365/41.
[...]
(REsp 795.580/SC, Rel. Min. CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/12/2006, DJ de 1º/02/2007). (Grifei).
Ocorrendo valorização geral ordinária, o instrumento legal é a Contribuição de Melhoria.
“Em se tratando de valorização geral ordinária, decorrente da construção de rodovia, não é possível o decote na indenização com base no art. 27 do Decreto-Lei 3.365/41, cabendo ao Poder Público, em tese, a utilização da contribuição de melhoria como instrumento legal capaz de fazer face ao custo da obra, devida proporcionalmente pelos proprietários de imóveis beneficiados com a valorização do bem” (REsp 1.230.687-SC, Segunda Turma, julgado em 18/10/2012).
Ocorrendo valorização geral extraordinária, o instrumento legal é a desapropriação por zona (art. 4º do Decreto-Lei 3.365/41). E ocorrendo a valorização especifica dos imóveis desapropriados, essa sim deve resultar na dedução do valor a ser pago, incidindo o art. 27 do Decreto-Lei 3.365/41[15].
Como explica Eduardo de Castro[16]:
“A supracitada dedução do valor da indenização paga pelo Estado, ainda nos moldes da jurisprudência do STJ, será admissível apenas quando a valorização imobiliária for específica, ou seja, quando a obra pública beneficiar apenas um ou alguns proprietários identificados ou identificáveis situados na zona de influência da atuação estatal. Trata-se da melhor interpretação do disposto no art. 27 do Decreto-Lei nº 3365/41”. (Grifei).
Eis, então, os três instrumentos legais para evitar que a desapropriação se transforme em fonte de lucro, enriquecimento sem causa, quando há valorização imobiliária.
Notas
[1] “O valor da indenização, como ensina Manoel de Oliveira Franco Sobrinho, é uma soma inevitável de elementos concretos, reais e de fácil constatação”. (PRADO, Luiz Guilherme Muller. A Justa Indenização na Desapropriação do Imóvel Rural. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 71).
[2] FURTADO, Lucas Rocha. Curso de Direito Administrativo. 5ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2016, p. 657.
[3] MENDES, Vicente de Paula. A Indenização na Desapropriação: doutrina, legislação e jurisprudência. Belo Horizonte: Del Rey, 1992, p. 96 e 102.
[4] Na ADPF-387 ficou decidido que “é aplicável o regime dos precatórios às sociedades de economia mista prestadoras de serviço público próprio do Estado e de natureza não concorrencial”. No mesmo sentido, ADPF-275.
[5] “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DESAPROPRIAÇÃO. IMISSÃO NA POSSE. DEPÓSITO PRÉVIO. VALOR INSUFICIENTE. DIFERENÇA. PRECATÓRIO. Verificada a insuficiência do depósito prévio na desapropriação por utilidade pública, a diferença do valor depositado para imissão na posse deve ser feito por meio de precatório, na forma do artigo 100 da CB/88. Agravo regimental a que se nega provimento”. (RE 598.678-AgR/MG, Rel. Min. Eros Grau, Segunda Turma).
[6] FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson; NETTO, Felipe Braga. Manual de Direito Civil: volume único. 2ª ed. Salvador: Juspodivm, p. 854-855.
[7] Súmula 69 do STJ: “Na desapropriação direta, os juros compensatórios são devidos desde a antecipada imissão na posse e, na desapropriação indireta, a partir da efetiva ocupação do imóvel”.
[8] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 33ª ed. São Paulo: Atlas, 2019, p. 930.
[9] A decisão final da ADI 2.332 foi proferida em 17/05/2018, divulgada no informativo 902 do STF, e a Ata de Julgamento Publicada – ATA 15, de 17/05/2018 – DJe 103, divulgada em 25/05/2018. O Supremo Tribunal assentou ser suficiente a publicação da ata da sessão de julgamento para que a decisão produza efeitos: “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CUMPRIMENTO DA DECISÃO. 1. Desnecessário o trânsito em julgado para que a decisão proferida no julgamento do mérito em ADI seja cumprida. Ao ser julgada improcedente a ação direta de inconstitucionalidade - ADI nº 2.335 - a Corte, tacitamente, revogou a decisão contrária, proferida em sede de medida cautelar. Por outro lado, a lei goza da presunção de constitucionalidade. Além disso, é de ser aplicado o critério adotado por esta Corte, quando do julgamento da Questão de Ordem, na ADI 711 em que a decisão, em julgamento de liminar, é válida a partir da data da publicação no Diário da Justiça da ata da sessão de julgamento. 2. A interposição de embargos de declaração, cuja consequência fundamental é a interrupção do prazo para interposição de outros recursos (art. 538 do CPC), não impede a implementação da decisão. Nosso sistema processual permite o cumprimento de decisões judiciais, em razão do poder geral de cautela, antes do julgamento final da lide. 3. Reclamação procedente” (Rcl 2576, Relatora a Ministra Ellen Gracie, DJ 20.8.2004). (Grifei).
[10] FERRAZ, Sérgio. A Justa Indenização na Desapropriação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978, p. 72-73.
[11] FERRAZ, Sérgio. A Justa Indenização na Desapropriação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978, p. 73.
[12] CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Lei de Desapropriação. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992, p. 40.
[13] FERRAZ, Sérgio. A Justa Indenização na Desapropriação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978, p. 19.
[14] FERRAZ, Sérgio. A Justa Indenização na Desapropriação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978, p. 19
[15] “Art. 27. O juiz indicará na sentença os fatos que motivaram o seu convencimento e deverá atender, especialmente, [...] e à valorização ou depreciação de área remanescente, pertencente ao réu”. (Grifei).
[16] In: CASTRO, Eduardo de; LUSTOZA, Helton Kramer; GOUVÊA, Marcus de Freitas. Tributos em Espécie. 2ª ed. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 111.