3 A Codificação do Direito nos Sistemas Jurídicos Civil Law e Common Law.
A Codificação do Direito. Na perspectiva da evolução e sistematização da Teoria Geral do Direito, os Ordenamentos Jurídicos do Estados, passaram a conceber os Códigos Civis e as Constituições Nacionais, que possibilitaramuma nova organização jurídica da sociedade, realizando o espírito da época, que consistia no individualismo próprio do pensamento liberal, que estabelece a divisão do Direito, em Direito Público e Direito Privado, na garantia da liberdade dos indivíduos, na concepção da centralidade do Direito, em face da Política e da Filosofia. Os exemplos historicamente mais importantes desse processo são os Códigos Civis Francês e Alemão, e posteriormente, o Código Civil da Argentina e do Brasil, na América Latina, entre outros.
Registre-se que Friedrich Carl von Savigny (1779-1861)[11] foi um dos mais respeitados e influentes juristas alemães do Século XIX, e Professor Catedrático na Universidade de Berlim. Foi o nome maior da Escola Histórica do Direito. Essa Escola tinha como pressuposto o ensinamento de que as normas jurídicas, seriam o resultado de uma evolução histórica e que, a essência delas, seria encontrada nos costumes e nas crenças dos grupos sociais. No pensamento de Savigny, o Direito teria suas origens nas forças silenciosas e não no arbítrio do legislador. O pensamento de Savigny, teve grande influência no Direito alemão, bem como, no Direito dos países de tradição romano-germânica, especialmente, na formulação do Direito Civil e do Código Civil alemão (Bürgerliches Gesetzbuch - BGB) de 1900.
Diga-se que, a codificação do Direito foi um movimento jurídico que surgiu no Ocidente no Século XIX, em função do qual, os direitos ocidentais, quanto à forma, se dividiam e ainda, se dividem, em Direito Codificado Nacional ou Civil Law e o Sistema da Common Law ou do grupo Anglo-Americano.
Como ensina o Prof. Ricardo Rabinivich-Berkman, da Universidade de Buenos Aires[12], “en el Siglo XIX, passan a ser un requisito de la soberanía nacional: todo Estado independiente, siente que debia tener, por lo menos, un Codigo Civil”.
A Codificação do Direito compreende o Grupo francês, tendo por ponto de partida, o Código de Napoleão, de 1804 e o Grupo alemão, com o Código Civil Alemão de 1900, Bürgerliches Gesetzbuch ou BGB. O BGB serviu como um modelo para os Códigos Civis, de várias outras jurisdições de Direito Romano- Germânico, incluindo Portugal, Estônia, Letônia, República China, Japão, Tailândia, Coreia do Sul, Grécia, Ucrânia e Angola. Posteriormente, alcança a América Latina, com o Código Civil Argentino, de 1869, de Vélez Sarsfield, que foi revogado e substituído pelo novo Código Civil de 2014, e o Código Civil Brasileiro, de 1916 de Clovis Beviláqua, que foi revogado e substituído pelo novo Código Civil de 2002, e finalmente, tal codificação, se estendeu para África e Oriente Médio.
O Sistema da Common Law ou do Grupo Anglo-Americano. Se funda nos chamados precedentes escritos, que se encontram em coleções e livros. Esta jurisprudência escrita (case law) é uma espécie de Código sob outra forma. Nos Estados Unidos, os precedentes judiciais predominantes, assentados e tradicionais, sobre determinadas matérias jurídicas, estão sendo compilados. A essência do Direito Comum da Inglaterra, utilizado na maioria dos países da Commonweathe, é que ele é realizado por juízes nos Tribunais, com a aplicação de seu senso comum e conhecimento do precedente legal (stare decisis).
Ainda, como exemplo de codificação, porém, como uma codificação política do Direito, a Constituição dos Estados Unidos, de 1787, e a Constituição da França, de 1791, serviram de inspiração para os denominados Estados Nacionais. O modelo Constitucional dos denominados, Estados Nacionais, proveniente do modelos norte-americano e francês, irradiou para a maioria dos 194 países, existente no mundo que adotaram a Constituição, como Lei máxima para o seu Sistema Jurídico.
Como ensina Heleno Taveira Torres[13], consolidado “o Estado de Direito, afirma-se a doutrina do Estado Constitucional, especialmente, com os avanços da doutrina da Constituição material. Como decorrência da crise do Estado Liberal, ou se preferir, com o êxito do Estado Social, e o surgimento do Estado Democrático”, foi marcante a expansão das necessidades de receitas tributárias para a cobertura de inúmeros custos financeiros com direitos sociais, e com a função extrafiscal, de intervenção estatal na economia.
Raul Gustavo Ferreyra (56)[14], é Advogado, Doutor pela Universidade de Buenos Aires, UBA, Professor Catedrático em Direito Constitucional na Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires, UBA, Argentina, ensina que “o Estado moderno constitui o modelo mais afirmado de um Sistema Social, que estabelece a centralização da força pela comunidade. Sua afirmação e consolidação se devem, sem dúvidas, à centralização do emprego da força”. As comunidades se organizam de acordo com determinados níveis ou graus de perfeição ou imperfeição, que desenham, por sua vez, a autorização a determinados indivíduos para que façam ou desempenhem determinados atos. Portanto, uma característica do Estado, consiste em que a coexistência dos homens, é regulada pelo Direito. Para a Ordem Jurídica, se apresenta como uma maneira em relação com os demais.
A grande maioria das doutrinas jus positivistas costuma postular, que as duas diferenças que marcam a distinção entre os Sistemas Jurídicos e Morais, religiosos ou de trato social, consistem em que:
(a) os sistemas jurídicos, em caso de não se cumprir a conduta regrada, estipulam a aplicação de sanções de caráter externo quer em última instância podem derivar na utilização da força física, e
(b) a coação se encontra monopolizada pelo Estado, isto é, se encontra institucionalizada.
O Estado Constitucional de Direito, fundado na livre iniciativa e na propriedade privada obriga-se a sustentar-se mediante impostos. A partir de agora, “melhor seria falar de um Estado Constitucional Tributário”, como o faz Saldanha Sanches[15], pois, a passagem para a fase do Estado Fiscal, vai implicar na constitucionalização do Direito Fiscal, nos seus aspectos fundamentais.
4 A Teoria Geral do Direito, os Sistemas Jurídicos e o Direito Digital.
Dentro da perspectiva da Teoria Geral do Direito, que tem por objetivo, estudar os conceitos fundamentais e universais do Direito e as características que são comuns a todos os Sistemas Jurídicos, vale registrar o lançamento, pelos soviéticos, do satélite Sputnik, na segunda metade do Século XX (1957) e, a partir daí o mundo tornou-se globalizado, com as telecomunicações, com o rádio, com a televisão, com a informática, com celulares, e, acima de tudo, surgiu um mundo conectado, onde se navega pela internet em tempo real, vale dizer, o surgimento da Era da Informação ou Era Digital.
Nos ensinamentos de Rosa[16], observa-se que nos anos 1970, “a internet passou a ser utilizada para fins acadêmicos e científicos". Por exemplo, o correio eletrônico (e-mail), até hoje é a aplicação mais utilizada da rede, que foi criada em 1972, por Ray Tomlinson. Em 1973, a Inglaterra e a Noruega, são ligadas à rede, tornando-se, com isso, um fenômeno mundial. Em meados da década de 1980, o Governo norte-americano abriu a rede às empresas e continuou financiando a ARPANET, (ARPA - Advance Research Projects Agency - Agência de Projetos de Pesquisa Avançada) até o ano de 1989, quando também foi lançado o primeiro browser (Windows), tendo sido apresentado em Genebra, a World Wide Web (www).
No Brasil, as primeiras normas que visavam regular o serviço de internet foram traçadas em 1995, em nota conjunta do Ministério das Comunicações e do Ministério da Ciência e Tecnologia. Estabeleceu-se, por exemplo, que os serviços comerciais da rede, seriam fornecidos por empresas privadas.
A Lei nº 7.232, de 29/10/1984, estabelece princípios, objetivos e diretrizes da Política Nacional de Informática, seus fins e mecanismos de formulação, cria o Conselho Nacional de Informática e Automação - CONIN, dispõe sobre a Secretaria Especial de Informática - SEI, cria os Distritos de Exportação de Informática, autoriza a criação da Fundação Centro Tecnológico para Informática - CTI, institui o Plano Nacional de Informática e Automação e o Fundo Especial de Informática e Automação.
A internet, como é conhecida hoje, foi concebida a partir de 1983, quando, após quebras de barreiras militares, a rede acabou repercutindo na área civil. Depois desse período, o meio se espalhou por todo o mundo, e, destarte, causou uma revolução na maneira de se comunicar e realizar negócios. A partir desse fato, a Internet passou a complementar, em vários aspectos, as relações entre os Estados, Organizações Empresas e pessoas físicas e jurídicas, se tornando relevante para o desenvolvimento do mercado em meio a uma sociedade tecnológica global.
Dessa forma, dentro da Era Digital, surge o Direito na Internet (Rede Mundial de Computadores) ou o Direito Digital, estabelecendo a necessidade de repensar importantes aspectos relativos à organização social, à democracia, à tecnologia, privacidade, liberdade etc. Ora, o Direito, como se conhecia até o surgimento da Era Digital, se baseava nas Leis e, as leis, tem jurisdição sobre um espaço físico para sua aplicação. O Espaço físico corresponde ao Princípio da Territorialidade e ao Princípio da Extraterritorialidade.
O Princípio da Territorialidade corresponde ao espaço que engloba o território físico do Estado Brasileiro, bem como as Ilhas Oceânicas, onde o Brasil exerce a sua soberania. O Princípio da Extraterritorialidade corresponde e se projeta ao espaço das Embaixadas e os Consulados, localizados no Exterior, bem como, aos espaços das aeronaves e dos navios brasileiros, de carga ou passageiros, em circulação pelo Globo, observando-se as Leis, Tratados e as Convenções Internacionais, de que o Brasil seja signatário, observado as disposições do art. 5º, §2º e §3º, da Constituição Federal do Brasil.
Todavia existe um novo espaço, o denominado espaço cibernético ou cyberespaço que é distinto do espaço físico terrestre. Discute-se se surgirá uma disciplina autônoma, já que toda vez que surgiu uma nova tecnologia, surgiu também a necessidade de reunir seus problemas em torno dessa matéria. Atualmente, difunde-se muito a ideia de Direito do Espaço Virtual.
Assim, a lei de um Estado, em tese, terá jurisdição no espaço virtual que corresponda ao seu espaço físico territorial. Transcendendo-se essa fronteira física, a Lei ou o Direito Virtual de outro Estado, deverá prevalecer dentro dos limites deste Estado, e assim por diante.
Diga-se que, como esta atividade é recente, não há uma classificação definida entre os Ramos do Direito, numa perspectiva da Teoria Geral do Direito, já que a mesma transcende as fronteiras geográficas ou dimensões físicas de um Estado, e por essa razão, o Direito Digital, a nosso ver, poderia ser classificado como um Direito Internacional Privado, por envolver direitos de pessoas físicas e jurídicas, notadamente, nos chamados e-commerce, comércio eletrônico, que se realiza entre pessoas físicas e jurídicas, em todos os pontos do Globo, vale dizer,a globalização, que“é considerada uma estratégia de vendas de produtos uniformizados, em todos os mercados importantes, em qualquer parte do globo”, conforme afirmou o Prof.Theodore Levitt, da Harvard Universit[17].
Todavia existem alguns países, talvez, por razões políticas e de soberania, tem a intenção de controlar a internet, nacionalmente, como ocorreu na China, na Coréia do Norte, e no Irã, que regulamentou o acesso à Internet, por intermédio de servidores nacionais centrais, que só permitiam um tipo de informação.
Registre-se também que nos dias atuais dessa contemporaneidade, é impossível pensar o mundo sem a Internet. Ela tomou parte e integra os Órgãos Governamentais, as Empresas, as Universidades as Escolas, nos pequenos negócios, notadamente, nos lares de milhões ou bilhões de pessoas de todo o mundo, e hoje, com os denominados smartfones, que se encontram nas mãos da maioria das pessoas,estar conectado à rede mundial, passou a ser uma necessidade de extrema importância, possibilitando o acesso às informações e notícias do mundo, seja em dados, gráficos, fotografias, textos e filmes,em apenas um click, fator este que contribui para ampliar as informações e o conhecimento do homem numa aldeia global.
Diga-se, no mundo contemporâneo, a vantagem hoje está na boa aplicação do Conhecimento. A Alemanha e o Japão têm ganho a concorrência dos EUA, pois, estão sabendo aplicar melhor o conhecimento nesses setores do que seus concorrentes. Observa-se isso, nos processos como o just in time (na hora certa), que tornam a produção mais eficaz, reduzindo o custo da produção. Nestes processos há uma enorme troca de informações entre os trabalhadores e essa metodologia que, tem como premissa, o aperfeiçoamento contínuo, utilizando-se de todos os meios disponíveis, inclusive dos meios disponíveis na internet ou do Direito Digital, que se originou no Século XX e incorporou ao Direito Internacional Contemporâneo.
Por fim, o termo saber tem hoje, por força das coisas e pela realidade do uso, um sentido bem mais amplo que ao termo ciência. Hoje em dia, é considerado saber, todo um conjunto de conhecimentos metodicamente adquiridos, mais ou menos ou, sistematicamente organizados, para serem transmitidos por um processo pedagógico de ensino. O conceito de “saber” poderá ser aplicado à aprendizagem de ordem prática e, ao mesmo tempo, às determinações de ordem propriamente intelectual e teórica, para o desenvolvimento da humanidade, no sentido latu sensu.
A Justiça brasileira e internacional há tempos, desde o final dos anos 1990, ingressou na Era Digital, pois, a crescente demanda por acesso à Justiça, para a resolução de litígios, seja por parte da sociedade, como pelos próprios entes públicos, tem gerado, ano após ano, o incremento do número de processos em tramitação e, consequentemente, das dificuldades para o Poder Judiciário concretizar sua missão, em solucionar esses litígios. Isso obrigou ao Poder Judiciário a dar uma resposta mais rápida aos jurisdicionados, e para tanto, necessitou proceder a implantação dos processos judiciais eletrônicos, permitindo que a marcha processual, seja executada de forma instantânea, talvez, na velocidade da luz, se comparada ao começo do Século XX.
Para tanto foi editada a Lei nº 11.419, de 19/12/2006, que dispõe sobre a informatização do processo judicial; altera a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil - CPC. Diga-se, que a Lei nº 13.105, de 16/03/2015, revogou a Lei nº 5.869/1973, e implantou o Novo Código de Processo Civil - NCPC.
Registre-se que a expressão Processo Judicial Eletrônico - PJE, é o nome mais utilizado atualmente e entendido como o mais adequado para nomear um Sistema Processual, que se apropria de recursos da Informática, para reproduzir o procedimento judicial em meio eletrônico, substituindo o antigo modelo de registro dos atos processuais, realizados no papel, por armazenamento e manipulação dos autos em meio digital. Para designar esse sistema também já foram usados os termos processo digital, virtual ou telemático. O futuro é hoje, com a Revolução Digital e o Direito, tem que se inovar, se adaptar e evoluir, na Era Digital.
A utilização da internet para a implementação do processo eletrônico já se apresenta como uma realidade no Brasil, que vem ao encontro das expectativas da sociedade de um Direito mais moderno, mais rápido e mais eficiente e menos burocrático. O processo eletrônico democratiza o acesso à Justiça, quando permite o acesso ao Judiciário, mesmo nos mais distantes rincões do país, todavia, o acesso à tecnologia, aos computadores e à rede internet de alta velocidade, é um imperativo para tal democratização. O Profissional do Direito necessitará de capacitação e atualização constante, para acompanhar a nova dinâmica do Direito. Conforme sugerido pelo Professor Fausto Morey[18] da FGV,que,
A tradicional atividade de "fazer o fórum", realizada geralmente por estagiários do direito, será radicalmente mudada ou mesmo extinta. Poderá ocorrer ainda, a necessidade de modificação no currículo dos cursos de direito visando possibilitar a adequada preparação para que os alunos possam atuar no novo padrão tecnológico e rito processual.
Não há como deixar de reconhecer a evolução do homem, da sociedade, especialmente, a evolução do Direitoe a Era Digital,para o Poder Judiciário e o Sistema Normativo Brasileiro, bem como aos demais Sistemas Normativos dos demais Estados, já é uma realidade, constituindo-se, assim, em novos desafios do conhecimento e do saber jurídico, que passa a integrar, inexoravelmente, a Teoria Geral do Direito, estabelecendo novas fronteiras, concernentes ao desenvolvimento de novos métodos e princípios da atividade de interpretação da Norma Jurídica, propiciando incontáveis desafios e ao mesmo tempo estímulos para superação, para os profissionais do Direito.