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A LGPD – O tratamento de dados na prática da constelação familiar no âmbito do sistema de Justiça

A constelação familiar e a prática sistêmica refletem bem-vinda mudança cultural no que tange aos direitos indisponíveis da individualidade humana. É imprescindível que cada profissional ou empresa busque adequar-se à LGPD.

A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei 13.709/98) dispõe, em seu artigo 1º, “sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado”.

Tem por objetivo proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade, bem como o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural, previstos na nossa Carta Magna.

A lei aplica-se em todas as relações jurídicas que tenham por objetivo a oferta ou o fornecimento de bens ou serviços.

Por isso, é importante que se faça algumas reflexões sobre o cabimento da LGPD para as empresas ou pessoas naturais que atuam com as dinâmicas de constelação familiar e/ou prática sistêmica.

A atividade de facilitador(a) de constelação familiar (Familienstellen) não é uma atividade profissional legalmente reconhecida.

O termo Familienstellen foi introduzido por Sophie Hellinger em 2020, para evitar as confusões sobre a técnica e identidade desenvilvida por Bert Hellinger.

Muito embora seja uma atividade em visível expansão, sendo, inclusive, incorporada como Prática Integrativa e Complementar (PICS) no Sistema Único de Saúde (SUS), através da Portaria n° 702, de 21 de março de 2018, pelo Ministério da Saúde.

Referida portaria, entre outras coisas, dispõe que:

“A constelação familiar é uma abordagem capaz de mostrar, com simplicidade, profundidade e praticidade onde está a raiz, a origem, de um distúrbio de relacionamento, psicológico, psiquiátrico, financeiro e físico, levando o indivíduo a um outro nível de consciência em relação ao problema e mostrando uma solução prática e amorosa de pertencimento, respeito e equilíbrio”.

Ao passo que as constelações familiares e o Direito Sistêmico surgem no âmbito da Justiça em meados de 2012, com o Dr. Sami Storch, juiz de Direito do Tribunal de Justiça da Bahia, tendo por objetivo possibilitar às partes aprofundarem o seu olhar para as questões ocultas e inconscientes do seu sistema familiar, fomentando a cultura de paz e uma justiça mais humanizada.

Dr. Sami Storch relata que o Direito Sistêmico surge através da sua “[...] análise do direito sob uma ótica baseada nas ordens superiores que regem as relações humanas, segundo a ciência das constelações sistêmicas.” (STORCH, 2010).

Com o crescimento da prática sistêmica no Brasil, encontramos facilitadores de constelação sistêmica, psicólogos, advogados, defensores, juízes, promotores e tantos outros profissionais que atuam diretamente com esse olhar na gestão dos conflitos no Sistema de Justiça.

Por isso, é fundamental entender como a LGPD pode afetar essa atividade.

Um ponto relevante no enquadramento diz respeito ao objetivo da empresa ou do(a) facilitador(a) na oferta ou fornecimento de bens ou serviços (II, artigo 3º, LGPD), em especial quando há remuneração pelo serviço.

Outro ponto, que pela simples leitura da definição de constelação familiar na Portaria do Ministério da Saúde, resta evidente, é que o(a) facilitador(a) de constelação familiar lida essencialmente com dados pessoais e sensíveis.

Aqui destaco, por exemplo, a dinâmicas individuais, cursos, workshops nos quais os participantes podem trazer dados sensíveis para o profissional/empresa e terceiros, especialmente, quando esses eventos são gravados. Como tratar os dados e adequar essas atividades?

É notório que os profissionais que atuam com responsabilidade e ética nas dinâmicas de constelações sistêmicas buscam sempre preservar a identidade/singularidade, bem como evitam a exposição dos contextos do cliente.

Ocorre que a LGPD determina a proteção de dados pessoais e sensíveis que, invariavelmente são colhidas em um atendimento sistêmico, como por exemplo: origem racial ou étnica, convicção religiosa, estado de saúde ou à vida sexual, além da imagem no que tange ao uso de plataformas digitais, entre outras (art. 5º, II, da LGPD).

E mais. Dispõe que as informações colhidas pelo facilitador de constelação sistêmica e todos que atuam na prática sistêmica (pessoa física ou jurídica) deverão observar a boa-fé e princípios, sucintamente: consentimento, indicação de finalidade, adequação, necessidade da informação, transparência, temporalidade (artigo 6º, da LGPD).

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Fator relevante a ser destacado: o consentimento, que deve ser por escrito ou por outro meio que demonstre a manifestação de vontade do cliente de forma inequívoca. Descrever a finalidade e a necessidade do acolhimento da informação, bem como o tempo de descarte com o qual essa informação será tratada.

Por outro lado, estabelece o artigo 4ª da LGPD as hipóteses nas quais a lei não se aplica:

“I - realizado por pessoa natural para fins exclusivamente particulares e não econômicos;

II - realizado para fins exclusivamente:

a) jornalístico e artísticos; ou

b) acadêmicos, aplicando-se a esta hipótese os arts. 7º e 11 desta Lei”.

Assim, em contrapartida, nos casos em que a dinâmica da constelação familiar e/ou prática sistêmica não tenha fins econômicos, com viés jornalístico ou acadêmico, não se enquadram na LGPD.

Muito embora, pela leitura ipsis litteris, pode-se deduzir que não seja imposto por lei o tratamento dos dados e sanções, é fundamental que os princípios constitucionais sejam observados, pois podem incorrer em outras sanções, na esfera cível, consumidor e criminal, como por exemplo, direito de imagem, danos morais, etc.

A LGPD traz, em seu bojo, responsabilidades e avanços importantes em nosso ordenamento, para a proteção da dignidade humana, o respeito à privacidade; liberdade de expressão, de informação, de comunicação e de opinião; inviolabilidade da intimidade, honra e da imagem; livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor; bem como os direitos humanos, o livre desenvolvimento da personalidade, a dignidade e o exercício da cidadania pelas pessoas naturais (artigo 2º, da LGPD).

É uma mudança de postura e cultura em nossa sociedade, no que tange aos direitos indisponíveis da individualidade humana.

E, por isso, especialmente no que tange à atividade específica da constelação familiar e/ou prática sistêmica, é imprescindível que cada profissional ou empresa busque entender, observar e adequar, sua atividade à LGPD.

Sobre a autora
Roberta Aparecida Moreira Reis dos Santos

Advogada sistêmica. Presidente da Comissão de Direito Sistêmico da OAB Subseção de Itaquera (2019-2020) Vice Presidente da Comissão de Direito Sistêmico da OAB Subseção da Lapa (2017-2018) Facilitadora de Constelação Sistêmica Pós-Graduada em Constelação Familiar aplicada ao Direito Sistêmico pela Hellinger Schule e Faculdade Innovare Docente de Direito Sistêmico na Pós-Graduação em Constelação Familiar pela USCS Pós Graduanda em Direito Civil e Processual na Faculdade Legale Coordenadora sistêmica do projeto Oficina de Direito Sistêmico #pazparatodos no Fórum Regional de Santo Amaro, Voluntária nos Projetos Sistêmicos no âmbito do Sistema de JustiçaConstelação Familiar Ipiranga e Justiça Terapêutica no JECRIM, ambos no Fórum Regional do Ipiranga, Projeto Integração no Fórum Regional do Jabaquara. Fundadora do Círculo Sistêmico de Amor Co-autora dos livros O Poder da Constelação em 27 relatos e Pensamento Sistêmico - Abordagem Sistêmica aplicada ao Direito.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Roberta Aparecida Moreira Reis. A LGPD – O tratamento de dados na prática da constelação familiar no âmbito do sistema de Justiça. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6444, 21 fev. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/88525. Acesso em: 22 nov. 2024.

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