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A objeção de não-executividade

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Agenda 01/12/2000 às 00:00

Sumário: 1. Introdução – 2. O processo como instrumento de pacificação da lide – 3. A eficácia da tutela jurisdicional pelo processo de execução – 4. Os instrumentos de oposição à execução – 5. A denominação do instituto: exceção de pré-executividade, objeção de pré-executividade ou objeção de não-executividade – 6. Hipóteses de cabimento da objeção de não-executividade – 7. Objeção de não-executividade em lugar de embargos do devedor? – 8. Conclusão – Notas -  Bibliográfia.


1.INTRODUÇÃO

Sob a designação de "exceção", ou "objeção", seguida do complemento "de pré-executividade" ou "de não-executividade", os doutrinadores e órgãos jurisdicionados brasileiros têm tratado de interessante figura processual, sem previsão expressa no Código de Processo Civil, mas com efeitos substanciais sobre o processo de execução.

Trata-se de figura que, em sendo admitida, permite ao executado insurgir-se diretamente contra o sustentáculo da execução, sem que se cogite de garantia do juízo ou oposição de embargos do devedor, tidos, até então, como processo incidental característico e exclusivo para tal mister.

Nosso estudo propõe a investigação de alguns dos fundamentos básicos dessa recente figura, sua localização no ordenamento e sua natureza jurídica, a admissibilidade da medida e o tratamento que lhe vem sendo dado pela doutrina e pela jurisprudência, sobretudo para identificar as hipóteses em que tem sido aceita sua utilização em detrimento dos embargos do devedor.


2. O PROCESSO COMO INSTRUMENTO DE PACIFICAÇÃO DA LIDE

O processo afigura-se, nos dizeres de JOSÉ FREDERICO MARQUES, como "um meio de composição de litígios, ou conjunto de atos destinados à aplicação do direito objetivo a uma situação contenciosa".(1)

FRANCESCO CARNELUTTI afirma que "a palavra processo serve, pois, para indicar um método para a formação ou para a aplicação do direito que visa a garantir o bom resultado, ou seja, uma tal regulação do conflito de interesses que consiga realmente a paz e, portanto, seja justa e certa: a justiça deve ser sua qualidade superior ou substancial; a certeza, sua qualidade exterior ou formal".(2)

Tratando do conflito de interesses, cuja pacificação faz-se objeto primordial do processo, CARNELUTTI destaca que, na relação conflituosa, "a satisfação da necessidade que corresponde a um dos interesses exclui ou pelo menos limita a satisfação do outro"(3) e define o litígio, ou lide, como sendo o "conflito (intersubjetivo) de interesses qualificado por uma pretensão contestada (discutida)"(4). Essa pretensão nada mais é que o reflexo jurídico de um interesse próprio que subordina o interesse alheio.

Através do processo, portanto, a pretensão que possui ressonância na lei (direito objetivo), recebe do Estado, através de seus agentes jurisdicionados, a tutela apropriada, resolvendo-se o conflito de interesses.

No exercício da jurisdição(5), o juiz, figura neutra e imparcial, após a necessária provocação por parte do titular do direito lesionado ou ameaçado de lesão, dará o devido encaminhamento aos atos processuais, de acordo com o rito apropriado, para, ao final, proferir a sentença, solucionando o litígio.

Mas como agirá, então, aquele que recebeu da autoridade Estatal a confirmação de sua pretensão? Como dar eficácia ao comando contido na sentença, para fazer valer seu direito?

No passado, o particular exercia pessoalmente e pela força, a satisfação de sua pretensão, exercendo a chamada autotutela. Era o exercício da força, em benefício das próprias razões.

Até o ano 326 a.C., o devedor respondia pelas dívidas pessoalmente, ou seja, com sua liberdade, seu corpo, ou até com sua vida. A lex Poetelia Papiria, editada naquele ano, afastou essa carga da pessoa do devedor e transferiu-a unicamente aos seus bens.

O Estado, então, chamou para si o exercício da jurisdição, retirando do particular essa possibilidade. Assim, substituiu o direito da força pela força do Direito.

Mas ao fazê-lo, obviamente assumiu a responsabilidade de tutelar os interesses legitimados pela lei objetiva e o mister de dar-lhes eficaz cumprimento.

Por essa razão, ao lado do processo de conhecimento e do processo cautelar, o legislador cuidou de traçar normas de procedimento capazes de assegurar a observância, forçada se preciso, do comando contido nas decisões judiciais solucionadoras dos conflitos de interesse, ou dos títulos extrajudiciais revestidos de força executiva, por meio de uma atuação prática. Fê-lo através do processo de execução.


3.A GARANTIA DA EFICÁCIA DA TUTELA JURISDICIONAL PELO PROCESSO DE EXECUÇÃO

Para ARAKEN DE ASSIS, "nem toda regra jurídica concreta, obtida através de sentença, reclama a mencionada atuação prática, porque em si mesma já satisfaz o demandante."(6)

É o que ocorre com as sentenças que possuem cunho declaratório ou constitutivo, onde nada há a executar quanto ao objeto específico da decisão e a parte encontra sua satisfação na exclusiva manifestação favorável do juiz.

Mas, quando não tem a prestação jurisdicional o escopo de gerar ao demandante a satisfação de sua pretensão reconhecida e deferida, faz-se necessário, em possuindo a sentença eficácia condenatória, promover-se a execução do comando contido na sentença.

Citando PONTES DE MIRANDA, ARAKEN DE ASSIS assevera que "a força executiva ‘retira valor que está no patrimônio do demandado, ou dos demandados, e põe-no no patrimônio do demandante’".(7)

Vejamos o que diz, ainda o próprio PONTES DE MIRANDA: "Nas execuções forçadas, o Estado executa pelo que devia executar: o Estado diz que alguém deve, decisão no plano processual, e entrega, dizendo que entregou pelo executado – o que talvez não coincida com a realidade no plano material, ou porque o réu não devesse, ou porque o objeto da entrega seja diferente, ou não exista, ou não tivesse sido realmente entregue."(8)

Essa atuação estatal, para que possa ser exercida, pressupõe a existência de um direito materializado em título, revestido de força executiva.

CARLOS ALBERTO CARMONA aduz com clareza: "Condição indispensável para a propositura de ação de execução é a existência de título executivo, que pode ser identificado como o ato ou fato a que a lei atribui (às vezes até mesmo de forma arbitrária) tamanho grau de certeza que permite ao autor desde logo pleitear medidas satisfativas, dispensando – no caso dos títulos executivos extrajudiciais – o processo cognitivo condenatório prévio".(9)

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Assim, há duas modalidades de títulos providos de força executiva: o título executivo judicial, proveniente de processo de cognição, materializado na sentença (art. 584, I a V, do CPC), e o título executivo extrajudicial (art. 585, I a VII, do CPC), que se origina de ato da vontade das partes, representando uma obrigação.

Para JOSÉ FREDERICO MARQUES, "Título executivo é a denominação dada à prestação típica provida de força executiva, quando certa líquida e exigível. Trata-se de prestação típica, porque não há título executivo sem disposição expressa de lei. Indica esta qual a prestação que integra o título executivo e, ao mesmo tempo, dá os contornos formais deste. Portanto, se a prestação e respectivo instrumento se subsumem na descrição legal, configurado se acha o título executivo".(10)

Seja pela imposição contida na decisão do Estado, materializada em título judicial, seja por força da obrigação assumida voluntariamente pelo devedor, em documento revestido de força executiva, na esfera extrajudicial, a execução é ação destinada a tutelar a pretensão insatisfeita do credor


4. OS INSTRUMENTOS DE OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO

Tradicionalmente, proposta a ação de execução, o devedor só pode valer-se dos meios previstos na lei adjetiva para opor-se à pretensão do exeqüente, após ofertar (ou ter constritados) seus bens, em montante suficiente para garantir o juízo da execução, através da penhora, ocasião em que, estando presente uma das hipóteses de contrariedade previstas no artigo 741 ou 745 do CPC(11), insurge-se contra a cobrança executiva por meio de embargos do devedor.

Os embargos, pela esmagadora doutrina, possuem natureza de ação de conhecimento incidental. Há quem sustente a natureza dúplice dos embargos, entendendo-os, também, como forma de defesa, seara esta à qual abstemo-nos de ingressar, por não ser relevante ao presente estudo.

É certo, porém, que destinam-se os embargos a atacar a eficácia do título executivo ou a relação processual representada pelo mesmo. Nesse contexto, os embargos são o instrumento processual adequado para opor-se o devedor à execução contra ele movimentada pelo credor.

Mas, é de indagar-se: só os embargos prestam-se a tal mister? Não haveria outro iter a ser trilhado pelo executado, em certas condições, quando presente vício ou irregularidade capaz de desconstituir de plano a obrigação representada no título, ou, ainda, atacar a existência do próprio título executivo?

Seguramente que sim. Trata-se de uma construção doutrinária, que se vem enraizando em nossa jurisprudência, denominada por alguns autores de exceção de pré-executividade, ou para outros, objeção de pré-executividade.


5. A DENOMINAÇÃO DO INSTITUTO: EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE, OBJEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE OU OBJEÇÃO DE NÃO-EXECUTIVIDADE?

Segundo NELSON NERY JUNIOR, "a expressão objeção de pré-executividade é a mais adequada, já que o termo ‘exceção’ sugere que se trate de matéria de defesa, e, portanto, não passível de ser conhecida de ofício e sujeita a preclusão." (12)

Para CLÁUDIO ARMANDO COUCE DE MENEZES e LEONARDO DIAS BORGES, "A objeção de execução (ou a execução?) tem dois momentos básicos: o que preexiste à penhora e o posterior a esta. Em regra, as alegações são trazidas ao Juiz assim que inicia a execução até que expire o prazo para pagar ou garantir a execução. Todavia, nada impede trazer a parte suas questões após decorrido o prazo de aforamento dos embargos, em hipótese de pressupostos processuais e condições da ação, pois tais matérias não são precluíveis (art. 267, § 3º, do CPC). Estas são as que podemos dar alcunha de objeções executivas em oposição às primeiras, objeções de pré-executividade. Há quem, entretanto, prefira distinguir pelo fato gerador da objeção. Se este for anterior à execução ou concomitante com o ajuizamento da ação de execução, tem-se a objeção de pré-executividade. Após este marco, configura-se já uma objeção executiva." (13)

O Professor JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA, em artigo recente(14), questiona severamente a imprecisão terminológica em que têm incorrido a doutrina e a jurisprudência. Sob sua bem fundamentada ótica, não haveria como falar-se em exceção, porquanto esta tem sido ao longo dos tempos empregada para designar gênero de "defesa", onde, a rigor, descabe a apreciação ex officio pelo juiz.

Já a expressão pré-executividade, na visão do festejado autor, seria igualmente incorreta, posto que o substantivo abstrato "executividade" indica a qualidade do que é executivo. Como essa característica é própria do processo e do título (executivos), o prefixo "pré" os atingiria, levando a pensar em processo pré-executivo ou título pré-executivo, em evidente inadequação terminológica.

Afinizamo-nos com as considerações de BARBOSA MOREIRA, pois não se trata a objeção de instrumento para questionar o tempo da execução – se antes ou depois –, mostrando-se atécnico falar em "pré-executividade", mais porque quando o devedor manifesta-se, a execução já existe e é contra ela que se dirige o ataque.

Assim, a oposição à execução por vício que impossibilitaria sua existência, poderia ser tratada com expressões mais oportunas e técnicas, como: "objeção de não-executividade" ou "objeção à executividade", que parecem melhor exprimir a negativa da executividade, que deveria ter sido reconhecida de plano pelo juiz, mas que por não ter sido, pode ser-lhe apontada pelo executado, quando tomar conhecimento da execução indevida.

Por tal prerrogativa, o suposto devedor pode comprovar a inviabilidade do procedimento executório, diretamente nos autos de execução, sem necessitar para tanto garantir o juízo pela penhora nem opor embargos.

CLÁUDIO ARMANDO COUCE DE MENEZES e LEONARDO DIAS BORGES lançam a indagação: "Mas, afinal de contas, o que é a exceção ou objeção de pré-executividade? Independentemente do exato nome a ser dado à alegação, tem-se pela "pré-executividade" a possibilidade de o executado alegar determinadas questões, em execução, sem a prévia garantia do juízo e o ajuizamento dos embargos do devedor."(15)

É óbvio que tal possibilidade cinge-se aos casos em que se faz palpável a ausência dos requisitos do título executivo, em especial por lhe faltar liquidez certeza ou ser inexigível, ocasião em que o juiz, examinando a prova produzida pelo opoente, pode trancar a execução, por ausência dos pressupostos processuais de existência e validade da relação jurídica, qual seja, o próprio título, que se desconstitui.

Vejamos o entendimento de HUMBERTO THEODORO JUNIOR: "Mostrando-se visivelmente nulo o título executivo ou manifestamente ilegítima a parte contra quem se intenta a execução fiscal, ou ainda, estando a relação processual contaminada de nulidade plena e ostensiva, cabe o expediente que se vem denominando "exceção de pré-executividade", que nada mais é do que o simples pedido direto de extinção do processo, independentemente do uso dos embargos e da segurança do juízo." (16)

Para TEREZA ARRUDA ALVIM WAMBIER, "seria absurdo que o sistema não contivesse freios, consubstanciados nas decisões negativas de admissibilidade, cujo objetivo é o de evitar que prossiga uma etapa procedimental gerada por um pedido fadado ao insucesso. É justamente a isso que se visa com o possibilitar que o executado alegue certo tipo de ‘defesa’, mesmo antes da citação, principalmente quando se trata de alegações que, se conhecidas e acolhidas, devem gerar necessariamente a extinção daquilo que nem execução chegou a ser." (17)

Pensamos não se tratar de defesa propriamente dita, mais porque o contraditório é sumário na execução e, embora se permita a manifestação do executado em variadas fases do processo, para assegurar o modo que lhe seja menos gravoso, a lei adjetiva não contempla fase apropriada para o exercício defensivo e nem abre a possibilidade de o executado discutir matéria de mérito em seu bojo.


6. HIPÓTESES DE CABIMENTO DA OBJEÇÃO DE NÃO-EXECUTIVIDADE

As matérias passíveis de serem alegadas por tal expediente não podem ser outras senão aquelas que incumbe ao magistrado conhecer e declarar de ofício.

Vê-se que a necessidade de o processo de execução atender aos postulados de existência e validade, tendo como pressuposto a existência de um título executivo líquido, certo e exigível, permite, sem o caráter de defesa propriamente dita, que o executado oponha-se diretamente à execução, prescindindo dos embargos, para atacar a deficiente formação da relação jurídica processual, que não se consolida por faltar-lhe um elemento essencial.

Neste sentido, o julgado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal:

EXECUÇÃO – OBJEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – HIPÓTESE DE CABIMENTO – 1. O desfazimento do contrato por novo acordo de vontades impede que persista qualidade de título executivo extrajudicial (artigo 585, inciso II, CPC) do instrumento escrito que as partes haviam assinado, no que tange às prestações que venceriam posteriormente. 2. A existência de título executivo é pressuposto processual necessário do processo de Execução, dele podendo o Juiz conhecer de ofício ou por provocação incidental do devedor, independentemente de penhora e da propositura da ação autônoma de Embargos. Agravo de Instrumento provido. Execução extinta.(18) (destaques nossos).

E o aresto da 4a Turma do Superior Tribunal de Justiça é esclarecedor:

Execução. Título imperfeito. Nulidade. Declaração independentemente da apresentação de embargos.

A argüição de nulidade da execução com base no art. 618 do Estatuto Processual Civil não requer a propositura da ação de embargos à execução, sendo resolvida incidentalmente.(19)

Realmente, estar-se-ia diante de um absurdo jurídico, privar o demandado de apontar a inexistência ou deficiência congênita da relação jurídica materializada em um título não revestido das formalidades legais.

PAULO HENRIQUE DOS SANTOS LUCON, comentando a objeção de não-executividade discorre: "A doutrina e jurisprudência têm gradativamente e com maior freqüência afirmado ser possível, pelo executado, a impugnação à executividade do título apresentado pelo exeqüente antes mesmo da realização da penhora. Como ato de afetação patrimonial que é, a penhora atinge de forma severa a esfera jurídica do executado, que muitas vezes está sendo injustamente demandado."(20)

Qual será, então a natureza jurídica da objeção de não-executividade, uma vez que o processo de execução não prevê apresentação de defesa, posto não envolver análise cognitiva?

A jurisprudência vem buscando defini-la, atribuindo-lhe a natureza de defesa específica no processo de execução. Exige, entretanto, como regra de admissão da postulação especial, nos próprios autos, a demonstração cabal do vício apontado, sem importar em aprofundamento na dilação probatória, conforme aresto do TRF 3a Região, que apesar de extenso, transcrevemos integralmente, pela profundidade de análise que encerra:

EXECUÇÃO FISCAL – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – CONCEITO – REQUISITOS – GARANTIA DO JUÍZO – DEVIDO PROCESSO LEGAL – 1 – A exceção de pré-executividade é uma espécie excepcional de defesa específica do processo de execução, ou seja, independentemente de embargos do devedor, que é ação de conhecimento incidental à execução; o executado pode promover a sua defesa pedindo a extinção do processo, por falta do preenchimento dos requisitos legais. É uma mitigação ao princípio da concentração da defesa, que rege os embargos do devedor. 2 – Predomina na doutrina o entendimento no sentido da possibilidade da matéria de ordem pública (objeções processuais e substanciais), reconhecível, inclusive, de ofício pelo próprio magistrado, a qualquer tempo e grau de jurisdição, ser objeto da exceção de pré-executividade (na verdade objeção de pré-executividade, segundo alguns autores que apontam a impropriedade do termo), até porque há interesse público de que a atuação jurisdicional, com o dispêndio de recursos materiais e humanos que lhe são necessários, não seja exercida por inexistência da própria ação. Por ser ilegítima a parte, não haver interesse processual e possibilidade jurídica do pedido; por inexistentes os pressupostos processuais de existência e validade da relação jurídica-processual e, ainda, por se mostrar a autoridade judiciária absolutamente incompetente. 3 – Há possibilidade de serem argüidas também causas modificativas, extintivas ou impeditivas do direito do exeqüente (v.g. pagamento, decadência, prescrição, remissão, anistia, etc.) desde que desnecessária qualquer dilação probatória, ou seja, desde que seja de plano, por prova documental inequívoca, comprovada a inviabilidade da execução. 4 – Isso não significa estar correta a alegação, de certa forma freqüente principalmente em execuções, de que, com a promulgação da atual Constituição Federal, a obrigatoriedade da garantia do juízo para oferecimento de embargos mostrar-se-ia inconstitucional, tendo em vista a impossibilidade de privação de bens sem o devido processo legal. É certo que o devido processo legal é a possibilidade efetiva da parte ter acesso ao poder judiciário, deduzindo pretensão e podendo se defender com a maior amplitude possível, conforme o processo descrito na lei. O que o princípio busca impedir é que de modo arbitrário, ou seja, sem qualquer respaldo legal, haja o desapossamento de bens e da liberdade da pessoa. Havendo um processo descrito na lei, este deverá ser seguido de forma a resguardar tanto os interesses do autor, como os interesses do réu, de forma igualitária, sob pena de ferimento de outro princípio constitucional, qual seja, da isonomia, que também rege a relação processual. Agravo improvido.(21)

A possibilidade de discutir a eficácia do título executivo em sede dos próprios autos de execução, justifica-se pela necessidade de o Poder Judiciário dar proteção jurídica aos interesses individuais ilegitimamente ameaçados de lesão pela própria ação de execução.

Mas quando o assunto é daqueles que comportam uma investigação prévia e sumária, suprindo o juízo inicial de admissibilidade deficitariamente realizado pelo juiz, "cada vez mais os tribunais brasileiros têm aceito as denominadas objeções de pré-executividade, que versam sobre matéria de defesa e são cognoscíveis de ofício pelo julgador por se referirem a questões de ordem pública, passíveis de apreciação independentemente de qualquer iniciativa do demandado (CPC, art. 267, § 3º, e 301, § 4º). Permite-se com tais objeções o oferecimento de defesas antes da efetivação da penhora ou do depósito e ao longo de todo o arco procedimental, pois não estão sujeitas à preclusão; o demandado pode insurgir-se contra a execução, antes de seguro o juízo, que autoriza a oposição de embargos por petição dirigida aos próprios autos do processo executivo."(22)

Na ótica de ANTÔNIO CARLOS COSTA E SILVA, se a hipótese for de ausência de pressupostos processuais, o juiz não poderá abster-se de conhecer da objeção, posto que tem por dever zelar pela regularidade do feito. É por isso que o autor assevera, ao falar dos deveres do juiz perante as partes, que aquele "não poderá deixar de extinguir o processo quando lhe faltar qualquer dos pressupostos processuais (art. 267, IV, combinado com o art. 598, do C. de Pr. Civil)"(23)

É de se imaginar o quanto de ônus a decisão pode abreviar para o exeqüente indevidamente demandado, em hipóteses em que não existe a relação jurídica invocada pela parte autora ou há, no título, nulidade que o torna imprestável a exigir a obrigação que supostamente encerra.

Caso típico é o de falsidade do documento ou da assinatura nele lançada, ou, ainda, de emissão maliciosa e fraudulenta (como ocorre no desconto de duplicatas que não correspondem a uma venda e compra real).

Seria injustamente oneroso exigir que o devedor gravasse seu patrimônio para só então demonstrar a estapafúrdia inexigibilidade do título executivo, movimentando ação de embargos, que se rege pelo processo de conhecimento, que exige dispêndio de valores nada módicos e experimentando, às vezes por anos, o dissabor da morosidade do Judiciário para ver anulada a pretensão executória.

PAULO HENRIQUE DOS SANTOS LUCON assinala que, "quando o título não existe ou quando a sua própria existência é posta em discussão, seria uma ilegalidade exercer constrição sobre o patrimônio do obrigado, justamente porque para tanto falta o elemento legitimador possível – ou seja, o título executivo."(24)

Outro não é o entendimento de ARAKEN DE ASSIS, embora vislumbre a dificuldade para fazer valer a exceção sem garantia de juízo e oposição de embargos – mas entendendo-a plenamente admissível, sobretudo para evitar prejuízos imotivados à parte – , senão vejamos:

"O principal óbice à admissibilidade desta exceção reside no regime legal da oposição do devedor. Como é notório, o Código criou remédio universal e único contra a execução, a ação incidental de embargos, e condicionou-a, outrossim, à penhora (art. 737, I) ou ao depósito (art. 737, II). Em contrapartida, conferiu efeito suspensivo ao contra-ataque do executado. Inúmeras vezes, porém, a suspensividade dos embargos se revela inútil. O depósito da coisa ou a penhora expressiva no patrimônio pode acarretar paralisação das atividades econômicas do devedor e outras conseqüências imprevisíveis".(25)

Sobre o autor
Helder Martinez Dal Col

Advogado e Professor no Paraná, Especialista em Direito Civil e Processual Civil pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/RJ), Mestre em Direito Civil pela Universidade Estadual de Maringá (UEM/PR)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COL, Helder Martinez Dal. A objeção de não-executividade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 48, 1 dez. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/908. Acesso em: 23 dez. 2024.

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