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A desaposentação do servidor público:

aspectos controvertidos

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Agenda 31/05/2007 às 00:00

4. Conclusão

O direito previdenciário é um ramo dos chamados direitos sociais e, como tal, tem tratamento diferenciado no que tange à proteção de seus beneficiários. Assim, ele surge para trazer ao trabalhador o direito e, principalmente, a garantia de uma velhice assistida, na qual tenha condições de sobreviver 26.

A concessão dessa proteção/garantia se materializa através de um ato administrativo denominado aposentação. Como abordamos neste trabalho, a aposentação é um ato vinculado, ou seja, reunidas suas condições, não cabe à Administração Pública analisar a conveniência ou oportunidade de sua concessão.

O desfazimento dos atos administrativos somente pode ocorrer nas hipóteses de anulação e revogação. Desse modo, a Administração Pública não pode usar de sua faculdade para extinguir atos administrativos, senão quando o interesse público a exigir – conveniência e oportunidade – devendo, nesse caso, se tratar de ato discricionário. A inconveniência do ato deve, necessariamente, atingir à própria Administração, não podendo um ato administrativo inoportuno e inadequado ao interesse do particular – que em nada interfere ao interesse público – ser revogado. Menos ainda pode se esperar ou mesmo admitir que um ato lícito, válido e eficaz seja anulado por conveniência do administrado.

No caso da desaposentação, conforme tentamos demonstrar neste estudo, sua viabilidade vai muito além de sua legalidade, passando pela cumulabilidade de cargos, segurança jurídica, ato jurídico perfeito, coisa julgada administrativa, ressarcimento dos valores percebidos a título de aposentadoria.

Sem dúvida alguma, a desaposentação, quando o servidor tem a pretensão de se habilitar em novo benefício, visa atender ao preceito constitucional da proteção ao trabalhador, esculpido dentre os direitos protetivos. Contudo, na busca pela consecução desse direito, não podemos ignorar as demais regras que norteiam a Previdência Social.

Sendo assim, até que haja norma específica tratando dessa matéria, o deslinde dessas questões caberá ao Poder Judiciário que, diante da ausência normativa vedando ou possibilitando tal pretensão, decidirá cada caso.


Notas

01 RODRIGUES. Flávio Martins. A Responsabilidade Civil dos Gestores de Fundos de Pensão. Revista de Previdência da UERJ nº 1. Rio de Janeiro: Gramma. 2004. p. 106.

02 Sobre o tema, veja o nosso trabalho intitulado "A solidariedade social e a contributividade como alicerces da Previdência Social dos servidores públicos civis", publicado na revista jurídica do site Âmbito Jurídico, disponível em <https://www.ambito-juridico.com.br/site/>

03 Embora a maioria da doutrina e da jurisprudência afirme ser a aposentação um ato complexo, nos filiamos ao posicionamento liderado pela ilustre administrativista Weida Zancaner (In, Reforma da Previdência e Controle das Aposentadorias pelos Tribunais de Contas. V Congresso Brasileiro de Direito de Estado. Disponível em <https://www.direitodoestado.com.br/viewvideo.asp?id=99> acesso em 08 de dezembro de 2006) segundo o qual no que se refere à formação da vontade o ato de aposentação é um ato simples, pois se perfaz integralmente no momento de sua publicação no Diário Oficial, quando passa a ser um ato existente, válido (tendo em vista a presunção de legitimidade dos atos administrativos) e eficaz. Isso se comprova pelo fato de o servidor público começar a receber os proventos de aposentadoria tão-logo saia a publicação do ato que concedeu a aposentadoria. A partir desse momento o ato passará a sofrer controle pelo respectivo Tribunal de Contas, sendo necessário para que o ato de aposentação se estabilize no ordenamento jurídico. Essa é a razão que leva a doutrina majoritária a classificá-lo, equivocadamente, como ato complexo.

04 Não interessa ao objeto do estudo aqui proposto entrar na discussão que surge em relação a uma inovação imposta pelo Decreto nº 3.048/99 em relação à Lei por ele regulamentada. Mas, com intuito de alimentar o debate, nos reportamos às palavras do sempre esclarecedor Celso Antônio Bandeira de Melo que ensina que "o regulamento não cria nem pode criar direitos, obrigações, deveres ou restrições à liberdade, à propriedade, às atividades ou direitos dos indivíduos, grupos ou pessoas jurídicas. Apenas circunscreve a discricionariedade administrativa que, do texto legal, resulta em prol da Administração".

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05 IBRAHIM, Fábio Zambitte. Desaposentação. O caminho para uma melhor aposentadoria. Ed. Impetus. Rio de Janeiro. 2005. p. 5.

06 Apelação Cível nº 2005.001.50840 cuja relatoria coube ao Desembargador Sidney Hartung.

07 Segundo a Teoria do desfazimento dos atos administrativos (também conhecida como Teoria da invalidade), esses podem se desfazer de duas maneiras: a primeira através da revogação, que se dá quando o ato praticado é desvinculado, podendo a Administração Pública exercer seu juízo de conveniência e oportunidade tanto para editar o ato quanto para desfazê-lo. Já a segunda ocorre por meio da anulação (ou invalidação) do ato viciado.

08 O vocábulo "lei" aqui é empregado no sentido amplo da palavra, vez que a previsão a que fazemos menção é constitucional (art. 7º, XXIV da CRFB).

09 ZANCANNER, Weida. Da convalidação e da invalidação dos Atos Administrativos. 2ª ed. Malheiros. São Paulo. 1996. p. 55.

10 Dispõe a Lei nº 9.784/99, que regulamenta o processo administrativo federal: Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de: I - atuação conforme a lei e o Direito;

11 In, Direito Administrativo Brasileiro. 25ª ed. Malheiros. São Paulo. p. 82.

12 In, Manual de Direito Administrativo. 10ª ed. Lumen Juris. Rio de Janeiro. 2003. p. 14.

13Gustavo Binenbojm, em artigo intitulado "Da Supremacia do Interesse Público ao Dever de Proporcionalidade: Um Novo Paradigma para o Direito Administrativo" publicado na Revista de Direito Administrativo, nº 239, leciona que "partindo da premissa de que interesses privados e coletivos coexistem como objeto de tutela constitucional, conclui-se que a expressão interesse público consiste em uma referência de natureza genérica, a qual abarca a ambos, interesses privados e coletivos, enquanto juridicamente qualificados como metas ou diretrizes da Administração Pública. Conseguintemente, o interesse público, num caso específico, pode residir na implementação de um interesse coletivo, mas também na de um interesse eminentemente individual. Este é o caso, v. g., da manipulação do aparato policial em defesa de um cidadão, situação que prestigia o valor segurança individual". Nesse mesmo sentido, leciona Celso Antônio Bandeira de Melo (In, Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros. 2003, p. 51) ao dizer que interesse público e interesse coletivo são sinônimos.

14 Esse pensamento se aproxima do que a doutrina chama de concepção restritiva do princípio da legalidade, segundo o qual a Administração Pública visa, em última instância, à realização do interesse público. A par dessa restrição, que impede a prática de ato contrário à lei, a Administração encontra-se livre para a consecução desse interesse público (aqui nos filiamos à corrente que entende interesse público como sendo aquele que busca atingir os interesses coletivos e particulares). A doutrina traz ainda outras duas concepções a respeito dessa submissão da Administração Pública às leis. São elas a concepção ampliativa e a concepção eclética.

15 In. Da Convalidação e da Invalidação dos Atos Administrativos. Rio de Janeiro: Malheiros, 1996. p. 23.

16 Idem. p. 52.

17 Op. Cit. p. 90.

18 Cumpre-nos esclarecer que as ações pessoais visam proteger os direitos pessoais em sua concepção estrita. Os direitos relativos à personalidade, embora dentro da categoria de direitos pessoais, são imprescritíveis.

19 Com a alteração introduzida pelo artigo 2º do Decreto-Lei nº 4.597/42, a referida prescrição qüinqüenal abrange também todo e qualquer direito e ação contra as autarquias, entidades e órgãos paraestatais criados por lei e mantidos mediante impostos, taxas ou quaisquer contribuições exigidas em virtude de lei. Esse, evidentemente é o caso das autarquias previdenciárias que são notoriamente mantidas com as contribuições previdenciárias.

20 A vedação da acumulação de vencimentos com proventos está consagrada pelo Supremo Tribunal Federal, só sendo permitida quando se tratar de cargos, funções ou empregos acumuláveis na forma do artigo 37, XVI e XVII, e artigo 95, § único, I, todos da Constituição da República. Dessarte, para não incidir em acumulação ilícita, o caminho a ser seguido será, necessariamente, a renúncia aos proventos.

21 Contudo, a regulamentação da matéria só adveio com a edição da Lei nº 9.796/99, e seu Decreto regulamentador n° 3.112/99, além da Portaria MPAS nº 6.209, de 16 de dezembro de 1999.

22 A Lei nº 6.226/75 já previa tal impossibilidade: Art. 4º - Para efeitos desta Lei, o tempo de serviço ou de atividades, conforme o caso, será computado de acordo com a legislação pertinente, observadas as seguintes normas: (...) III - Não será contado por um sistema, o tempo de serviço que já tenha servido de base para a concessão de aposentadoria pelo outro sistema;

23 Ao tratar do tema, Alexandre de Moraes disserta que "em regra, não poderá o Poder Público negar-se a fornecer as informações solicitadas". Mais adiante, o autor faz a ressalva de que o direito à expedição de certidão "jamais pode se dar sob hipóteses ou conjecturas relacionadas a situações ainda a serem esclarecidas" (in, Direito Constitucional. 15ª ed., Atlas: São Paulo, p. 190). Verifica-se, que a regra é o atendimento ao preceito constitucional, porém já há posicionamentos no sentido de que o direito de obter certidão da Administração Pública não pode ser considerado absoluto (MANNHEIMER, Sérgio Nelson. Parecer nº 20/94 publicado in: Revista de Direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. 47/1994. p. 137).

Portanto, nesse diapasão poderia se concluir que o direito à certidão não é um direito ilimitado ou incondicionado, podendo, em tese, sofrer certas limitações. No caso em discussão, poderia a Administração se negar a fornecer certidão de tempo de serviço para o servidor que renunciou à aposentadoria ou mesmo fornecer ressalvando a impossibilidade daquele tempo ser novamente computado.

24 Não tem maiores importância para nosso estudo a discussão que se criou em torno da acumulação de cargos. Para uma corrente, a essência da inacumulabilidade está no dispêndio de quantias do Tesouro para o mesmo servidor, enquanto para outra a regra se aplica ao cargo em si, sendo impossível a cumulação mesmo que haja renúncia aos estipêndios, salvo nas hipóteses constitucionais.

25 Deve-se anotar o fato de a parcela percebida em decorrência da aposentadoria ter natureza alimentar, o que suscita a discussão quanto à impossibilidade de sua restituição.

26 Sem entramos aqui na questão da necessidade de se ajustar as aposentadorias à realidade, passando, de fato, a garantir um mínimo para a vida decente dos nossos idosos.


Referências Bibliográficas

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COIMBRA, Flavia Natario. Renúncia à aposentadoria: possibilidade jurídica e conseqüências. Revista Previdenciária Municipal nº 2. Rio de Janeiro. 2006. Disponível em <https://www.rio.rj.gov.br/previrio/default.htm> acesso em 25 de outubro de 2006.

ERTHAL, Clélio. Prescrição e Decadência. Estudos em homenagem ao Desembargador Valmir Peçanha. Revista da EMARF. Edição Especial Histórica nº 1. p. 37/43.

MANNHEIMER, Sérgio Nelson. Parecer nº 20/94 publicado in: Revista de Direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. 47/1994.

MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. Rio de Janeiro, Forense, 1980.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 15ª ed., Atlas: São Paulo.

NOVAES, André Santos. Possibilidade de Desaposentação. In Temas Atuais de Previdência Sócial: Homenagem a Celso Barroso Leite. Wladimir Martinez Novaes (coord). São Paulo: LTR, 1998.

IBRAHIM. Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 5. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2005.

_____________________. Desaposentação. O caminho para uma melhor aposentadoria. Rio de Janeiro. Ed. Impetus, 2005.

RODRIGUES, Flávio Martins. A Responsabilidade Civil dos Gestores de Fundos de Pensão. Revista de Previdência da UERJ nº 1. Rio de Janeiro: Gramma, 2004.

_________________________. Fundos de Pensão de Servidores Públicos. Rio de Janeiro: Renovar. 2002.

SILVA. Fábio de Souza. Desaposentação. Revista Direito Atual nº 1. 2006. Disponível em <https://www.direitoatual.com.br/artigos.php> Acesso em 15 de dezembro de 2006.

ZANCANER, Weida. Da Convalidação e da Invalidação dos Atos Administrativos. Rio de Janeiro: Malheiros, 1996.

_________________. Reforma da Previdência e Controle das Aposentadorias pelos Tribunais de Contas. V Congresso Brasileiro de Direito de Estado. Disponível em <https://www.direitodoestado.com.br/viewvideo.asp?id=99> acesso em 08 de dezembro de 2006.

Sobre o autor
Rodrigo Felix Sarruf Cardoso

consultor do Escritório Medeiros e Buonora Advogados, pós-graduando em Direito Público, assistente da diretoria jurídica do Fundo Único de Previdência Social do Estado do Rio de Janeiro (RioPrevidência)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARDOSO, Rodrigo Felix Sarruf. A desaposentação do servidor público:: aspectos controvertidos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1429, 31 mai. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9965. Acesso em: 22 nov. 2024.

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